Subido por luca morlando

cp119420

Anuncio
ESCOLA NACIONAL DE CIÊNCIAS ESTATÍSTICAS
MESTRADO EM ESTUDOS POPULACIONAIS E
PESQUISAS SOCIAIS
O USO DE EXPLOSIVOS COMO ATO DE VIOLÊNCIA NA
SOCIEDADE CIVIL BRASILEIRA E AS ATUAIS RESPOSTAS
DA SEGURANÇA PÚBLICA.
RICARDO HAMID SAIKALI
Rio de Janeiro – RJ
2009
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
RICARDO HAMID SAIKALI
O USO DE EXPLOSIVOS COMO ATO DE VIOLÊNCIA NA SOCIEDADE
CIVIL BRASILEIRA E AS ATUAIS RESPOSTAS DA SEGURANÇA
PÚBLICA
Dissertação submetida ao corpo docente do Curso de
Mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais,
da Escola Nacional de Ciências Estatísticas, como parte
dos requisitos necessários para a obtenção do título de
Mestre.
RIO DE JANEIRO, RJ - BRASIL
SETEMBRO DE 2009
S132u Saikali, Ricardo Hamid
O Uso de explosivos como ato de violência na sociedade civil brasileira e as
atuais respostas da segurança pública / Ricardo Hamid Saikali. –
Rio de Janeiro : 2009.
136 f.
Inclui bibliografia e anexo.
Orientador: Prof. Dr. José Eustáquio Diniz Alves;
Co-orientadora: Profa. Dra. Suzana Marta Cavenaghi.
Dissertação (Curso de Mestrado) – Escola Nacional de Ciências
Estatísticas. Programa de Pós-Graduação em Estudos Populacionais e
Pesquisas Sociais.
1. Segurança pública – Rio de Janeiro (Estado). 2. Segurança pública –
Política pública - Rio de Janeiro (Estado). 3. Segurança pública – Brasil.
4. Violência urbana - Rio de Janeiro (Estado). 5. Bombas (Explosivos).
I. Alves, José Eustáquio Diniz. II. Cavenaghi, Suzana Marta. III. Escola
Nacional de Ciências Estatísticas (Brasil). III. IBGE. IV. Título.
CDU:
351.78(815.3)
Agradeço a todos que de alguma forma contribuíram para a realização deste mister.
À minha família, em especial a minha companheira Ana Beatriz, pela compreensão dos
momentos dedicados exclusivamente ao trabalho e a minha irmã Luana pelas sugestões. Aos
colegas de turma e de profissão, especialmente ao caro amigo Flávio Rocha, pelos incentivos.
Ao amigo e mestre todas as horas, Maulaz, pelo fornecimento de rico material sobre o objeto
de pesquisa. Aos professores e funcionários da ENCE, pelo ambiente acolhedor e produtivo.
Ao IBGE, pela excelência na estrutura proporcionada. Aos orientadores, Professor José
Eustáquio e Professora Suzana Cavenaghi, pela paciência e generosidade dos ensinamentos.
Ao meu filho Pedro, por existir e sorrir nos momentos mais difíceis e ao bondoso Deus, a
quem tudo devemos.
Ricardo Hamid Saikali
“A violência, seja qual for a maneira como ela se manifesta, é sempre uma derrota.”
Jean-Paul Sartre (1905-1980).
RESUMO
O presente trabalho versa sobre um fenômeno de violência muito aterrorizador, porém, pouco
estudado e, por conseguinte, carente de instrumentos científicos de gestão que auxiliem o
Estado na sua devida contenção. Trata-se do uso ilícito e violento dos explosivos.
Inicialmente busca-se a adequada compreensão do explosivo em si e do seu potencial lesivo,
tanto pelas características intrínsecas do explosivo quanto pela descrição das formas como o
mesmo é utilizado. A partir de um resgate histórico no estudo de alguns casos emblemáticos,
desmistifica-se a crença comum de que o fenômeno analisado não é um problema que de fato
atinja à sociedade brasileira. O passo seguinte residiu na identificação das possíveis fontes de
dados, a partir do Estado do Rio de Janeiro, capazes de dimensionar o problema. Na outra
face estão as respostas da segurança pública, por meio dos seus principais atores. Para
compreendê-los, foram feitas entrevistas semi-estruturadas com os principais responsáveis
pelo combate direto desse mal, os técnicos que compõe os grupamentos antibombas. Por meio
de análises qualitativas de dados, utilizando-se formulários e conversas informais, obteve-se
uma visão dos que estão na linha de frente, entendendo seus campos de atuação e as fronteiras
de integração entre eles. Contextualiza-se o Brasil no cenário mundial, pelos grandes eventos
de segurança, pelo emprego e desenvolvimento de tecnologia e pelo desafio das novas
ameaças do terrorismo globalizado. Por fim, faz-se a análise da solução empregada por alguns
países que adotam a centralização de dados, em bancos específicos sobre o fenômeno,
concluindo que este é um caminho possível e desejável para a realidade brasileira.
Palavras-Chave: Bombas e explosivos. Segurança pública. Violência urbana.
ABSTRACT
This research focuses on a feared violence phenomenon, but hardly studied. Therefore, there
are not scientific-management tools to provide its proper restraint - the violent and illegal use
of explosives. Initially, it describes the potential damage, the intrinsic characteristics and how
the explosive is used. A historic search of some cases is conducted, rejecting the common
belief that this phenomenon is not a social problem in Brazil. Data sources and searches were
based on Rio de Janeiro´s reality. Interviews were conducted with the authorities in charge of
fighting this evil and the technicians who take part in bomb squads. The several players in
national security, who are responsible for fighting this violence, were studied, considering
their expertise and the cooperation among them. In addition, this research contextualizes the
Brazil in the world by major security events, use and development of technology and the
challenge of new threats of global terrorism. Finally, an analysis of a solution implemented by
some countries in supporting specific data centers on this matter is made and led to a
conclusion: the same solution could also be applied to the Brazilian reality.
Keywords: Bombs and explosive. Public safety. Urban violence.
LISTA DE SIGLAS
ABDC –
Australian Bomb Data Centre (Centro Australiano de dados sobre
bombas)
ADM –
Arma de Destruição em Massa
ANFO -
Ammonium Nitrate Fuel Oil (Nitrato de Amônio e Óleo Combustível)
ATF –
Bureau of Alcohol, Tobacco, Firearms and Explosive (Agência de
Álcool, Tabaco, Armas de Fogo e Explosivos)
CABE –
Curso de Atualização em Bombas e Explosivos
CBDC –
Canadian Bomb Data Centre (Centro Canadense de Dados sobre
Bombas)
CONSEG –
Conferência de Segurança Pública
CORE –
Coordenadoria de Recursos Especiais
CEF –
Caixa Econômica Federal
CSN -
Companhia Siderúrgica Nacional
CTA -
Centro Técnico Aeroespacial
DPF–
Departamento de Polícia Federal
DEI –
Dispositivo Explosivo Improvisado
DITEC -
Diretoria Técnica-Científica
DOPS –
Delegacia de Ordem Política e Social
DPTC -
Departamento de Polícia Técnico-Científica
DFPC –
Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados
EB -
Exército Brasileiro
ECT –
Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos
EMBRATEL –
Empresa Brasileira de Telecomunicações
FBI –
Federal Bureau of Investigation
FBI BDC –
FBI Bomb Data Center (Centro de Dados sobre Bombas do FBI)
GATE –
Grupo de Ações Táticas Especiais
GBE –
Grupo Especializado em Bombas e Explosivos
IBGE –
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IMBEL –
Indústria de Material Bélico do Brasil
IMLAP –
Instituto Médico Legal Afrânio Peixoto
INFOSEG –
Rede de Integração Nacional de Informações de Segurança Pública,
Justiça e Fiscalização
INFRAERO –
Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária
IPM –
Inquérito Policial Militar
ISP –
Instituto de Segurança Pública
MRE -
Ministério das Relações Exteriores
OAB –
Ordem dos Advogados do Brasil
OACI -
Organização de Aviação Civil Internacional
PETN -
Nitropenta
PCC –
Primeiro Comando da Capital
PCF –
Perito Criminal Federal
PC/RJ –
Polícia Civil do Rio de Janeiro
PDL –
Programa Delegacia Legal
PFF –
Polícia Ferroviária Federal
PRONASCI –
Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania
PRF –
Polícia Rodoviária Federal
QBRN –
Química, Biológica, Radiológica e Nuclear
Senasp –
Secretaria Nacional de Segurança Pública
Sinesp –
Sistema Nacional de Estatística de Segurança Pública e Justiça Criminal
SEPLANSEG –
Secretaria de Planejamento de Ações Nacionais de Segurança Pública
SETEC –
Setor Técnico-Científico
SFPC –
Serviço de Fiscalização de Produtos Controlados
SUS –
Sistema Único de Saúde
SUSP –
Sistema Único de Segurança Pública
TNT –
Trinitrotolueno
UFRRJ –
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
VPR –
Vanguarda Popular Revolucionária
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: efeitos da queima da pólvora negra (2003). .............................................................. 19
Figura 2: cenário de destruição do acidente na cidade do Texas (1947). ................................. 25
Figura 3: cenário de destruição do atentado na cidade de Oklahoma (1995). .......................... 26
Figura 4: esquema simplificado de um dispositivo explosivo (bomba). .................................. 27
Figura 5: abertura de um pacote postal suspeito (2007). .......................................................... 28
Figura 6: simulacro de bomba encontrado dentro de um veículo (1997). ................................ 30
Figura 7: velocidade de deslocamento da frente de onda. ........................................................ 32
Figura 8: soldagem de duas placas de metais distintos por explosão (1997). .......................... 35
Figura 9: gráfico de pressão de uma explosão. ......................................................................... 36
Figura 10: lança-rojão M72A2 apreendido pelo DPF no Rio de Janeiro (2007). .................... 37
Figura 11: traje antibomba (2003/2002). .................................................................................. 38
Figura 12: granada M3 e sua luva de estilhaçamento para uso defensivo (2004). ................... 39
Figura 13: granada M4 com a radiografia dos anéis de estilhaçamento (2004). ...................... 39
Figura 14: comparativo entre os efeitos da geometria na detonação. ....................................... 40
Figura 15: granada antitanque em ação (2002). ....................................................................... 41
Figura 16: exemplos de granadas apreendidas pela Polícia Federal/RJ (1999, 2007). ............ 42
Figura 17: granada de mão artesanal apreendida pela Polícia Civil/RJ (2002). ....................... 43
Figura 18: granada abandonada em uma agência da CEF no Rio de Janeiro (2007). .............. 43
Figura 19: artefatos explosivos utilizados em ataques à presídios em SP (2002). ................... 44
Figura 20: réplica do colar-bomba utilizado no episódio de extorsão na Colômbia (2003). ... 48
Figura 21: bomba recuperada do vôo 441 da Pan Am (1982). ................................................. 54
Figura 22: estado da mesa da diplomata após a explosão do livro-bomba (1995). .................. 56
Figura 23: epicentros das explosões ocorridas na UFRRJ (2008). ........................................... 59
Figura 24: torre de energia de Nova Tebas onde uma das bombas foi localizada (1998). ....... 61
Figura 25: artefato recebido pela Anistia Internacional (2000). ............................................... 62
Figura 26: aproximação dos policiais ao carro-bomba (2002). ................................................ 63
Figura 27: dispositivo explosivo do carro-bomba de Barra Funda (2002). .............................. 64
Figura 28: carro-bomba de Taboão da Serra (2004)................................................................. 65
Figura 29: dispositivo explosivo localizado no interior do veículo (2004). ............................. 65
Figura 30: cenário da padaria após a explosão (2008). ............................................................ 67
Figura 31: fragmentos recolhidos da bomba utilizada na padaria (2008). ............................... 67
Figura 32: cópia do registro de ocorrência nº 035-06347/2008da PC/RJ – parte 1. ................ 72
Figura 33: cópia do registro de ocorrência nº 035-06347/2008da PC/RJ – parte 2. ................ 73
Figura 34: cópia do registro de ocorrência nº 035-06347/2008da PC/RJ – parte 3. ................ 74
Figura 35: amostra do banco de dados do Esquadrão Antibomba - PC/RJ. ............................. 76
Figura 36: granadas artesanais "tipo pedaleira" (2007, 2009, 2003, 2004). ............................. 77
Figura 37: amostra das ocorrências atendidas pelo GBE/RJ. ................................................... 78
Figura 38: gráfico do número de apreensões por ano no Estado do Rio de Janeiro (2008). .... 80
Figura 39: distribuição nacional de ocorrências de bombas nos Correios (2007). ................... 83
Figura 40: carta-bomba, Brasília (1972). ................................................................................. 84
Figura 41: registro existente das ocorrências de bombas pela ECT (2006). ............................ 85
Figura 42: registro da INFRAERO sobre ocorrências de bombas (2008). ............................... 87
Figura 43: caixa contendo granadas, apreendida dentro de um ônibus pela PRF (2001)......... 93
Figura 44: formulário de entrevista .......................................................................................... 98
Figura 45: ação do canhão d’água na abertura da mala de um veículo (2000). ..................... 106
Figura 46: missa campal realizada por Sua Santidade o Papa João Paulo II (1997). ............. 107
Figura 47: neutralização de uma mochila suspeita (1999) ..................................................... 108
Figura 48: utilização de cães adestrados para farejar explosivos (2007). .............................. 109
Figura 49: exposição de equipamentos do Esquadrão Antibombas da PC/RJ (2009). .......... 110
Figura 50: robô antibombas dotado de canhão disruptor (2009). ........................................... 111
Figura 51: gerador de espuma de baixo custo desenvolvido por Peritos da PF (2008). ......... 112
Figura 52: gráfico de risco x consequência das ameaças. ...................................................... 113
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................. 16
1. O USO ILÍCITO DE EXPLOSIVOS .......................................................... 18
1.1. Os explosivos ao longo da história ............................................................................. 19
1.2. Classificações e distinções dos tipos de explosivos e bombas .................................. 27
1.2.1. Classificação quanto ao uso ................................................................................ 27
1.2.2. Classificação quanto ao modo de fabricação ...................................................... 29
1.2.3. Classificação quanto ao princípio de funcionamento .......................................... 29
1.2.4. Classificações pelas características técnicas dos explosivos............................... 31
1.3. Os efeitos de uma explosão ......................................................................................... 33
1.3.1. Efeito térmico ...................................................................................................... 34
1.3.2. Sobrepressão........................................................................................................ 35
1.3.3. Deslocamento ...................................................................................................... 37
1.3.4. Fragmentação ...................................................................................................... 38
1.3.5. Outros efeitos ...................................................................................................... 40
1.4. O emprego do explosivo como forma de violência ................................................... 42
1.4.1. Arsenal do crime organizado............................................................................... 42
1.4.2. Roubo de valores ................................................................................................. 43
1.4.3. Ataques a instalações prisionais .......................................................................... 44
1.4.4. Crimes passionais ................................................................................................ 44
1.4.5. Vandalismo.......................................................................................................... 45
1.4.6. Violência entre gangues e torcidas ...................................................................... 45
1.4.7. Violência nas escolas .......................................................................................... 46
1.4.8. Crimes ambientais ............................................................................................... 47
1.4.9. Crimes contra o patrimônio ................................................................................. 48
1.4.10. Descarte de material explosivo ......................................................................... 49
1.4.11. Terrorismo ......................................................................................................... 49
2. CASOS EMBLEMÁTICOS ......................................................................... 51
2.1. Rio de Janeiro, três atentados à bomba no mesmo dia (1980) ................................ 51
2.2. Atentado do Riocentro (1981) .................................................................................... 52
2.3. Bomba em Boeing 747 aterrissado no Rio de Janeiro (1982) ................................. 53
2.4. Explosão no monumento aos trabalhadores (1989) ................................................. 55
2.5. Livro-bomba no Itamaraty (1995)............................................................................. 56
2.6. Explosão no Fokker 100 (1997).................................................................................. 57
2.7. Reincidência de bombas na UFRRJ (1997/2008) ..................................................... 58
2.8. Atentado as torres da Embratel e de Furnas – (1998) ............................................. 60
2.9. Atentado atribuído a skinhead em São Paulo (2000)............................................... 61
2.10. Atentado ao fórum de Barra Funda São Paulo - SP (2000) .................................. 63
2.11. Carro-bomba no fórum de Barra Funda, São Paulo - SP (2002) ......................... 63
2.12. Carro-bomba em Taboão da Serra - SP (2004) ..................................................... 64
2.13. Explosão no Rio Grande do Sul (2008) ................................................................... 66
3. O PANORAMA BRASIL A PARTIR DO RIO DE JANEIRO ............... 69
3.1. Inexistência de estatísticas oficiais............................................................................. 69
3.2. Fontes próprias de dados ........................................................................................... 69
3.2.1. Boletins de ocorrências das delegacias ............................................................... 70
3.2.2. Registros de ocorrências dos grupos especializados em explosivos ................... 75
3.2.3. Instituto de Segurança Pública ............................................................................ 79
3.3. Fontes alternativas de dados ...................................................................................... 80
3.3.1. Registros hospitalares .......................................................................................... 80
3.3.2. Registros administrativos dos Correios ............................................................... 83
3.3.3. Registros administrativos da INFRAERO .......................................................... 86
3.3.4. Instituto Médico-Legal ........................................................................................ 88
4. AS RESPOSTAS DA SEGURANÇA PÚBLICA ....................................... 89
4.1. A segurança pública nacional .................................................................................... 89
4.1.1. Polícia Federal ..................................................................................................... 92
4.1.2. Polícia Rodoviária e Polícia Ferroviária ............................................................. 92
4.1.3. Polícia Civil ......................................................................................................... 93
4.1.4. Polícia Militar...................................................................................................... 94
4.1.5. Corpo de Bombeiros............................................................................................ 95
4.1.6. Força Nacional .................................................................................................... 95
4.2. Prevenção e controle do uso de explosivos................................................................ 96
4.3. Visão dos que estão na linha de frente ...................................................................... 96
4.3.1. Utilidade do serviço prestado .............................................................................. 99
4.3.2. Dificuldades enfrentadas ................................................................................... 100
4.3.3. Adequabilidade das respostas da segurança pública e possíveis melhorias ...... 101
4.3.4. Motivações identificadas para o uso violento dos explosivos .......................... 102
4.3.5. Utilização de base de dados estatísticos ............................................................ 103
4.4. A integração das diversas forças ............................................................................. 103
5. PERSPECTIVAS E DESAFIOS................................................................ 105
5.1. A segurança de grandes eventos mundiais sediados pelo Brasil .......................... 105
5.1.1. ECO 92 (03 a 14 de junho de 1992) .................................................................. 106
5.1.2. Encontro do Santo Padre com as famílias (2 a 6 de outubro de 1997) ............. 107
5.1.3. CIMEIRA (28 e 29 de junho de 1999) .............................................................. 108
5.1.4. PAN 2007 (13 a 29 de julho de 2007)............................................................... 108
5.2. Novas tecnologias e equipamentos........................................................................... 110
5.3. Ameaças futuras – o desafio QBRN ........................................................................ 112
5.4. A criação de um banco de dados oficial .................................................................. 114
5.4.1. O desafio da centralização dos dados em estatísticas oficiais ........................... 114
5.4.2. As informações quantitativas e qualitativas relevantes ..................................... 116
5.4.3. Política de acesso aos dados .............................................................................. 117
5.4.4. A experiência de alguns países na adoção de um banco de dados .................... 118
CONCLUSÃO ................................................................................................. 120
ANEXO 1 – LEGISLAÇÃO FEDERAL PERTINENTE AO TEMA ....... 123
REFERÊNCIAS .............................................................................................. 132
16
INTRODUÇÃO
A violência se apresenta de várias formas, muitas são bem conhecidas e até mesmo
facilmente reconhecidas, podendo ser reduzidas a números e a qualquer tempo analisadas.
