ALVARO HENRIQUE SIQUEIRA CAMPOS SANTOS As Sonatas para Violão de Manuel Maria Ponce BACHARELADO EM MÚSICA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO 2004 i ALVARO HENRIQUE SIQUEIRA CAMPOS SANTOS As Sonatas para Violão de Manuel Maria Ponce Monografia apresentada à Banca Examinadora da Universidade de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do grau de bacharel em música, sob a orientação do Prof. Dr. Edelton Gloeden. SÃO PAULO 2004 ii DEDICATÓRIA A quem me permitiu estudar quatro anos fora de casa, meu pai e minha mãe; A todos que me ajudaram nesse período em que vivi nessa cidade, especialmente os amigos (Luis Lieu e Leandro Manfio Ferreira em especial, mas seria injusto esquecer de pessoas como Maécio Gomes, Natália, Liana Pereira, Ricardo Meira-Lins) e minha namorada, Alda Regina Minioli, bem como toda sua família; A todos os que me ajudaram na elaboração e apresentação desse trabalho, em especial à simpaticíssima Corazon Otero e ao atual diretor da ECA, Waldenyr Caldas; Ao meu pai, que trabalhou toda a vida em prol de seus filhos e faleceu poucos meses antes de ver minha irmã e a mim formados. iii SUMÁRIO 1 - INTRODUÇÃO .....................................................................................................1 2 - BIOGRAFIA...........................................................................................................4 3 - A OBRA PARA VIOLÃO DE MANUEL PONCE E SUA RELAÇÃO COM ANDRÉS SEGOVIA....................................................................................................9 4 – SONATAS PARA VIOLÃO SOLO DE MANUEL MARIA PONCE............13 4.1 – Comparação entre a edição urtext e a edição publicada das obras..............13 4.1.1 – Sonata Mexicana..............................................................................................14 4.1.2 – Sonata em Lá menor.........................................................................................17 4.1.3 – Sonata III..........................................................................................................17 4.1.4 – Sonata Clássica................................................................................................17 4.1.5 – Sonata Romântica.............................................................................................22 4.1.6 – Sonata de Paganini..........................................................................................32 4.2 – Apontamentos sobre a forma das sonatas para violão solo de Manuel Maria Ponce............................................................................................................................34 4.2.1 – Sonata Mexicana..............................................................................................35 4.2.1.1 – Allegro moderato...........................................................................................36 4.2.1.2 – Andantino affettuoso.........................................................................................38 4.2.1.3 – Allegretto, quasi serenata...................................................................................39 4.2.1.4 – Allegretto un poco vivace..................................................................................40 4.2.2 – Sonata III..........................................................................................................41 4.2.2.1 – Allegro moderato..............................................................................................41 4.2.2.2 – Chanson – Andantino molto espressivo...............................................................43 4.2.2.3 – Allegro non troppo............................................................................................44 4.2.3 – Sonata Clássica................................................................................................45 iv 4.2.3.1 – Allegro.............................................................................................................46 4.2.3.2 – Andante............................................................................................................48 4.2.3.3 – Menuet – Trio...................................................................................................48 4.2.3.4 – Allegro.............................................................................................................49 4.2.4 – Sonata Romântica.............................................................................................50 4.2.4.1 – Allegro non troppo, semplice.............................................................................50 4.2.4.2 – Andante............................................................................................................52 4.2.4.3 – Moment Musical – Vivo....................................................................................53 4.2.3.4 – Allegro non troppo e serioso..............................................................................54 4.2.5 – Sonata de Paganini..........................................................................................55 5 - CONCLUSÃO.......................................................................................................56 6 - BIBLIOGRAFIA...................................................................................................57 ANEXOS PRIMEIRA EDIÇÃO DAS SONATAS PARA VIOLÃO SOLO DE PONCE......1 Sonata Mexicana...........................................................................................................2 Sonata III.....................................................................................................................17 Sonata Clássica............................................................................................................27 Sonata Romântica.......................................................................................................39 EDIÇÃO URTEXT DAS SONATAS PARA VIOLÃO SOLO DE PONCE........53 Sonata Mexicana.........................................................................................................54 Sonata III.....................................................................................................................62 Sonata Clássica............................................................................................................70 Sonata Romântica.......................................................................................................78 v Sonata de Paganini......................................................................................................89 OUTROS ANEXOS...................................................................................................99 Manuscrito do terceiro movimento da Sonata Mexicana.....................................100 Manuscrito da Sonata de Paganini..........................................................................101 Manuscrito de uma versão em andamento da Sonata Clássica............................112 Edição da Sonata a Chitarra Sola com Acompagnamiento di violino de Paganini.....................................................................................................................115 E-mail de Angelo Gilardino ao autor do presente trabalho.................................126 vi 1 - Introdução Manuel Maria Ponce (1882-1948) está entre os compositores que mais escreveram para violão no século XX. Isso já seria suficiente para despertar nos violonistas o interesse de estudá-lo, mas sua obra tem ainda outras peculiaridades significativas: ele é um dos primeiros compositores nacionalistas latino-americanos; sua produção violonística é altamente idiomática; ele emprega várias linguagens musicais nas suas peças para violão (vide quadro 1) e sua primeira peça para violão tornou-se o terceiro movimento de uma sonata (a Sonata Mexicana), primeira sonata para violão solo escrita após um hiato de cerca de cem anos. O fato de a obra ser uma sonata é mais inusitado se considerarmos que poucos compositores se aventuram a escrever pela primeira vez para violão uma obra longa. Toda a produção musical de Ponce não está alinhada às vanguardas musicais de seu tempo, especialmente com a segunda escola de Viena. Há na obra violonística de Ponce peças com linguagens distintas, separáveis em três grandes grupos, que nesse trabalho nós denominaremos de Nacionalismo, Impressionismo e obras de epígono1. Serão tidas como Nacionalistas as obras que empregam conscientemente elementos folclóricos do México; Impressionistas as obras que procuram obter um resultado estético similar ao das obras de Gabriel Fauré (1845-1924), Claude Debussy (1862-1918) e Maurice Ravel (1875-1937) e, por fim, obras de epígono as obras que deliberadamente foram compostas com o objetivo de imitar o estilo de outros compositores. Todas as suas obras para violão conhecidas até o presente momento estão classificadas a seguir nesses três grupos. 1 Em MED, Bohumil. Teoria da Música, Brasília, Editora Musimed, 1996, p. 396 esse termo é definido como “compositor que segue o estilo dos grandes mestres”. 1 Quadro 1: Linguagem das obras para violão solo de Manuel Maria Ponce Obra 2 Data Cidade Linguagem predominante Sonata I – Sonata Mexicana Canciones Mexicanas Prélúde Thème varié et Finale Sonata II - Sonata em Lá Menor3 Sonata III c. 1923 out. 1925 23 dez. 1925 21 ago. 1925 - México México Paris Paris Paris Nacionalista Nacionalista Impressionista Impressionista / traços românticos - c. 1927 Paris Sonata IV – Sonata Clássica Sonata V - Sonata Romântica Suíte I – Suíte de Weiss 24 Prelúdios dez. 1927 – jan. 1928 ago. 1928 Paris Impressionista, uso de elementos espanhóis no terceiro movimento. Obra de epígono à Franz Joseph Haydn Paris Obra de epígono à Franz Schubert c. 1929 fev. 1929 Paris Paris Estúdio Sonata VI – Sonata de Paganini 19 maio 1930 31 ago. 1930 Paris Paris Sonatina Prelúde, Ballet y Courante Prelúdio, Tema, Variações e Fuga Suíte II – Suíte de Scarlatti dez. 1930 out. 1931 1931 a 1932 Paris Paris Paris jan. a jun. de 1932 jan. 1932 Paris Obra de epígono ao estilo Barroco Misto: obra de epígono (clássico e barroco), caráter espanhol, nacionalista, impressionista Obra de epígono: romantismo/ caráter espanhol Livre adaptação sobre a Grand Sonata a Chitarra Sola com Acompagnamiento di violino de Paganini Impressionista / caráter espanhol Obra de epígono ao estilo Barroco Misto: impressionista, nacionalista, exercício de estilo Obra de epígono ao estilo Barroco Paris Impressionista 1932 a 1933 11 maio 1946 Paris /México México Misto: caráter espanhol, impressionista e cubano Impressionista 2 set. 1947 México Nacionalista 8 fev. 1948 México Misto: impressionista, nacionalista e obra de epígono Final del Homenaje a Tárrega4 Cuatro Piezas Viñetas (dedicada a Jesús Silva) Seis Prelúdios Fáciles (dedicada à filha de Carlos Chavez) Variaciones (dedicada ao Pe. Brambilla)5 Fonte: ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, p. 6 Nota: Dados trabalhados pelo autor 2 Será utilizada a nomenclatura proposta por Alcazar (2000, p. 6), embora se trate de uma nomenclatura conflitante com a da primeira edição dessas peças, por se tratar de uma edição urtext e a única integral da obra para violão solo de Ponce. 3 Obra tida como extraviada. O musicólogo italiano Angelo Gilardino afirma ter em sua posse fragmentos do último movimento, conforme correspondência em anexo, e devido a compromissos legais não pode me permitir o acesso a essa partitura. 4 Os dois primeiros movimentos são tidos como extraviados, só restando o terceiro movimento, que foi publicado pela primeira vez em PONCE, Manuel Maria. Homenaje a Tárrega per chitarra. Ancona: Bèrben, [s/d]. Revisão e digitação: Angelo Gilardino. 5 ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, p. 296 diz que o tema utilizado não é de autoria de Cabezón mas que se trata do tema Filii et Filiae, do Líber Usualis católico. 2 Nota-se que as formas empregadas são sonatas (em número de seis), peças características (seis obras, cinco com mais de um movimento), temas com variações (três obras), sonatinas (duas), suítes (duas), uma peça didática e um arranjo de canções populares mexicanas. As obras Nacionalistas são três, escritas no México; as Impressionistas são seis, das quais cinco foram escritas em Paris, e as obras de epígono são seis, todas escritas em Paris. Algumas obras apresentam uma linguagem mista (quatro obras escritas em México e Paris). Essas últimas não são obras que fundem perfeitamente essas três linguagens num só estilo por toda a peça, mas que apresentam mudanças de linguagem entre seus movimentos. Uma análise mais detalhada da relação entre o período, a cidade e a linguagem de cada uma das Sonatas, objeto desse estudo, será fornecida adiante. À exceção das três últimas peças desse compositor, todas as obras mencionadas no quadro 1 foram escritas graças ao incentivo de Andrés Segovia (1893-1987), violonista espanhol que ao longo de sua carreira procurou fomentar a produção de obras para violão feitas por compositores não-violonistas6. O conjunto de seis sonatas constitui um dos grupos mais representativos da produção para violão solo de Ponce, pois apresenta todas as tendências estéticas empregadas em sua obra violonística. Além disso, a publicação das cartas trocadas entre o compositor mexicano e Segovia permite acompanhar a composição de cada uma dessas obras. 