Subido por Diana Villota

ARTIGO PERMANOVA

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Programa de Pós-Graduação em Ecologia – CCB – UFSC
Copyright © 2018 – PPG Ecologia UFSC
Impresso no Brasil / Printed in Brazil
Diagramação: Maiara Albuquerque Hayata e Eduardo L. Hettwer Giehl (capa)
Foto da capa: araucária, Araucaria angustifolia (Bertol.) Kuntze na RPPN Grande
Floresta das Araucárias, Bom Retiro, SC. Autor: Andrei Langeloh Roosl
Foto da contra-capa: aranha, Parawixia sp., na RPPN Grande Floresta das
Araucárias, Bom Retiro, SC. Autor: Andrei Langeloh Roos
Revisão: Autores e organizadores
Catalogação na fonte pela Biblioteca Universitária da
Universidade Federal de Santa Catarina
Programa de Pós-Graduação em Ecologia
Centro de Ciências Biológicas, UFSC
Campus Universitário Trindade, Florianópolis, SC, Brasil - CEP 88010-970
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Ecologia de Campo: Ambientes Costeiros e Montanos
Riqueza e composição de espécies arbóreas
em áreas de Floresta Ombrófila Mista com
diferenças no uso pelo gado
Rupil, G.; Machado, M. X.; Burg Mayer, G.; Peres, L. M. C.; Roos, A. L.; Peroni, N.;
Giehl, E. L. H.
Introdução
A composição da assembleia de plantas em um local é determinada pelas diferentes
capacidades das plantas para enfrentar as condições do ambiente. Essa capacidade
depende das diferenças na performance das espécies que é influenciada pela
disponibilidade de recursos, competição, predação e condições ambientais. Além
disso, a composição de assembleias depende de diferenças na disponibilidade de
espécies, que resultam da disponibilidade de vetores para dispersão, conectividade
e do banco de sementes, e da disponibilidade de locais adequados e que podem ser
modificados pela intensidade e frequência de distúrbios (Pickett et al., 2005).
O distúrbio pode ser definido como qualquer evento discreto no tempo que
perturbe a estrutura de ecossistemas, comunidades ou populações e altere a
disponibilidade de recursos, substrato ou ambiente físico (White & Pickett, 1985).
Distúrbios podem dar início a processos sucessionais. Estabilidade ou ausência de
sucessão pode ocorrer quando distúrbios são muito raros ou pouco intensos, e o
contrário quando distúrbios são frequentes ou severos. No caso de distúrbios muito
raros, pode-se chegar a comunidades estáveis dominadas por espécies de vida
longa, que substituem a si mesmas após distúrbios, ou espécies com ambas
características. No caso de distúrbios frequentes, podem ser mantidas comunidades
ruderais que raramente mudam de estágio sucessional, e no caso de distúrbios
severos podem ser promovidas espécies tolerantes ao estresse, e a composição de
espécies pouco muda ao longo do tempo (Walker & Moral, 2009).
Entretanto, o distúrbio também pode afetar positivamente a riqueza de
comunidades. Muitas formas de distúrbio são componentes relevantes de sistemas
naturais, sendo particularmente importantes na manutenção da biodiversidade em
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comunidades ricas em espécies, como proposto na hipótese do distúrbio
intermediário de Connell (1978).
Segundo esta hipótese, os distúrbios, ao abrirem espaço para colonização e
disponibilizarem recursos, permitem uma coexistência entre espécies que são boas
competidoras e espécies que são boas colonizadoras. Isto não seria possível num
ambiente em equilíbrio, onde prevaleceriam as espécies com alta capacidade
competitiva, que eliminariam as demais. Por outro lado, num ambiente com alta
frequência ou intensidade de distúrbios prevaleceriam espécies pioneiras. Assim,
frequências ou intensidades intermediárias de distúrbio gerariam um balanço ideal
que permitiria a coexistência de um maior número de espécies (Connell, 1978).
A floresta com araucária ou Floresta Ombrófila Mista (FOM) é um ecossistema
típico do sul do Brasil. No planalto norte de Santa Catarina, as paisagens são
compostas por mosaicos de fragmentos florestais e áreas de cultivo e de pastagem
em meio à FOM. Tais áreas são denominadas caívas, paisagens heterogêneas
dentro de paisagens culturais onde ocorre uso da área para pastejo do gado e
manejo florestal, como a extração de erva-mate e pinhão (Mello, 2013). Em caívas, o
gado desempenha um importante papel na transformação da paisagem,
removendo o estrato herbáceo ao se alimentar e pisotear estas áreas, mantendo o
sub-bosque livre de espécies que podem interferir com as espécies de interesse.