Estas estatísticas servem para dimensionar o problema e permitem as devidas reações de
combate ou de mitigação do Estado. Há, entretanto, outros tipos de violência que, embora
causem temor extremo, não recebem o mesmo tratamento. A explicação talvez resida na
existência em escala menor. Fato é que os mesmos existem e geram muitos prejuízos à
sociedade. É o caso da utilização ilícita dos explosivos.
O estudo visa à análise contextual do uso e das ameaças envolvendo artefatos
explosivos (bombas) nas suas mais variadas formas e composições, com as respectivas
respostas que o Estado por meio do sistema de segurança pública opõe ou é capaz de opor.
Para tanto algumas etapas foram realizadas.
Preliminarmente constatou-se uma carência de fontes bibliográficas, o que reforçou a
hipótese de que o problema é subestimado. Buscou-se então o conhecimento, as dificuldades
e os anseios de quem tem por ofício combater esse tipo de violência. Foram feitas entrevistas
com os especialistas que lidam diretamente no combate das ameaças de bombas. Algumas
dessas entrevistas foram sintetizadas sob a forma de formulários (anexo I). A diretriz utilizada
foi propiciar a maior liberdade possível do entrevistado, objetivando entender o cerne da
questão, sem idéias preconcebidas.
Para a efetiva compreensão do perigo na utilização ilícita do explosivo, foram
estudadas no capítulo 1 as características e propriedades dos explosivos e o seu histórico,
inclusive os grandes benefícios que a humanidade obtém da sua utilização apropriada. As
formas como os explosivos podem ser empregados em atos de violência também tiveram um
estudo destacado neste capítulo.
O capítulo 2 teve o intuito de relatar os vários casos que ilustram bem as formas
ilícitas de empregos de explosivos descritas anteriormente. Foram utilizadas as fontes
bibliográficas disponíveis e os depoimentos dos técnicos que trabalharam diretamente nesses
casos, identificados quando da realização das entrevistas.
A dificuldade de se resgatar a memória, de se acessar o que realmente aconteceu nos
eventos importantes estudados e que possuíram grande repercussão à sua época, mas que
ficaram sujeitos ao esquecimento, seja pela falta de registros ou mesmo pela falta de
preservação desses, inspirou a realização do capítulo 3. Trata-se da pesquisa das fontes de
17
dados capazes de retratar da forma mais fidedigna possível o que vem ocorrendo no Brasil, a
partir do Rio de Janeiro, sobre o tema.
Os dois capítulos seguintes versam sobre as respostas que o Estado tem oferecido.
Primeiro pela organização e atribuição de responsabilidade dos diversos entes que formam a
segurança pública nacional, e depois pela participação do Brasil como organizador de vários
eventos internacionais, em que a preocupação com possíveis ameaças de bombas é real e tem
que ser adotada.
18
1. O USO ILÍCITO DE EXPLOSIVOS
O fabrico e a utilização de explosivos remonta de longa data possuindo diversas
finalidades. As invenções e descobertas nessa área caminharam impulsionadas pelas
demandas e engenhosidades da sociedade. Isto se deu tanto pelo bem, legalmente respaldado,
como também pelo mal, cujo emprego proibido ou ilícito deve ser estudado e combatido.
O explosivo, em uma definição mais simples, é uma substância capaz de produzir
bruscamente um grande volume de gases por meio de uma reação química exotérmica
(BEZERRA NETO1, 2006). É importante diferenciar esse tipo de explosão, que é o de
interesse para o estudo, de outras explosões tais como as mecânicas ou mesmo as nucleares.
Uma explosão, de forma genérica, é definida por SUCESKA2 (1995) como uma
expansão súbita da matéria para um volume muito maior que o inicial. São várias as fontes
que podem gerar essa expansão da matéria. E convivemos com esses eventos, como por
exemplo, os efeitos de uma descarga atmosférica, o rompimento de uma panela de pressão,
etc. A literatura agrupa as explosões em três modalidades: físicas (ou mecânicas), nucleares e
químicas. Embora todas possam produzir danos materiais e à vida, as explosões que se
originam de reações químicas são as mais utilizadas com o intuito ilícito. Isto ocorre pela
facilidade tanto da obtenção dos materiais quanto do controle do processo de reação. Mais
adiante serão detalhados a explosão química e os seus efeitos.
Outra forma bem simples de se definir o tipo de explosão e explosivos que
interessam ao presente estudo está na delimitação utilizada por FORDHAM3 (1980) para o
seu objeto de análise:
AN EXPLOSION occurs when energy previously confined in suddenly released to
affect the surroundings. Small explosion, like the bursting of a toy balloon, are
familiar and innocuous, but large-scale explosions, like an atomic bomb, are rare and
usually disastrous. Between these two extremes lie the commercial and military
fields where explosions are produced on a limited scale to cause specific effects. It is
with explosions of this intermediate scale that this book is concerned.
Acrescenta-se a esta delimitação, além dos campos comerciais e militares, o uso
ilícito na sociedade civil, desviando a função precípua para qual foram projetados esses
explosivos. Há também que se considerarem as produções improvisadas, normalmente
artesanais, das perigosas misturas químicas.
1
BEZERRA NETO, Aggeu Lemos et al. Bombas e Explosivos: XVII CABE. Brasília: Academia Nacional de
Polícia, 2006. p. 13.
2
SUCESKA, Muhamed. Test methods for explosives. Nova York: Springer, 1995. p.1.
3
FORDHAM, Stanley. High explosives and propellants. 2 ed. Oxford: Pergamon, 1980. p. 1.
19
Além da conceituação dos explosivos, uma breve análise do surgimento, da
diversidade desses produtos, de suas aplicações, classificações e características técnicas
relevantes, certamente contribuem para uma melhor compreensão do fenômeno da sua
utilização como forma de violência. Esta utilização maléfica se vale da potencialização dos
efeitos lesivos da explosão, daí também a necessidade de estudá-los.
1.1. Os explosivos ao longo da história
A substância mais antiga empregada pelo homem como explosivo é, sem dúvida, a
pólvora negra. Não tão certa é a sua origem. WALTERS4 (2003) aponta para o ano de 1040
d.C. baseado em um manuscrito militar chinês que descrevia até granadas e bombas para
serem lançadas por catapultas. Era conhecida como “huo yao”, verdadeiros “fogos químicos”.
As composições químicas exatas dessas “pólvoras” primitivas eram verdadeiros “segredos”,
frutos da alquimia, dando aspecto de feitiçaria. A magia ocorria com a queima rápida da
substância, gerando grande volume de fumaça (gases), calor e brilho intenso (Figura 1). Isto
implicava na esperada oposição da Igreja. Uma vez iniciada a queima das pólvoras
confinadas, o aumento súbito de pressão gerado pelos gases formados, resultava em uma
impactante explosão. O poder e o fascínio que as mesmas proporcionavam aos seus detentores
suplantaram as resistências, provocando uma grande difusão do interesse sobre o assunto.
Figura 1: efeitos da queima da pólvora negra (2003).
Demonstração realizada durante o XIII Curso de Atualização em Bombas e Explosivos.
Fonte: arquivo pessoal.
4
WALTERS William P.; ZUKAS, Jonas A. (ed.). Explosive Effects and Applications. Nova York: Springer,
2003. p. 29.
20
Uma das causas apontadas para o domínio inicial dos chineses foi o conhecimento da
técnica de purificação do salitre (um dos componentes básicos da pólvora) através da
recristalização. A pólvora passa a ter mais destaque na Europa a partir de 1250, com o frade
franciscano inglês Roger Bacon, que descreve cientificamente o processo de purificação do
salitre e a obtenção da pólvora. Ironicamente, anos depois (após 1300), outro franciscano
também se destaca na evolução da utilização da pólvora, principalmente no seu uso para fins
bélicos. É o lendário monge alemão Berthold Schwarz, a quem muitos atribuem o
descobrimento europeu da pólvora, ou pelo menos a redescoberta alemã e também sua
aplicação desta como uma forma de acelerar um projétil no cano de uma arma de fogo
(STETTBACHER5, 1952), ou seja, a utilização da pólvora como um propelente.
A utilização para fins não bélicos teve o seu marco em 1627, com a introdução dos
explosivos nas atividades de mineração, servindo a composição básica da pólvora para
abertura de túneis, galerias etc. Conforme o propósito, a pólvora sofria modificações visando
aperfeiçoar os seus efeitos. Foram realizados experimentos tanto na composição, como na
forma e tamanho dos grãos do produto. A granulometria da pólvora influencia na taxa de
queima e, por conseguinte, nas características de propelente de arma de fogo.
A falta de estabilidade e a dificuldade de reprodutibilidade nos processos
provocavam muitos incidentes no manejo da pólvora. Somente entre o final do século XVIII e
início do XIX (WALTERS6, 2003) é que se padronizou a composição da pólvora, pela
seguinte fórmula: 75% de nitrato de potássio, ou seja, salitre (KNO3), 15% de carbono (C) sob
a forma de carvão e 10% de enxofre (S). A inicialização da pólvora também necessitava de
atenção especial, pois até 1831 não se conhecia uma forma de queima lenta, prática e segura,
como os estopins, para se levar o fogo da chama de ignição à pólvora.
Um ponto marcante na evolução dos explosivos se deu com os experimentos do
químico francês Claude Louis Berthollet, membro da Academia de Ciências de Paris. Em
1788 ele resolveu substituir o salitre pelo clorato de potássio (KClO3). Esta substituição,
criando as pólvoras cloretadas, visava obter maior potência, entretanto, tornava a queima
muito mais rápida e perigosa ao ser utilizada. Teve aplicações na pirotecnia, outro ramo que
se vale da ciência dos explosivos e com histórico mais antigo que a própria pólvora.
O fracasso aparente de Berthollet não o impediu de fazer novas descobertas na área
de explosivos conseguindo substâncias mais poderosas, como a prata fulminante (azida de
prata – AgN3), e que introduziram uma nova classe de explosivos: os detonadores ou
5
6
STETTBACHER, Alfred. Polvoras y explosivos. Buenos Aires: G. Gili, 1952. p. 1.
WALTERS William P.; ZUKAS, Jonas A. (editores). Op Cit. p. 30.
21
explosivos iniciadores. Muito embora, este efeito “detonante” já fosse conhecido, com o ouro
fulminante do alquimista Blasius Valentius, ele era utilizado mais como diversão do que
como explosivo. Estas substâncias apresentam uma alta sensibilidade, não só a chama ou
fricção, mas também ao choque mecânico, podendo assim serem iniciadas com uma simples
percussão, gerando uma grande energia, capaz de iniciar outras reações em explosivos mais
estáveis.
Na aplicação desses explosivos iniciadores, se destaca a utilização dos fulminatos,
descoberta atribuída ao químico inglês Edward Charles Howard, por volta de 1800 com o
fulminato de mercúrio. O fulminato de mercúrio é o mais conhecido e que posteriormente foi
amplamente utilizado em espoletas para cartuchos de arma de fogo (percussão da agulha
iniciando o explosivo), até ser substituído por substâncias mais eficientes e menos corrosivas
como o estifinato de chumbo e a azida de chumbo. Os fulminatos representaram um salto de
potência em relação às pólvoras, aumentando substancialmente os efeitos das explosões.
Entretanto, a manipulação perigosa, o custo elevado e ainda a alta toxidade eram barreiras que
os tornavam de pouca valia para aplicações já comuns às pólvoras, como as de mineração e
construção civil.
Com barateamento de insumos pela utilização de materiais mais comuns e o
aprimoramento das técnicas, várias novas substâncias explosivas foram sendo introduzidas
em diferentes processos químicos. A fixação do oxigênio, necessário para a combustão, não
vinha mais da mistura mecânica do salitre, e sim de processos químicos, como a nitração.
Muitas dessas descobertas foram feitas de forma indireta. A indústria dos corantes,
por exemplo, após a introdução da anilina (obtida a partir do composto orgânico nitrobenzeno
que por sua vez tem origem na nitração do benzeno), buscou novos tipos de substâncias
corantes. Ocorre que muitas dessas novas composições orgânicas são, ou estão muito perto de
serem, substâncias explosivas. WALTERS7 (2003) relata que atualmente é sabido que há
aproximadamente 20.000 tipos de moléculas com potencial explosivo, fora as inúmeras
misturas de combustíveis e oxidantes que também se tornam explosivos.
Algumas dessas substâncias tiveram importância fundamental para a difusão do uso
dos explosivos, tal qual ocorre nos dias de hoje. STETTBACHER8 (1952) qualifica como
decisivo o descobrimento da trinitrocelulose (pelo germânico-suíço Christian Friedrich
Schönbein) e da nitroglicerina (pelo italiano Ascanio Sobrero). Ambas foram descobertas por
volta de 1846, por processos de trinitração, um da celulose, que tem como insumo básico o
7
8
WALTERS William P.; ZUKAS, Jonas A. (editores). Op Cit. p. 2.
STETTBACHER, Alfred. Op Cit. p. 1.
22
algodão (daí também ser conhecido como algodão-pólvora), e o outro da glicerina (glicerol),
ou seja, materiais de baixo custo em relação aos demais até então utilizados.
A nitroglicerina é extremamente sensível, podendo explodir facilmente com o
choque, mas com enorme potencial de utilização pelo seu poder de ruptura, muito maior que a
pólvora negra. Já a trinitrocelulose é uma espécie de pólvora sem fumaça e,
conseqüentemente, com poucos resíduos após a sua combustão, tornando-a um importante
elemento na confecção dos modernos propelentes.
A utilização prática da nitroglicerina só foi possível pela genialidade do sueco Alfred
Nobel, que em 1867 resolveu o problema da sensibilidade excessiva, absorvendo a
nitroglicerina em terra de infusórios (do alemão kieselguhr), material poroso inerte, composto
basicamente de dióxido de sílica (também chamada de terra de diatomáceas). Para acionar
essa massa explosiva, agora relativamente insensível ao choque, Nobel adicionou sua outra
invenção (de 1864), um detonador à base de fulminato de mercúrio, altamente sensível ao
calor e ao choque como já citado.
