Leituraescolare históriasemquadrinhos: fruiçãointelectual, criatividadeeformação degostosdeleitores ( Profa. Dra. Valéria Bari Universidade Federal de Sergipe RESUMO: Discute a importância das Histórias em Quadrinhos na formação de acervos, tanto na Biblioteca Escolar quanto nos diferentes espaços de leitura destinados aos estudantes na comunidade. Especificamente, será contemplada a formação do leitor, com a superação das etapas de decodificação, memorização e apropriação dos aspectos da comunicação escrita, sob a ótica de seus componentes afetivos, que são potencializados pela presença das Histórias em Quadrinhos no processo de Letramento. Neste contexto, será enfatizado o “ponto de inflexão” no cenário da leitura escolar, representado pela recém promulgada Lei no. 12.244/2010, que dispõe sobre a universalização das Bibliotecas Escolares no Brasil. PALAVRAS-CHAVE: Histórias em Quadrinhos – Educação; Leitura Escolar; Formação do Leitor; Políticas Públicas – Leitura. ABSTRACT: The importance of comics as part of the body of school libraries and of the various reading spaces dedicated to the community’s students is discussed. Forming of readers will be specifically discussed, with the overcoming of the decodifying, memorizing and appropriation of aspects of written communication stages, seen through the light of their affective components, which are enhanced by the presence of comics in the lettering process. In this context the school reading scenario’s ‘turning point’ will be emphasized, represented by the recently passed federal law no. 12.244/2010, pertaining to universal implementation of school libraries in Brazil. KEY WORDS: Comics – Education; School Reading; Reader Forming; Public Policy – Reading. A Educação Universal, como apregoada nos princípios internacionais que norteiam os Direitos Humanos, está voltada à preparação dos indivíduos para a f ruição intelectual plena do 9ª Arte (| São Paulo, vol. 1, n. 2, 25-33, 2o. semestre/2012 25 conhecimento armazenado por toda a humanidade ao longo dos séculos. Para tal, as nações buscam a implantação da educação formal inserida nas políticas públicas, sob as diretrizes que contemplam ao mesmo tempo na difusão do conjunto de conhecimentos dimensionados nas relações sociais e de empregabilidade, a formação da identidade nacional, identidade local, preservação e difusão cultural. Pela característica bibliográfica do registro de conhecimento, sobretudo no ocidente, a questão da formação do leitor permeia todos os aspectos do ideal da Educação Universal. No Brasil, esta situaçãoproblema é agravada pela pouca disponibilidade e má distribuição territorial de equipamentos públicos voltados para a leitura, ou seja, as diferentes unidades de informação, desde a tradicional Biblioteca Pública até o Centro de Informação Especializada. Ao mesmo tempo, uma combinação de altos custos na aquisição de livros e pouca tradição de leitura familiar torna raros os acervos pessoais, também pouco compartilhados fora da esfera familiar. Esta situação compromete os indicadores qualitativos da Educação, da Produção Científica e da Empregabilidade dos cidadãos brasileiros. Ou seja, se a leitura não é disponibilizada, nem do ponto de vista dos itens (livros e periódicos, p. ex.), nem do ponto de vista dos ambientes sociais voltados para a leitura, fica comprometida a familiarização dos cidadãos coma a prática social da leitura. Se a formação do hábito leitor vem da familiaridade, o prazer é uma mistura desta familiaridade com um nível de letramento que permite uma leitura descontraída. O gosto pela leitura, atingido na fase mais madura do letramento, é o estabelecimento de 26 preferências personalizadas por um elenco de gêneros e autores, que imprime elementos de identidade ao hábito e ao prazer pela leitura, com fruição intelectual e criatividade em relação a apropriação e ressignificação da informação e do conhecimento. Devido a carência de unidades de informação e a falta de recursos para atuar em todas as frentes necessárias, as políticas públicas atuais priorizam a implementação sob as melhores condições possíveis da Biblioteca Escolar, acreditando que a mesma seja uma precursora do aparecimento