6 De acordo com o musicólogo norte-americano Matanya Orphée, em consulta ao fórum violão erudito (Disponível em: <http://www.forumnow.com.br/vip/mensagens.asp?forum=26122&grupo=74032&topico=2544068&nrpa g=1>. Acesso em: 23 nov. 2004), a mais antiga obra para violão solo escrita por um compositor nãoviolonista conhecida atualmente são as duas valsas do pianista argentino Juan Pedro Esnaola (18081878), compostas em 1848. 3 O objetivo desse trabalho é, portanto, estudar as sonatas para violão solo de Manuel Maria Ponce por meio de uma breve análise motívica e estrutural dessas peças, atentando para as linguagens musicais utilizadas, e de uma comparação entre as edições existentes delas, quando possível. Tal comparação visa reunir informações que possibilitem a elaboração de uma edição crítica das sonatas para violão de Ponce no futuro. Como a produção das peças para violão desse compositor teve forte ligação com seu contato com Andrés Segovia, que o considerava o melhor compositor para violão que conheceu7, apresentamos uma biografia de Ponce e um capítulo tratando da influência de Segovia na produção dessas obras. 2 - Biografia8 Manuel Maria Ponce nasceu em 8 de dezembro de 1882, em Zacatecas, México. Com dois meses de idade sua família mudou-se para Aguascalientes, cidade que ele sempre teve como sua terra natal. Sua mãe incentivou seus filhos a estudar música e outras artes. Sua irmã Josefina notou o interesse de seu irmão na música e lhe deu suas primeiras aulas de piano e solfejo, aos quatro anos. Com isso Manuel Ponce aprendeu a ler música antes de aprender a ler o alfabeto. 7 ALCAZAR, Miguel. The Segovia-Ponce letters. Columbus: Orphée, 1989, p. 47. apresenta o seguinte trecho escrito por Segovia para Ponce: “En fin, tu obra, es lo que mas vale, para mi, y para todos los musicos que la oyen, de la literatura guitarristica. Y tu, personalmente, tambien, entre todos los que se me han acercado y he conocido”. 8 Foi utilizada como fonte biográfica OTERO, Corazon. Manuel M. Ponce y la Guitarra. México: Fonapas, 1981. 4 Sua primeira composição, La danza del sarampión, data de seus cinco anos de idade, escrita enquanto estava com sarampo. Aos dez anos passou a ter aulas com um professor de piano propriamente dito e ingressou no coro infantil do templo de San Diego. Aos treze se tornou organista ajudante e aos quinze, organista titular dessa igreja, o que demonstra que foi uma criança prodígio. Com dezenove ingressou no Conservatório Nacional de Música do México, mas regressou a Aguascalientes descontente com o curso, que achou deveras acadêmico. A partir de então passou a pesquisar o folclore mexicano, estudando a canção popular de seu país – inclusive a de origem pré-colombiana. Incentivado pelo contexto político e musical da época, sua obra demonstrou uma busca por mudar o fazer musical mexicano. Tais fatos devem-se à Revolução Mexicana e a consolidação do nacionalismo musical. Com vinte e dois anos vendeu seu piano e usou o dinheiro para aperfeiçoar-se na Europa pela primeira vez. Foi admitido no Liceu Rossini, em Bologna, para ter aulas de composição com Luigi Torcchi e Cesare Dall’Olio, alunos de Giacomo Puccini (1858-1924). Mudou-se para Berlin (onde os ideais estéticos de Richard Wagner (1813-1883) e Johannes Brahms (1833- 1897) predominavam). Em 1908, viu-se forçado a voltar para o México devido a sua situação econômica. Quando voltou a sua pátria passou a trabalhar com o folclore mexicano num país ainda culturalmente eurocentrista. Até então escrevia quase que somente danças ou outras formas menores, empregando uma linguagem romântica. A partir de sua volta ao México passou a empregar grandes formas musicais com o uso cada vez mais consciente do folclore enquanto escrevia canções populares. Em 1911 escreveu um 5 concerto para piano e orquestra e no ano seguinte escreveu sua famosa canção Estrellita. Apesar de Manuel M. Ponce ter iniciado a escola nacionalista mexicana, sua linguagem tem influência européia, o que leva alguns estudiosos, entre eles Corazon Otero, a ter sua obra como nacionalismo não-puro. O que o compositor demonstrou ao longo de sua vida, no entanto, era que toda a linguagem musical à sua volta lhe era facilmente assimilável e influenciava sua maneira de escrever música. Em 1915 ele se exilou em Cuba e escreveu algumas obras de forte caráter cubano, como a Sonata para violoncello y piano, a Suíte Cubana, a Rapsódia Cubana e a Paz de Ocaso para piano.9 Dois anos mais tarde ele se casou com Clementina Maurel (carinhosamente chamada de Clema), contralto de origem francesa. Em seguida, se tornou maestro da Orquestra Sinfônica Nacional do México, cargo que abandonou em 1919 por motivos políticos, e passou a se dedicar à composição, ao ensino e à crítica musical. Em 1923, assistiu a um recital de Segovia no México. No dia seguinte, ele escreveu o seguinte artigo em sua coluna “Crônicas Musicales por Manuel M. Ponce” no El Universal: “El espléndido recital de Andrés Segovia Oír las notas de la guitarra tocada por Andrés Segovia, es experimentar una sensación de intimidad y bien estar hogareño; es evocar remotas y suaves emociones envueltas en el misterioso encanto de las cosas pretéritas; es abrir el espíritu al ensueño y vivir unos momentos deliciosos en un ambiente de arte puro, que el gran artista español sabe crear... Andrés Segovia es un inteligente y valioso colaborador de los jóvenes músicos españoles que escriben para guitarra. Su cultura musical permítele traducir con fidelidad en 9 OTERO, Corazon. Manuel M. Ponce y la Guitarra. México: Fonapas, 1981, p. 25. 6 su instrumento el pensamiento del compositor y, de esta manera, enriquece día a día el no muy copioso repertorio de música para guitarra... Al final de su recital toco la “Sonatina” de Moreno Torroba que em mi modesta opinion fue la obra más importante del programa que desarrolló magistralmente Andrés Segovia, em su recital de presentación ante el público de México. En esa “Sonatina” se descubre al compositor lleno de ideas melódicas, al músico conocedor de las formas clásicas, al sapiente folclorista, que con elementos de ritmos y melodías populares sabe construir obras importantes por su desenvolvimiento y nuevas tendências armónicas. Casals y Segovia han sido de los pocos artistas que se han adueñado instantaneamente de la admiración y entusiasmo de nuestro público...”10 Segovia se interessou em conhecer o articulista que tanto o enobreceu e pediu para o compositor mexicano escrever para violão. O pedido foi atendido prontamente com uma pequena obra intitulada, no manuscrito, De México para Andrés Segovia, Allegretto quasi serenata. O violonista convenceu Ponce a fazer dessa peça um movimento de uma obra maior e a escrever uma sonata, a Sonata Mexicana. Em 1925 Ponce sentiu a necessidade de ampliar sua técnica de composição e embarcou rumo à França, onde reafirmou e reforçou sua amizade com Andrés Segovia, que já residia em Paris. Essa relação era tão próxima que era comum o casal Clema e Manuel Ponce viajar junto com o casal Andrés e Adelaida Segovia. Além disso, Segovia ajudou financeiramente seu amigo compositor com freqüência e fez aulas de harmonia com ele. Durante o período parisiense desse compositor, Segovia foi mais que um divulgador de sua obra violonística, foi também seu mecenas e se empenhou em torná-lo conhecido no meio musical da época e em divulgar sua obra para outros instrumentos, apresentando-o para importantes compositores, intérpretes, críticos musicais, musicólogos e divulgando para vários instrumentistas obras de 10 Idem. Ibidem, p. 31, citando PONCE, Manuel Maria. Crônicas Musicales por Manuel M. Ponce. El Universal. México, 6 maio 1923. 7 Ponce que eles pudessem incluir em suas apresentações. Foi escrita nesse período a maior e mais importante parte de sua produção para violão solo. Durante sua estada em Paris freqüentou as aulas de composição de Paul Dukas (1865-1935)11, tendo entre seus colegas Joaquin Rodrigo (1901-1999), e Heitor VillaLobos (1887 - 1959). Em 1928 sua obra Miniaturas para quarteto de cordas12 ganhou um concurso de composição em Barcelona. No ano seguinte sua situação econômica o forçou a abandonar as aulas de Dukas, mas o professor interviu para que seu estimado aluno seguisse tendo aulas com ele, ao menos como ouvinte, enquanto uma ajuda financeira que o governo mexicano havia prometido a Ponce não chegava. Por fim, com a ajuda de Segovia e o empenho de sua esposa para fazer com que o governo mexicano pagasse uma bolsa de estudos para Ponce, ele terminou suas aulas com Dukas em 1932, com nota 30 ao invés da nota máxima 10. Em 1933 começou a ensinar piano e história da música no Conservatório Nacional de Música do México e Composição na Universidade do México. Dois meses depois foi nomeado diretor do Conservatório. A partir de então sua produção para violão foi ficando cada vez mais escassa e chegou a ficar um bom tempo sem manter qualquer contato com Segovia. Nesse período ele se voltou para a composição de obras para crianças (devido a seu ofício como professor), obras sinfônicas e concertos, entre eles o Concierto del Sur para guitarra y orquesta, estreado em Montevidéu em 4 de outubro de 1941 num clima altamente festivo. Ponce se fez 11 Segundo SADIE, Stanley (org.). The New Grove Dictionary of Music and Musicians. London: Macmillan Publishers Limited, 1980, p. 690-691, Paul Dukas foi um grande cultuador do domínio da técnica composicional e chegou a destruir várias obras de sua própria autoria (no catálogo de suas obras o número de obras destruídas ou apenas projetadas é próximo ao de obras terminadas). Suas orquestração foi vastamente admirada e imitada. Bem informado da música de seu tempo, foi também professor de Messian. 12 OTERO, Corazon. Manuel M. Ponce y la Guitarra. México: Fonapas, 1981, p. 67 8 presente nessa ocasião e ministrou cursos, palestras, participou de reuniões nas sociedades musicais uruguaias, assistiu a concertos em que obras suas foram executadas. Todo esse evento contou com a organização e influência de Segovia, nesse período residindo em Montevidéu. A saúde sempre fraca de Manuel Maria Ponce passou a ficar mais grave a partir de 1946, período em que vários órgãos oficiais do México demonstraram interesse em condecorá-lo por honra ao mérito de sua produção musical. Faleceu em 24 de abril de 1948, aos 66 anos, menos de três meses após ter sido o primeiro músico a receber o Prêmio Nacional de Artes y Ciências. Este prêmio foi entregue pelas mãos do então Presidente da República, Miguel Alemán. 3 - A obra para violão de Manuel Ponce e sua relação com Andrés Segovia Andrés Segovia, o mais destacado violonista de sua geração, demonstrou ao longo de sua carreira musical uma forte preocupação em firmar o violão como instrumento de concerto. Na sua concepção, um dos maiores problemas que o violão enfrentava era a falta de um repertório qualitativo e quantitativo que justificasse sua presença nas salas de concerto mais prestigiadas do mundo. Para tanto, atuou em três frentes: fez transcrições e arranjos de grandes obras musicais, resgatou obras importantes do repertório violonístico que estavam esquecidas e, principalmente, tinha a concepção clara que composições relevantes só seriam feitas por compositores propriamente ditos e não por violonistas. Como exemplos podemos citar, respectivamente, o arranjo da Ciacconna da Partita BWV 1004 de Johann Sebastian Bach (1685-1750), o resgate da obra de Fernando Sor (1778-1839) e de Luís Milan (c. 1500-1561) e a composição dos Doze Estudos para Violão de Heitor Villa-Lobos. 9 O primeiro a atender o pedido de Segovia foi Federico Moreno-Torroba (1891-1982), que escreveu em 1919 uma dança que foi incorporada na Suíte Castellana, e ao longo de sua carreira outros compositores foram seduzidos pelo carisma e pelo talento do violonista espanhol e atenderam aos seus pedidos para escrever novas obras para violão. Foram aqueles que mais escreveram para ele Joaquín Turina (1882 - 1949), Joaquín Rodrigo, Mario Castelnuovo-Tedesco (1895 1968), Manuel Ponce, Heitor Villa-Lobos e Alexander Tansman (1897-1986). Recentemente foram descobertas outras peças escritas para Segovia13 que representam um importante aumento quantitativo e qualitativo da produção violonística do século passado. A influência de Segovia é visível no repertório escrito para ele: predominância de peças de estilo conservador e acadêmico, que não se alinhavam à vanguarda musical da época, fortemente idiomáticas e de fácil aceitação pública. Para obter tal resultado ele não só pedia que fossem escritas obras com essa estética como também sugeria modificações de trechos inteiros dessas obras alegando que tais alterações tornariam essas peças mais idiomáticas, porém com freqüência tais modificações apenas deixavam as peças mais próximas de seu gosto musical. Nem sempre tais sugestões eram acatadas pelo compositor, no entanto praticamente toda obra que Segovia gravava, editava e tocava tinha uma versão final divergente do manuscrito do compositor. Como veremos no objeto de estudo desse trabalho, nem sempre essas divergências são estruturalmente relevantes, mas alteram o resultado sonoro final da obra. 13 Publicadas pela editora italiana Bérben numa coleção intitulada The Andrés Segovia Guitar Archive. 