O detonador utilizava pequena quantidade de fulminato com a função de iniciar o
explosivo principal (nitroglicerina devidamente dessensibilizada), formando o que se chamou
de dinamite, quase um sinônimo de explosivo face à sua popularidade. Para iniciar o
detonador, bastava um rastilho, uma mecha, que conduzisse a chama ateada de um ponto
distante, formando assim uma prática e segura cadeia de detonação, capaz de executar
inúmeros trabalhos de difícil realização para as pólvoras (rompimento de rochas mais duras,
por exemplo) com enorme segurança no manuseio.
Esse feito de Nobel, como ressalta WALTERS9 (2003) mudou o curso da ciência dos
explosivos. Aprimorando o seu produto, Nobel inventou em 1875 a gelatina explosiva, uma
massa viscosa contendo nitroglicerina e trinitrocelulose, que ficou conhecida como dinamite
100% ou dinamite gelatinosa. A utilização prática dada por Nobel fez crescer enormemente a
produção de nitroglicerina no mundo, bem como a sua fortuna com a patente da dinamite, o
que permitiu instituir o famoso fundo que leva o seu nome.
Ainda como fruto acidental da indústria dos corantes, há outro explosivo de grande
destaque, muito utilizado no meio militar, que é o TNT (trinitrotolueno). Sua descoberta
ocorreu em 1863, pelo químico alemão Joseph Wilbrand, originalmente como tinta amarela. É
um potente explosivo, não reagente com os metais, o que propiciou o seu uso como munição.
Posteriormente verificou ser um contaminante do meio ambiente, tóxico ao ser humano.
9
WALTERS William P.; ZUKAS, Jonas A. (editores). Op Cit. p. 32.
23
A não observância inicial do TNT como um explosivo se deve a sua maior virtude: a
estabilidade. É praticamente imune ao choque e também não se sensibiliza com o calor.
Assim, o TNT pode ser fabricado, armazenado e manipulado com total segurança, podendo
inclusive ser perfurado por projétil de arma de fogo, sem risco de explosão (ideal para
transporte em campos de batalha). Para acioná-lo é necessária uma grande energia de
ativação, oriunda de outra explosão, ou seja, precisa de detonadores.
A engenharia bélica alemã soube explorar bem essa característica do TNT na
confecção de munições explosivas, que só detonavam após penetrar nas blindagens inimigas.
O sucesso da sua utilização foi tanto, que o TNT é considerado o explosivo padrão universal.
Uma quantidade de explosivo qualquer, para fins de estudo, deve preferencialmente ser
convertida no equivalente em TNT. O TNT também serve de base para outras composições
explosivas.
A aplicação dos explosivos no campo bélico nas duas grandes guerras foi decisiva.
Todo esse cenário atraiu e continua atraindo estudiosos e empreendedores para a fértil e rica
indústria dos explosivos. Esses novos explosivos serão citados oportunamente nos tópicos
seguintes, conforme as características que os diferenciam e os tornam relevantes. Finalizando
este breve e, por conseguinte injusto histórico, se faz mister descrever a origem e o uso como
explosivo do nitrato de amônio (NH4NO3) em especial sob a forma de ANFO, principalmente
pela fácil obtenção e comum aplicação ilícita do mesmo.
Além da fixação do oxigênio, a nitração, uma reação de inclusão de grupo nitro
(NO2) na substância, também proporciona a fixação do nitrogênio reativo, fundamental para
os principais explosivos, o que era como visto anteriormente, um dos papéis do salitre.
Embora o nitrogênio seja abundante na natureza, compondo quase 78% da atmosfera, a forma
gasosa como ele se apresenta é de pouco uso prático se comparado com a sua utilização a
partir do nitrato de amônio (NH4NO3), tornando este a matéria-prima para muitos explosivos.
A amônia (NH3), de onde o nitrato de amônio deriva, por sua vez, só se tornou um
insumo de uso comercial com a sua produção sintética pelo processo conhecido como HaberBosch, nome dado em homenagem aos inventores. Esta produção sintética (e barata) da
amônia revolucionou o mundo (ERISMAN10, 2008). O químico Alemão Fritz Haber em 1908
foi quem obteve sinteticamente a amônia a partir do nitrogênio obtido da atmosfera e do
hidrogênio oriundo do gás natural, utilizando-se de altas pressões e temperaturas. Entretanto,
10
ERISMAN, Jan W. et al. How a century of ammonia synthesis changed the world. Nature Geoscience.
London, v.1 n. 10, p. 636-639, out. 2008.
24
foi preciso contar com o trabalho do seu compatriota e também químico, Carl Bosch que, em
1931, conseguiu produzir amônia em escala industrial. Ambos, por ocasião de cada
descoberta, foram merecedores de prêmios Nobel de química, face à enorme relevância do
processo inventado.
Muito embora o processo Haber-Bosch tenha sido impulsionado pela demanda alemã
para a produção de bombas e explosivos nas duas Grandes Guerras, eventos que provocaram
a morte de milhões, o impacto maior do processo inventado se deu pela possibilidade de
enriquecimento dos solos com a fixação do nitrogênio, com a produção dos derivados da
amônia sob a forma de fertilizantes. Esta fixação do nitrogênio revolucionou a produtividade
na agricultura, alimentando a humanidade, possibilitando a sobrevivência de bilhões,
impedindo a concretização da previsão malthusiana11 sobre a escassez de alimentos frente ao
acelerado crescimento demográfico.
Há enormes benefícios na produção em larga escala de derivados da amônia, como o
nitrato de amônio, barateando e difundindo as suas aplicações. Isto de certa forma ofusca os
riscos inerentes ao manuseio inapropriado ou mesmo ilícito do nitrato de amônio,
potencializado pela relativa fácil obtenção. O nitrato de amônio é um sal altamente oxidante,
podendo, em certas condições, se decompor de forma explosiva, como na exposição
continuada ao calor (incêndios) e também com variações de pressão (confinamento).
O mesmo produto que serve para combater a fome, melhorando a produção no
campo, pode trazer a dor e o sofrimento para muitos. Vários acidentes ocorreram nesse
sentido, durante a fabricação, transporte ou manuseio do nitrato de amônio. Alguns casos
ficaram marcados na história, tais como o da fábrica da Basf no vilarejo de Oppau na
Alemanha em 1921 com 430 mortos (HAMMOND12, 1997) e mais recentemente, a explosão
de um trem de carga na cidade de Ryongchon, na Coréia do Norte, em 22 de abril de 2004,
com 154 mortos e 1300 pessoas feridas (ROWLAND III13, 2008).
Um dos casos mais famosos foi o ocorrido na cidade do Texas, em 16 de abril de
1947 (STEPHENS14, 1997). O mundo se estarreceu com a capacidade explosiva do nitrato de
amônio devido a mais este terrível desastre. Após um incêndio, o navio cargueiro Grandcamp,
carregado com 2.300 toneladas de nitrato de amônio dentre outros materiais, explodiu,
11
De Thomas Robert Malthus (1766-1834), economista, demógrafo e estatístico britânico.
HAMMOND, David J.; HINMAN, Eve E. Lessons from the Oklahoma City Bombing: defensive design
techniques. Reston: ASCE Publications, 1997. p.1.
13
ROWLAND III, James H.; MAINIERO, Richard J. A review of recent accidents involving explosives
transport. In: ANNUAL CONFERENCE ON EXPLOSIVES AND BLASTING TECHNIQUE, 34, Louisiana.
Anais… Cleveland: International Society of Explosives Engineers, 2008. Disponível em:
<http://www.cdc.gov/niosh/mining/pubs/pdfs/arora.pdf>. Acesso em: 29 dez. 2008.
14
STEPHENS, Hugh W. The Texas City Disaster, 1947. Texas: Universty of Texas Press, 1997. p. 1-5.
12
25
destruindo toda a região portuária e entorno, matando perto de 600 pessoas e ferindo outras
3.500 (praticamente 25% da população então estimada em 16.000).
As circunstâncias como o calor do incêndio e a pressão nos compartimentos onde o
nitrato de amônio estava estocado, foram suficientes para iniciar o processo de detonação do
material. A força da explosão foi tanta, que pode ser sentida a mais de 240 quilômetros de
distância do seu epicentro. Varias explosões e incêndios se sucederam em cadeia, destruindo
edificações e instalações, formando o que é considerado o pior acidente industrial dos Estados
Unidos (Figura 2).
Figura 2: cenário de destruição do acidente na cidade do Texas (1947).
Fonte: domínio público disponível em: http://texashistory.unt.edu/permalink/meta-pth-11686.
Composições químicas com base no nitrato de amônio representam perigo pelo seu
alto potencial explosivo quando não bem conhecidas. Uma das formas de utilizar o nitrato de
amônio com mais eficiência enquanto explosivo é na sua combinação com outros materiais
orgânicos, como por exemplo, combustíveis, surgindo daí o ANFO. A palavra ANFO vem
das iniciais de Ammonium Nitrate Fuel Oil, ou seja, é a composição do nitrato de amônio com
óleo combustível (normalmente óleo diesel). Esta combinação explosiva possui maior
estabilidade na sua decomposição térmica, embora possa ser até mais sensível e potente. Sua
iniciação se dá com alguma energia de ativação relativamente alta, como por exemplo, uma
onda de choque oriunda de outra explosão (de um detonador). A estabilidade e o baixíssimo
custo são atrativos para sua ampla utilização em mineração e em outras atividades comerciais
lícitas. É assim o explosivo mais utilizado, juntamente com géis e emulsões também a base de
26
nitrato de amônia. Entretanto, a energia de ativação pode ocorrer de forma não planejada, em
acidentes, ou o que é pior, o planejamento pode ter fins ilícitos, como o do terrorismo.
O atentado na cidade de Oklahoma é uma triste prova desse fato. Ocorrido no dia 19
de abril de 1995, causou a morte de 168 pessoas (19 crianças) e grande número de feridos,
além dos danos materiais. Foi um ataque ao prédio Alfred P. Murrah, pertencente ao governo
federal norte-americano, sede de várias agências regionais governamentais. O atentado teve
como protagonista Timothy McVeigh, auxiliado por Terry Lynn Nichols, ambos norteamericanos. A ação foi motivada por ambos se oporem a medidas adotadas pelo governo dos
EUA, matando civis inocentes, o que causou mais espanto e indignação da população.
McVeigh utilizou um pequeno caminhão contendo essencialmente ANFO, em uma
mistura de nitrato de amônio com o combustível nitrometano no lugar do óleo diesel e ainda
contando explosivos reforçadores, totalizando cerca de 3 toneladas de substância explosiva
(CRODDY15, 2005). Os estragos foram enormes. O prédio precisou ser demolido face ao seu
estado de destruição (Figura 3).
Figura 3: cenário de destruição do atentado na cidade de Oklahoma (1995).
Fonte: domínio público, crédito ao Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América, disponível em:
<http://en.wikipedia.org/wiki/File:Oklahomacitybombing-DF-ST-98-01356.jpg>. Acesso em: 31 dez. 2008.
15
CRODDY, Eric A.; WIRTZ, James J. Weapons of Mass Destruction: An Encyclopedia of Worldwide Policy,
Technology, and History. Santa Barbara: ABC-CLIO, 2005. p.203.
27
1.2. Classificações e distinções dos tipos de explosivos e bombas
Preliminarmente, há que se distinguir explosivo de bomba. Diferenciar o componente
do conjunto. Bomba, neste caso, é referida simplesmente como um dispositivo capaz de
explodir, valendo-se pela definição já utilizada para explosão. É, portanto, um dispositivo que
tem no seu conjunto formador, o componente explosivo. Em um esquema simplificado, um
dispositivo ou artefato explosivo seria composto por uma fonte de energia, por um mecanismo
de acionamento e por um explosivo a ser acionado (Figura 4).
Figura 4: esquema simplificado de um dispositivo explosivo (bomba).
A grande variedade de substâncias e composições explosivas e, ainda, os diversos
usos e aplicações dos explosivos e dos artefatos explosivos implicam na necessidade de
caracterização prévia dos diferentes tipos. Há várias formas de classificação e também há uma
gama de propriedades que os distingue. As formas mais comuns e relevantes são apresentadas
a seguir. Consoante os objetivos deste estudo, destacam-se as características técnicas
específicas relativas aos explosivos.
1.2.1. Classificação quanto ao uso
Basicamente os explosivos se diferenciam quanto ao uso em três categorias:
comerciais, militares e uso ilícito.
Os explosivos comerciais são aqueles utilizados notavelmente em atividades civis,
tais como mineração e obras de engenharia, envolvendo aí o desmonte de bancadas
(pedreiras), a abertura de túneis, demolições, implosões etc. Também são usados em
28
atividades menos aparentes como nas extinções de incêndios (pelo vácuo formado após a
explosão), nos sistemas de inflar dos dispositivos de segurança veiculares (airbag) e nas
fusões (soldas) de placas metálicas nas indústrias, dentre outros. Também podem ser incluídos
nessa categoria, os explosivos usados para pirotecnia, como os empregados em fogos de
artifício, efeitos especiais em filmagens e sinalizadores de salvatagem, muito embora possam
ser considerados como uma categoria à parte (SUCESKA16, 1995).
A utilização militar de explosivos depreende condições especiais de uso, onde os
mesmos estariam sujeitos a condições extremas, típicas de guerra, além de possuírem
características adequadas para fins bélicos. Esta categoria também abrange alguns dos
explosivos e dispositivos explosivos utilizados por forças especiais policiais, como
esquadrões antibombas e grupos de operações táticas.
Embora possa parecer um contra-senso, os esquadrões antibombas utilizam
explosivos como ferramentas em suas atividades, em técnicas de contramedida para
neutralizar artefatos suspeitos (Figura 5). Já os grupos de operações táticas empregam
explosivos para abertura de portas e janelas em entradas forçadas.
Figura 5: abertura de um pacote postal suspeito (2007).
Atendimento do GBE da Polícia Federal/RJ. Em destaque a utilização de um arranjo com explosivos para a
abertura remota e segura do pacote.
Fonte: arquivo pessoal.
16
SUCESKA, Muhamed. Op Cit. p. 3.
29
Por fim, o uso ilícito constitui o emprego de explosivos em ações não permitidas ou
por pessoas não habilitadas. São utilizados tantos explosivos militares como os comerciais,
além dos explosivos improvisados ou caseiros.
1.2.2. Classificação quanto ao modo de fabricação
A forma como é fabricado o explosivo ou o dispositivo explosivo também pode ser
categorizada. Há os industrializados e os artesanais, também chamados de improvisados.
No Brasil, os explosivos de uso militar são fabricados principalmente pela Imbel –
Indústria de Material Bélico do Brasil, pertencente ao Exército Brasileiro e pela RJC
Aeroespacial Ltda (detentora dos produtos da CEV – Companhia de Explosivos Valparaíba).
Os de utilização comercial possuem vários fabricantes (Tabela 1).
Tabela 1: Produção e venda dos produtos e serviços relacionados a explosivos.
Descrição dos produtos
2,4,6 - trinitrotolueno (TNT)
Estopins,
cordéis
detonantes, fulminantes ou
cápsulas
fulminantes;
detonadores elétricos
Explosivos
preparados,
exceto pólvoras propulsivas
Fogos de artifício, foguetes
de sinalização ou outros
artigos pirotécnicos
Nitroglicerina; tetranitrato
de pentaeritritol (PETN,
Nitropenta, Pentrita)
Pólvoras propulsivas
Serviço de produção de
explosivos
ou
serviços
relacionados
Outros
TOTAIS
Unidade
de
medida
Produção
Vendas
kg
(x)
Valor
(1000 R$)
(x)
(x)
Valor
(1000 R$)
(x)
kg
36.672.302
30.919
32.971.682
28.580
kg
76.419.317
299.315
71.604.188
277.738
kg
12.503.158
57.592
11.984.837
53.240
kg
(x)
(x)
(x)
(x)
kg
(x)
(x)
(x)
(x)
(x)
(x)
(x)
(x)
5.234
393.060
Fonte: IBGE - PIA EMPRESA 2007.
-
4.491
364.050
Quantidade
Quantidade
-
No caso dos explosivos artesanais, a preocupação é maior ainda, pois inexiste
qualquer forma de controle quanto à produção.
1.2.3. Classificação quanto ao princípio de funcionamento
As formas como os explosivos podem ser iniciados também são utilizadas como
elementos diferenciadores para classificá-los. Estes mecanismos de acionamento se dividem
pelos princípios que os regem, podendo ser físicos, químicos ou mistos.
30
Os princípios físicos são aqueles que, assim como a própria definição de física, se
valem das forças naturais sem alteração relevante da matéria, servindo essas forças como
verdadeiros gatilhos (triggers) que desencadeiam o processo para que ocorra a explosão. São
as variações de uma ou mais grandezas físicas, que ao serem detectadas e ultrapassarem os
limites estabelecidos pelo sistema do mecanismo de acionamento, resultam na explosão.