dos demais equipamentos públicos necessários à sociedade brasileira nessa área. Como estabelecido pela Lei no. 12.244, recentemente promulgada em 24 de maio de 2010, que dispõe sobre a Universalização da Biblioteca Escolar, todos os estabelecimentos escolares públicos e privados brasileiros dedicados ao Ensino Fundamental e Médio deverão dispor desta importante unidade de informação. Mas, a mera imposição de um espaço destinado à leitura, da presença de livros, assim como de outras mídias, linguagens e Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC’s), não serve de garantia a formação do gosto pela leitura durante a sua escolarização formal. O verdadeiro “ponto de inflexão” na situação-problema atual ocorrerá por meio da mudança na cultura escolar que esta unidade de informação tem o potencial de criar, mediante a aproximação dos profissionais da Educação e da Biblioteconomia. Esta comunicação científica, baseada na continuidade da pesquisa desenvolvida e defendida por meio de tese de doutorado em 2008, denominada O Potencial das Histórias em Quadrinhos na Formação de Leitores, visa acrescentar elementos relevantes a discussão acadêmica e social sobre a 9ª Arte (| São Paulo, vol. 1, n. 2, 25-33, 2o. semestre/2012 formação do leitor, sobretudo no que tange ao desenvolvimento do gosto pela leitura, aqui especificamente dirigida a leitura escolar e à Biblioteca Escolar, enfatizando a importância da presença das Histórias em Quadrinhos neste tipo de unidade de informação. Segundo as conclusões obtidas na ocasião da apresentação do referido trabalho acadêmico, que seguem sendo comprovadas por novos estudos de atualização da pesquisa nos últimos três anos, a formação do gosto pela leitura é facilitada pela criação de situações de leitura cotidiana, principalmente quando as mesmas não estão vinculadas a uma utilidade da vida, pois isto descaracteriza um momento de lazer. Assim, a disponibilização das histórias em quadrinhos ao leitor novato e a facilitação de sua circulação, em ambientes como a escola, assim como o lar e a comunidade, é extremamente importante na familiarização, repetição e reforço de conteúdos escolares de alfabetização, sob um ângulo de entretenimento. As histórias em quadrinhos, além da facilidade da veiculação de conteúdos complexos aos leitores novatos, amadurecem também a relação emocional entre o leitor e a sua leitura. Essa relação emocional tem teor eclético, ou seja, cria leitores que apreciam todos os tipos de leitura, da mais popular a mais erudita. Comprovadamente, a leitura de Histórias em Quadrinhos forma leitores que gostam de toda a natureza de obras, com a vantagem de gerar uma cultura leitora infanto-juvenil, comunidades leitoras de grande abrangência e perenidade por toda a vida. O seu potencial informacional também está à disposição da escolarização, e ainda não se explorou o seu limite na formação de uma postura proativa do estudante na busca do conhecimento, pois as histórias em quadrinhos propiciam a possibilidade de conjugação de fontes, capacidade de síntese e formação de discurso próprio, inerentes sinais da apropriação e ressignificação de informações e conhecimentos. Uma boa opção seria a incorporação da leitura e da produção infantil das Histórias em Quadrinhos nas diferentes práticas pedagógicas, acompanhando a disponibilização das mesmas no acervo da Biblioteca Escolar. POLÍTICAS PÚBLICAS E A NOVA LEGISLAÇÃO DAS BIBLIOTECAS ESCOLARES Para a promoção da Educação Universal no Brasil, após o final da ditadura militar e a ainda mais recente abertura política, o país contava com uma rede escolar pública muito combalida, castigada por um regime que lhe impôs restrições severas, tratou os educadores com pouco respeito e não priorizou a infraestrutura dos prédios escolares e outros espaços e equipamentos públicos voltados para o acesso à educação e cultura. Mais recentemente, os movimentos populares, as organizações não governamentais e as políticas públicas federais protagonizaram o início da necessária renovação da Educação no Brasil, seja pela capacitação de seus quadros, seja pela melhoria de sua infraestrutura, seja pelas ações afirmativas que tem tornado o Ensino Fundamental