10 Dentre os compositores que escreveram para o violonista espanhol o que ele mais teve intimidade foi Manuel Maria Ponce. Tanta intimidade permitia algumas iniciativas. Segovia encomendava novas composições que servissem a suas próprias necessidades de repertório sem considerar a linguagem individual de Ponce e as alterava para que elas cumprissem de maneira ainda mais eficaz seu ideal estético. As cartas escritas por Segovia 14 documentam que várias peças foram exemplo dessa prática. Nesse trabalho trataremos apenas das Sonatas para violão solo, que não estão entre as peças de Ponce que sofreram o maior grau de interferência de Segovia no resultado final.15 Além dos pedidos de alterações documentadas pelas cartas, como eles se viam com freqüência certamente vários pedidos semelhantes devem ter sido feitos pessoalmente, mas como veremos, nem todas as alterações sugeridas foram acatadas. Durante o período em que foram compostas as três primeiras sonatas Segovia obtinha sucesso em fazer intervenções pontuais que não modificavam de maneira significativa a estrutura dessas sonatas, embora levassem a resultados musicais diferentes. Ele fez pedidos que alterariam a estrutura final dessas obras, como pedir que fosse composto um outro segundo movimento para a Sonata Mexicana, pedidos que não foram atendidos. Sua revisão, no entanto, demonstra ser a principal causa de divergência entre as edições dessas obras, pois ele chegava a entregar as obras revisadas diretamente para o editor sem que Ponce olhasse o resultado dessa revisão, e pelas cartas vemos que o compositor não recebia nem mesmo as provas. Verificam-se 14 Publicadas em ALCAZAR, Miguel. The Segovia-Ponce letters. Columbus: Orphée, 1989. 15 Dentre as peças com maiores alterações encontram-se os 24 Prelúdios, dos quais 12 foram descartados por Segovia e alguns dos outros 12 tiveram modificações de nota e tonalidade, e o Prelúdio, Tema e Variações sobre Folias de Espanha, que foram editadas sem o Prelúdio, com menos variações e com a ordem das variações alteradas, o que também ocorreu no Tema Variado e Final. 11 em suas cartas passagens como “Ya he mandado los dos últimos tiempos, digitados, a Schott. He recibido, en cambio, las pruebas de los dos primeros.”16 Tal fato pode ter ocorrido devido à confiança que o compositor tinha no violonista e na dificuldade de comunicação de uma época especialmente conturbada no século passado, o entreguerras e a segunda guerra mundial. As três últimas sonatas, no entanto, são frutos diretos da influência de Segovia e representam mais o resultado estético de obras que o violonista espanhol gostaria que já tivessem sido escritas para violão do que o resultado estético do desenvolvimento da linguagem musical individual do compositor mexicano. A Sonata Clássica marca uma nova fase na relação dos dois que reflete diretamente nas futuras composições para violão de Ponce. Enquanto o compositor mexicano trabalhava em projetos que desenvolviam sua própria linguagem musical (como Chapultepec, de 1929), o violonista espanhol, que durante os anos de 1928 a 1930 tinha dificuldades para conseguir tantos concertos quanto antes, começou a pedir que Ponce escrevesse obras que imitam o estilo de compositores bem quistos pelos organizadores de recitais e pelo público da época, como Franz Joseph Haydn (1732 - 1809), Franz Schubert (1797 - 1828) e Johann Sebastian Bach (1685 - 1750). Desde a composição dessa sonata até o momento em que Ponce saiu de Paris, Segovia com freqüência requisitava novas obras ao mexicano que imitam o estilo de outros compositores. Há casos de peças compostas por Ponce cuja autoria foi 16 ALCAZÁR, Miguel. The Segovia-Ponce letters. Columbus: Orphée, 1989, p. 44. 12 atribuída pelos dois a outros compositores, como a Suíte I17, a Sonata Clássica18, o Prélude, Ballet y Courante19 e a Suíte II20. De acordo com as fontes que conseguimos levantar, à exceção de algumas poucas obras juvenis, não há no catálogo das obras do compositor mexicano obras que imitem o estilo de outro compositor além dessas obras para violão que Segovia requisitou. Segundo Alcázar, “se han esbozado um sinnúmero de hipótesis acerca de la atribución de esta obra a outro compositor, pero ninguna de ellas há resultado convincente.” 21 Além disso, é curioso notar que a partir do retorno de Ponce ao México, ele não escreve mais nenhuma obra de epígono tão pouco qualquer outra obra para violão solo para Segovia. 4 - Sonatas para violão solo de Manuel Maria Ponce 4.1 – Comparação entre a edição urtext e a edição publicada das obras A seguir desenvolveremos, quando possível, uma comparação entre a primeira edição publicada das obras estudadas e a edição urtext lançada em 2000 por um órgão 17 A Suíte I, também conhecida como Suíte em Lá menor, Suíte Antiga ou Suíte de Weiss, é o caso mais notório. Durante toda sua vida Segovia publicamente atribuiu essa peça a Sylvius Léopold Weiss (1686 - 1750) e deu como fonte um manuscrito que nenhum musicólogo jamais encontrou. Alguns de seus alunos, após a morte de seu mestre, começaram a anunciar essa peça como sendo de Ponce, o que causou controvérsia durante anos. A publicação das cartas de Segovia enviadas a Ponce em ALCAZAR, Miguel. The Segovia-Ponce letters. Columbus: Orphée, 1989 comprovou que essa obra se tratava de mais uma peça que imitava o estilo de outro compositor. 18 Em ALCAZAR, Miguel. The Segovia-Ponce letters. Columbus: Orphée, 1989. p. 22. se lê: “La [Sonata] de Sor la anuncio simplesmente como de Sor, sin añadir 1a. audición, ni nada, a fin de que quede la puerta abierta para hacerlo en Europa como tu prefieras.” 19 Outra obra que foi divulgada como sendo de Weiss, de acordo com ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, p. 182. 20 Obra que foi atribuída a Allesandro Scarlatti (1660-1725), de acordo com ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, p. 222. 21 ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, p. 104. 13 público do México, o Conselho Nacional de Cultura (Conaculta), revisada por Miguel Alcazar. 4.1.1 – Sonata Mexicana Dentre as obras citadas, a que Segovia menos pediu alterações. No entanto, o próprio fato da obra ser uma sonata é uma demonstração da influência do espanhol, pois, como vimos, Ponce primeiramente escreveu uma peça curta, que por fim se tornou o terceiro movimento dessa sonata. Segovia pediu que fosse composto um outro segundo movimento, pedido que não foi atendido. Uma comparação entre a primeira versão publicada22, a edição feita a partir dos manuscritos originais 23 e o manuscrito do terceiro movimento dessa peça 24 mostram as seguintes divergências: Na edição urtext e no manuscrito há ligaduras de expressão apenas no terceiro movimento. No entanto, todas as ligaduras de expressão no terceiro movimento da edição Peer estão ausentes no manuscrito. Também não há uma única indicação de harmônicos na edição urtext ou no manuscrito. Como veremos, não há em todas as obras analisadas uma única indicação de digitação, arpejos, rasgueios ou glissandos na edição urtext ou nos manuscritos com a caligrafia do compositor que tivemos acesso. Outras divergências serão mostradas no quadro a seguir: 22 PONCE, Manuel M. Sonata Mexicana (Sonata no. 1). [S.l]: Peer International Corporation, 1967. Revisão e digitação: Manuel Lopez Ramos. Editado por: Carlos Vázquez. 23 ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, pp. 2431. 24 Reproduzido em OTERO, Corazon. Manuel M. Ponce y la Guitarra. México: Fonapas, 1981, p. 32. 14 Quadro 2 – divergências entre edições da Sonata Mexicana Primeiro movimento Compasso25 1 3 7, 46, 49, 55, 91 12 13, 74 19 76 77, 78 95 102 107 122 129 e 130 Edição Peer sem indicação de dinâmica ou expressão sem indicação de dinâmica sem indicação de dinâmica Edição Conaculta (Urtext) f e humorístico p acento no segundo tempo sem indicação de dinâmica sem indicação de dinâmica sol3#26 si4 acorde em mínima dó#4 ré3 sol#4 acorde na cabeça do compasso mi2 dó#4 mi2 em mínimas crescendo no final do compasso acentos em todas as notas sol bequadro 3 sib4 acorde em semínima dó bequadro4 ré#3 sol bequadro 4 acorde na cabeça do compasso mi2 ré3 dó#4 mi2 em semínimas Segundo movimento 2 7 11 13 e 14 si#3 baixo no quarto tempo em sol2 ré3 sol#3 si bequadro3 baixo no quarto tempo em mi2 ré3 sol3 21 40 42 48 e 49 sol4 última nota do compasso fá#4 sib3 sol#4 última nota do compasso mi4 si bequadro 3 53 lá3 e dó#4 no segundo tempo apenas dó#4 no segundo tempo Terceiro movimento27 Compasso 1 1 1, 8, 11, 13, 37 2, 21, 24, 36, 48, 50 2, 9, 10, 38 Edição Peer Allegretto in tempo di serenata sem indicação de dinâmica sem indicação de articulação 3, 25, 44 5, 8, 16, 22, 35, 39, 45 6 6 sem indicação de dinâmica sem indicação de dinâmica ligadura abarcando todas as notas do compasso p crescendo sem indicação de expressão mi4 semínima si3 colcheia no soprano espress. mi4 colcheia si3 semínima no soprano sem indicação de dinâmica sem indicação de articulação Fac-símile do manuscrito Allegretto, quasi serenata p seguido de crescendo ligadura abarcando as quatro primeiras notas e staccatos simples nas duas últimas decrescendo 25 Numeração de compasso seguindo a edição urtext, exceção feita no terceiro movimento, em que a numeração segue a edição Peer. 26 Nesse estudo para identificar as notas dentro da escala geral está se considerando a sua escrita, não o resultado sonoro obtido, embora no violão se leia uma oitava acima do som real. 27 Esse é o único movimento de todas as sonatas para violão que Ponce faz indicações de articulação. 15 8 12, 14, 16 15 17, 29, 46 29, 31 e 32 31 32 34 37 38 44 45 46 47 48 a 50 51 52 semínima no primeiro dó4 ligadura entre a segunda e a terceira nota do compasso fá#2 lá#2 si2 na voz melódica, acompanhado de acorde sustentado desde o compasso anterior sem indicação de dinâmica acordes em semínima ou colcheia acento no segundo tempo acento no primeiro tempo rallentando sem indicação de dinâmica última nota do compasso mi3 Poco piu mosso primeiro acorde mi3 lá3 dó#4 lá4 apenas ré#3 na cabeça do segundo tempo primeiro acorde lá2 mi3 lá3 dó#4 semínima pontuada no soprano colcheia no soprano e no contralto, apenas lá3 na cabeça do segundo tempo primeiro acorde lá2 lá3 dó#4 mi4, nota seguinte mi4, lá2 colcheia 55 sol#3 Compasso 13 14, 86 33 36 60 61 63 64 76 78 82 Edição Peer dó#4 sem indicação de dinâmica fá#3 dó#4 sol#3 sem indicação de expressão ré3 ré4 p sul ponticello sol#2 e sol#3 sem indicação de dinâmica todas as notas em semicolcheias ligadura entre as três últimas notas do compasso si3 lá#3 si3 na voz melódica, sem acompanhamento f acordes apenas em semicolcheias p no segundo tempo sem indicação de dinâmica poco rallentando pp última nota do compasso mi2 sem indicação de andamento primeiro acorde mi3 lá3 dó#4 re#3 lá3 na cabeça do segundo tempo primeiro acorde mi3 lá3 dó#4 semicolcheia no soprano semicolcheia no soprano e no contralto, ré3 lá3 na cabeça do segundo tempo primeiro acorde lá2 mi3 lá4 dó#4 mi4, nota seguinte mi3 simultâneo ao mi4, lá2 semicolcheia sol bequadro 3 Quarto movimento Edição Urtext dó bequadro 4 decrescendo fá bequadro 3 dó bequadro 4 sol bequadro 3 scherz. ré#3 ré#4 sem indicação de dinâmica sem indicação de timbre sol bequadro 2 e sol bequadro 3 f Fonte: PONCE, Manuel M. Sonata Mexicana (Sonata no. 1). [S.l]: Peer International Corporation, 1967. Revisão e digitação: Manuel Lopez Ramos. Editado por: Carlos Vázquez e ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, pp. 24-31. Nota: Dados trabalhados pelo autor. No terceiro movimento dessa obra também encontramos divergências entre as edições nos compassos 39 a 43, mostradas abaixo: 16 4.1.2 – Sonata em Lá menor Como vimos, tal sonata foi recentemente recuperada e ainda não publicada. 4.1.3 – Sonata III O manuscrito dessa obra está tido como extraviado, o que inviabiliza uma comparação entre edições. No entanto, em cartas Andrés Segovia pede outro fim para o primeiro movimento, mas acaba editando o que foi escrito. 4.1.4 – Sonata Clássica Primeira obra de epígono de Ponce, Segovia manda sete cartas num período de cerca de cinco meses pressionando para que essa obra fosse escrita. Faz também alguns pedidos com relação à sua estrutura. Como exemplo podemos citar que ele pede para essa peça ter quatro movimentos e seguir a mesma estrutura formal de outras sonatas enviadas previamente a Ponce. Além disso, escreve: “Sin embargo quisiera que modificaras aún el ponte para ir al segundo tema, la rentrée, y tal vez, la coda. Quisiera também que el desarollo fuera um poco mas extenso, y acaba el Rondo que estoy deseando trabajar, para que la Sonata esté completa.”28 28 ALCAZAR, Miguel. The Segovia-Ponce letters Columbus: Orphée, 1989, p. 22. 17 “Si tienes borrador del primer tiempo de la Sonata, hás um mero puente para ir al segundo tema. Escribe tambien un gracioso diseño sobre la reentre ao tema principal, después del desarollo, y hás mas extenso este, sin tocar para nada a lo que ya está escrito, que me gusta mucho. Tal vez outra coda.”29 A musicóloga e violonista mexicana Corazon Otero gentilmente nos enviou uma cópia de uma versão em andamento dessa obra com a caligrafia de Manuel Ponce. Nela constam o primeiro movimento e doze compassos do segundo, em versões ainda não terminadas e com alguns rabiscos. Uma comparação entre essa versão e a versão final mostra que a música foi modificada de acordo com o pedido de Segovia expresso nessas cartas. No entanto, a coda dessa versão é a mesma da versão final, com exceção de um trecho de três compassos, que na última versão está uma oitava abaixo. Uma comparação entre a edição urtext30 e a primeira edição publicada31 mostra as seguintes divergências 32 : assim como na Sonata Mexicana, não há em toda a Sonata Clássica qualquer ligadura de expressão na edição urtext, apenas ligaduras de prolongamento. Também não há em toda a obra uma única indicação de digitação, de arpejo, de staccato e a única indicação de harmônico está nos compassos 54 a 5733 do segundo movimento. Outras divergências são mostradas no quadro a seguir: 29 Idem, ibidem, p.26 30 ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, pp. 7885. 