As grandezas físicas utilizadas podem ser várias, tais como: tempo (bomba-relógio),
temperatura, força, pressão (descompressão), tração, tensão de um cabo, umidade,
luminosidade, capacitância etc. Ocorrendo a variação dessas grandezas, os sensores dos
mecanismos a percebe e acionam um dispositivo iniciador, como por exemplo, um detonador,
que é formado por um explosivo muito sensível ao calor ou ao atrito. Ao receber o calor ou
atrito necessário, o detonador explode gerando a energia necessária para ativar a massa
principal de explosivo. O calor fornecido para o explosivo iniciador do detonador pode ser
oriundo de uma chama (estopim) ou de uma resistência elétrica pelo efeito joule (detonador
elétrico ou eletrônico), ou ainda de uma onda de choque (cordéis detonantes, tubos de
choque).
As grandezas envolvidas nos sistemas iniciadores podem dar nome ao dispositivo
explosivo e assim servir como subclassificação, tais como bomba de tempo (Figura 6), de
tração, de pressão, eletrônica etc.
Figura 6: simulacro de bomba encontrado dentro de um veículo (1997).
Ocorrência da Polícia Federal/RJ. Destaque para o mecanismo de acionamento de tempo.
Fonte: arquivo pessoal.
31
Por sua vez, os princípios químicos se valem da alteração da matéria como gatilho de
iniciação do dispositivo explosivo. Uma reação química exotérmica que gere calor suficiente
para acionar os detonadores poderá servir como base de um mecanismo dessa natureza, já que
a reação química pode ocorrer depois de determinado tempo (oxidando a mistura química no
contato direto com o ar, por exemplo) tendo assim função apropriada para um dispositivo
explosivo temporizado (bomba-relógio).
A utilização dos dois princípios forma o sistema misto. Um exemplo é o ataque de
ácido a um fio metálico tensionado, corroendo-o, oxidando-o (princípio químico) ao ponto de
rompê-lo. Quando isso ocorre, há a liberação do fio que por sua vez, fecha mecanicamente
(princípio físico) os contatos de um circuito elétrico energizando e acionando um detonador.
As combinações são inúmeras, conforme a criatividade de quem as constrói. Quando se trata
de dispositivo improvisado, essas combinações acabam identificando as pessoas que as
idealizaram, formando a chamada “assinatura” (ou modus operandi).
1.2.4. Classificações pelas características técnicas dos explosivos
Os explosivos possuem diversas propriedades e características técnicas. A relação
dessas características, evidenciando o desempenho da substância como explosivo, faz com
que esses parâmetros sirvam isoladamente ou em conjunto como uma forma de classificá-los.
A maior ou menor utilização de uma classificação por uma determinada característica técnica
é proporcional à relevância que esta característica possui no contexto de utilização daquele
dispositivo explosivo. As que mais se destacam são: velocidade de detonação, brisância,
estabilidade e sensibilidade.
A velocidade de detonação é a velocidade com que a reação química se propaga ao
longo do explosivo, em outras palavras, é a velocidade com que a zona de reação, formada
quando da iniciação do explosivo, se desloca através do próprio, e que vai se decompondo,
gerando a explosão e os seus efeitos (Figura 7). É possível medir a velocidade do
deslocamento dessa zona de reação, obtendo-se o tempo em que a frente de onda demora a se
deslocar em um determinado percurso, sendo um dos mais importantes parâmetros dos
explosivos (SUCESKA17, 1995).
A medida é comumente fornecida em metros por segundo (m/s), sendo que os
explosivos que possuem velocidade de detonação acima de 1000 m/s são chamados de altos
explosivos e os que estão abaixo, até o limite inferior da velocidade do som (340 m/s), de
baixos explosivos. Valores inferiores a 340 m/s não são considerados como velocidades de
17
SUCESKA, Muhamed. Op Cit. p. 93.
32
detonação e sim de deflagração. Um exemplo típico é a pólvora negra que possui uma
velocidade de deflagração em torno de 300 m/s (velocidade máxima de 400 m/s, conforme
Stettbacher18). Isso implica em dizer que para se obter uma explosão útil com pólvora negra, a
mesma tem que estar confinada, caso contrário pode ocorrer uma combustão (deflagração) e
não uma detonação.
Quanto maior a velocidade de um explosivo, mais poderoso ele se torna no aspecto
da sua capacidade de rompimento. Esta propriedade de se realizar um trabalho mecânico, de
rompimento, quebra e fragmentação do material em sua volta é denominada brisância, que é
de suma importância para aplicações militares no rompimento de barreiras visando atingir os
alvos e nas aplicações de mineração fragmentando as rochas. A brisância é uma medida
influenciada pela rapidez com que o explosivo atinge o seu pico máximo de pressão durante
uma explosão, sendo, portanto, diretamente dependente da velocidade de detonação.
Energia de
iniciação
EXPLOSIVO INTACTO
Frente de Onda
Zona de Reação
Massa decomposta
Frente de Onda
Figura 7: velocidade de deslocamento da frente de onda.
A estabilidade de um explosivo se refere a sua capacidade de manter as suas
propriedades inalteradas frente às circunstâncias as quais é submetido. Assim, explosivos
estáveis podem, por exemplo, serem armazenados por longos períodos ou em condições
climáticas desfavoráveis sem alterações em suas características fisioquímicas. Essa
capacidade é muito valorizada em explosivos militares, pelo regime de estocagem e condições
de uso.
18
STETTBACHER, Alfred. Op Cit. p. 133.
33
Por fim, destaca-se a sensibilidade que é a resposta que o explosivo fornece ao
receber energia. Um explosivo muito sensível pode se iniciar com pequenas quantidades de
energia, como as geradas pela fricção do material. Os explosivos poucos sensíveis precisarão
de grande energia, tais como as oriundas de outra explosão. Novamente, para fins militares é
vantajoso que o explosivo manuseado seja insensível às condições de guerra, não devendo
iniciar ao ser perfurado por um projétil, por exemplo. Alguns explosivos podem responder
bem a estímulos mecânicos como impactos e serem insensíveis a outros, como o calor de uma
chama. É o caso, por exemplo, da nitroglicerina que sob determinadas condições, pode
explodir, simplesmente ao atingir o solo de uma pequena altura, enquanto a mesma
nitroglicerina pode ser consumida ao ser submetida ao calor de uma chama, sem explodir
(WALTERS19, 2003).
Conjugando as características técnicas apresentadas têm-se as classificações mais
satisfatórias, segundo Suceska20: explosivos primários, explosivos secundários, propelentes e
o grupo dos pirotécnicos (estes já descritos).
Os explosivos primários ou de iniciação são altamente sensíveis, e possuem essa
denominação por serem utilizados na ativação de outros explosivos menos sensíveis,
formando uma cadeia ou trem de fogo. São exemplos: a azida de chumbo, o estifinato de
chumbo, fulminato de mercúrio etc.
Os explosivos secundários (devido a sua posição na cadeia de iniciação) também são
chamados de explosivos de ruptura. Para tanto, possuem alta brisância e, portanto, alta
velocidade de detonação (altos explosivos). Nesta categoria, têm-se como exemplos
explosivos plásticos, TNT, hexogênio (RDX), tetril, nitropenta (PETN) etc.
Os propelentes são basicamente as pólvoras e que conforme já dito, possuem
velocidade de deflagração, necessitando de condições especiais (confinamento) para
explodirem. Possuem fins balísticos e na propulsão de foguetes, envolvendo várias técnicas na
composição e geometria dos grãos das pólvoras.
1.3. Os efeitos de uma explosão
Ao ocorrer uma explosão diversos efeitos se sucedem variando em intensidade
conforme o tipo de dispositivo explosivo empregado e as condições do local atingido. Esses
efeitos podem ser potencializados ou minimizados por outras circunstâncias, como por
exemplo, o confinamento do ambiente ou o direcionamento da carga explosiva. Associados
19
20
WALTERS William P.; ZUKAS, Jonas A. (editores). Op Cit. p. 189.
SUCESKA, Muhamed. Op Cit. p. 2.
34
aos efeitos de uma explosão estão os danos que esta pode causar, em especial no ser humano.
A literatura médica usualmente divide esses danos em primários, secundários, terciários e
quaternários (AZAROW21, 2006).
Os danos ou ferimentos primários são os relacionados com traumas causados pela
variação súbita e pelos picos de pressão no ambiente. Os órgãos mais suscetíveis a traumas
pela sobrepressão são, em regra, os mais fluidos e, por conseguinte os que se expandem e se
comprimem mais facilmente com a passagem da onda formada pela explosão (onda de
choque) ou pelas ondas refletidas. São os pulmões, sistema gastrointestinal e região
timpânica. Com o trauma desses órgãos, pode ocorrer desde uma surdez temporária até o
óbito por hemorragia severa (BELANGER22, 2006).
Os fragmentos resultantes da explosão e que devido à força da expansão dos gases
atingem altas velocidades, provocam os danos secundários. Além de serem altamente
penetrantes, causando todo tipo de ferimento, há ainda que se considerar o risco proposital ou
não de infecção pela contaminação do material fragmentado.
Ferimentos terciários são os ocasionados pelo impacto da impulsão e da colisão dos
corpos arremessados devido à explosão, contra objetos e anteparos. Resultam em lesões de
larga escala, tanto penetrantes como contundentes (BAR-TAL23,2006).
Por fim, têm-se as lesões quaternárias que englobam as resultantes de queimaduras,
inalações diversas (poeira, fumaça etc.), complicações em função de doenças pré-existentes,
demolição de estruturas pela explosão, ou seja, lesões por uma miscelânea de efeitos de uma
explosão.
O estudo dos efeitos e das conseqüências das explosões facilita a compreensão do
potencial lesivo do emprego ilícito dos explosivos. Citado os danos, as lesões, por meio dos
seus agrupamentos sob o ponto de vista médico, resta descrever mais detalhadamente os
efeitos que originam tais danos. Basicamente são quatro os principais efeitos: térmico,
sobrepressão, deslocamento e fragmentação.
1.3.1. Efeito térmico
A reação química decorrente de uma explosão libera muita energia de forma
extremamente rápida, provocando entre outros, o efeito térmico, que consiste na brusca
21
AZAROW, Kenneth et al. Bronchoscopy in the blast injury patient. Archives of Surgery. Chicago, v. 141, n. 8,
p. 806, ago. 2006.
22
BELANGER, Heather G. et al. Mechanism-of-injury approach to evaluating patients with blast-related
polytrauma. The Journal of the American Osteopathic Association. Chicago, v. 106, n. 5, p. 266, maio 2006.
23
BAR-TAL, Gabi et al. Role of radiology in evaluation of terror attack victims. American Journal of
Roentgenology. Leesburg, v. 187, n. 3, p. 609, set. 2006.
35
elevação e declínio da temperatura. O patamar da temperatura da zona de reação ou da
temperatura de detonação é na faixa de 2000 a 5000 K (SUCESKA24, 1995). Esta alta
temperatura se sustenta por pouco tempo (µs), pois o decréscimo é da ordem de 105 K/s
(LAFONT25, 1999) o que leva a um rápido resfriamento.
A alta temperatura alcançada é suficiente para ocasionar a fusão dos materiais
próximos ao epicentro da explosão. Como há um rápido resfriamento, não há transferência de
calor suficiente para a expansão da fusão a extensões maiores. Industrialmente este efeito é
utilizado, por exemplo, na solda e junção por explosão de placas dos mais variados metais
(Figura 8) e ainda com inúmeras vantagens em relação aos demais processos comuns de
soldagem devido a, comparativamente, ausência de aquecimento (BANKER26, 1993).
Figura 8: soldagem de duas placas de metais distintos por explosão (1997).
Material gerado em aula prática na fábrica de explosivos Britanite.
Fonte: arquivo pessoal
1.3.2. Sobrepressão
A brusca expansão do material explosivo, aumentando em muito o seu volume inicial
e formando gases que se deslocam a partir do epicentro da explosão, gera a já descrita frente
24
SUCESKA, Muhamed. Op Cit. p. 93.
LAFONT, M. C.; NOBILI, A.; MASRI T. Recent Developments in Characterization of a Titanium-Steel
Explosion Bond Interface. In: Proceedings of reactive metals in corrosive applications conference. Albany: Wah
Chang, p. 93, set. 1999.
26
BANKER, John G.; REINEKE, Edward G. Explosion Welding. In: OLSON, David L. (ed.). ASM Handbook.
Cleveland: ASM International, v. 6, p. 303, 1993.
25
36
de onda. Essa frente faz com que a pressão atmosférica varie conforme ocorre a sua passagem
pelo ambiente, sendo também conhecida como onda de choque.
Inicialmente, o ambiente pré-explosão está sujeito a pressão atmosférica. Com o
desencadeamento da explosão, à passagem da onda de choque faz com que haja um grande
aumento da pressão existente, ocorrendo um pico ou sobrepressão. Essa sobrepressão tem
uma breve duração (na ordem de ms), mas os seus efeitos são devastadores, empurrando toda
a matéria à sua frente e ocasionando as lesões primárias. É a chamada fase positiva da
explosão.
Com a passagem da onda, o que se tem em seguida é a ausência de ar (que foi
impulsionado pela frente de onda), gerando uma pressão negativa. Essa fase negativa é
igualmente na ordem de ms, porém com duração bem maior do que a positiva, pois é o tempo
para o ambiente se reequilibrar, com oscilações desprezíveis (em termos de tempo total) após
a fase negativa (Figura 9).
Interessante destacar que essa fase negativa faz com que pequenos objetos ou
fragmentos sejam atraídos de volta ao epicentro. Uma perícia pós-explosão poderá encontrar
pesados objetos lançados bem longe (resultado da fase positiva) contrastando com outros bem
mais leves próximos de onde se deu a explosão. Além disso, outra característica da fase
negativa é a formação de vácuo. Essa característica faz com que se utilizem explosivos para a
extinção de incêndio, desde que propriamente preparados para tal.
Figura 9: gráfico de pressão de uma explosão.
37
1.3.3. Deslocamento
Um efeito intrinsecamente relacionado com a sobrepressão é o deslocamento da
matéria em volta do epicentro da explosão. Embora relacionados, as poderosas conseqüências
desse deslocamento fazem com que este efeito seja estudado independentemente das
variações da pressão do ambiente.
O deslocamento da massa devido à força das ondas de choque oriundas da explosão
faz com que essa massa reaja segundo a terceira lei de Newton (Princípio da Ação e Reação),
exercendo uma força sobre o explosivo em direção contrária. Uma das aplicações imediata
reside na utilização dos explosivos como propelente, impulsionando o artefato (projétil) que
também pode ter uma carga explosiva. É um engenho devidamente projetado para este fim,
com grande alcance e precisão, servindo para fins bélicos (Figura 10). Além de projéteis
convencionais, o efeito de deslocamento das explosões também possibilita uma ampla
utilização improvisada de materiais agregados aos explosivos, como pregos, parafusos, bolas
de gudes etc. Estes materiais, que também sofrem o efeito da fragmentação, são lançados a
altas velocidades.
Figura 10: lança-rojão M72A2 apreendido pelo DPF no Rio de Janeiro (2007).
Na radiografia se diferencia o propelente (à esquerda da linha tracejada) do projétil.
Fonte: arquivo pessoal.
Em termos de resultado sobre seres vivos, conforme descrito anteriormente, o
deslocamento é o responsável pelas lesões terciárias. Isto ocorre tanto na aceleração brusca
dos corpos como na sua desaceleração, normalmente por colisão contra anteparos
38
(edificações, veículos, etc.) nas proximidades do epicentro da explosão. Esta característica é
evidenciada no projeto de trajes antibombas, onde é comum se ter uma proteção bem rígida na
frente, enquanto na parte traseira há um acolchoamento prevenindo, caso ocorra uma
explosão, evitando que o técnico antibomba sofra lesões ao ser lançado pelo efeito do
deslocamento. A proteção é sempre relativa, sendo influenciada diretamente pela quantidade
de explosivos e pela distância destes à pessoa ou ao bem a ser protegido. No caso do traje, é
fundamental ainda que o técnico fique sempre de frente para a bomba a ser neutralizada,
mesmo ao se afastar (andando de costas). Caso isto não ocorra, a roupa ao invés de proteger,
irá potencializar os efeitos do deslocamento, servindo a parte rígida frontal como um anteparo
contra o qual o corpo do técnico será fortemente pressionado (Figura 11).
Figura 11: traje antibomba (2003/2002).
À esquerda o apresentado no “Primeiro Seminário de Técnicas antiexplosivos e manejo de equipamento
especializado”, em Bogotá. À Direita o apresentado durante o XII CABE, em SP. Destacam-se a proteção rígida
(parte escura) e o acolchoamento traseiro do traje.
Fonte: arquivo pessoal.
1.3.4. Fragmentação
A força gerada a partir da expansão da matéria explosiva e a forma rápida como a
mesma ocorre tem um poderoso efeito de rompimento, de fragmentação do material próximo
ao explosivo, principalmente do invólucro que o contém. Estes fragmentos lançados a alta
velocidade (pelo efeito do deslocamento, visto anteriormente) se tornam projéteis com grande
capacidade de penetração, produzindo nos seres humanos as chamadas lesões secundárias.