e Médio cada vez mais atraente aos grupos sociais antes excluídos. No entanto, ainda há um longo percurso para nivelar a formação do leitor brasileiro ao 9ª Arte (| São Paulo, vol. 1, n. 2, 25-33, 2o. semestre/2012 27 nível de nações financeiramente equivalentes. A situação pode ser comprovada pela comparação de indicadores internacionais fornecidos por investigações internacionais como as desenvolvidas pelo Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), que em 2009 ainda classifica o Brasil em 49ª. posição no quesito Leitura Escolar, num grupo de 79 países distribuídos nos cinco continentes. Uma concretização desta nova situação da leitura pública no Brasil pode ser verificada no documento veiculado pela Fundação Biblioteca Nacional, relativo à caracterização do Programa Nacional de Incentivo à Leitura (PROLER), no qual são nomeadas as “Organizações Não Governamentais – ONGs”, como parceiras, no qual é designado que Nacionalmente o PROLER desenvolve ações em parceria com secretarias de cultura e de educação (municipais ou estaduais), universidades, bibliotecas, ONG´s e outras instituições, estabelecendo convênios e constituindo os Comitês. Em todas as Unidades Federadas atuam Comitês do PROLER, promovendo ações de práticas leitoras. A promoção da leitura tem efeito multiplicador, fazendo com que novos parceiros se integrem ao Programa. (BRASIL, Fundação Biblioteca Nacional, 2006, p.3) Trabalhando paralelamente ao PROLER, que é um programa voltado para a capacitação de agentes culturais na área de formação do leitor, está o Plano Nacional do Livro e da Leitura (PNLL), com funções mais voltadas para formação de acervos voltados para a leitura pública. Assim, 28 O Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) foi instituído pelo Ministério da Cultura e Ministério da Educação, aos quais permanecerá vinculado. No Ministério da Cultura, ficará vinculado à Fundação Biblioteca Nacional, que tem como função estatutária gerar subsídios para a formulação da política pública setorial. [...] Por ser um esforço em conjunto entre Estado e sociedade, o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) tem uma modalidade de gestão compartilhada e participativa. O responsável pelo gerenciamento do PNLL é o Conselho Diretivo, colegiado formado por dois representantes do Ministério da Cultura, dois representantes do Ministério da Educação, um representante dos autores, um representante dos Editores e um representante dos especialistas em leitura. A Organização dos Estados Ibero-americanos – OEI – também integra o Conselho Diretivo como órgão assessor. Há, ainda, um Conselho Consultivo, que é formado pelos membros da Câmara Setorial do Livro, Literatura e Leitura. (BRASIL, MEC, 2007, p. 1) Partindo da concretização das propostas da Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1997) e de seus documentos derivativos, como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), novas políticas públicas têm investido nos equipamentos mínimos para a promoção do letramento escolar, ainda que em seus níveis mais básicos. Quanto às políticas públicas voltadas para o desenvolvimento da leitura escolar, o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), assim como 9ª Arte (| São Paulo, vol. 1, n. 2, 25-33, 2o. semestre/2012 o Programa Nacional de Biblioteca da Escola (PNBE), contemplaram até o ano de 2010 o Ensino Fundamental e Médio com a formação de acervos para a leitura de lazer, dentre as quais está selecionado um número significativo de álbuns de Histórias em Quadrinhos, definidas pelo corpo de especialistas do Programa Nacional Biblioteca da Escola, da Secretaria de Educação Básica (SEB/MEC). Porém, muito deste material é subutilizado pela rede pública brasileira, já que não estão previstos os espaços, tempos e pessoas que deverão coordenar sua disposição e uso, pois [...] em algumas bibliotecas [escolares], embora a oferta de livros seja variada, falta o bibliotecário, ou um auxiliar devidamente treinado; a reposição do acervo é feita por meio de “caixinhas de multa”; há estantes muito altas (mais de dois metros de altura); os horários de atendimento são irregulares [...] (MACEDO, 2005, p. 54) Finalmente, a Lei