31 PONCE, Manuel M. Sonata Clásica: Hommage a Fernando Sor. Mainz: B. Schott’s Söhne, 1929. Digitação: Andrés Segovia. Dedicada a Andrés Segovia. 32 De acordo com o manuscrito da versão anterior dessa sonata, em ambas edições o si4 do compasso 67 deveria ser sib4. Nesse manuscrito não há qualquer outra divergência com a edição urtext nas seções que estão presentes nas duas versões. 33 Numeração de compasso seguindo a edição urtext. 18 Quadro 3 – divergências entre as edições da Sonata Clássica Primeiro movimento Compasso34 1a4 1 6, 30, 31, 131, 132 13 16 16 17, 103, 105, 120, 140, 141, 18 22, 118, 123, 124, 157 23 24, 35, 74 29 30 32 34 38 40 55 61 76 79 79 81 90 91, 93, 95 102 109 113 114 115 116 117, 119 122 127 a 129 130 131 133 135 34 Edição Schott crescendos e decrescendos mínima no tenor e no contralto uso de acento no primeiro tempo, acorde mi3 si3 mi4 sol#4 no segundo tempo, semínima no baixo seguido de duas semínimas Edição Conaculta (Urtext) sem indicação de dinâmica semínima no tenor e no contralto ausência de acento em todo o movimento no primeiro tempo, acorde mi3 si3 sol#4 mínimas no contralto mínima no baixo no segundo tempo, duas colcheias no baixo (mesma nota) seguido de uma mínima semínimas no contralto semibreve no baixo pausa no segundo tempo e semínima no terceiro tempo do baixo semínima no baixo dois mi2 colcheia no segundo tempo e mínima no terceiro tempo do baixo semibreve no baixo colcheia no baixo semínima no baixo colcheia no baixo e no tenor sol4 colcheia sol3 no soprano fá3 mínima fá4 mínima semínima seguido de pausas no baixo, tenor e contralto crescendo apoggiatura no terceiro tempo lá3 mínima acordes: si2 sol#3 e lá2 lá3 mínima no soprano semínima na primeira nota do baixo e do soprano ré#4 semínima mínima pontuada no soprano e no contralto no terceiro tempo, mínimas nas vozes internas primeira nota do baixo dó3 primeiro acorde sol#3 si3 mi4 si4, fá natural 3 no segundo acorde primeiro acorde mi3 si3 mi4 sol4 fá4 sol natural 3 no primeiro acorde quatro colcheias, semínima e pausa de semínima no baixo ré4 no baixo, dois grupos de semínima seguido de pausa de semínima colcheia no baixo e no tenor mi4 colcheia mi3 no soprano ré3 mínima semibreve no baixo mínima no baixo mínima no baixo e no tenor sol4 semibreve sem soprano fá3 semínima fá4 semínima mínima seguido de pausas no baixo, tenor e contralto sem indicação de dinâmica sem ornamento lá3 semínima acordes: si2 ré3 sol#3 e lá2 ré3 lá3 semínima no soprano mínima na primeira nota do baixo e do soprano ré#4 mínima semibreve no soprano e no contralto no terceiro tempo, semínimas nas vozes internas primeira nota do baixo lá2 primeiro acorde sol#3 mi4 si4, fá#3 no segundo acorde primeiro acorde mi3 si3 sol#4 fá#4 sol#3 no primeiro acorde quatro colcheias e mínima no baixo ré#4 mínimas no baixo semibreve no baixo e no tenor mi4 semibreve sem soprano ré3 semínima Numeração de compasso seguindo a edição urtext. 19 137 139 150 155 mi3 mínima ré4 mínima semínima no terceiro tempo do baixo e do tenor colcheia no tenor, contralto e soprano mi3 semínima ré4 semínima mínima no terceiro tempo do baixo e do tenor semínima no tenor, contralto e soprano Segundo movimento 1, 40 3 3 4, 8, 13, 14, 42, 43, 47, 48 6 9 12, 13 14 16 18 22 24 29 30 30 41 42 42, 43, 47, 48 44 47 48 54 acorde dó4 mi4 sol4 semínima nas vozes agudas seguido de pausa de semínima sol2 semínima no segundo e terceiro tempo no segundo tempo, sem contralto. No terceiro tempo, fá3 no tenor e sol3 no contralto acordes com sol3 acorde mi4 sol4 mínima nas vozes agudas sol2 mínima no segundo tempo sem voz interna no terceiro tempo, mi3 semínima na voz interna acorde mi4 sol4 semínima nas vozes agudas ligado a acorde com mesmas notas em colcheia pontuada acorde sem ré4 no terceiro tempo, semínima no tenor, no contralto e no soprano acorde dó4 mi4 sol4 semínima nas vozes agudas seguido de pausa de colcheia pontuada acorde com ré4 no terceiro tempo, colcheia seguido de pausa de colcheia no tenor, no contralto e no soprano acorde com ré3 no terceiro tempo, dó#4 no terceiro tempo, si3 semínima seguido de pausas no baixo e no tenor baixo e contralto iniciando em semínima seguido de pausa de semínima no baixo, colcheia seguido de pausas uso de acento no segundo tempo, colcheia seguido de pausas nas vozes graves no terceiro tempo, colcheia seguido de pausa de colcheia nas vozes graves acorde com sol3 sol#4 no terceiro tempo segundo acorde com si3 semínima seguido de pausa de colcheia no primeiro tempo do tenor e soprano no segundo tempo, seminima seguido de pausa no baixo no segundo tempo, sol3 colcheia ligado a sol3 anterior no contralto. No terceiro tempo, sem contralto. acordes sem sol3 acorde sem ré3 sem dó#4 no terceiro tempo sem si3 no terceiro tempo mínima seguido de pausa no baixo e no tenor baixo e contralto iniciando em mínima no baixo, semínima seguido de pausas sem acento em todo esse movimento no segundo tempo, mínima nas vozes graves no terceiro tempo, semínima nas vozes graves acorde sem sol3 sol bequadro 4 no terceiro tempo segundo acorde sem si3 semínima pontuada no primeiro tempo do tenor e do soprano no segundo tempo, mínima no baixo Terceiro movimento 1 2, 28 9 acorde com sol3 pizzicatto pausa no primeiro tempo do baixo 11, 14 18 pp pausa no segundo tempo do baixo 23 24 a 26 26 27 31 semínima nas vozes internas semínimas nos acordes ten. e tempo uso de acento no terceiro tempo, colcheia nas vozes graves, seguido de pausa acorde sem sol3 sem indicação de articulação sol3 semínima no primeiro tempo do baixo p si2 semínima no segundo tempo do baixo colcheia nas vozes internas colcheias nos acordes sem indicação de expressão sem acento no terceiro tempo, semínima nas vozes graves 20 38 38 39 41 51 53 55 56 57 57 60 semínima no baixo f e crescendo crescendo sem fermata semínima nas vozes graves no primeiro tempo, sol3 semínima no primeiro tempo, semínima nas vozes graves, seguido de pausa rit. tempo semínima seguido de pausa no primeiro tempo do soprano no primeiro tempo, semínima seguido de pausa no baixo mínima pontuada no baixo apenas crescendo f fermata no segundo acorde mínima nas vozes graves no primeiro tempo, sol3 mínima no primeiro tempo, mínima nas vozes graves sem indicação de expressão sem indicação de andamento mínima no primeiro tempo do soprano no primeiro tempo, mínima no baixo Quarto movimento 10, 12, 27, 198 a 200 11, 69, 117, 120, 124 a 129, 142, 155 24 31 43 46 70 101 146 149, 199, 201 154, 156 155 159 194 195 198, 200 202 semínima no primeiro acorde, seguido de pausa de colcheia semínima seguido de pausa de semínima na voz grave semínima pontuada no primeiro acorde dó#4 no primeiro tempo semínima no primeiro tempo do baixo sem dó#4 no primeiro tempo semínima pontuada no primeiro tempo do baixo última colcheia acorde sol#3 si3 ré#4 acorde em mínima sem acento a tempo semínima pontuada no primeiro tempo do contralto e do soprano semínima pontuada nas vozes internas mínima no baixo semínima pontuada no primeiro tempo do soprano no acorde, todas as vozes em semínima pontuada baixo iniciando em semínima última colcheia si3 ré4 acorde em semínima seguido de pausa uso de acento sem indicação de expressão semínima no primeiro tempo do contralto e do soprano semínima nas vozes internas no baixo, semínima seguido de pausa semínima no primeiro tempo do soprano no acorde, apenas soprano em semínima pontuada baixo iniciando em colcheia seguido de pausa de colcheia lá2 no baixo acorde no primeiro tempo sol#3 ré4 mi4 mínima na voz grave sem lá2 no baixo acorde no primeiro tempo sol#3 si3 ré4 mi4 Fonte: PONCE, Manuel M. Sonata Clásica: Hommage a Fernando Sor. Mainz: B. Schott’s Söhne, 1929. Digitação: Andrés Segovia. Dedicada a Andrés Segovia e ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, pp. 78-85. Nota: dados trabalhados pelo autor 21 4.1.5 – Sonata Romântica Outra peça que Segovia insistiu muito para que fosse escrita: em nove cartas num período de cerca de dois meses ele cobra o término dessa obra. Ele chega a pedir uma alteração numa seção, explicando o motivo: “Querido Manuel: Me tiré como perro hambriento al final.. Y estoy desesperado con la guitarra. Resulta imposible - ¡¡por vez primera com tu musica!! – lo que menos te imaginas: los arpegios... Y hás coincidido con el mismo gênero de dificultad que hace inabordable el prelúdio em mi mayor de Bach (violín solo) para la guitarra. Ejemplo: Tu haces asi35: Y Bach asi: etc. Y la dificultad, em ambos trozos, consiste en que es preciso hacer en una misma cuerda esa sucesion de grados conjuntos, manteniendo, al mismo tiempo, una posicion, a veces disparatada, para pulsar la nota disjunta del arpegio.”36 Tocar o trecho em questão usando uma única corda requer muita habilidade do intérprete, beirando o impossível. Essa prática se devia ao uso de tripa de animais para 35 Embora na carta original os trechos não tenham clave ou armadura, no presente trabalho os trechos estão apresentados com clave e armadura da peça citada, para melhor compreensão do leitor. 36 ALCAZAR, Miguel. The Segovia-Ponce letters. Columbus: Orphée, 1989, p. 38. 22 a confecção das cordas37, caracterizadas por um desequilíbrio tímbrico que é evitado tocando todas as notas de uma melodia na mesma corda. Porém, como se trata de um trecho de andamento rápido, a alteração de timbre ocasionado pelo dedilhado em várias cordas é praticamente imperceptível. Portanto, podemos considerar, nesse trecho, a escolha do dedilhado em uma ou mais cordas como uma preferência do intérprete e não uma imposição do instrumento, conforme afirmou Segovia. Além disso, verificamos que, desde que as notas das melodias sejam tocadas em duas cordas, os trechos citados acima são possíveis de ser tocados no violão. Além disso, a peça citada como exemplo de impossibilidade similar, o Prelúdio da Suíte BWV 1006a de Bach38, já havia sido transcrita para violão e editada sete anos antes dessa carta 39 . Esta peça está inclusa numa publicação da obra alaudística de Bach transcrita para violão, pela editora que Segovia usava para publicar as obras de diversos compositores, incluindo Ponce. Como está clara a omissão de algumas informações nos trechos citados, como baixos, não podemos dizer categoricamente que a afirmação de Segovia é incorreta, pois não tivemos acesso ao manuscrito, bem como outros documentos. Há, portanto, a possibilidade de existir informações adicionais sobre esse assunto que mostrem que procede o que Segovia escreveu, invalidando nossa hipótese. Embora nós não tenhamos conseguido manuscritos que localizem quais seriam os compassos citados na carta, que foram mudados devido a essa observação, uma 37 As cordas de violão tal como conhecemos hoje só surgiram após 1940. 38 Obra transcrita para alaúde pelo próprio compositor. 39 Em BRUGER, Hans Dagobert (arranjador). Johann Sebastian Bach, Kompositionen für di Laute. Wolfenbuttel: Schott Musik Verlag, 1921. 23 análise da obra mostra que o mais provável é que se trate dos compassos 169 a 172 do último movimento dessa sonata. Caso a melodia que foi escrita nessa carta estiver notada no manuscrito acompanhada apenas dos baixos dos compassos 169 a 172 da versão final ela é, da mesma forma, possível de ser tocada ao violão. Mas como vimos, uma análise pormenorizada desse trecho só seria possível com documentos que infelizmente não puderam ser levantados durante o período desse estudo. Das sonatas em que foi possível comparar a edição publicada40 com a edição urtext41 essa é a obra em que há divergências entre as edições em maior número e que de maneira mais significativa alteram o resultado musical final. O primeiro movimento apresenta 132 compassos divergentes de 151 compassos totais; o segundo movimento, 58 de 72; o terceiro, 171 de 178 e o quarto, 135 de 209. Assim como na Sonata Mexicana e na Sonata Clássica, não há qualquer ligadura de expressão na edição urtext da Sonata Romântica, apenas ligaduras de prolongamento. Também não há em toda essa obra, na edição urtext, uma única indicação de digitação, glissando, staccato, acento ou arpejo, e a única indicação de harmônico está nos compassos 112 a 118 do terceiro movimento. Outras divergências estão mostradas no quadro a seguir: 40 PONCE, Manuel M. Sonata Romántica: Hommage a Fr. Schubert qui aimait la guitare. Mainz: B. Schott’s Söhne, 1929. Digitação: Andrés Segovia. Dedicada a Andrés Segovia. 41 ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, pp. 93103. 