Baseados nesse efeito, muitos artefatos são produzidos com alto poder lesivo, por
meio de acessórios, cuja finalidade precípua é a de facilmente se romper em pequenos
fragmentos de material metálico. São anéis ou luvas de estilhaçamento. Em alguns casos,
esses acessórios são opcionais, conforme o fim bélico que se destinam. É o caso, por
39
exemplo, das granadas de mão que podem ser defensivas ou ofensivas. Ao contrário do que se
poderia pensar, granadas ofensivas são as que não utilizam os tais acessórios de
fragmentação. Isto se explica devido à classificação ter como referencial quem está fazendo o
lançamento da granada, ou seja, uma tropa que está em ofensiva, ao lançar uma granada, não
objetiva que a mesma se fragmente e atinja seus combatentes. Da mesma forma, uma tropa
que esteja abrigada, se defendendo, pode fazer uso de uma granada com alto poder de lançar
fragmentos e assim potencializar as lesões no inimigo que se aproxima (Figura 12).
Figura 12: granada M3 e sua luva de estilhaçamento para uso defensivo (2004).
Fonte: arquivo pessoal.
Os elementos utilizados para aumentar a fragmentação podem ser externos ou
internos (Figura 13). Mesmos os modelos industrializados, com marca e modelo
identificáveis, podem ocultar esses elementos, o que deve ser considerado quando se estipula
uma distância de segurança, longe do raio de ação do artefato.
Figura 13: granada M4 com a radiografia dos anéis de estilhaçamento (2004).
Fonte: arquivo pessoal.
Além da fragmentação do invólucro e dos materiais previamente agregados à massa
explosiva, há que se considerar também a fragmentação dos objetos próximos ao explosivo,
principalmente quando o explosivo possui alta brisância.
40
1.3.5. Outros efeitos
Além dos efeitos descritos, há outros que também são aproveitados nos diversos
artefatos. São variações da geometria e da constituição dos materiais em torno do explosivo,
produzindo resultados impressionantes no aproveitamento útil da energia gerada na explosão.
No caso da geometria, destacam-se as chamadas cargas ocas, onde a disposição da
substância explosiva vale-se da propriedade de propagação perpendicular das ondas de
choque na superfície. Destarte, o arranjo direciona e soma as ondas, resultando no aumento e
na concentração da força (Figura 14). Uma definição mais completa é dada por WALTERS27
(1991):
A cylinder of explosive with a hollow cavity in one end and a detonator at the
opposite end is known as a hollow charge. The hollow cavity, which may assume
almost any geometric shape such as a hemisphere, a cone, or the like, causes the
gaseous products formed from initiation of the explosive at the end of the cylinder
opposite the hollow cavity to focus the energy of the detonation products. The
focusing of the detonation products creates an intense localized force.
(a)
(b)
Figura 14: comparativo entre os efeitos da geometria na detonação.
Em (a) efeitos de uma carga plana e em (b) com uma carga cônica.
A concentração geométrica de ondas explosivas, com resultados mais efetivos e com
menos quantidade de explosivo, denomina-se efeito Munroe na Inglaterra e nos Estados
Unidos, e efeito Neumann ou Von Foerster na Alemanha (WALTER28, 2008). São nomes em
homenagem aos que se destacaram no estudo dessa característica dos explosivos, muito
embora vários outros nomes também tenham dado importantes contribuições para o
27
WALTERS William P. Shock waves in the study of shaped charges. Technical Report. Maryland: Ballistic
Research Laboratory Aberdeen proving ground; ago. 1991. BRL-TR-3258. p. 1.
28
Idem. A Brief History of Shaped Charges. Technical Report. Maryland: Ballistic Research Laboratory
Aberdeen proving ground; dez. 2008. ARL-RP-232. p. 2.
41
desenvolvimento de aplicações com esse efeito geométrico. O primeiro trabalho escrito sobre
o assunto é atribuído à Von Baader em 1792.
Outro aspecto a ser considerado é a força que uma detonação exerce contra um
metal. DAVIS29 (2002) descreve essa força como algo entre 100 a 1000 vezes a própria
resistência que o metal poder oferecer. Assim, qualquer imperfeição, por menor que seja, ou
mesmo uma configuração proposital na superfície do explosivo, irá deixar sua marca no metal
e nos fragmentos decorrentes da explosão.
Outros experimentos, acoplando metais à superfície das cavidades da carga oca,
propiciaram o desenvolvimento de armas ainda mais poderosas, pois esses metais no contato
com o explosivo em detonação formam jatos com incrível capacidade de penetração (Figura
15). É o princípio utilizado, por exemplo, nos altos explosivos antitanque (HEAT – High
Explosive Anti-Tank), torpedos, mísseis etc.
Figura 15: granada antitanque em ação (2002).
Demonstração realizada durante o XII CABE, em SP.
Fonte: arquivo pessoal.
29
DAVIS, W. C.; HILL, L. G. Joints, Cracks, Holes and Gaps in Detonating Explosives. In: Symposium
(International) on Detonation, 12, 2002, San Diego. Proceedings of the…
42
1.4. O emprego do explosivo como forma de violência
Os explosivos possuem diversas aplicações lícitas, respondendo pela quase totalidade
do seu emprego. Porém, mesmo representando uma parcela ínfima, ao se pensar nos
explosivos, quase sempre se faz uma associação imediata com a aplicação criminosa ou como
forma de violência. Convém destacar as várias facetas desse emprego nocivo.
1.4.1. Arsenal do crime organizado
Uma das principais formas de emprego ilícito reside como forma de arma para os
criminosos afrontarem o poder público. Nesta categoria, incluem-se tantos os armamentos
industrializados, tais como granadas e rojões, normalmente contrabandeados ou desviados dos
meios militares, como os de fabricação artesanal.
Figura 16: exemplos de granadas apreendidas pela Polícia Federal/RJ (1999, 2007).
Na parte superior, 25 granadas argentinas modelo FMK2, na inferior, 68 granadas nacionais modelo CEV M4.
Fontes: parte superior, arquivo pessoal; inferior, PCF Marcos Bacha Santos.
São inúmeras apreensões de materiais explosivos, principalmente na cidade do Rio
de Janeiro, onde há varias facções criminosas exercendo um poder paralelo sobre a população.
Como forma de demarcação de domínio de território é utilizada a exibição ostensiva de
símbolos e nomenclaturas por elas criadas (Figura 17). É uma demonstração de força que
desafia o poder público.
43
Figura 17: granada de mão artesanal apreendida pela Polícia Civil/RJ (2002).
Destaque para a sigla “C.V.”, uma referência explícita à facção criminosa “Comando Vermelho” e para o
conteúdo da granada, composto de pregos, parafusos etc.
Fonte: arquivo pessoal.
1.4.2. Roubo de valores
A guarda e o transporte de valores se valem tanto da segurança física, por meio de
vigilantes devidamente armados, como a utilização de tecnologia em materiais resistentes,
que formam obstáculos quase instransponíveis para o acesso não permitido. É no rompimento
desses obstáculos que os explosivos são empregados, além da própria intimidação dos agentes
de segurança.
Valendo-se da brisância dos explosivos, a criminalidade, muitas vezes de forma
amadora e inadequada, os utiliza obtendo resultados insatisfatórios (Figura 18). Há exageros
na carga, sem muita eficácia para o fim colimado. Entretanto, com utilização cada vez maior,
a tendência é que os resultados passem a ser mais efetivos.
Figura 18: granada abandonada em uma agência da CEF no Rio de Janeiro (2007).
Caso atendido pelo DPF, com uma granada caseira abandonada e outra explodiu no local ferindo o delinqüente.
Fonte: arquivo pessoal.
44
1.4.3. Ataques a instalações prisionais
De forma análoga ao emprego de explosivos para rompimento de obstáculos visando
roubar valores, há a utilização visando libertar criminosos. Os alvos são as paredes das
instalações prisionais (Figura 19) e felizmente, mais uma vez, ainda não se observa muito
sucesso nos resultados, com falhas até na forma de acionamento dos explosivos. Esses
ataques estão também vinculados ao crime organizado.
Figura 19: artefatos explosivos utilizados em ataques à presídios em SP (2002).
O da esquerda era a base de pólvora negra e foi colocado no Centro de Detenção Provisória – Pinheiros. O da
direita continha 25 kg de ANFO e foi colocado no Presídio de Parelheiros. Ambos falharam no acionamento.
Fonte: arquivo pessoal.
1.4.4. Crimes passionais
Razões emocionais e que desencadeiam em vingança estão entre as maiores causas
da utilização de explosivo como meio de atingir as pessoas. Isto ocorre de forma direta
lesionando-as ou por meio de seus patrimônios. Esta constatação vem de estudos como o
realizado por DAVIS30 (2005) que durante o período de vinte anos (1983 a 2002) analisou
36110 casos de incidentes com explosivos nos Estados Unidos. Também neste mesmo país,
um dos alvos preferenciais do terrorismo, há uma publicação oficial do Departamento de
Justiça31 que cita o vandalismo e a vingança como os motivos mais freqüentemente apontados
nos incidentes com explosivos. Com isso, mais uma vez, desmistifica-se que o Brasil não teria
30
DAVIS, Mark A. et al. The United States twenty-year experience with bombing incidents: implications for
terrorism preparedness and medical response. The Journal of trauma injury, Infection, and critical care. San
Antonio, n. 59, p.1436-1444, dez. 2005.
31
EUA. Department of Justice. Office of Justice Programs. National Institute of Justice. A guide for explosion
and bombing scene investigation. Washington: 2000.
45
esse problema de segurança pública. Infelizmente, não há estudo semelhante para os
incidentes ocorridos no Brasil.
1.4.5. Vandalismo
Em um artigo sobre violência, MARCONDES FILHO32 (2001) aborda um agir
vândalo, como “destruição insensível e inconseqüente do bem público, dos símbolos de
cidadania, de urbanidade, indo até as formas elementares de interação social.” Cita ainda no
mesmo artigo, ENZENSBERGER sobre “jovens que destroem qualquer coisa que funciona” e
“hospitais e equipamentos médicos que são destruídos por vândalos que, fatalmente,
precisarão dos mesmos equipamentos no dia seguinte.”
Essas referências traduzem bem a irracionalidade destrutiva do vandalismo o que
explica a sua fácil e perigosa associação com explosivos, sendo como já dito, uma das
principais motivações dos incidentes que figuram nas estatísticas.
1.4.6. Violência entre gangues e torcidas
Outro grande problema relacionado com o emprego ilícito dos explosivos está na sua
utilização como arma nos confrontos de gangues. Esta questão é mais expressiva e com maior
repercussão quando envolvem brigas de torcidas organizadas dos clubes de futebol,
principalmente os de grande expressão popular.
Em uma busca sistemática em jornais paulistas no período de janeiro de 1980 a
dezembro de 1999, PIMENTA33 (2000) constata uma adoção efetiva, a partir da década de 90,
de armas de fogo e bombas por parte das torcidas organizadas. Com isso há registro de várias
mortes. A própria mídia acaba sendo apontada como incentivo para o aumento desse
fenômeno:
Jamelão, ex-presidente dos “Gaviões da Fiel”, acredita que “(...) a imprensa tem que
chegar junto com a gente (...), porque todo aquele que for associado que está na
faixa de 15 a 17 anos, vendo uma matéria no jornal: ‘são-paulino toca bomba no
corintiano’, isso automaticamente fica na memória dele no próximo jogo, ele vai
fazer bomba para atacar o são-paulino. (...) A imprensa ao invés de colaborar e
querer saber quais os pontos para ter uma solução, eles preferem vender a imagem,
vender o jornal (...)”.
A dificuldade de se prevenir a utilização de bombas caseiras pelas torcidas, reside em
parte na tênue distinção entre fogos de artifícios, legitimamente utilizados em comemorações,
32
MARCONDES FILHO, Ciro. Violência fundadora e violência reativa na cultura brasileira. São Paulo em
perspectiva, São Paulo, v.15, n.2, p. 20-27, abr. 2001.
33
PIMENTA, Carlos Alberto Máximo. Violência entre torcidas organizadas de futebol. São Paulo em
perspectiva, São Paulo, v.14, n.2, p. 122-128, jun. 2000.
46
e artefatos explosivos, que também são, em sua maioria, à base de pólvora negra, mas, visam
atingir a torcida adversária. A própria detecção das bombas em estádios com grandes
aglomerações é um desafio à segurança pública, face às diversas e criativas formas de
dissimulá-las.
Ilustra bem esta situação, parte da descrição do evento ocorrido em São Paulo e que
ficou conhecido na mídia como “o caso do gordo do ABC”, feita por TOLEDO34 (1997):
A paixão pelo futebol herdou do pai, que o levava aos estádios desde criança. Rotina
que se alterou bruscamente a partir do dia 23 de janeiro de 1992, semifinal da taça
São Paulo realizada no estádio do Nacional, clube da segunda divisão da capital
paulistana. Havia uma superlotação no estádio, ânimos acirrados como de costume,
insultos disparados por ambas as partes e uma proximidade perigosa entre as
torcidas rivais, imposta pelas reduzidas dimensões do estádio. Num determinado
momento do gol do São Paulo Futebol Clube, além da explosão de alegria incontida
do lado da torcida são-paulina, uma bomba de fabricação caseira é arremessada a
esmo em meio aos corintianos ainda aturdidos pelo tento adversário. Bomba sem
endereço determinado, a não ser pelo contraste das cores dos opositores, atingiu o
outro aglomerado torcedor. Situação em que mal se podia identificar os contendores,
sequer qualquer atributo que os individualizassem. Um gol, a explosão posterior,
espanto, alegria, dor, indignação compuseram o cenário que vitimou o corintiano
Rogério de Gásperi.
A violência ocorre tanto entre torcidas adversárias, como entre facções de uma
mesma torcida. Há também atos de protesto das torcidas contra os jogadores dos seus próprios
times, motivadas por maus resultados ou por atitudes polêmicas dentro e fora do campo.
1.4.7. Violência nas escolas
Além da formação de gangues em torno de interesses comuns, como o caso já citado
das torcidas organizadas de times de futebol, há também a cumplicidade entre colegas de
turmas de colégios que propicia essa formação ou pelo menos aumenta a impunidade dos atos
ilícitos pela não delação dos colegas. A violência nas escolas pode ocorrer de várias maneiras.
Podem ser ameaças falsas, reais, briga entre alunos, de alunos contra os funcionários da
escola e vice versa.
Um estudo quantitativo e qualitativo envolvendo 13 capitais do Brasil
(ABRAMOVAY35, 2005), aponta para a existência de ocorrências de bombas em banheiros
escolares e transcreve um relato de um grupo de estudantes de uma escola pública de Vitória
–ES, onde fica patente o pacto de silêncio entre os alunos:
Someone blew a bomb last year (...) The kid put together a pile, put a cigarette
inside and took it to the restroom. The minute the wick caught fire there was this
terrible burst. Then they called the police, they came and investigated, but found
34
TOLEDO, Luiz Henrique de. Short Cuts – histórias de jovens, futebol e condutas de risco. Revista Brasileira
de Educação. Campinas, n. 6, p. 209-221, set/out/nov/dez. 1997. p. 216.
35
ABRAMOVAY, Mirian; RUA, Maria das Graças. Violences in schools. Brasília: UNESCO, 2005. p.60.
47
nothing. The kids in our class kind of knew who did it, but we were not going to
give them away. For quite some time, the kid stayed in the clear in the bomb case.
But then they started suspecting another kid who had done nothing. Then we were in
quite a dilemma, but, afterwards, the boy was found out and expelled from school.
Em outro estudo, realizado no segundo semestre de 2003 em três escolas públicas
estaduais de Curitiba, ficou evidenciado que o problema é relativamente comum. Pela
pesquisa de campo, apurou-se que 29,8% dos entrevistados tinham conhecimento de alguma
ocorrência de bomba artesanal nas escolas (SILVA36, 2004).
1.4.8. Crimes ambientais
Infelizmente o meio ambiente também sofre agressões por conta do emprego ilícito
de explosivos. É o caso, por exemplo, da pesca predatória com bombas artesanais e também
da mineração ilegal.
A pesca predatória com explosivos é feita por meio de bombas improvisadas que
podem ter em sua composição materiais desviados como dinamites e emulsões ou
reaproveitamento do material de fogos de artifício ou mesmo composições caseiras
envolvendo pólvora, clorato de potássio, salitre, enxofre etc. Uma vez preparada, a bomba é
arremessada de maneira a explodir na passagem dos cardumes. A força das ondas geradas
pela explosão dentro d’água resulta na morte dos peixes pelas lesões já descritas no tópico
sobre os efeitos de uma explosão. Não são somente os peixes que sofrem esses efeitos. Todo o
ecossistema marítimo é afetado. Há relatos também de danos às construções próximas e de
mutilações dos pescadores (RAMOS37, 2006).
A mineração utilizando explosivos no desmonte de bancadas, por sua vez é uma
atividade que causa grandes impactos ao meio ambiente, pelos vários problemas associados
(BACCI38, 2006). É necessário se fazer um estudo prévio de implantação visando minimizar e
mitigar esses impactos. A partir do momento em que este tipo de atividade comercial é feito
de forma clandestina, não há como ter qualquer gestão ambiental, aumentando em muito os
impactos inerentes.