no. 12.244, de 24 de maio de 2010, dispõe sobre a Universalização da Biblioteca Escolar. Esta nova legislação estabelece um plano decenal de implantação de Bibliotecas Escolares, de qualidade e com disponibilidade de serviços para estudantes e comunidade escolar, que cobrirá as lacunas na prestação desse importante serviço aos estudantes brasileiros. Ou seja, está previsto que, no período de uma década, a unidade de informação presente na Escola seja uma Biblioteca Escolar, com Bibliotecário e equipe adequada, em espaço apropriado, constituída em uma unidade de informação que deve ter adequada sua gestão do acervo, da informação e dos serviços específicos. Porém, para que os avanços legais se concretizem de forma satisfatória, torna-se imprescindível a articulação entre professores e bibliotecários para que esta estruturação seja mais que uma medida burocrática. Ao mesmo tempo, para que esse espaço não seja voltado à mera contemplação de uma obediência civil, uma medida burocraticamente imposta, é necessária a ressignificação das praticas leitoras escolares e a melhoria da fraca desenvoltura da escolarização brasileira atual na formação do leitor. A BIBLIOTECA ESCOLAR E AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS Na atualidade, apesar do amplo reconhecimento das funções da Biblioteca Escolar no Brasil, admitese que sua ausência ou precariedade em grande parte da rede escolar pública e privada não é determinada somente por problemas econômicos, mas por ausência de articulação entre os profissionais de educação e biblioteconomia, pois Nem o bibliotecário escolar, nem o professor de ensino básico conhecem, formalmente, a área um do outro. Um ou outro, em pequena escala, procura aproximar-se e apropriar-se de conhecimentos necessários ao fortalecimento de algo que ambos deveriam ter em comum, os recursos/fontes de informação em relação ao processo ensinoaprendizagem da escola a que pertencem. (MACEDO, 2005, p. 45) Ou seja, não há um consenso sobre o papel da Biblioteca Escolar no organograma educacional, qual ou quais os profissionais que deverão nela atuar, qual deve ser sua formação e vínculo com a instituição escolar. Geralmente, essas responsabilidades são entregues de forma precária a 9ª Arte (| São Paulo, vol. 1, n. 2, 25-33, 2o. semestre/2012 29 funcionários escolares sem formação adequada, ou a responsabilidade por elas é delegada aos educadores, como “atividade complementar”. No momento presente, a Biblioteca Escolar encaminha-se para uma nova fase na educação brasileira, criando o espaço de debate onde uma rede de relações sociais será conceituada por meio da aproximação entre profissionais da Educação e da Biblioteconomia, no interesse maior da formação do leitor proficiente e socialmente ativo a partir dos ambientes e vivências propiciados na escolarização. Esta mudança também se faz acompanhar de uma nova valoração das formas de leitura não-formais, ou seja, leituras não-utilitárias. Sob esta nova epísteme, as Histórias em Quadrinhos, no caso específico da formação de acervo das Bibliotecas Escolares, deixam de ser um material secundário, pois estão agora diretamente vinculados às ações bibliotecárias e pedagógicas de formação do leitor. A FORMAÇÃO DA GIBITECA ESCOLAR A equipe escolar ou bibliotecária que deseje desenvolver uma coleção setorial de Histórias em Quadrinhos na Biblioteca Escolar, a que chamaremos de Gibiteca Escolar, deve verificar uma série de premissas, para que não se desperdice o precioso tempo e os recursos financeiros e humanos sem garantia dos efeitos esperados. Normalmente, a Biblioteca Escolar inicia seu acervo por meio de doações da comunidade escolar, assim como por acer vos especialmente destinados pelos diferentes programas de fomento à leitura escolar e pública já descritos neste artigo. Porém, sempre existe a possibilidade da dotação de 30 verbas da “caixa-escolar”, doações financeiras de benfeitores, ou simplesmente dotação orçamentária a partir das diferentes verbas recebidas pelas instituições escolares. Os recursos são necessários, pois grande parte dos títulos de histórias em quadrinhos é de publicação periódica e será passível de assinatura. Também é necessário compreender