24 Quadro 4 – divergência entre as edições da Sonata Romântica Primeiro movimento Compasso42 1 5-6 Edição Schott Allegro moderato sem indicação de dinâmica 6 7 sem indicação de dinâmica sem indicação de dinâmica 7, 10 a 13, 58 a 60, 67, 69, 70, 105, 109, 110, 123, 134 8, 106 9 baixo e tenor iniciando em semínima seguido de pausa de semínima 10 11 12 13 17, 115 18, 79, 97, 103 19 20 20, 118 semínima no baixo e no tenor decrescendo na primeira metade do compasso crescendo na primeira metade do compasso, f com acento no terceiro tempo seguido de decrescendo crescendo, acento no terceiro tempo seguido de crescendo crescendo decrescendo por todo o compasso acorde arpejado mi2 si2 mi3 sol#3 si3 mi4 sem indicação de dinâmica sem indicação de dinâmica 25 26 decrescendo no primeiro tempo, semínima no baixo, tenor e soprano fá#2 semínima, lá3 dó#3 semínima pontuada decrescendo baixo iniciando em semínima f no terceiro tempo sem indicação de dinâmica baixo, tenor e contralto iniciando em semínima seguido de pausa de semínima ff decrescendo 27, 120 27, 28, 31, 47, 129, 130, 145 28, 30 crescendo soprano e contralto iniciando em semínima seguido de pausa de semínima sem indicação de dinâmica 29 p e sem outra indicação de dinâmica 31, 95 33 sem indicação de dinâmica no soprano, pausa de colcheia no terceiro tempo seguido de três colcheias 21 21 22 23 24 25, 46 42 Edição Conaculta (Urtext) Allegro non troppo, semplice decrescendo do quarto tempo do compasso 5 à metade do compasso 6 sf nas notas ré3 mi3 crescendo na primeira metade e decrescendo no último tempo do compasso baixo e tenor iniciando por mínima mínima no baixo e no tenor sem indicação de dinâmica na primeira metade do compasso, sf no quarto tempo seguido de decrescendo decrescendo no primeiro tempo vindo do compasso anterior, crescendo na primeira metade do compasso apenas f no terceiro tempo decrescendo até o terceiro tempo crescendo nos três primeiros tempos seguido de decrescendo acorde plaquê mi2 sol#3 si3 mi4 f f no primeiro tempo, decrescendo no terceiro p no primeiro tempo, mínima no baixo, tenor e soprano fá#2 mínima, lá3 dó#3 mínima pontuada sem indicação de dinâmica baixo iniciando em mínima pontuada cresc. no segundo tempo cresc baixo, tenor e contralto iniciando em mínima f p no primeiro tempo, crescendo no segundo sem indicação de dinâmica soprano e contralto iniciando em mínima decrescendo a partir do terceiro tempo p e crescendo a partir da segunda metade do compasso crescendo a partir do terceiro tempo no soprano, mi4 no terceiro tempo ligado à mesma nota desde o tempo Numeração de acordo com a primeira edição dessa obra. 25 34 34 35, 37 f animato p espress. 35, 37, 92 sem indicação de dinâmica 36 37 f lá#4 semínima seguido de pausa de colcheia soprano iniciando em semínima seguido de pausa de semínima cresc. et accel. 38, 68, 128 38 39 39 44 49 53 54 a 57, 127 58 61 63, 65 66, 117 67, 93, 127 68 70 73 74, 136, 137 74 75 76 77 78 81, 122 83 86 87, 91, 97, 144 87 88 90 95 96 97 98 99 101 dó4 semínima dó#4 semínima mi3 no quarto tempo mínima no baixo, tenor e contralto mi4 semínima no soprano, mi2 semínima e mínima pontuada no baixo mi#2 sol#3 dó#4 no quarto tempo no baixo, semínima no terceiro tempo seguido de pausa animando sempre baixo iniciando em semínima seguido de pausa de semínima no baixo, semínima seguido de pausa de semínima baixo, contralto e soprano iniciando em semínima sem indicação de dinâmica f no primeiro e quarto tempo no quarto tempo, acorde si2 si3 dó#4 ré#4 decrescendo seguido de p voz(es) inferior(es) em dois grupos de semínima seguido de pausa de semínima fá#4 acento, seco e ff na cabeça do compasso acento, seco e ff na cabeça do compasso acento, seco e ff na cabeça do compasso seguido de p acento, seco e ff na cabeça do compasso seguido de p cresc. cresc. com acento ritard. semínima no acorde a tempo, p tranquilo mínima ligada a colcheia no baixo mínima no baixo dó#4 acorde mi2 mi3 si3 sol#4 espress. poco ritard espressivo mínima na primeira nota do tenor anterior seguido de três tercinas. p scherz. sem indicação de expressão, crescendo na primeira metade do compasso crescendo na primeira metade do compasso sem indicação de dinâmica lá#4 semínima ligado a colcheia soprano iniciando em mínima sem indicação de dinâmica e expressão dó4 mínima dó#4 mínima mi#3 no quarto tempo semibreve no baixo, tenor e contralto mi4 semibreve no soprano, quatro mi2 semínima no baixo mi#2 dó#4 no quarto tempo, sem sol#3 no baixo, mínima no terceiro tempo animando baixo iniciando em mínima mínima no baixo baixo, contralto e soprano iniciando em mínima p no primeiro tempo f apenas no primeiro tempo no quarto tempo, acorde si2 dó#4 ré#4 apenas p voz(es) inferior(es) em mínimas fá bequadro 4 poco piu mosso e sf sf na cabeça do compasso sf na cabeça do compasso sf na cabeça do compasso, crescendo a partir do terceiro tempo sem indicação de dinâmica f sem acento dim. e rit. molto semínima pontuada no acorde apenas a tempo mínima no baixo mínima pontuada no baixo dó bequadro 4 acorde mi2 si3 sol#4 sem indicação de expressão decrescendo e rall. a tempo semínima pontuada na primeira nota 26 102 108 no primeiro tempo, duas colcheias no soprano, colcheia no contralto. No terceiro tempo, semínima seguido de pausa no soprano no terceiro tempo, semínima seguido de pausa no soprano f com acento no terceiro tempo 109 110 111 f seguido de decrescendo sem indicação de dinâmica sem indicação de dinâmica 120, 125, 126 122 baixo iniciando em semínima acorde sol#2 sol#3 si#3 sol#4 no quarto tempo mi2 ré4 e sol#4 na cabeça do quarto tempo mínima seguido de pausa no baixo baixo e tenor iniciando em semínima seguido de pausa cresc. f expressivo rall. acorde do segundo tempo mi2 dó#4 mi4 lá4, mínima no baixo no terceiro tempo 103 131 132 135, 140 136 138 144 145 146 146 147 do tenor no primeiro tempo, colcheia pontuada e semicolcheia no soprano, colcheia pontuada no contralto. No terceiro tempo, mínima no soprano no terceiro tempo, mínima no soprano crescendo na primeira metade do compasso, f no terceiro tempo, sem acento p f no terceiro tempo decrescendo no primeiro tempo, p no terceiro baixo iniciando em mínima pontuada acorde sol#2 si#3 sol#4 no quarto tempo mi2 e sol#4 na cabeça do quarto tempo semibreve no baixo baixo e tenor iniciando em semínima pontuada cresc. ed animando ff sem indicação de expressão sem indicação de expressão acorde do segundo tempo mi2 dó#4 lá4, semínima no baixo no terceiro tempo e mi2 semínima no quarto tempo do baixo sem indicação de andamento quatro lá2 semínima no baixo 147 148 e 149 a tempo lá2 semínima mínima pausa de semínima no baixo sem indicação de dinâmica f, f, crescendo, decrescendo 150 e 151 dois acordes em p com arpejo 151 acorde lá2 dó#4 mi4 lá4 1 1, 2 p seguido de crescendo e decrescendo mínima pontuada na segunda nota do soprano crescendo decrescendo p seguido de crescendo semínima ligada a semínima seguido de pausa na segunda nota do soprano sem indicação de dinâmica sem indicação de dinâmica 7 8, 56 8, 10, 49 p seguido de crescendo e decrescendo colcheia na nota mais grave de cada arpejo f mínima no soprano sem indicação de dinâmica 11 15 16 decrescendo dim. calmo apenas crescendo e decrescendo mínima na nota mais grave de cada arpejo crescendo semibreve no soprano decrescendo na segunda metade do compasso p calmo sem indicação de expressão crescendo decrescendo desde o final do compasso 148, poco rall. no fim do compasso 149 acordes plaquê, o primeiro em pp e indicação a tempo no penúltimo acorde do movimento acorde lá2 mi3 dó#4 lá4 Segundo movimento 2, 44 3, 41 e 42, 45, 48, 62 4 5, 7, 51 27 18 18 19, 50, 52 e 53 24 25 28 28 e 29 fá#2 fá#3 no baixo dois grupos de colcheia, colcheia ligada a colcheia, pausa de colcheia no baixo sem indicação de dinâmica pp espressivo três últimos baixos fá#3 p e decrescendo na segunda metade fá#4 mínima no soprano seguida de pausa de mínima fá#2 ré#3 no baixo dois grupos de colcheia e colcheia ligada a semínima no baixo crescendo na primeira metade e decrescendo na segunda metade do compasso p três últimos baixos dó#3 crescendo na segunda metade fá#4 semínima ré4 semínima ligado a semínima e pausa de semínima no soprano 30 31 32 32, 54 33 acorde ré3 fá#3 ré4 acorde lá2 mi3 lá3 mi4 sem indicação de dinâmica acorde si2 fá#3 si3 ré#4 em semínima 33 35 37 e 59 39 40 e 44 43, 60 45 acento na segunda nota do soprano decrescendo sem indicação de dinâmica sem indicação de dinâmica três últimas notas do baixo si2 p acorde do terceiro tempo fá#2 mi3 dó#4 46 soprano iniciando em si3 semínima seguido de si3 colcheia p rall a tempo sem indicação de dinâmica 46 47 55, 58 57 59 61 64 64 65 65 66 67 dois grupos de semínima, pausa de semínima no baixo três últimas notas do baixo mi3 sem indicação de dinâmica acorde do segundo tempo fá#2 lá3 dó#3 lá4 sem indicação de dinâmica primeiro acorde si2 mi3 sol#3 si3, soprano a seguir si3 colcheia pontuada, dó#4 semicolcheia primeiro acorde mi2 sol#3 si3 mi4, sem pausa na segunda metade do primeiro tempo, só soprano no quarto tempo acordes nos seguintes valores: semínima, colcheia pontuada, semicolcheia, semínima acorde ré3 fá#3 lá3 ré4 acorde dó3 mi3 lá3 mi4 crescendo no acorde, si2 fá#2 em mínima e lá3 e ré#4 em semínima f na cabeça do compasso, sem acento crescendo p pp três últimas notas do baixo fá#2 f acorde do terceiro tempo fá#2 mi3 lá3 dó#4 soprano iniciando em si3 colcheia, lá#3 colcheia, si3 colcheia decrescendo p f na cabeça do compasso mínimas no baixo três últimas notas do baixo si2 decrescendo acorde do segundo tempo fá#3 dó#4 lá4 p seguido de crescendo primeiro acorde si2 sol#3 si3, soprano a seguir si3 colcheia, dó#4 colcheia primeiro acorde mi2 sol#3 mi4, pausa de colcheia na segunda metade do primeiro tempo, no quarto tempo somado ao soprano há o acorde mi2 sol#3 ré4 em semínima primeiro acorde acrescido de um lá3, os demais com as mesmas notas mas nos seguintes valores: semínima, semínima pontuada, colcheia, semínima 28 68 69 71 e 72 p seguido de crescendo p em cada acorde 1 1, 4, 54, 9 III - Allegretto vivo si2 no segundo tempo 2 e 10 pausa, si2, mi2, si2 no baixo 3 6 6e7 mi2 no primeiro tempo sem indicação de dinâmica pausas de colcheia na cabeça dos tempos 9 11 sol3 si3 semínima, si3 sol3 colcheia e lá3 dó4 colcheia no soprano e no contralto dois mi2 semínima no baixo 12 pausa, mi2, si2, mi2 no baixo 13 14, 24, 40, 47 14 cresc. sem indicação de dinâmica colcheia seguido de pausa de colcheia no segundo acorde, dó4 ré4 lá4 no último acorde crescendo primeiro tempo com pausa de colcheia no soprano e no contralto fá#4 no segundo tempo do baixo apenas crescendo pp apenas no primeiro acorde Terceiro movimento 15, 76, 103, 104 15 16 17 17, 25, 43 18 18, 45, 95, 98 19 21 22 23 semínima seguido de pausa de semínima no soprano e no contralto sem indicação de dinâmica sol3 semínima seguido de pausa de semínima no baixo sem indicação de dinâmica pausa no primeiro tempo do baixo apenas si2 no baixo dois grupos de pausa de colcheia si2 colcheia no baixo, lá3 e dó#4 na cabeça do segundo tempo apenas si2 nas metades dos tempos 26 pausa de colcheia na segunda metade do segundo tempo do soprano e do contralto 27 pausa, mi2, mi3, mi2 no baixo, no soprano e contralto dois grupos de si3 sol3 semínima 30 31 no soprano, pausa de colcheia na cabeça do compasso no soprano, si4, lá4 e pausa de semínima 33 34 sem baixo no baixo, pausa de colcheia fá#3 III – Moment Musical, Vivo e segno si2 acompanhado de mi3 no segundo tempo pausa, mi2, si2 acompanhado de mi3, mi2 no baixo si2 e mi3 no primeiro tempo f acorde ligado ao acorde anterior (mesmas notas) na cabeça dos tempos sol si semínima pontuada e lá dó colcheia no soprano e no contralto pausa de colcheia, mi2 semínima e mi2 colcheia no baixo pausa, si2 acompanhado de mi3, mi2 e si2 acompanhado de mi3 no baixo sem indicação de dinâmica crescendo semínima no segundo acorde, ré4 lá4 no último acorde sem indicação de dinâmica no primeiro tempo acorde ligado ao anterior (mesmas notas) sol3 acompanhado de si3 e fá#4 no segundo tempo do baixo mi4 sol4 mínima no soprano e no contralto decrescendo sol3 mínima acompanhado de si3 no baixo p dó4 no primeiro tempo do baixo si2 no baixo acompanhado de mi3 pausa de colcheia, si semínima pontuada no baixo, apenas dó#4 na cabeça do segundo tempo si2 acompanhado de mi3 nas metades dos tempos lá3 si3 na segunda metade do segundo tempo do soprano e do contralto no baixo, pausa, mi2, si2 acompanhado de mi3, mi2, no soprano e no contralto sol3 si3 semínima e pausa de semínima no soprano, ré#4 colcheia na cabeça do compasso no soprano, si4 e lá4 ligado a lá4 semínima fá#3 semínima no baixo no baixo, pausa de semínima e fá#3 29 semínima, pausa de colcheia no baixo, si3, fá#3, ré#3 e si2 semínima no baixo, si3, si3, fá#3 e ré#3 37 no baixo, semínima e pausa de semínima 41, 78 41 43 sem indicação de dinâmica mínima no baixo e no tenor ré4 acompanhado de sol4 semínima, fá4 e mi4 colcheia no soprano no baixo, colcheia seguido de pausas crescendo no baixo, colcheia, pausa de colcheia e pausa de semínima f semínima no baixo e no tenor pausa de colcheia, ré4, fá4 e mi4 no soprano no baixo, semínima seguido de pausa decrescendo 56 57 e 58 67, 69, 75, 98, 99, 106, 107 e 109 68, 77 71, 72, 103 74 decrescendo dois grupos de pausa de colcheia e si2 colcheia no baixo, cabeça do segundo tempo lá3 dó#4 pausa de colcheia, si2 colcheia seguido de pausa de semínima no baixo, última nota do compasso ré#4 pausa, mi2, si2, mi2 no baixo repetição dos compassos 55 e 56 mi3 no tenor sem indicação de dinâmica pausa de colcheia, si2 semínima, pausa de colcheia no baixo, cabeça do segundo tempo dó#4 pausa de colcheia, si2 em semínima pontuada no