36
SILVA, Maria J. D. da. Violências nas escolas, vozes ausentes: a perspectiva de pais ou responsáveis de
escolas públicas. 2004. 166f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal do Paraná, Curitiba.
p. 77.
37
RAMOS, Mariana. Agressão além do mar - Pesca com bomba, um crime social, cultural e ambiental.
Salvador: Faculdade de Comunicação e Marketing/Centro Universitário da Bahia - FIB, 2006.
38
BACCI, Denise de La Corte; LANDIM, Paulo Milton Barbosa; ESTON, Sérgio Médici de. Aspectos e
impactos ambientais de pedreira em área urbana. Revista Escola de Minas. Ouro Preto, v. 59, n. 1, p. 47-54,
jan/mar. 2006.
48
1.4.9. Crimes contra o patrimônio
O grande poder emocional, o verdadeiro pânico que uma ameaça de bomba exerce
contra as pessoas, seja esta real ou não, propicia vantagens econômicas aos delinqüentes. São
crimes que atingem o patrimônio das vítimas. Nesta categoria também se incluem as
vantagens aferidas após a ocorrência de uma explosão provocada maliciosamente. É o caso
das fraudes contra as operadoras de seguro.
Um exemplo famoso de extorsão usando explosivos ocorreu na Colômbia em 15 de
maio de 2000 (Figura 20). Até os colombianos, então acostumados com um triste cotidiano de
violência, ficaram horrorizados com o terrível crime que inicialmente foi atribuído às Forças
Armadas Revolucionárias Colombianas – FARC e depois se verificou que eram criminosos
comuns (MARCELLA39, 2003):
(…) Elvia Cortez, a rural property owner and community activist, was killed by a
bomb placed around her neck, literally a collar bomb. The criminals demanded
$7,500, or the bomb would be allowed to explode. They left the note: “To unlock the
collar there are numerous ways, mechanical, hydraulic, electrical, and digital. It’s
important to note that it can only be unlocked at a specific hour either during the day
or night.” The sophisticated device, which was sensitive to body temperature for
detonation, decapitated her and killed the technician sent to disarm it. The main
perpetrator, thought to be one of nine common criminals not associated with any of
the three terrorist groups, was convicted 1 year later and sent to prison for 32 years,
while an investigation against eight others began.
Figura 20: réplica do colar-bomba utilizado no episódio de extorsão na Colômbia (2003).
“Primeiro Seminário de Técnicas antiexplosivos e manejo de equipamento especializado”, Bogotá.
Fonte: arquivo pessoal.
39
MARCELLA, Gabriel. The United States and Colombia: the journey from ambiguity to strategic clarity.
Strategic Studies Institute. Carlisle: United States Army War College, may 2003.
49
1.4.10. Descarte de material explosivo
O descarte de material explosivo, principalmente o bélico, representa um grande
risco para toda a sociedade. Infelizmente, não são raras as ocorrências de acidentes
envolvendo cidadãos de baixa renda que inadvertidamente recolhem ou mesmo furtam
granadas e outros artefatos bélicos imaginando transformá-los em dinheiro pela venda como
sucata devido ao valor de suas estruturas metálicas.
Com o crescimento urbano, áreas que antigamente eram naturalmente afastadas e,
portanto, ideais para o funcionamento de campos de instrução militares, se transformaram em
zonas de risco. A presença de moradores no entorno desses campos faz com que eles
convivam com o perigo do recolhimento, por catadores de lixo ou mesmo por curiosos, de
artefatos lançados que não explodiram ou que ainda possuem algum potencial explosivo. São
os chamados “tijolos quentes” no jargão militar. Este descarte a também é uma forma de
violência e que deve ser combatida pelo Estado.
1.4.11. Terrorismo
Por fim, uma das piores formas de demanda ilícita e violenta dos explosivos reside
no terrorismo. Há várias formas de se definir e classificar este mal, demonstrando que se está
longe de uma construção conceitual universal. Esta impossibilidade é apontada por
SEIXAS40, 2006:
Uma primeira dessas questões diz respeito à impossibilidade da neutralidade
científica e de uma definição consensual do terrorismo. Apresentei a perspectiva de
alguns autores que tentam negar ou mascarar as suas premissas de valor procurando
uma definição neutra e universal do terrorismo ou até recusando-se a apresentar uma
concepção do mesmo, dada a impossibilidade de encontrar uma definição universal.
Outros tentam deslegitimar o terrorismo, despolitizando-o, retirando-o do seu
contexto geopolítico e reduzindo-o a uma questão de cognição ou a uma patologia
individual ou social. (...)
Independentemente de qual conceito ou classificação, o terrorismo é, sem sombra de
dúvida, uma das maiores preocupações de segurança de qualquer país, sendo este alvo
preferencial ou não, face à sua ubiqüidade. A aviação comercial, por exemplo, permite essa
ausência de fronteira do terror, como explica GARCIA41 (2003):
40
SEIXAS, Eunice Castro. “Terrorismos”: uma exploração conceitual. Revista de sociologia e política, Curitiba,
v.16, número suplementar, p. 9-26, ago. 2008.
41
GARCIA, Marcos P. P. “Aviação civil e terrorismo”. In: BRANT, Leonardo Nemer Caldeira Brant (coord.).
Terrorismo e direito: os impactos do terrorismo na comunidade internacional e no Brasil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003, p. 316-317.
50
Do ponto de vista operacional, o avião é sítio ideal para a manutenção dos
passageiros. Ele voa a grande altitude e não conhece fronteira. Em geral, as vítimas
têm diferentes nacionalidades. Envolve-se, com isso, mais de um governo. A pressão
política é, portanto, maior. A possibilidade de resgatar militarmente passageiros com
vida é virtualmente nula. Em resumo, pode-se dizer, o avião é um importante
instrumento para a prática terrorista.
Tão controverso quanto à conceituação do terrorismo é a sua origem. Entretanto, não
há dúvida de que não se trata de um fenômeno novo, assim também como a descoberta da
pólvora e, por conseguinte, há relatos antigos da utilização de explosivos para fins terroristas.
No Brasil, apenas para fins de exemplificação, podemos citar os atos de terrorismo
praticados durante o regime militar, tanto os denominados subversivos quantos os repressivos,
de acordo com a ideologia política extremada, à esquerda ou à direita. Atualmente,
prevalecem atos de terror para fins de domínio de poder das organizações criminosas como
demonstração de força.
51
2. CASOS EMBLEMÁTICOS
Na casuística nacional há vários casos que por apresentarem certas características
merecem destaque. Ressalta-se que a pesquisa realizada, além de se limitar as ocorrências
nacionais, buscou informações da década de 80 em diante. São situações que ilustram as
diversas formas descritas sobre o emprego ilícito do explosivo, além de casos que tiveram
grande repercussão.
Infelizmente, mais uma vez, ressente-se a ausência de um banco de dados
centralizado sobre tão relevante tema para a segurança pública nacional. São informações que
se perdem em arquivos-mortos e que criam o mito de que o Brasil é um país que não sofre
esse tipo de violência.
2.1. Rio de Janeiro, três atentados à bomba no mesmo dia (1980)
O período do regime militar no Brasil (1964-1985) é marcado por diversos episódios
de violência patrocinados por grupos extremistas, tanto da direita como da esquerda. Em
1980, mais especificamente nos meses de julho e agosto ocorreu uma onda de atentados
contra bancas de jornais, visando coibir a divulgação da imprensa alternativa (MAUES42,
2006).
Nesses meses difíceis, o dia 27 de agosto de 1980 tem um triste destaque de três
atentados à bomba, todos na cidade do Rio de Janeiro. O primeiro ocorreu de madrugada, na
sede do jornal “Tribuna Operária”. O horário foi programado, pois o mecanismo era de uma
bomba-relógio.
O terceiro foi à tarde na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, no gabinete do
vereador Antônio Carlos de Carvalho, ferindo seis pessoas, inclusive uma funcionária
grávida. O assessor parlamentar do vereador, José Ribamar Sampaio de Freitas, teve o braço
esquerdo amputado em função dos ferimentos, além de perder a visão.
O que marcou de forma indelével a história de atentados terroristas no Brasil foi o
segundo evento, também à tarde, que vitimou Lyda Monteiro da Silva de forma fatal por meio
de um pacote contendo uma bomba, recebido na sede da OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil).
Lyda era funcionária da OAB, secretária do presidente, Eduardo Seabra Fagundes, o
provável alvo. A sua morte sensibilizou vários setores da sociedade, em parte por ser um
ataque a uma instituição fundamental na luta pela volta à democracia, e também pela forma
42
MAUES, Flamarion. O momento oportuno: Kairós, uma editora de oposição. História, Franca, v. 25, n. 2, p.
135, nov. 2006.
52
brutal como a mesma ocorrera, característica típica do uso de explosivos pelo terrorismo
(VEJA43, 1980):
Primeiro a chegar à sala, Theodoro Assunção, funcionário da tesouraria,
testemunhou o começo da agonia da primeira vítima fatal da onda de atentados
promovidos por terroristas de direita. “Foi uma bomba”, balbuciou dona Lyda. Ela
estava sem a mão esquerda, depois encontrada na marquise do 3.º andar. Tinha o
braço dilacerado, exibia fundas lesões no tórax e no rosto, e, soube-se logo depois,
seu pulmão esquerdo fora perfurado. Conduzida ao Hospital Souza Aguiar 10
minutos mais tarde, a mais antiga funcionária da OAB, viúva de um promotor
público, só teve tempo de perguntar por seu filho Luís Felipe Dias, 24 anos,
estudante de Direito da PUC. Morreu quando médicos tentavam prolongar-lhe a
sobrevida com respiração artificial.
2.2. Atentado do Riocentro (1981)
Outro evento de triste lembrança ocorrido no regime militar se deu também na cidade
do Rio de Janeiro, na noite de 30 e abril de 1981, uma quinta-feira, véspera de feriado. Um
show no Riocentro, na Barra da Tijuca, foi organizado para 20 mil participantes
comemorarem o dia do trabalhador. Duas explosões mancharam de vez, a já nefasta atuação
do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa
Interna), bem como o próprio regime.
A primeira explosão ocorreu no interior de um automóvel Puma que estava no
estacionamento do Riocentro. Dentro do veículo, dois militares que serviam no DOI-CODI do
I Exército: o Capitão, Wilson Luís Chaves Machado e o Sargento, Guilherme Pereira do
Rosário. O Sargento morreu na hora, sentado no banco do carona e com lesões compatíveis
com a explosão do artefato no seu colo. O capitão saiu gravemente ferido.
A outra explosão ocorre minutos depois, na casa de força do Riocentro sem vítimas e
sem afetar o show. Caso houvesse uma falta de energia seguida de explosão, certamente o
pânico gerado poderia causar uma tragédia sem dimensões, face ao grande número de pessoas
presente.
O polêmico Inquérito Policial Militar (IPM) concluiu que os militares sofreram um
ataque de um grupo terrorista de extrema esquerda vinculado à Vanguarda Popular
Revolucionária (VPR). Há várias contradições no suspeito IPM (ZAVERUCHA44,2004).
O evento demonstrou mais uma vez o risco que a sociedade está sujeita pelas
medidas extremadas, sejam elas de esquerda ou de direita, principalmente quando se utiliza
explosivos.
43
ENTRAM os assassinos. Veja, São Paulo, n. 625, p.16, set. 1980.
ZAVERUCHA, Jorge; MELO FILHO, Hugo Cavalcanti. Superior Tribunal Militar: entre o autoritarismo e a
democracia. Dados, Rio de Janeiro, v. 47, n. 4, p. 763-797, 2004.
44
53
2.3. Bomba em Boeing 747 aterrissado no Rio de Janeiro (1982)
Ainda no período do regime militar, mas sem qualquer conexão com grupos
extremistas nacionais, um episódio colocou o Brasil em destaque no cenário internacional. É,
possivelmente, um dos raros exemplos de bomba real retirada do interior de uma aeronave
após a sua colocação pelo terrorista. Normalmente, quando se atinge esse estágio, ou seja,
quando se vence todas as barreiras de segurança e se consegue instalar um dispositivo
explosivo dentro de um avião, o sucesso da empreitada é praticamente certo com a explosão
da aeronave. Resta aos peritos a difícil tarefa de se buscar evidências junto aos destroços nos
cenários de pós-explosão.
O fato ocorreu no dia 25 de agosto de 1982 no Aeroporto Internacional do Rio de
Janeiro, conforme os registros policiais dos especialistas que fizeram o atendimento da
ocorrência. No local estiveram equipes da Polícia Federal e da Polícia Civil do Rio de Janeiro.
Era o vôo 441 da Pan Am vindo de Miami. A transcrição do registro da ocorrência pelo
Esquadrão Antibomba da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro descreve o ocorrido45:
I – As 10:13 hs, deslocou-se desta base a equipe FALCÃO VII, composta por
Gilberto, Ataíde, Figueiredo e Barreto, juntamente com a equipe de FALCÃO I,
composta por Gustavo e Egdes, por determinação de Elmo 0 para o Aeroporto
Internacional do Galeão, onde, no avião JUMBO 747 da PANAM vôo 441, prefixo
nº 748 PA – Pilotado pelo comandante Hellmam, com a escala Londres, Miami e
Rio de Janeiro, foi encontrado um embrulho suspeito.
O referido embrulho estava afixado sob a poltrona nº 29A, que fica sobre as asa e o
tanque de combustível, que foi encontrado pela servente Maria das Mercês Santana e
entregue ao Sr. Antonio Agostinho Neto, que é o chefe responsável pela limpeza, às
07:00 hs.
Após ter aberto o embrulho, foi constatado que se tratava de uma bomba, que logo
foi desativada pela equipe de FALCÃO.
Estiveram presentes no local, o major Sartori que é o chefe da Segurança do
Aeroporto, Dr. Elbio Pereira Melo – Delegado Titular do DOPS da Polícia Federal,
agente Sílvio, Perito Sodré, Equipe de JAGUAR e o Det. Inspetor Wilson mat.
174695-2 da 37. D.P.
Regresso a base 13:00hs.
Da mesma forma, pelos peritos da Polícia Federal no Rio de Janeiro:
EXAME EM LOCAL DE ARTEFATO EXPLOSIVO
Às 11h30m do dia 25/08/82, atendendo solicitação telefônica do Dr. Zacarias/SR/RJ,
compareceram os signatários, acompanhados do Dr. Élbio/DOPS, ao Aeroporto
Internacional do Galeão, Setor B-Internacional.
Em lá chegando, após contatos com Agentes do DGIE/SSP, foram os signatários
informados de que na aeronave da PAN AM, sita no estacionamento, fora
encontrado um artefato explosivo, sob a poltrona um artefato explosivo, sob a
poltrona 29-A, lado esquerdo, próximo a asa e local de armazenamento de
combustível.
45
Livro de Registros do Esquadrão Anti-Bombas da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, 25.08.1982, p.
161-162.
54
O artefato havia segundo as informações, sido neutralizado pelos próprios agentes
do DGIE.
Das condições em que pudemos observar, descrevemos da forma que segue:
um retângulo de material gelatinoso, odor característico mas leve, de 1 cm de
espessura, medindo aproximadamente 40 x 15 cm, contendo um mecanismo elétrico,
alimentado por pilhas, uma pequena peça de metal prateado, com características de
detonador, embutida em uma das extremidades do artefato, ligada aos fios e pilhas.
O mecanismo de disparo, até a saída de todos do local, não era conhecido.
Esclarecem os Peritos que o material arrecadado ficou em poder dos Agentes do
DGIE/SSP.
R.J., 25/08/82.46
Com a rara oportunidade se estudar o dispositivo íntegro, foi possível realizar um
laudo detalhado (Figura 21) permitindo compará-lo com o ocorrido semanas antes, em 11 de
agosto, quando outro avião da Pan Am, vôo 830 de Tóquio a Honolulu, sofreu uma explosão
matando um passageiro e ferindo vários outros. Foi uma bomba instalada embaixo do assento
do passageiro, provocando um rombo que obrigou o piloto a fazer uma aterrissagem de
emergência. Este atentado foi atribuído ao grupo terrorista “15 de maio”, responsável por
diversos episódios similares, em nome da causa palestina(CAUVIN47, 2006).
Figura 21: bomba recuperada do vôo 441 da Pan Am (1982).
Fonte: imagem cedida pelo Esquadrão Antibomba da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro.
46
Livro de Registros do Núcleo de Criminalística do Setor Técnico-Científico da Superintendência de Polícia
Federal no Estado do Rio de Janeiro, 25.08.1982, p. 117-118.
47
CAUVIN, Henri E. Bomber of 1982 flight gets 7 years. The Washington post, Washington, 25 mar. 2006.
Disponível em: <http://www.washingtonpost.com/wp-dyn/content/article/2006/03/24/AR2006032401795_pf.
html>. Acesso em: 24 jul. 2009.