qual parte do acervo será destinada à conservação e qual será previamente destinada ao consumo, pois os serviços prestados por meio dos exemplares serão bem diferentes. A decisão de como será formada a coleção da Gibiteca Escolar se refere aos grupos sociais que se pretende atender com prioridade. Para ilustrar essa afirmação, falaremos dos segmentos mais comuns, ajudando a estabelecer parâmetros. Para ser vir a faixa etária infanto-juvenil, a Gibiteca Escolar possui um enorme potencial para a alfabetização, formação de hábitos e gostos dos leitores, além de propiciar as primeiras formas de expressão livre em suporte bibliográfico, pois estimula seus leitores a produzir e intercambiar entre os amigos as suas próprias histórias. A gestão desse acervo tem de ser voltada para a criança, com muito cuidado na seleção de acervo, pois se enganam aqueles que imaginam que toda história em quadrinhos é feita para crianças. Na verdade, temos constatado que quase 70% da produção brasileira é voltada para o público maior de dezesseis anos, com cenas de violência e outros conteúdos desaconselháveis às mais tenras faixas etárias, sendo que isso é uma tendência na produção brasileira desde o séc. XIX. Por essa mesma razão, é importante segmentar os quadrinhos voltados para o público adulto na Biblioteca Escolar. Normalmente, é prevista uma vida relativamente curta para os 9ª Arte (| São Paulo, vol. 1, n. 2, 25-33, 2o. semestre/2012 exemplares, principalmente para o público infanto-juvenil, que devem sofrer descarte por degeneração sem preocupações com a reposição. Como em qualquer caso de descarte, é aconselhável que seja devidamente sinalizada a situação do material, por meio de carimbos próprios, e que a retirada se dê por meio de doação a ONGs de reciclagem, mediante recibo especificado em metros cúbicos de papel. No caso da Gibiteca Escolar de adultos, a preocupação com a questão da preservação é um pouco maior, pois será formada de álbuns mais caros, mas jamais deve comprometer a leitura (objetivo primordial dessa coleção). Assim, aconselha-se que sejam adquiridas duplicatas para destinar ao empréstimo, sendo que o exemplar principal pode ser lido no espaço destinado à consulta local. A Gibiteca Escolar sempre deve dispor de uma área de leitura, pois grande parte de seus usuários apreciará uma permanência mais longa ao lado do acervo. Como a leitura se dá de forma individualizada, assim devem se pensados os postos. Mesas longas e sempre retangulares, que podem ser mais estreitas do que as de estudos, são as ideais para espaços restritos. Quando há disponibilidade, também se podem acomodar mesas pequenas, poltronas e algumas pranchas inclinadas para álbuns maiores. Quando a Gibiteca Escolar é infantojuvenil, um tapete com almofadas também é convidativo para o momento da leitura. O empréstimo é uma excelente prática, conhecendo-se de antemão os efeitos da circulação dos exemplares, por meio da criação de situações de leitura cotidiana, que impregnam de leitura de lazer muitos outros ambientes sociais de convívio e melhoram a cultura da sociedade. Assim, é saudável o planejamento que prevê a duplicação de acer vo estratégico para uso referencial, sendo que um dos exemplares nunca sai do acervo, assim como é possível projetar que certos títulos tenham uma vida útil e desapareçam quando deteriorados. Ou seja, não se pode esperar a preservação de nenhum exemplar de histórias em quadrinhos sujeito à circulação e isso tem de estar bem claro na gestão da Gibiteca Escolar. O efeito desta gestão e da formação do espaço destinado à leitura é o de que usuários se habituarão a permanecerem algumas horas por semana na Gibiteca Escolar, para a leitura de alguns títulos, levando outros de sua preferência para a leitura residencial. Esse fator é “mágico” na absorção de uma postura de leitura concentrada, pois os ambientes sociais da atualidade são permeados de muita comunicação e ruídos, dificultando a leitura atenta aos neófitos. No caso da reposição de exemplares descartados, as possibilidades são muito pequenas. De fato, a peculiaridade do desenvolvimento da coleção de uma Gibiteca Escolar é a relação de propriedade transitória e a volatilidade