baixo, última nota do compasso ré#4 acompanhado de lá3 pausa, mi3, mi2, mi3 no baixo compassos inexistentes nessa edição voz uma oitava acima, logo mi4 ré#3 no tenor mínima no tenor primeiro acorde em semínima 76, 87, 88 ré#3 no acorde voz uma oitava acima, logo rè34 semínima no tenor primeiro acorde em colcheia seguido de pausa de colcheia acorde sem ré#3 79 mínima no baixo, sem contralto 80 ré#3 mínima no baixo, fáx3 mínima no tenor 81 83 acorde do primeiro tempo ré#3 sol#3 si3 f com baixo ligado à próxima nota 84 85 85 e 86 acorde mi2 dó#4 no primeiro tempo, fá#2 no baixo decrescendo 89 e 90 91 a 94, 97, 98 96 97 100 e 108 dim. rallent. fá#3 no tenor a tempo sem indicação de dinâmica acorde em lá2 ré#3 si3 fá#4 mínima 101, 109 104 109 112 mi4 semínima, mi3 no tenor mínima no tenor sem indicação de expressão pausa de semínima e si2 semínima no 35 36 45 50 51 52 53 55 semínima no baixo, si3 lá#3 sol#3 no contralto pausa de semínima e ré# semínima no baixo, fáx3 semínima e colcheia no contralto acorde no primeiro tempo sol#3 si3 sem indicação de dinâmica nem ligadura acorde mi2 sol#3 lá#3 dó#4 no primeiro tempo, si2 no baixo sem indicação no compasso 85, crescendo no compasso 86 f no segundo tempo do compasso 89 voz uma oitava acima, logo fá#4 sem indicação de andamento pp acorde lá2 fá#4 mínima e voz interna ré#4 semínima, si3 semínima mi4 mínima, sem tenor colcheia no tenor rall. dois si2 semínima no baixo 30 113 a 168 170 171 a 173 174 e 175 176 e 177 baixo seção A reescrita com várias divergências com a parte A dessa mesma edição mi2 harmônico no baixo (soa si3) baixo acompanhando os harmônicos harmônicos que soam si5 e mi6 acordes em pp e arpejados seção suprimida pois no compasso 112 há a indicação D.C al Coda si2 nota natural no baixo apenas harmônicos harmônicos que soam si4 e mi5 acordes plaquê sem indicação de dinâmica Quarto movimento 6 7 10, 52, 54, 70, 94, 100, 173 a 176 12, 47, 63 a 66, 74, 72 13, 103 14 16, 18, 20, 22, 24, 26, 30 a 33, 36, 37, 40, 41, 45, 61, 91, 93, 95, 97, 99, 101, 108, 112, 130, 132 e 169 a 171 21 23 e 24 27 28 48 48, 50, 51, 53 49 52, 54 56 62, 136 68 86, 129 96 101 117 127 128 133 137 139 141 152 semínima seguido de pausa no baixo crescendo até o terceiro tempo, decrescendo no quarto tempo dois grupos de semínima seguido de pausa de semínima no baixo semínima no primeiro tempo do baixo seguido de pausa de semínima mínima pontuada no baixo ré#4 no terceiro tempo semínima no terceiro tempo do baixo seguido de pausa de semínima f crescendo crescendo sem indicação de dinâmica mínima ligado a semínima no baixo no terceiro tempo, mi4 depois ré#4 semínima seguido de pausas no baixo e no tenor no terceiro tempo, sol#4 depois fáx4 colcheia na segunda metade do segundo tempo seguido de pausa de colcheia no soprano no soprano, semínima seguido de pausas mínima seguido de pausa no baixo colcheia seguido de pausa de colcheia e de semínima, semínima seguido de pausa de semínima no baixo mínima no primeiro tempo do soprano e do contralto ré4 na última semicolcheia do primeiro tempo lá4 na última semicolcheia f semínima, pausa de mínima e semínima na voz interna sem contralto no primeiro tempo mínima na primeira nota do tenor pausa de mínima no primeiro e segundo tempo do baixo semínima na primeira nota do tenor mínima no tenor e no contralto accel. cresc. semibreve no baixo apenas decrescendo no quarto tempo mínimas no baixo mínima no primeiro tempo do baixo semibreve no baixo ré bequadro 4 no terceiro tempo mínima no terceiro tempo do baixo apenas f sem indicação de dinâmica f semibreve no baixo no terceiro tempo, ré#4 depois mi4 mínima seguido de pausas no baixo e no tenor no terceiro tempo, fáx4 depois sol#4 semínima na segunda metade do segundo tempo do soprano no soprano, mínima seguido de pausas semibreve no baixo mínimas no baixo mínima pontuada no primeiro tempo do soprano e do contralto lá3 na última semicolcheia do primeiro tempo fá#4 na última semicolcheia sem indicação de dinâmica mínima pontuada, colcheia pontuada seguido de pausa na voz interna no primeiro tempo, lá3 no contralto semínima ligada a colcheia pontuada na primeira nota do tenor dois mi2 mínima no baixo mínima na primeira nota do tenor semínima no tenor e no contralto sem indicação de dinâmica ou 31 155 159 e 161 164 acorde do terceiro tempo mi2 lá2 mi4 sol#4 mi5 f seguido de p acorde no primeiro tempo mi2 lá2 mi4 sol#4 dó#5 andamento acorde do terceiro tempo mi2 lá2 ré#4 mi4 sol#4 mi5 apenas p no terceiro tempo acorde no primeiro tempo mi2 lá2 lá3 mi4 sol#4 dó#5 Fonte: PONCE, Manuel M. Sonata Romántica: Hommage a Fr. Schubert qui aimait la guitare. Mainz: B. Schott’s Söhne, 1929. Digitação: Andrés Segovia. Dedicada a Andrés Segovia e ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, pp. 93-103. Nota: dados trabalhados pelo autor A ponte para a seção B do terceiro movimento (compassos 59 a 66), por ser um trecho longo com várias divergências, não caberia no quadro e é reproduzida abaixo: 4.1.6 – Sonata de Paganini Esta foi mais uma obra que Segovia insistiu para ser escrita, revisada e terminada: foram enviadas sete cartas num período de três meses tratando dessa peça. Supõe-se também que tenha tido maior alteração de Segovia no resultado final, uma vez que ele pediu para Ponce esquecer essa sonata para sempre após receber uma primeira versão dela que não satisfez o seu gosto: “Antes de que hicieras esa reduccion la habia yo hecho, y lo que yo esperaba y que omiti decirte - ¡mea culpa! – era uma transcripcion libre en donde tu talento 32 hubiese cubierto piadosamente la banalidad de la obra. (...) Ese tiempo, que te he robado neciamente, hubieras podido consagrarlo a cosa mas digna. En fin, perdoname y enterremos esa sonata para siempre. Y digo enterremos, porque yo no pienso tocarla, hubiera podido, al menos, editarse, a fin de que tu trabajo no hubiera sido estéril del todo.”43 Mas Ponce seguiu a sugestão e, ao invés de uma redução para violão da Grande Sonata em Lá maior para violão com acompanhamento de violino de Niccolò Paganini (1782-1840), escreveu uma nova composição elaborada a partir da obra do italiano e Segovia respondeu com grande alegria: “He recebido la remozada Sonata de Paganini. Antes era imposible tocarla. Ahora es imposible no tocarla.”44. Mesmo assim ele mais tarde ainda pediu novas alterações: “Mi querido Manuel: Buscando obra nuevas para mis concertos de España he tropezado con la Sonata de Paganini. El I tiempo lo he desechado irrevocablemente aun modificado por ti. Su estúdio es muy enojoso. Pero la Romanza y el tema final, variado por ti, pueden componer un numero muy brillante, y estoy estudiandolo. Pero me faltan dos variaciones mas, que si me das permiso para ello, te las pediré com urgência. Acuerdate del estilo pirotécnico del genial italiano, y hazlas en ese sentido, de modo que la gente no dude de que tambien yo he vendido mi alma al diablo”45 “Puesto que te vas a ocupar de Paganini, ¿no querias hacerme el favor de escribir una cadencia para la Romanza? (...) Se trata de una cadencia rapida sobre la dominante de lá menor para desembocar en el tema(...)”46 Essas últimas alterações foram pedidas posteriormente a 31 de agosto de 1930. Como essa sonata foi publicada integralmente pela primeira vez por meio de uma reprodução do manuscrito assinado por Ponce em 31 de agosto de 1930 em OTERO, 43 ALCAZAR, Miguel. The Segovia-Ponce letters. Columbus: Orphée, 1989, p. 77. 44 Idem, ibidem, p. 80. 45 Idem, ibidem, p. 104. 46 Idem, ibidem, p. 105. 33 Corazon. Manuel M Ponce y la Guitarra. México: Fonapas, 1981. pp. 78-8747, essas alterações não estão presentes nessa partitura. 4.2 – Apontamentos sobre a forma das sonatas para violão solo de Manuel Ponce Grosso modo, todas as sonatas analisadas têm a mesma estrutura formal: primeiro movimento em allegro de sonata, último em rondó e os demais em A-B-A. Constituem exceções apenas a Sonata Mexicana (o terceiro movimento dessa obra não foi concebido inicialmente como um movimento de uma sonata) e a Sonata de Paganini, de autoria de Paganini. Utilizamos para fins de análise a edição urtext dessas obras. Quadro 5 – formas dos movimentos das Sonatas para violão solo de Ponce Sonata mov. andamento forma Sonata Mexicana I II III IV I II III I II III IV I II III IV I II III Allegro moderato Andantino affetuoso Allegretto, quase serenata Allegretto un poco vivace Allegro moderato Chanson – Andantino molto espressivo Allegro non troppo Allegro Andante Menuet – Trio Allegro Allegro non troppo, semplice Andante Moment Musical – Vivo Allegro non troppo e serioso Allegro risoluto Piu tosto largo Andantino variato allegro de sonata A-B-A Rondó Rondó allegro de sonata A-B-A Rondó allegro de sonata A-B-A A-B-A Rondó allegro de sonata A-B-A A-B-A Rondó allegro de sonata alla italiana A-B-A Variações sobre um tema Sonata em lá menor Sonata III Sonata Clássica Sonata Romântica Sonata de Paganini Fonte: ALCAZAR, Miguel. Obra Completa para Guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000 Nota: dados trabalhados pelo autor 47 Como vimos, a própria Corazon Otero gentilmente nos enviou uma cópia desse manuscrito que segue em anexo a esse trabalho 34 Nota-se nessas obras que os andamentos empregados não são andamentos rápidos e com exceção da Sonata Clássica os allegros estão seguidos de outras indicações que levam à escolha de andamentos mais brandos. Ao longo da breve análise de cada sonata notar-se-á nessas obras o uso de procedimentos que no século XX estão associadas à academia, mesmo nas que não são exercícios de estilo. O procedimento empregado pelo compositor constitui em seguir os cânones dessa forma, representados pelas sonatas de Franz Joseph Haydn (1732 - 1809), Wolfgang Amadeus Mozart (1756 - 1791) e Ludwig van Beethoven (1770 - 1827). Manuel Ponce não esboça qualquer tentativa de superar ou re-elaborar o modelo de produção de sonatas da primeira escola de Viena. 4.2.1 – Sonata Mexicana Primeira sonata para violão escrita no século XX. Nela é empregada uma linguagem próxima ao impressionismo (especialmente no uso da harmonia e no segundo movimento) com elementos românticos e modais, características que aproximariam essa obra da música tradicional mexicana. O compositor já conhecia a obra de Debussy (Ponce escreveu um Scherzino dedicada ao compositor francês em linguagem impressionista onze anos antes da composição dessa obra). No mesmo período em que essa sonata foi composta ele estava esteticamente comprometido em escrever obras nacionalistas. Dessa forma, a escolha da linguagem utilizada nessa peça se deu não por se tratar de uma obra de um período de assimilação do impressionismo, mas sim de um período em que, já consciente dos procedimentos impressionistas, escrevia obras de linguagem mais próxima à música de seu povo, característica comum a outros compositores latino-americanos dos anos 1920, incluindo Villa-Lobos. Isso é comprovado pelo uso consciente de fragmentos de 35 canções folclóricas no primeiro e terceiro movimentos e pela presença constante de gestos musicais mexicanos na obra. Nos anos 70 Segovia tocou essa sonata dando títulos programáticos ao primeiro, ao segundo e ao quarto movimento, que foram chamados respectivamente de Bailecito del rebozo, Lo que sueña el ahuehuete e Ritmos y cantos aztecas48. Não conseguimos levantar durante a execução desse trabalho a origem desses nomes. 4.2.1.1 – Allegro moderato O primeiro tema desse movimento é, segundo Miguel Alcazar, parecido ao tema do villancico Salve, niño hermoso, canção anônima de Guanajuato. Ainda segundo esse autor, seu desenvolvimento, baseado somente nesse tema, recorda os desenvolvimentos escritos por Debussy em suas últimas sonatas49. Segundo Corazon Otero, os desenhos rítmicos presentes nesse movimento são de origem indígena50. Apesar de a obra ser em lá maior e o primeiro tema poder ser harmonizado usando acordes de tônica, dominante e subdominante, ele preferiu harmonizá-lo usando acordes mais distantes, como dominante da dominante e tônica anti-relativa. Ao longo desse movimento nota-se um tratamento harmônico que não só busca evitar e enfraquecer a polarização tônica - dominante como evita empregar o acorde de tônica, que aparece pela primeira vez no compasso 113 (aparece um acorde de lá maior no compasso 42 que não funciona como tônica, mas sim como subdominante da dominante). 48 ALCAZAR, Miguel. Obra completa para guitarra de Manuel Ponce. México: Conaculta, 2000, p. 22. 49 Idem. ibidem, p. 18 50 OTERO, Corazon. Manuel M Ponce y la Guitarra. México: Fonapas, 1981, p. 33. 36 O primeiro tema (constituído de um antecedente de dois compassos, um compasso rítmico, um conseqüente de dois compassos e mais um compasso rítmico) é enunciado nos seis primeiros compassos, seguido de uma frase de sete compassos que elabora os elementos rítmicos do tema. A ponte para o segundo tema (compasso 14 a 26) repete trechos e motivos anteriores, transpostos. O segundo tema (constituído de um antecedente isomotívico de cinco compassos seguido de um conseqüente também isomotívico) é a única seção da peça que apresenta relações tônica – dominante e está toda baseada em acordes de dominante, subdominante da dominante, subdominante relativa da dominante, dominante da dominante e dominante anti-relativo. Apesar de no breve período de pesquisa desse trabalho não termos encontrado a origem folclórica desse tema, ele utiliza elementos que lembram a música mexicana de influência espanhola, normalmente tocada em instrumentos de metais. 