55
2.4. Explosão no monumento aos trabalhadores (1989)
Novamente, o dia em homenagem ao trabalhador fica marcado negativamente com
um ato de terrorismo com a utilização de bomba e explosivo. No primeiro de maio do ano de
1989, ano seguinte à promulgação da Constituição Federal de 1988, na cidade de Volta
Redonda – RJ foi inaugurado um monumento em homenagem aos três operários mortos em 9
de novembro de 1988, o “Memorial 9 de novembro”. Eles perderam as vidas numa operação
militar visando reprimir uma greve na Companhia Siderúrgica Nacional – CSN.
No dia seguinte, o monumento erguido na Praça Juarez Antunes é tombado por uma
forte explosão. A explosão foi tão potente que os efeitos das ondas de choque estilhaçaram
janelas de prédios situadas a uma distância aproximada de 300 metros do epicentro (VEJA48,
1989).
Ao examinar o local, os técnicos do Esquadrão Antibomba da Polícia Civil do Rio de
Janeiro, localizaram dentro do lago que circunda o monumento uma bolsa de lona comum,
com quase 7 quilos de explosivos plásticos não detonados. O relatório técnico49 elaborado
informa entre outras conclusões:
Ocorreu a detonação de praticamente simultânea de 3 (três) cargas explosivas,
contendo cada uma no mínimo 4 (quatro) e no máximo 10 (dez) placas do explosivo
plástico denominado PLASTEX, no mínimo 1,320 Kg (um quilo trezentos e vinte
gramas) e no máximo 3,330 Kg (três quilos trezentos e trinta gramas) em cada carga,
escorvadas com ramificações de cordel detonante ligadas a uma linha tronco
também de cordel detonante.
Assim, a destruição poderia ter sido ainda maior, caso a bolsa encontrada também
tivesse sido detonada. Uma das possibilidades apontada no relatório como a mais provável
pelo erro grosseiro, incompatível com o grau de especialização do restante do arranjo, é de
que a referida bolsa não foi acionada propositalmente. Esta hipótese de que quem executou a
explosão não teria cometido a falha de não conseguir a detonação da bolsa é reforçada pela
forma como as outras cargas foram posicionadas, obtendo o tombamento a contento da
estrutura de concreto, feito relativamente difícil.
O memorial foi refeito, mas o seu idealizador, o arquiteto Oscar Niemeyer,
modificou o seu projeto original para que ficassem evidenciadas as marcas da violência
causada pelo atentado à bomba.
48
UMA bomba nos nervos do país tenso. Veja, São Paulo, n. 1078, p.62-67, mai. 1989.
Relatório Técnico nº 018/89 – Seção de Desativação de Artefatos Explosivos e Incendiários – Divisão de
Recursos Especiais – Coordenadoria de Apoio Operacional – Secretaria de Estado da Polícia Civil – RJ.
49
56
2.5. Livro-bomba no Itamaraty (1995)
O que parecia ser um presente, literalmente explodiu em pesadelo. A vítima, a quem
o embrulho se destinava, a diplomata Andréia Rigueira David, era a Chefe da Divisão de
assuntos Previdenciários e Sociais do MRE (Ministério das Relações Exteriores), que
trabalhava em um anexo do Palácio Itamaraty, em Brasília. A entrega foi feita por um falso
mensageiro não identificado, e a rotina de segurança até então adotada permitia essa perigosa
imprudência, fazendo chegar até o destinatário sem grande dificuldade.
A explosão ocorreu na tarde do dia 3 de outubro de 1995. Andréia sofreu várias
lesões, principalmente nos olhos e nas mãos (perdeu dedos das duas mãos). Tratava-se de uma
armadilha disfarçada em livro. A forma como o livro foi aberto, sobre a mesa e não próximo
ao rosto, como é comum, provavelmente salvou Andréia de um destino pior.
O artefato era à base de pólvora e continha esferas de chumbo visando potencializar
o efeito de fragmentação. A força da detonação foi capaz de produzir um buraco na mesa de
Andréia (Figura 22).
Figura 22: estado da mesa da diplomata após a explosão do livro-bomba (1995).
Fonte: PCF Luiz Eduardo Lucena Gurgel.
Iniciada as investigações, tudo levava a crer que o autor teria sido um funcionário do
Itamaraty que tinha sido demitido, o oficial de chancelaria, Jorge Alfredo Lomba Mirândola,
autor de várias cartas ameaçadoras ao Itamaraty, todas assinadas, as quais Mirândola dizia
serem avisos de suas premonições mediúnicas e não ameaças. Havia outras evidências, como
os materiais encontrados em seu apartamento no Rio de Janeiro. Entretanto, com o
aprofundamento das investigações, Mirândola, que passou sete dias preso como suspeito da
autoria do crime, teve que ser solto, pois era de fato inocente. O verdadeiro remetente,
57
também funcionário insatisfeito do MRE, era Nelson Silva Leonel, preso em fevereiro de
1996.
2.6. Explosão no Fokker 100 (1997)
Acidentes com aeronaves comerciais sempre causam grande comoção na sociedade.
Tratando-se de interferência ilícita, conforme nomenclatura adotada pelos que militam na área
de segurança aeroportuária, o impacto causado aumenta. Se a interferência for com o uso de
explosivos, o medo passa a ser extremo. O Brasil, até o dia 9 de julho de 1997, não havia
ainda vivido essa combinação de elementos.
Esta primazia nada honrosa coube ao vôo 283 da empresa TAM, ligando Vitória à
São Paulo, em uma aeronave modelo Fokker 100. A explosão ocorreu minutos após a sua
decolagem do aeroporto de São José dos Campos onde fez escala. A 2.400 metros de altura,
com o efeito da explosão, combinado com a diferença entre a pressão interna da aeronave e a
pressão exterior, surge um rombo, na fuselagem de aproximadamente 3 metros de largura por
1,5 metro de altura. Por este rombo e ainda pela força da despressurização, as poltronas 18C,
18D e 18E foram ejetadas. Na poltrona 18E estava a vítima fatal, o Engenheiro Eletrônico,
Fernando Caldeira de Moura Campos. Outros seis passageiros ficaram feridos.
Houve divergências de conclusões pelas instituições responsáveis em apurar o
ocorrido. Inicialmente levantou-se a hipótese da própria vítima ter sido o responsável.
Posteriormente, com a análise mais detalhada dos vestígios recolhidos, com a elucidação de
várias evidências e que, tecnicamente tornaram-se fortes indícios, chegou-se à outra autoria,
descartando a hipótese inicial e indiciando então o professor Leonardo Teodoro de Castro.
O ineditismo, conforme visto, também provocou um desafio às autoridades
responsáveis pela apuração do que teria ocorrido. A complexidade das investigações e a
necessidade do trabalho em conjunto de várias instituições exigiram uma reflexão crítica de
como atuar a contento em um evento dessas proporções. O relato de parte da equipe de peritos
que trabalhou no caso ilustra bem a situação (BISTERÇO50, 2005):
Data: 09 de julho de 1997.
Local: Suzano, São Paulo.
Incidente: Um dispositivo explosivo improvisado (DEI) foi colocado sobre uma das
poltronas de um avião Fokker 100 da companhia aérea TAM, durante o vôo entre as
cidades de São José dos Campos e São Paulo. O artefato explodiu e causou uma
ruptura da carcaça do avião, na região anterior à turbina direita deste avião. A
descompressão rápida expandiu o dano original, arremessando ao ar parte de
revestimentos, bancos e estruturas da nave. Junto com estas foi também lançada ao
50
BISTERÇO, Maristela Guizardi; LOCATELLI, Lys Rosita Boeira. Atentados com uso de explosivos:
gerenciamento da crise. Monografia (conclusão do curso). Brasília. Academia Nacional de Polícia e Fundação
Getúlio Vargas, 2005.
58
ar uma vítima, que estava sentada ao lado da janela e atrás da poltrona onde foi
colocado o dispositivo. Restou provado que o artefato foi colocado por um
passageiro sentado na fileira anterior ao dispositivo. Os exames na aeronave ficaram
a cargo do Setor de Criminalística da Polícia Federal em São Paulo, em conjunto
com o Centro Técnico Aeroespacial – CTA, enquanto o corpo da vítima e sua
indumentária foram examinados respectivamente pelo Instituto Médico Legal e
Instituto de Criminalística do Estado de São Paulo. Esta última agência, pressionada
pela mídia e a empresa aérea, apresentou o Laudo referente aos exames nas roupas
da vítima em curto prazo e com resultados equivocados, divergindo dos exames que
ainda estavam sendo realizados pelos peritos da Polícia Federal, juntamente com os
engenheiros da Aeronáutica. O referido Laudo e as manifestações açodadas daquele
órgão estatal na mídia, conduziam a investigação para a utilização de uma bomba
altamente sofisticada que estaria junto ao corpo da vitima, ou seja, suicídio. Quando
foi efetivamente apresentado o autor do delito, o passageiro da poltrona anterior ao
local onde foi assentado o artefato explosivo, um ex-professor, mesmo
fundamentado em provas cabais, o emocional popular já tinha dado o seu veredicto.
Lições Aprendidas: As agências, departamentos, laboratórios, servidores e
indivíduos envolvidos no processo de apuração de um atentado, necessitam
comunicarem-se uns com os outros e compartilhar métodos, informações ou dados,
questionando-se e complementando-se, sem prevalecer vaidades políticas ou
interesses escusos particulares que prejudicam ou atrasam a solução do incidente.
Relacionamentos dentro e entre as instituições de segurança pública devem ser
desenvolvidos para facilitar o atendimento aos ataques a bomba.
2.7. Reincidência de bombas na UFRRJ (1997/2008)
Bombas colocadas por alunos em estabelecimentos de ensino de todos os níveis
possuem várias motivações e suas ocorrências são mais comuns do que aparentam,
principalmente nas vésperas de feriados e de finais de semana. O presente relato não possui
grande distinção dos vários outros pelo Brasil. Entretanto, justamente por seguir “a regra”,
confirmada ainda pela repetição de evento similar na mesma instituição, é que o torna
pertinente, servindo de ilustração para mais uma forma de violência com explosivos.
O fato ocorreu no dia típico, uma sexta-feira, mais exatamente em 29 de agosto de
1997, na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Outra característica também
comum são os locais eleitos. Neste caso específico, o artefato foi posto em um dos quatro
boxes sanitários do banheiro masculino do refeitório. É o tipo de local onde o acesso é
franqueado a todos e se tem necessariamente a privacidade preservada facilitando a atuação
do delinqüente. Não houve danos à integridade física, somente danos materiais, o que
também, felizmente, costuma também ser o mais comum. Com impacto, a explosão danificou
o teto do banheiro e chegou a arrancar a porta do referido boxe51.
51
Informação com base no registro de ocorrência nº 184/97 do plantão da criminalística da Polícia Federal do
Rio de janeiro.
59
Onze anos depois, no dia 13 de novembro de 2008, no mesmo campus universitário,
outro episódio envolvendo explosivos alterou a rotina da UFRRJ, conforme o trecho
transcrito do livro de ocorrências:
Registro para os devidos fins que às 09:30h o servidor ROSINALDO ALVES DA
SILVA – Chefe do SETOR DE RESIDÊNCIA ESTUDANTIL do DECANATO DE
ASSUNTOS ESTUDANTIS desta UFRRJ, comunicou-se via telefone com esta
DGV, solicitando-nos para comparecermos ao M-3, pois no local, por volta das
06:00h foram detonados diversos explosivos. Imediatamente atendemos ao chamado
do servidor. Constatamos que os artefatos explosivos foram detonados no corredor
do 2º andar do M-3, onde danificaram o reboco da parede e do teto do corredor e
estilhaçou o vidro das janelas do banheiro. Constatamos também que jogaram um
explosivo de uma das janelas do referido alojamento que atingiu o auto que estava
estacionado ao lado. Este auto – VW modelo GOL – cor PRETO – Placa
LBX8958/Miguel Pereira/RJ é de propriedade do Aluno ALAN DE BONI COSTA
– 2005035001-5 – morador do M-3 311-B. O corredor do Alojamento foi
imediatamente isolado e mantido sob vigilância.52
Tanto o alojamento quanto o veículo, segundo a conclusão dos peritos que os
examinaram, foram alvos de artefatos explosivos (Figura 23). Na explosão que ocorreu no
alojamento, os vestígios indicaram a utilização de tubo de PVC com pólvora confinada, as
denominadas pipe-bomb. Os prejuízos foram materiais, mas certamente causariam graves
lesões, caso houvesse pessoas próximas, conforme se constata pelos danos causados.
Figura 23: epicentros das explosões ocorridas na UFRRJ (2008).
Fonte: PCF Bruno Rebouças Dalston.
52
Livro da Divisão de Guarda e Vigilância da UFRRJ, Parte de Serviço 044, item III, do dia 13 de novembro de
2008.
60
Os colégios possuem também um número muito grande de denúncias falsas de
existência de bombas, ou mesmo de simulacros. O objetivo na maior parte dos casos é de
interromper as aulas, a não realização de provas, ou simplesmente a saída mais cedo para um
feriado. Para tanto, valem-se do pânico que normalmente causam nos diretores e professores
das escolas. Medidas simples, como a não interrupção das aulas antes da devida checagem da
real ameaça, minimizam essas ocorrências. Entretanto não se pode descartar a real
possibilidade do intuito oculto de se testar o sistema de segurança visando identificar as
fragilidades, daí a necessidade de sempre se registrar e investigar esses tipos de ocorrências.
2.8. Atentado as torres da Embratel e de Furnas – (1998)
A seqüência dos eventos a serem descritos neste tópico impressiona pela técnica
empregada e também pelos riscos impostos aos setores de energia e telecomunicações, vitais a
qualquer nação. Atribui-se os atentados a uma represália à privatização do sistema Telebrás,
cujo leilão se deu no dia 29 de julho de 1998.
O primeiro episódio ocorreu em 27 de julho, com duas explosões praticamente
simultâneas, às 6h00 da manhã, em torres do sistema de telecomunicações da Embratel. Uma
explosão ocorreu em Lages e outra em Borel, ambas no Estado de Santa Catarina, distantes
aproximadamente 70 km. A sincronização das explosões foi possível com a utilização de
bombas temporizadas, com relógios digitais e circuitos elétricos de detonação. O explosivo
utilizado foi um alto explosivo sob a forma de cordel detonante (nitropenta).
Alguns meses depois, mais precisamente no dia 13 de setembro, novamente torres
foram alvos de ataques. Desta vez, torres de transmissão de energia de Furnas Centrais
Elétricas. Uma torre de aproximadamente 43,5 metros de altura, pesando cerca de 9 toneladas,
caiu devido a uma explosão que ocorreu por volta das 2h00 na cidade de Nova Tebas no
Paraná, atingindo uma das linhas de transmissão de energia da usina de Itaipu. Próximo desta
torre, a uns 80 metros de distância, outro artefato enterrado na base de outra torre, por sorte
não detonou (Figura 24). Com a retirada desse segundo artefato, os peritos puderam estudar o
modus operandi, a assinatura do terrorista.
Foram constatados vários pontos comuns ao modo de atuação do episódio de Santa
Catarina. Neste artefato foi empregada também uma massa explosiva de cartuchos de
dinamite, visando gerar efeito suficiente para derrubar a torre, diferentemente das torres de
telecomunicação onde os alvos foram os cabos de transmissão.
61
Figura 24: torre de energia de Nova Tebas onde uma das bombas foi localizada (1998).
Fonte: PCF Aggeu Lemos Bezerra Neto.
Poucos dias depois, antes mesmo que as investigações pudessem avançar, a equipe
de peritos da Polícia Federal foi novamente acionada, por terem encontrado um terceiro
artefato. Este fato ocorreu no dia 17 de setembro, há aproximadamente 30 km do local
anterior, no município de Pitanga – PR. O artefato foi neutralizado com sucesso.
Comprovou-se pela análise dos vestígios recolhidos nos locais que todos os eventos
estavam relacionados. Não se chegou até hoje aos autores, mas certamente eram pessoas com
domínio do assunto e que atacaram pontos estratégicos. Utilizaram dispositivos eletrônicos
temporizados e dimensionaram as cargas para atingir com êxito os objetivos de interrupção da
transmissão de dados e de energia. Felizmente o trabalho policial realizado evitou um desastre
maior que atingiria não só a região sul, mas certamente refletiria em todo o Brasil, uma vez
que o sistema de energia do país é interligado e as linhas transmitiam energia de Itaipu, usina
vital para o bom funcionamento do sistema. Com apenas a derrubada de uma torre, estimou-se
um prejuízo de aproximadamente R$ 2.133.000,0053.
2.9. Atentado atribuído a skinhead em São Paulo (2000)
Um caso de grande repercussão nacional foi o envio de um pacote pelo serviço
SEDEX dos Correios, com uma bomba ao funcionário da Anistia Internacional de São Paulo,
ao professor José Eduardo Bernardes da Silva. Como remetente, constava o nome da
53
Dados estimados pela Eletrobrás.
62
Congregação Israelita Paulista. O que foi inicialmente noticiado relatava que o professor teria
desconfiado e por isso fez uma abertura pelo lado de trás do pacote, acionando em seguida o
GATE. Verificou-se que o artefato era composto por tubos de PVC, envolto em fita adesiva,
apresentando nas extremidades o desenho da suástica (Figura 25). Acreditou-se então que era
uma ameaça ofensiva de grupos radicais neonazistas ou intolerantes, tais como os skin-heads.