dos suportes, em um nível muito maior do que qualquer outro material, inclusive se tratando de publicações periódicas. A experiência obtida nos eventos de animação cultural literários é plenamente aproveitável na Gibiteca Escolar, como por exemplo, a leitura dramática, a exibição de festivais de filmes inspirados nas histórias em quadrinhos, as palestras com autores, os concursos de redação. Quanto ao desenho e a pintura, eles têm espaço garantido na ação cultural da Gibiteca Escolar. Oficinas do gênero são muito bem f requentadas, assim como têm o 9ª Arte (| São Paulo, vol. 1, n. 2, 25-33, 2o. semestre/2012 31 potencial de gerar belas exposições para ornar os espaços adequados da instalação da Biblioteca Escolar. Para as crianças, datas comemorativas podem ser revestidas da “fantasia dos quadrinhos”. Além das atividades ligadas às brincadeiras, jogos e pinturas com o aproveitamento de diferentes personagens, também existe a possibilidade da atuação de grupos de contadores de histórias, que aplicarão as técnicas do teatro e da expressão corporal do “descerramento” da leitura infantil das histórias em quadrinhos. A criança precisa brincar, aprende brincando, mas também aprende recriando as atitudes dos mais experientes e adultos. Assim, a animação cultural infantil pode valerse de inúmeros subterfúgios, mas deve ter o momento da leitura direta no papel como um dos momentos importantes do evento. Como no caso do livro infantil, também é possível ler com entonação e exibir as vinhetas, para que todos observem qual é a fonte de tanta diversão, que pode ser acessível a todos. Finalmente, é preciso salientar que toda a ação da gestão do acervo da Gibiteca Escolar é uma ação eminentemente cultural, que faz por si só uma propagada altamente contagiante e positiva do acervo da unidade de leitura pública na qual se insere. Ou seja, há um grande investimento e, certamente, muito trabalho, na criação e manutenção de um acervo de histórias em quadrinhos, mas é necessário pensar nos altos benefícios de todo esse esforço. CONSIDERAÇÕES FINAIS Acadêmicos e profissionais da Biblioteconomia e da Educação têm a visão de que, apesar da situaçãoproblema da formação do leitor no Brasil demonstrar sua gravidade, ao 32 mesmo tempo se abre uma oportunidade antes inédita de articulação de forças, de planejamento conjunto e de ações desenvolvidas cooperativamente. Neste contexto, a Escola se configura como o ambiente social multiplicador da nova relação entre a juventude e leitura, com o potencial de expandir-se por toda a sociedade brasileira num período de tempo relativamente curto. Como já foi afirmado introdutoriamente, a formação do leitor só chega ao seu amadurecimento pleno se o indivíduo gosta de ler. Se as Histórias em Quadrinhos já foram responsabilizadas no passado por problemas sociais entre crianças e adolescentes, hoje esta restrição encontra-se superada dentro e fora da Academia. Isso torna viável a introdução de acervos de Histórias em Quadrinhos nas Bibliotecas Escolares, as chamadas Gibitecas escolares, que se tornam convidativas, atraentes e eficientes na apresentação do mundo da leitura aos estudantes. Acreditamos, por meio das evidências apontadas na pesquisa utilizada nesta comunicação científica e na vontade política de grande parte dos formadores de opinião no Brasil, que o “ponto de inflexão” no cenário da leitura escolar, ou seja, na situaçãoproblema atual, ocorrerá por meio da ação integrada de Bibliotecários e Professores, na formação de uma Biblioteca Escolar inovadora, informativa, convidativa, criativa, contando com todo o potencial e a simpatia de uma grande aliada, a História em Quadrinhos. REFERÊNCIAS BARI, Valéria Aparecida. Por uma epistemologia da educomunicação. São Paulo: Escola de Comunicações e Artes / Universidade de São Paulo – 9ª Arte (| São Paulo, vol. 1, n. 2, 25-33, 2o. semestre/2012 ECA/USP, 2002. (Dissertação de Mestrado). BARI, Valéria Aparecida ; VERGUEIRO, Waldomiro. As histórias em quadrinhos para a formação de leitores ecléticos: algumas reflexões com base em depoimentos universitários. Revista Comunicação e Educação. São Paulo: Paulinas, v. 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