37 Na ponte final dessa seção (compassos 45 a 57) são mostrados de maneira clara ritmos de caráter mexicano: os acordes dos compassos 45 e 46 bem como as escalas dos compassos 51 a 54 são gestos comuns da música mariachi. O desenvolvimento é relativamente curto (compassos 58 a 86) e baseado somente no primeiro tema. A harmonia desse trecho, por excelência modulatório, possui cadências com fracas relações tonais entre si, algumas com uso de intercâmbio modal (como Em7 (68)51 → Cm (69)) e outras com uso de cromatismo (como Eb/Bb (58 e 59) → Em (60 a 63)). A re-exposição dos temas é cópia literal da parte A, exceção feita na ponte para o tema B, que teve a harmonia alterada, pois ela agora deveria conduzir para a tônica, e para o fato de que o tema B está transposto para a tônica. 4.2.1.2 – Andantino affettuoso Movimento com uma introdução de quatro compassos e de forma A-B-A, está todo construído a partir da elaboração do motivo de cinco colcheias. Ora há uma ligadura numa voz enquanto outra se movimenta, ora há subdivisões das colcheias feitas em bordadura. As duas únicas exceções são os compassos 15 e 50 - que separam um trecho de alta movimentação de vozes de outro de baixa movimentação e a coda, que apresenta pausas. É o movimento dessa peça com a harmonia mais rica e que apresenta maiores traços impressionistas, como uso de acordes de quartas aumentadas (ex.1: compasso 19), acordes aumentados (ex. 2: compasso 13), cadências cromáticas (ex. 3: Bm7/A 51 Números de compasso indicados entre parênteses. 38 (16) → Bb/A (17)) e harmonia dúbia (ex. 4: compasso 18). A melodia, apesar de terna e singela, é pouco importante, pois se trata de mera elaboração da harmonia, resultado da ornamentação de uma das vozes harmônicas. ex. 1: ex. 2: ex. 3: ex. 4: 4.2.1.3 – Allegretto, quasi serenata Usando muitos arpejos e escalas, é o movimento com menor ritmo harmônico. Não há em todo o movimento cadências de tônica – dominante nem de dominantes individuais explícitas. Nos trechos em que elas se apresentariam ou o acorde de dominante é transformado em acorde menor (ex.: compasso 2) ou o acorde de repouso é transformado em acorde aumentado (ex.: compasso 11). À exceção do uso de acordes aumentados os procedimentos harmônicos, com cadências de intercâmbio modal e uso de acorde de quinto grau menor, lembram mais a linguagem romântica do que a impressionista. Esse movimento é um pequeno rondó, de estrutura A-B-A-C. A seção A está baseada em um amplo arpejo, a B no ritmo de valsa, ora com bordadura no segundo 39 tempo ora sem bordadura nesse tempo, e na seção C ele utiliza como fonte um fragmento do Jarabe Tapatío:52 4.2.1.4 – Allegretto un poco vivace Rondó-sonata com quase as mesmas características harmônica do terceiro movimento, está baseado em elaborações dos motivos dos movimentos anteriores, o que dá um certo caráter cíclico a essa obra. Como exemplos podemos citar os compassos 50 a 63, que mostram re-elaborações de motivos do segundo e do terceiro movimento. Há dois casos em que há uma cadência dominante → tônica: compassos 45 e 46, compassos 59 e 60. A seção A aparece três vezes, duas em lá maior e na segunda vez aparece diminuída em fá maior repetida em seguida em sol maior. Esse movimento tem a forma A-B-A’-C-A-D. 52 Ele utiliza a melodia do trecho com o verso “Vamos a tomar atole”. O Jarabe Tapatío é um dos temas mexicanos mais famosos em todo o mundo, difundido até em episódios de desenho animado norteamericanos. 40 Assim como nos movimento anteriores, vários gestos da música mexicana estão presentes nesse movimento, como o uso do 6/8, ora como compasso binário, ora como ternário, além de outros elementos já citados anteriormente, especialmente elementos da música mariachi. 4.2.2 – Sonata III Dentre as sonatas para violão solo de Ponce que temos disponíveis, é a mais rica musicalmente e a que melhor representa o domínio do compositor da linguagem musical. Foi escrita quando Ponce estudava em Paris com Paul Dukas. É uma das três obras para violão desse compositor mais conhecidas, mais representativas de sua produção e mais estudadas. O uso idiomático de harmonias abertas e coloridas nessa sonata é algo raro de se observar na obra de um compositor não-violonista. A obra apresenta o amplo uso de elementos típicos do impressionismo, como acordes de quartas (ex.: compassos 84 e 85 do primeiro movimento), ausência de polarização entre tônica e dominante, uso de acordes de classificação dúbia (como o acorde dó#3 si3 fá4 do compasso 32 do segundo movimento ou o acorde ré#3 dó#4 sol4 dó natural 5 do compasso 90 do primeiro movimento), e tratamento da dissonância como colorido harmônico e não como tensão que deve ser resolvida em seguida. 4.2.2.1 – Allegro moderato Allegro de sonata seguindo os cânones clássicos, apresenta um primeiro tema em ré menor sobre um baixo pedal. É interessante observar já no tema A uma característica da linguagem de Ponce observada até em suas obras feitas com o 41 objetivo de imitar o estilo de outro compositor: repetir um pequeno trecho melódico em cuja repetição a harmonia é diferente. Na frase seguinte (compassos 9 a 14) o compositor arpeja os acordes usando como motivo o baixo do acorde seguido de arpejo no soprano, em colcheias. Os demais trechos da ponte para o tema 2 utilizam ou o motivo descrito acima ou elaborações do motivo do tema A, exceção feita aos acordes repetidos dos compassos 39 e 40. Como eles não são desenvolvimentos de motivos anteriores, são muito eficazes em preparar a entrada de um novo tema. Apesar de a tonalidade da obra ser ré menor, o tema B não inicia na tônica relativa, mas no quinto grau menor, lá menor. Embora esse procedimento pareça anticanônico, segundo Newmann ele está presente em obras de Haydn e Beethoven.53 Além de o tema ter um caráter menos andado ele está acompanhado da indicação piu tranqüilo ed espressivo, o que torna ainda mais clara a diferença de caráter desse tema. É um tema bipartido, com a primeira parte nos compassos 41 a 47 e a segunda nos compassos 48 a 53. A segunda parte do tema está em fá maior, tônica anti-relativa. 53 NEWMANN, William S. The Sonata in the Classic Era: the second volume of a history of the sonata ideas. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1969. 42 O desenvolvimento desse movimento se inicia com um aumento do ritmo do motivo do tema A, arpejando em tercinas acordes que no motivo inicial eram tocados plaquê. Em seguida ele retoma idéias do final da primeira seção, mesclando com arpejos de acordes de quarta e escalas ascendentes e descendentes. O uso da harmonia nesse trecho apresenta características impressionistas, preferindo modulações de intercâmbio modal ou para tons vizinhos que cadências que criem a sensação de tensão e repouso. O uso dos acordes de quarta deixa ainda mais claro o uso da linguagem impressionista nessa obra. Como na Sonata Mexicana, a re-exposição é pouco ousada, sendo apenas uma mera repetição da primeira seção com a ponte alterada e o tema B transposto. A coda final é curta e abrupta, terminando num acorde dúbio, que pode ser tido como Bm7/D ou como D6. 4.2.2.2 – Chanson – Andantino molto espressivo Canção em forma A-B-A’. As cadências harmônicas utilizadas apresentam, às vezes, um caráter modal. A seção B, Vivo, é muito curta e utiliza o mesmo motivo da ponte para essa seção (compassos 13 a 15). 43 Na retomada da parte A, Manuel Ponce muda levemente a harmonia e aumenta a movimentação das vozes internas, dando-lhes mais importância nessa seção. A coda, elaborada a partir do motivo do compasso 4 dessa peça, cria uma terminação em clima nostálgico, contrastante com o próximo movimento. Todos os elementos lingüísticos usados no primeiro movimento estão aqui presentes. 4.2.2.3 – Allegro non troppo Nesse movimento alguns elementos impressionistas estão ausentes, e são utilizados elementos musicais de caráter espanhol. O tema desse rondó tem fortemente essa característica, mas os demais temas chegam a negá-la, exceção ao trecho em trêmolo. Nesse movimento a sensação de tonalismo é mais forte que nos anteriores, sendo o movimento menos ousado na harmonia e na estrutura tonal, chegando a ter uma seção e uma subseção na dominante. Quadro 6 – Tonalidade das seções do terceiro movimento da Sonata III A B A C A D A E A Coda D A D Bm→F#m D Bb D D→A D→Db C7→D6 Neste movimento, cujo tema A tem forte caráter espanhol, é interessante notar que não há elementos que unificam as seções, pelo contrário, a peça foi construída com o objetivo de que cada nova seção criasse a sensação de contraste: cada novo tema tem caráter menos e menos espanhol. Quando o primeiro tema da seção E quebra essa seqüência, em seguida, ainda nessa seção, surge o tema que nega com maior intensidade o tema espanhol desse movimento (compassos 83 a 86). 44 Esse tema é também utilizado na coda e encerra de maneira surpreendente e inusitada essa obra, uma vez que a prática é terminar uma peça longa de forma brilhante. A presença de um tema A com caráter espanhol nessa obra cria um ambiente propício a um final heróico, mas Ponce fez questão de que o final fosse melancólico. Como dito em 4.1.3, Segovia pediu para alterar o final dessa peça, provavelmente para torná-lo brilhante, mas esse pedido não foi atendido. O fato de nessa peça Ponce não ter aceitado alterações estruturais sugeridas por Segovia deve ter colaborado para ela ser uma de suas obras para violão mais representativas de sua linguagem pessoal. Como não há elementos motívicos que unifiquem as seções, a repetição do tema A após as demais seções encarrega-se de unificar a obra, pois o movimento soaria deveras rapsódico caso novas seções surgissem sem reaparecer esse tema. 4.2.3 – Sonata Clássica Primeira obra de Ponce composta para imitar o estilo de outro compositor. Foi dedicada a Fernando Sor, que, ao lado de Mauro Giuliani (1781 - 1829), constitui um dos mais importantes compositores para violão do Classicismo. Como vimos, Segovia a atribuiu a autoria dessa obra a Sor em algumas ocasiões com o intuito de estreá-la oficialmente numa cidade ou casa de espetáculos de maior prestígio. 45 Segue os cânones da primeira escola de Viena (Haydn, Mozart, Beethoven) em quase todas as suas características, sendo uma obra de linguagem clássica. Nada se vê do Ponce nacionalista, tão pouco do Ponce impressionista, as duas linguagens que ele utilizou na sua maturidade musical. Apesar disso, nota-se que as formas utilizadas, especialmente no segundo e no quarto movimento, não são clichês formais do Classicismo. 4.2.3.1 – Allegro Escrito em lá menor, a exemplo de muitas sonatas de Haydn, apresenta um tema de oito compassos cuja estrutura motívica é construída a partir de um motivo de dois compassos na tônica, seguida da repetição desse motivo na dominante, outro motivo de dois compassos derivado do motivo anterior e a repetição desse novo motivo. Como motivos são usados elementos que podem se transformar de melodia em acompanhamento e vice-versa, recurso empregado nessa obra. O trecho dos compassos 9 a 14 parte desses motivos e os re-elaboram, fragmentando-os até o compasso 15, em que o primeiro tema reaparece ornamentado. Como em obras de Mozart, para a ponte (compassos 20 a 29) Ponce prefere empregar um novo tema, derivado de elementos utilizados previamente, do que seguir 46 fragmentando e re-elaborando o tema inicial. Quatro compassos de notas repetidas criam o ambiente de expectativa adequado para surgir um novo tema. O tema B está na tônica relativa e tem um caráter mais calmo que o tema A. Assim que esse tema termina, paulatinamente o ritmo melódico aumenta até aparecerem tercinas, as figuras mais rápidas desse movimento. Todo o tratamento da ponte para o fim dessa seção lembra tratamentos muito mais freqüentes nas sonatas para piano que nas sonatas para violão do classicismo. O desenvolvimento inicia num acorde distante da tônica (Ab) e modula para paulatinamente chegar à dominante: Ab→Cm→G→Dm→G→Bb→F→C→Am→E→B →E são os acordes estruturais desse trecho. São utilizados elementos dos dois temas, com predominância de elementos do tema B. Na ponte para a re-exposição (91 a 101) utiliza-se motivos do tema com pouca alteração rítmica. Assim como nas sonatas anteriores, a re-exposição é uma mera reprodução da primeira seção, exceção feita à ponte para o tema B e para o fato do tema B estar 47 transposto para a tônica. Uma coda brilhante, que utiliza escalas rápidas, encerra esse movimento. 4.2.3.2 – Andante Escrito em dó maior (relativo de lá menor), e em forma A-B-A, apresenta uma atmosfera de influência beethoveniana. Apesar de haver elementos motívicos que unifiquem esse movimento, ele soa levemente rapsódico e possui uma curva tonal inusitada para obras seguindo a linguagem de Haydn e Mozart, mais próprias à linguagem de Schubert: C→G→A→Cm→Ab→G→Cm→Ab→G→C. 4.2.3.3 – Menuet – Trio Outro movimento em dó maior, ele tem um caráter festivo, assim como em várias valsas de Sor (especialmente os escritos para dois violões). Todas as frases de um mesmo trecho desse movimento são motivicamente similares e facilmente se percebe como os motivos foram desenvolvidos. A estrutura harmônica desse movimento é relativamente simples. A primeira frase do Minueto (compassos 1 a 9) é em dó maior e caminha pra sol maior. A segunda frase (compassos 10 a 19) se inicia num arpejo de dó# diminuto e caminha para sol maior. A próxima frase (compassos 19 a 26) se inicia em dó menor e caminha para sol maior. As duas últimas frases do Minueto estão em dó maior. A primeira frase do trio se inicia em dó maior e caminha para sol maior, a segunda inicia em mi bemol maior e caminha para sol maior. A última frase da peça é em dó maior. 