Além disso, consome frutas de diversas espécies, principalmente de mirtáceas,
família que contribui significativamente na composição florística das caívas, sendo
uma das espécies de maior riqueza específica, juntamente com Lauraceae e
Aquifoliaceae (Mello & Peroni, 2015).
Assim, o objetivo deste trabalho é determinar se as diferenças na intensidade de
uso pelo gado bovino afetam a composição taxonômica e diversidade da vegetação
arbórea em caívas. Hipotetizamos que áreas de caívas com uso mais intensivo pelo
gado apresentarão riqueza e composição diferentes de áreas onde a presença de
gado é menos frequente. Paralelamente, foram caracterizadas as áreas e a
fisionomia do terreno para detectar possíveis diferenças nas áreas consideradas.
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Material e métodos
Área de estudo e coleta de dados
O estudo foi desenvolvido na Fazenda Reunidas Campo Novo e áreas adjacentes à
RPPN Grande Floresta das Araucárias, município de Bom Retiro, Santa Catarina.
Foram selecionadas duas áreas na Floresta Ombrófila Mista de acordo com
diferentes intensidades de uso do gado, sendo uma localizada na área de fazenda,
com maior uso pelo gado (27° 54’ 17.53“S, 49° 26’ 1.79”O). A segunda |rea foi
selecionada na vegetaç~o contígua { |rea florestal que compõem a PPN (27° 54’
42.55“S, 49° 26’ 34.14”O), e que apresentam menor intensidade de uso pelo gado. O
uso pelo gado foi ranqueado de um a cinco com base no pisoteio e fezes em cada
parcela. Nenhuma parcela foi classificada como sem uso pelo gado.
Em cada área foram marcadas dez parcelas de 100 metros quadrados (10 x 10 m),
orientadas ao longo de uma transeção sentido norte/sul e distanciadas dez metros
entre si, totalizando cinco parcelas em cada área. Foram determinados cinco pontos
em cada parcela, quatro situados a três metros de cada vértice em direção ao centro
e um ponto central, onde foram medidas a inclinação, com um clinômetro, e altura
da serapilheira, com uma régua de 30 cm colocada em contato com o solo. Foi
considerado o valor médio dessas cinco medidas para cada parcela. A abertura de
dossel foi medida com um densiômetro esférico (Bartlesville), a partir de cinco
medidas em cada parcela. Essas foram dispostas em pontos sorteados
aleatoriamente e posteriormente foi obtida a média para cada parcela. Dentro de
cada parcela, foram contabilizadas e registradas as medidas de circunferência à
altura do peito (CAP a 1,30 m) de todos os indivíduos arbóreos com pelo menos de
30 cm de CAP. Estes indivíduos foram marcados com plaquetas metálicas
numeradas, identificados a nível de espécie, e tiveram sua altura estimada
visualmente.
Análises estatísticas
Inicialmente foram avaliadas possíveis diferenças na abertura do dossel, na
cobertura de serapilheira e na inclinação do terreno entre as áreas amostradas. Foi
aplicado um teste Shapiro-wilk, para checar a normalidade das variáveis.
Posteriormente, foi aplicado o teste t para variáveis com distribuição normal e um
teste de Wilcoxon para aquelas cuja distribuição não fosse normal.
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Em seguida foram estimadas curvas de rarefação para a riqueza de espécies das
duas áreas (pouco gado e muito gado) através do pacote iNEXT (Chao et al., 2014,
2015). Posteriormente, a hipótese de diferenciação na composição de espécies
arbóreas em função da intensidade no uso pelo gado foi testada por meio de análise
de variância multivariada (Permanova). Para isso, os dados de abundância das
espécies foram logaritmizados e a dissimilaridade calculada usando a distância de
Bray-Curtis entre parcelas. A homogeneidade da dispersão multivariada para as
duas áreas foi avaliada para validar o resultado obtido com a Permanova. O
resultado foi representado graficamente com uma análise de coordenadas
principais (PCoA). Todas as análises multivariadas foram calculadas com o pacote
Vegan (Oksanen et al., 2007). A homogeneidade da dispersão multivariada para as
duas áreas foi testada por meio da função betadisper do mesmo pacote, de forma a
corroborar o resultado obtido com a Permanova. A significância do teste de
homogeneidade foi testada por meio da função permutest do pacote Vegan com
999 permutações. Todas as análises estatísticas foram realizadas com linguagem de
programação R (versão 3.4; R Core Team, 2017).
Resultados
Em relação às características dos ambientes, o teste de Wilcoxon mostrou que
existe diferença significativa na abertura do dossel entre as duas áreas. (W= 25, P <
0,01; Fig. 1). Nem a inclinação do terreno nem a cobertura da serapilheira
mostraram diferenças significativas entre as duas áreas comparadas.