48 4.2.3.4 – Allegro Rondó em lá maior com uma interessante peculiaridade: apresenta uma seção A em lá maior, em seguida uma seção B com um motivo diferente em dó# maior. Logo após retoma o A seguido de uma longa elaboração de um motivo desse tema, em fá# menor que caminha para mi maior (compassos 31 a 47). Logo após uma seção C em lá maior, retoma o A e apresenta uma seção D em lá menor, com motivo baseado no motivo do segundo compasso. Após essa seção ele não retoma o A, mas a elaboração de A após a seção B (compassos 31 a 48), em outra tonalidade, fá menor (vide compassos 105 a 115). Em seguida apresenta uma seção D em lá menor que caminha para mi maior, retoma o A seguido de B, apresenta oito compassos que retomam a idéia da elaboração de A dos compassos 31 a 48. A coda é baseada nos motivos presentes nos compassos 8 e 9. Ou seja, esse rondó tem duas características raras: numa das seções destinadas à repetição de A ele utiliza uma elaboração motívica de A e ao final ele retoma idéias de seções mostradas anteriormente. Tal característica formal comprova que nessa obra concebida para imitar o estilo de outro compositor, Ponce se baseou em clichês harmônicos, melódicos e 49 motívicos para produzir uma obra em linguagem clássica, mas na forma ou ele se baseou em uma obra em especial (pois Segovia pediu que essa sonata fosse composta seguindo o exemplo de sonatas não-identificadas entregues a Ponce previamente) ou ele resolveu elaborá-la da maneira que mais lhe aprouve. 4.2.4 – Sonata Romântica Obra em estilo de Schubert, utiliza várias cadências de intercâmbio modal e contornos melódicos que lembram alguns lieder desse compositor. No entanto, a forma se aproxima mais de formas empregadas por Ponce em suas próprias sonatas que de formas empregadas por Schubert. O fato de o desenvolvimento ser feito a partir de motivos mostrados previamente com tanta naturalidade no trato melódico que elas soam quase rapsódicas e com difícil diferenciação de caráter entre os temas, uma característica particular das sonatas de Schubert, não está tão claramente presente nessa obra, embora o mexicano tenha tentado, sem grande sucesso, exibir essa característica. 4.2.4.1 – Allegro non troppo, semplice O primeiro tema dessa obra apresenta todos os elementos motívicos dessa peça à exceção dos dois motivos que só serão apresentados no tema B. Os 10 compassos seguintes são elaborações desse tema em torno do acorde de tônica e tônica anti-relativa. Em seguida o tema A é retomado, dessa vez caminhando 50 harmonicamente para o quinto grau, que se transforma em quinto grau menor. Segue uma ponte modulante para o tema B no quinto grau menor, na dominante e na tônica relativa maior. O tema B está na dominante. A ponte que segue é mais estável que a ponte anterior e cadencia no acorde de dominante da dominante. Feita essa cadência, segue um compasso de pausa (cadência silenciosa) e ataca-se a primeira parte do tema A, transposto uma terça menor acima e harmonizado na relativa da tônica menor. Por fim, caminha-se à dominante para encerrar essa seção. O desenvolvimento se inicia re-expondo o tema A, quase literalmente, sobre um acorde de tônica relativa, seguido da re-exposição de um trecho do tema B sobre um acorde distante, sol menor (relativo do quinto grau menor, mas tal classificação soa inadequada, pois não há em todo o desenvolvimento um único acorde de quinto grau menor e utiliza-se o acorde de dominante). Embora se utilizem elementos do tema A no desenvolvimento, o uso de elementos do tema B predomina. Um longo trecho do desenvolvimento (compassos 75 a 86) utiliza apenas motivos do tema B. A princípio ele parece uma ponte para a re-exposição, mas não o é, pois essa seção surge no trecho seguinte. O compasso 87 apresenta o início do tema A transposto. Numa primeira audição esse compasso engana o ouvinte, soando como re-exposição. Isso ocorre pois toda a obra não apresenta uma estrutura tonal clara e o ouvinte não consegue 51 acompanhar perfeitamente em que tonalidade está o trecho que ele escuta no momento. No entanto, esse compasso se trata apenas de uma ponte para a reexposição. O uso de elementos do tema A nessa ponte torna a chegada à re-exposição mais sutil e natural. Como nas outras sonatas, a re-exposição apresenta poucas novidades, nenhuma delas muito relevante. É o caso, por exemplo, de o tema A ser apresentado sob um pedal de dominante, o que altera levemente a harmonia desse tema nesse trecho. 4.2.4.2 – Andante Movimento em mi maior que, apesar de ser facilmente identificável como um A-B-A’, apresenta uma estrutura formal que o aproxima de um rondó. É apresentada uma seção A de 28 compassos com duas melodias de caráter diferente (compassos 1 a 4 e compassos 13 a 16, a primeira em mi maior e a segunda em dó# menor), mas que não são postas como temas contrastantes, pois toda a peça foi trabalhada motivicamente para levar uma idéia naturalmente à outra, sem oposição54. 54 Numa primeira audição é mais provável que o ouvinte tenha como tema contrastante ao inicial os compassos 20 a 28, em fá# maior / fá# menor, que não passam de uma elaboração da melodia dos compassos 9 e 10 com um acompanhamento homofônico. 52 Em seguida segue uma seção que retoma a primeira melodia do trecho anterior, transposta para ré maior, e surge uma idéia musical nova (compassos 32 a 38). É retomado o fim da primeira seção, agora em si maior / si menor, logo após uma repetição literal da primeira melodia. Seguem re-elaborações da primeira seção, que mantêm as frases próximas da tonalidade desse movimento, e uma pequena coda. Ao ouvir essa música até o compasso 58 é possível que um ouvinte pense que esse movimento seria em forma rondó, mas o que segue mostra que ele tem forma A-B-A’. Nesse movimento lento Ponce se aproxima de procedimentos de elaboração motívica típica de Schubert, no entanto, não os apresentam de forma tão genial quanto o compositor alemão. 4.2.4.3 – Moment Musical – Vivo Movimento que recorda um grupo de peças características de Schubert, apresenta duas seções fortemente contrastantes, a primeira em mi menor e a segunda em lá maior, em forma A-B-A. Cada seção se desenvolve através de elaborações da primeira frase de cada trecho, por meio de procedimentos mais próximos do improviso que do desenvolvimento sistemático dos motivos. A parte A pode ser dividida em duas grandes seções, uma em mi menor (compassos 1 a 26) e outra em si maior (compassos 26 a 64). Dentro dessas seções há frases em acordes relativos da tonalidade de cada seção que tem como objetivo mudar a cor dessas melodias e deixar dúbia a sensação tonal. Essa característica é típica de Schubert, e desperta a atenção 53 do ouvinte para todas as frases ao invés de levar a atenção somente para os temas principais, desprezando o conteúdo melódico de pontes e codas. 4.2.3.4 – Allegro non troppo e serioso Esse movimento emprega uma curiosa forma rondó, que lembra o tratamento de Schubert da forma sonata. Ele apresenta um tema A de oito compassos, em lá menor, seguido de uma pequena ponte de sete compassos que caminha para a dominante. Segue um tema B de forte caráter harmônico que também conduz para a dominante, passando por acordes razoavelmente distantes (no caso dessa apresentação desse tema, para a tônica relativa, tônica maior, tônica anti-relativa da tônica maior e tônica relativa da tônica maior), e um tema C mais interessante melodicamente, um tema mais “sinuoso”, na tonalidade de lá maior. É apresentada nos compassos 40 a 82 uma longa ponte modulante que inicia na tônica e caminha para a dominante da dominante da dominante, passando por acordes distantes e empregando com freqüência cadências de intercâmbio modal ou de cadências na mediante e em que predominam elaborações motívicas do tema C. No compasso 83 repete-se o tema A (transposto para o quinto grau menor da dominante), seguido do tema B (que inicia na mesma tonalidade e caminha para a dominante da dominante da dominante) e do tema C (na dominante da dominante). Segue outra ponte modulante (compassos 115 a 125) que inicia no quinto grau menor da dominante e leva para a dominante utilizando elementos motívicos dos temas B e C. Re-expõe-se o tema A, dessa vez em lá maior, seguido de uma ponte de 10 compassos. Repete-se o tema A novamente e segue-se um tema D de acordes de 54 extensão muito ampla para o violão55. A obra se encerra numa espécie de coda que se trata da fragmentação do tema B. Como a peça é construída a partir da re-exposição recorrente de um tema, é um rondó, mas como re-expõe recorrentemente todos os temas menos na parte final, pode ser visto, grosso modo, como um A tri-temático (lá menor→lá maior) - A’ tri-temático (si menor→si maior) - A bi-temático com longa ponte harmônica (lá maior). 4.2.5 – Sonata de Paganini Dentre as obras classificadas em catálogo como sonatas para violão de Ponce, é a que menos pode se reconhecer a sua própria linguagem musical, apesar de nela ser possível observar seu manejo da escrita musical. Toda a obra baseia-se na Grand Sonata a Chitarra Sola com Accompagnamiento di Violino de Paganini, e trata-se de uma livre elaboração dessa obra, uma espécie de arranjo em que as melodias originais de Paganini foram ornamentadas e levemente alteradas por Ponce. Como um dos objetivos desse trabalho é estudar a linguagem de Ponce e toda a forma, harmonia e tratamento motívico dessa peça não é de autoria dele, mas sim de Paganini56, consideramos uma análise formal dessa obra pouco interessante para esse estudo e mais adequada para um estudo voltado exclusivamente à comparação dessa livre elaboração de Manuel Ponce com a obra original. 55 Um violão normal tem três oitavas e uma quinta justa de extensão e esse trecho apresenta acordes com extensão de três oitavas e uma terça maior. 56 O que Ponce fez, especialmente nos dois primeiros movimentos, foi quase que exclusivamente ornamentar o texto original, com algumas modificações 55 5 - Conclusão Manuel Maria Ponce utilizou várias formas e linguagens musicais, das quais o conjunto de seis sonatas para violão solo representa um dos mais significativos da produção desse compositor. Nesse conjunto encontramos todas as linguagens musicais empregadas por ele. Além disso, entre essas obras figuram peças importantes em seu catálogo, duas em especial: a Sonata Mexicana, por sua importância histórica, e a Sonata III, por se tratar de uma obra madura, consciente das possibilidades harmônicas do violão, e em seu próprio estilo. O estudo da biografia de Ponce, especialmente no que se refere à sua relação com Andrés Segovia, é vital para compreender sua produção para violão, pois praticamente toda escolha musical dessas obras foi influenciada pela sua amizade com o violonista espanhol. Além disso, o violonista procurou interferir no resultado final dessas obras, com alterações que devem ser conhecidas e estudadas para que o intérprete tenha maiores subsídios e faça as suas próprias escolhas musicais. Por fim, espera-se que esse trabalho possa ajudar na reflexão sobre as sonatas para violão de Manuel Ponce, servir de auxílio para futuras pesquisas e também incentivar o estudo da obra desse compositor no Brasil. 56 6 - Bibliografia 6.1 – Livros ALCAZAR, Miguel. Obra completa para Guitarra de Manuel M. Ponce a partir de los manuscritos originales. México: Conaculta, 2000. _________, Miguel. The Segovia-Ponce letters. Columbus: Orphée, 1989. GRIAL, Hugo de. Músicos Mexicanos. México: Diana, 1965. MED, Bohumil. Teoria da Música. Brasília: Musimed, 1996. NEWMANN, William S. The Sonata in the Classic Era: the second volume of a history of the sonata ideas. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1969. ___________, William S. Sonata since Beethoven: the third and final volume of a history of the sonata idea. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1969. OTERO, Corazon. Manuel M. Ponce y la Guitarra. México: Fonapas, 1981. ROSEN, Charles. Sonata forms. New York: Norton, 1988. 6.2 – Partituras Vários autores. Álbum de música popular mexicana. México: Repertório Wagner S.A. DEBUSSY, Claude. Préludes pour piano. Buenos Aires: Ricordi. SOR, Fernando. Sonata op. 22. London: Tecla editions, 1982. 57 6.3 – Dicionários, enciclopédias e catálogos BLUME, Friedrich (org.). Die Musik in Geschichte und Gegenwart. Kässel und Basel: Bärereinter Verlag, 1951. HONEGGER, Marc (org.). Dictionnaire de la Musique, Les Hommes et leurs Oeuvres. Paris: Bordas, 1970. LIEPINS, Andrew. The Guitarist’s Repertoire Guide. 3rd. ed. Nottingham: SGC Publications, 1999. POCCI, Vicenzo. Guida al Repertoria della Chitarra nel Novecento. Roma: VP Music Media, 1999. SADIE, Stanly (org.). The New Grove Dictionary of Music and Musicians. London: Macmillan Publishers Limited, 1980. Vários autores. Enciclopédia de la Música. México: Editorial Cumbre, 1953. 6.4 – Gravações SEGOVIA, Andrés. Manuel Ponce Sonatas. MCA 42072. 6.5 – Correspondências com o autor do presente trabalho ALCAZAR, Miguel. GILARDINO, Angelo. ORPHÉE, Matanya. OTERO, Corazon. 58