Foram encontrados 116 indivíduos, pertencentes a 26 espécies arbóreas, nas
duas áreas: na área com pouco gado havia 55 indivíduos de 19 espécies, e na área de
muito gado 61 indivíduos de 14 espécies. Sete espécies foram comuns às duas áreas,
sendo 12 exclusivas da área com pouco gado e sete exclusivas da área de muito
gado (Tabela 1). A família com maior abundância foi Myrtaceae, totalizando 67%
dos indivíduos encontrados em áreas com muito gado e 45% dos indivíduos
amostrados em áreas de pouco gado. O aninhamento da composição de espécies
foi de 41% entre as duas áreas.
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Figura 1 - Inclinação do terreno, profundidade da serapilheira e abertura do
dossel em áreas com „muito gado‟ e „pouco gado‟.
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Tabela 1. Abundância relativa de espécies arbóreas em duas áreas com muito e
pouco uso do solo pelo gado.
Táxon
Acca sellowiana
Araucaria angustifolia
Blepharocalyx salicifolius
Cf. Myrsine
Symplocos tenuifolia
Clethra scabra
Drymis brasiliensis
Illex cf. dumosa
Illex paraguariensis
Lithraea melleoides
Matayba eleagnoides
Myrcia sp. 2
Myrceugenia cf. acutata
Myrceugenia ovalifolia
Myrceugenia cf. oxysepala
Calyptranthes concinna
Myrcia sp. 1
Myrsine coriacea
Ocotea sp.
Ocotea puberula
Ocotea pulchella
Schinus polygamus
Scutia buxifolia
Styrax leprosus
Symplocos uniflora
Zanthoxylum rhoifolium
Muito gado (%)
5
8
6
6
2
2
5
3
6
4
2
5
5
7
Pouco gado (%)
2
5
3
2
2
2
4
2
2
5
6
6
6
2
2
2
2
2
2
As curvas de rarefação entre as duas áreas amostradas se sobrepuseram,
mostrando não haver diferença de riqueza entre as mesmas, mesmo quando
projetadas para o dobro do tamanho da amostra em cada área (Figura 2). Por outro
lado, a Permanova indicou diferenças significativas na composição de espécies entre
as duas áreas estudadas (F = 2,61; P = 0,009; Fig. 3). Na Fig. 3 é possível visualizar a
diferenciação na composição de espécies entre as duas áreas. A análise betadisper
demonstrou não haver diferenças significativas na dispersão multivariada (F = 0,207;
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P = 0,603), corroborando o resultado obtido na permanova que demonstrou haver
diferenças na composição de espécies entre as áreas amostradas.
Figura 2 - Curvas de rarefação nas áreas com muito e pouco gado.
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Figura 3 - Diagrama de ordenação (PCoA) apontando para diferença de
composição de espécies nas duas áreas com diferença de uso pelo gado. Os
eixos PCoA 1 e PCoA 2 explicam 33,49% e 19,53% da variação
respectivamente.
Discussão
A diferença na intensidade do uso pelo gado não influenciou a riqueza de espécies
arbóreas, que foi semelhante nas duas áreas estudadas. Por outro lado, houve
diferença de composição, logo, há indícios de uma influência na estrutura da
vegetação com o uso diferenciado das áreas pelo gado. Assim, a presença do gado
mantém diferenças existentes ou pode proporcionar mudanças na composição de
espécies arbóreas, uma vez que impacta nos processos de regeneração e
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estruturação ambiental por meio do pisoteio, herbivoria e eventual dispersão de
espécies.
As diferenças na biologia das espécies, com diferentes sensibilidades aos
impactos causados pelo gado, podem gerar a médio e longo prazo uma
diferenciação em comunidades arbóreas. A grande abundância de mirtáceas nas
áreas pode estar relacionada à dispersão de sementes, uma vez que o gado se
alimenta de frutos destas espécies (Mello & Peroni, 2015). Alternativamente, as
florestas ombrófilas mistas são importantes ambientes para dispersão e reprodução
de mirtáceas (Sonego et al., 2007). Entretanto, o histórico das paisagens analisadas
é desconhecido, ou seja, não há informações pretéritas sobre a intensidade e
frequência de uso pelo gado nessas áreas. A diferenciação na composição de
espécies também pode ser explicada pelas interações com outras espécies,
herbívoros e dispersores da comunidade. Tais relações irão determinar o real
impacto dos pastejadores na composição das comunidades vegetais (McIntyre et
al., 1999).
Finalmente, embora a real importância do uso pelo gado no processo de
diferenciação das comunidades arbóreas seja mal compreendida, foi encontrada
diferença apenas na composição de espécies e não na riqueza como havia sido
postulado.
Agradecimentos
Agradecemos ao MSc. Rafael Barbizan Sühs pela colaboração em campo e ao
Programa de Pós-graduação em Ecologia-UFSC pelo apoio financeiro e logístico
para a realização deste trabalho.
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