Após o GATE contra carregar (desarticular o artefato com a utilização de outros
explosivos), constatou-se que era um simulacro e não uma bomba de verdade. Com a grande
repercussão na imprensa, o funcionário pediu asilo na Espanha, alegando que o fato era contra
a sua pessoa.
Figura 25: artefato recebido pela Anistia Internacional (2000).
Fonte: GATE/SP.
Depois, com o aprofundamento das investigações, o inquérito policial deu uma
reviravolta no caso, concluindo que o autor do artefato foi o próprio destinatário do pacote,
que teria montado toda a estória.
O objetivo era chamar atenção para si e conseguir o asilo político, o que explica a
grande divulgação que o caso teve (o professor teria chamado a imprensa). Entre outras
provas, os peritos da Polícia Civil de São Paulo encontraram as impressões digitais do
professor dentro do artefato, local onde só quem montou poderia ter manuseado.
Assim, mais uma vez, fica demonstrado que o uso criminoso dos explosivos pode ter
várias motivações e finalidades, o mesmo valendo para os simulacros.
63
2.10. Atentado ao fórum de Barra Funda São Paulo - SP (2000)
Análogo ao que ocorre nos colégios, as ameaças de bombas também são utilizadas
para, por exemplo, interromperem as atividades judiciárias. Em 14 de julho de 2000, uma
bomba caseira explodiu no banheiro, local comum para esse tipo de ocorrência, do Fórum
Criminal, localizado no distrito de Barra Funda, São Paulo.
Como conseqüência, houve a interrupção dos trabalhos e o banheiro ficou
danificado. Felizmente a explosão não fez vítimas.
2.11. Carro-bomba no fórum de Barra Funda, São Paulo - SP (2002)
Novamente o Fórum de Barra Funda, em São Paulo, foi alvo do uso criminoso de
explosivos. Dessa vez a destruição seria bem maior, não fosse a competência do GATE em
resolver o problema, face à grande quantidade de explosivos utilizada. O fato ocorreu no dia 8
de março de 2002, com o abandono de um carro no estacionamento do fórum. O GATE isolou
o local e realizou os procedimentos de desativação (Figura 26).
Figura 26: aproximação dos policiais ao carro-bomba (2002).
Fonte: GATE/SP.
64
Figura 27: dispositivo explosivo do carro-bomba de Barra Funda (2002).
Fonte: GATE/SP.
No interior do veículo (Figura 27), mais precisamente na mala do carro, havia cerca
de 40 kg de explosivos industrializados, tipo emulsão, com grande aplicação comercial pelo
seu uso comum em pedreiras, além de um reforçador (booster) de pentolite (alto explosivo). O
acionamento que seria feito remotamente, felizmente não ocorreu.
A utilização de veículos em atentados é uma forma eficiente em virtude da
dissimulação proporcionada, além da grande quantidade de explosivos que esses veículos
comportam, por isso é um meio preferido pelos grandes grupos terroristas. Nesse caso
específico, causa apreensão por ter sido uma ação atribuída ao PCC, Primeiro Comando da
Capital, grupo do crime organizado originário de São Paulo.
2.12. Carro-bomba em Taboão da Serra - SP (2004)
Mais um caso de carro-bomba, mas com detalhes que demonstram outra forma de
utilização. Desta vez, o objetivo não era necessariamente o alvo próximo ao veículo, como no
caso anterior.
Um veículo roubado no dia 23 de setembro de 2004, modelo Apollo da Volkswagen,
foi localizado na madrugada do dia 29 do mesmo mês, estacionado em frente à Delegacia
Seccional de Taboão da Serra (Figura 28). O veículo chegou a ser apreendido pela polícia e
seu dono foi acionado para levar o carro. Entretanto, ainda pela manhã ao buscá-lo, o dono
65
percebeu a existência de fiação suspeita no piso do carro e novamente o GATE entrou em
ação.
Figura 28: carro-bomba de Taboão da Serra (2004).
Fonte: GATE/SP (2004).
Havia 12,8 kg de explosivo comercial tipo emulsão, distribuídas em quase 100
bisnagas, explosivo do mesmo tipo descrito no caso anterior, além de espoletas convertidas
para acionamento elétrico e cordéis detonantes. Os explosivos estavam escondidos pelo forro
das portas do motorista e do passageiro (Figura 29), e como foi realizada apenas uma perícia
de rotina para veículos apreendidos, os mesmos não foram inicialmente detectados.
Figura 29: dispositivo explosivo localizado no interior do veículo (2004).
Fonte: GATE/SP.
66
O sistema de acionamento montado, e que por sorte não funcionou, era elétrico por
meio de contato direto com a bateria, ativado pela chave do carro.
Assim, diferentemente do caso anterior, este carro-bomba visava atingir também a
pessoa que fosse tentar ligá-lo. Como a quantidade de explosivos era muito grande,
desproporcional para visar à morte de apenas uma pessoa, provavelmente tinha como alvo a
destruição de edificações ou mesmo a criação de pânico.
O alvo provável seria a delegacia, o que faz novamente pensar numa organização
criminosa visando atingir a instituição policial.
A outra hipótese, menos provável, é de que o veículo foi abandonado, talvez por
medo de ser apreendido, por desistência dos delinqüentes de irem adiante com o seu intuito
inicial.
2.13. Explosão no Rio Grande do Sul (2008)
Na manhã do dia 09 de junho de 2008, a rotina de uma padaria em Porto Alegre foi
drasticamente interrompida após uma forte explosão, causando pânico e terror, chocando a
capital gaúcha.
Relatos iniciais, colhidos pela investigação, indicam que um cliente entrou na padaria
por volta das 9h10min e solicitou um café. Enquanto aguardava, passou a mexer em sua
bolsa, do tipo universitária e, logo após, saiu da padaria dizendo que ia se encontrar
rapidamente com uma pessoa, deixando a tal bolsa sobre uma das mesas.
Em seguida, um dos sócios presentes na padaria recebe um telefonema com uma voz
masculina avisando que havia uma bomba no local. Não acreditando na ameaça, o sócio
desliga, mas a pessoa insiste, ligando dessa vez para o outro número de telefone fixo do
estabelecimento comercial. As duas linhas tinham identificadores de chamada, e ao perceber
que era o mesmo número, o sócio da padaria desligou o telefone ignorando a ameaça,
acreditando que se tratava de um trote.
Infelizmente, a ameaça era real e minutos depois a bolsa deixada sobre a mesa
explode, causando grande destruição (Figura 30) e ferindo gravemente uma senhora idosa
além de duas outras pessoas.
67
Figura 30: cenário da padaria após a explosão (2008).
Fonte: GBE/RS.
Durante o exame do local, os peritos coletaram diversos fragmentos, incluindo
componentes de um aparelho celular, o qual provavelmente foi utilizado para acionar o
artefato explosivo. A recuperação do chip telefônico (Figura 31) foi fundamental para as
investigações, permitindo identificar o número da linha e com isso fazer o rastreamento das
ligações efetuadas e recebidas, cruzando com o número usado nas ameaças.
Figura 31: fragmentos recolhidos da bomba utilizada na padaria (2008).
Fonte: GBE/RS.
68
A conclusão da investigação culminou na denúncia pelo Ministério Público Estadual
do Rio Grande do Sul de três pessoas. Uma seria a pessoa que teria colocado a bomba no
local e feito o acionamento, a segunda, um ex-presidiário a quem foi encomendado o crime e
por último um dos sócios da padaria.
O motivo identificado foi a tentativa de receber uma apólice de seguro. Assim, este
caso ilustra bem o uso criminoso dos explosivos na modalidade fraude. A insistência da
pessoa que telefonou em afirmar que havia uma bomba se deve a intenção de não se inserir
em outras modalidades criminosas como homicídio, cuja pena é bem maior.
69
3. O PANORAMA BRASIL A PARTIR DO RIO DE JANEIRO
A obtenção de subsídios visando avaliar a situação brasileira em relação à violência
praticada com o uso dos explosivos possui uma ampla gama de caminhos, mas de resultados
imprevisíveis. Para aumentar a chance de êxito, selecionou-se também, baseado nas
entrevistas realizadas, as possíveis instituições detentoras desses dados, preferencialmente as
com representação na cidade do Rio de Janeiro. Destarte, o problema que é nacional, foi
enfocado a partir dos resultados do Estado do Rio de Janeiro.
3.1. Inexistência de estatísticas oficiais
Constatou-se que inexistem estatísticas oficias específicas sobre o assunto. Muitas
informações são perdidas. Há situações em que as ameaças, que aparentemente não geram
prejuízos imediatos, nem sequer são registradas. É o que normalmente acontece nos casos das
falsas ameaças ou dos simulacros de bombas. Estas situações, além de impossibilitar sua
visibilidade pelos gestores de segurança, também facilitam para que os objetivos dos
delinqüentes sejam alcançados. Por trás de uma inocente brincadeira pode se ocultar uma
estratégia de verificação dos planos de segurança, visando vencê-los numa próxima
oportunidade, dessa vez com artefatos reais. Os registros são fundamentais para que as
investigações tenham êxito.
3.2. Fontes próprias de dados
Uma vez constatada a inexistência de estatísticas oficiais, ou ainda de órgãos que
centralizem as informações, se buscou onde estão ou deveriam estar os registros
administrativos das ocorrências.
Considerando que o uso ilícito de explosivo, principalmente enquanto forma de
violência, é crime tipificado em vários dispositivos legais (ANEXO 1), cabe então ao poder
de polícia do Estado atuar na sua repressão e combate, fazendo os devidos registros. Logo, os
boletins de ocorrências são fontes próprias para obtenção dos dados almejados. Entretanto,
pela especificidade e periculosidade das atividades relacionadas com bombas e explosivos, é
natural que as polícias tenham destacamentos especializados para essas ocorrências. No caso
da Polícia Federal há o chamado GBE – Grupo Especializado em Bombas e Explosivos e na
Polícia Civil o Esquadrão Antibombas. Os livros de registros de ocorrências desses grupos
especializados são outras possíveis fontes de dados. E por fim, há também no Estado do Rio
70
de Janeiro, vinculado ao governo estadual, um instituto próprio para pesquisa e análise
criminal, o ISP – Instituto de Segurança Pública.
3.2.1. Boletins de ocorrências das delegacias
Na teoria, todas as ocorrências que provocam os acionamentos dos grupos
especializados no combate a bombas e explosivos deveriam ter o devido registro nas
delegacias, pois são na essência crimes, mesmo as falsas ameaças (ANEXO 1). Na prática, os
registros nem sempre são feitos. Existem acionamentos que podem não gerar os registros nas
delegacias, como por exemplo, os chamados diretos aos grupos especializados, que vão ao
local, fazem a vistoria e nada encontram, resolvendo a situação no local, e por não existir de
imediato qualquer ilícito, não é feito o registro na delegacia competente. A situação contrária
ocorre quando há o registro na delegacia e a situação se resolve sem a necessidade do
acionamento do grupo especializado, como por exemplo, quando há uma apreensão de
granadas e estas são encaminhadas às forças armadas para a devida destinação (destruição).
Os registros nas delegacias, os chamados boletins de ocorrências, ganharam,
enquanto fontes de informações, enorme importância a partir da implementação em 1999 do
Programa Delegacia Legal. Este programa consistiu numa verdadeira revolução no
monitoramento das atividades policiais, equipando as delegacias com infra-estrutura e
permitindo a informatização dos procedimentos por meio do preenchimento de formulários
padronizados, acessíveis às outras delegacias e demais órgãos interligados na rede,
aumentando a transparência. PAES54 (2006) destaca essa mudança no tratamento da
informação:
Isto é relevante, porque o Programa Delegacia Legal propõe-se a influir sobre a
apropriação particular por parte dos policiais dos recursos que são públicos. O
Programa Delegacia Legal propõe-se a mexer na rotina, na forma de produção do
trabalho e de tratamento das informações por parte da Polícia Civil. Em termos de
proposta, o programa dirige-se a uma tentativa de mudança consubstancial na
Polícia Civil, não só estética. Verifico que ao condensar as informações em sistema,
o PDL impõe três modificações cruciais na Polícia Civil: muda o potencial dos
registros das delegacias - os registros de todas as delegacias estão em uma base
comum de dados e podem ser pelos policiais pesquisada - integra as unidades
policiais isoladas e, por último, confere novo desenho às relações de poder.
54
PAES, Vivian Ferreira. A Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro: análise de uma (re) forma de governo na
Polícia Judiciária. 2006. 164f. Dissertação (Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e
Antropologia) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. p. 92.
71
Ressalta ainda SOARES55 (2000), um dos principais idealizadores do programa, a
importância do fluxo das informações:
Sobretudo, é a condição para o estabelecimento de comunicação permanente entre as
unidades policiais e os bancos de dados das instituições que compõem o campo da
segurança pública.
A qualidade de informações e o preenchimento dos registros são ilustrados com o
exemplo do ousado episódio de ataque a uma delegacia de polícia com uma bomba (Figuras
32, 33 e 34). Os dados identificadores foram propositalmente cobertos. Os demais campos
demonstram a essência do formulário, como a transparência das providências adotadas. É um
avanço em relação aos livros de ocorrência. Entretanto, não há campos para, por exemplo, os
resultados dos exames, prejudicando a análise qualitativa dos eventos.
Assim, principalmente nas delegacias legais, é interessante a coleta e filtragem dos
boletins de ocorrências das delegacias, por estes já seguirem uma padronização e também pela
facilidade da informatização. Contudo, esses dados precisam ser complementados por aqueles
oriundos dos técnicos e peritos que irão examinar os fragmentos (no caso das explosões) e os
próprios artefatos. Ou seja, os dados obtidos no trabalho realizado pelos grupos especializados
na neutralização e destruição dos artefatos explosivos e também nas perícias em locais pósexplosões podem alimentar a base de dados do registro de ocorrências das Delegacias Legais.
55
SOARES, Luiz Eduardo. Meu casaco de general: 500 dias no front da segurança pública do Rio de Janeiro.
São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 89.
72
Figura 32: cópia do registro de ocorrência nº 035-06347/2008da PC/RJ – parte 1.
73
Figura 33: cópia do registro de ocorrência nº 035-06347/2008da PC/RJ – parte 2.
74
Figura 34: cópia do registro de ocorrência nº 035-06347/2008da PC/RJ – parte 3.
75
3.2.2. Registros de ocorrências dos grupos especializados em explosivos
No caso do Rio de Janeiro, identificou-se a existência de duas instituições com este
mister: a Polícia Federal e a Polícia Civil, cada qual atuando conforme a sua competência.
Não se incluiu os grupos das forças armadas por estes atuarem mais especificamente na
desativação de engenhos militares falhados em seus campos de instruções de guerra.
Na Polícia Civil, dentro da estrutura da Coordenadoria de Recursos Especiais
(CORE) encontra-se o Esquadrão Antibombas, formando por policiais voluntários
selecionados e que passam por treinamentos específicos. Já na Polícia Federal, a atuação
compete ao Grupo Especializado em Bombas e Explosivos – GBE. Por ser relativamente
novo (oficialmente normatizado em 2004), o seu funcionamento ainda não está consolidado e
na ausência do GBE, cabe aos Peritos Criminais Federais, mormente aos plantonistas, a
responsabilidade pelo atendimento.
Nas duas instituições citadas, os registros das ocorrências são feitos manualmente,
lançados em livros que ficam a cargo das equipes de atendimento e que trabalham
normalmente em regime de plantão. As compilações desses dados, quando feitas, não seguem
uma padronização rigorosa e tampouco podem ser consideradas oficiais. São levantamentos
dos próprios funcionários, que os utilizam como instrumentos para demandas específicas, sem
compor um planejamento estratégico ou muito menos como ferramenta de gestão, além de
não existir uma interligação desses bancos, à exceção da troca de informações por contatos
pessoais.
Por não serem compilações padronizadas, optou-se por apenas exibir extratos, tais
como as mesmas são produzidas, demonstrando a riqueza de informações que são possíveis
de serem geradas e o potencial de utilização das mesmas.
Percebe-se que o mesmo trabalho realizado na modernização das delegacias de
polícia civil surtiria igual ou maior efeito se fosse implementado nos grupos especializados no
combate aos artefatos explosivos, dotando-os de uma infra-estrutura e de uma padronização
dos registros, facilitando a correta interpretação dos dados.
Do Esquadrão Antibombas, tem-se, por exemplo, para o mês de julho de 2007 os
seguintes dados (Figura 35):
76
Figura 35: amostra do banco de dados do Esquadrão Antibomba - PC/RJ.
É uma pequena amostra, mas demonstra claramente a enorme quantidade de artefatos
que são apreendidos pela Polícia Civil em todo o Estado do Rio de Janeiro. Nota-se a
existência de apreensões tanto de materiais industrializados (granadas, morteiros), como de
materiais artesanais (bombas, artefatos caseiros). São materiais nacionais e estrangeiros. Outra
informação interessante é a localização das delegacias onde as apreensões foram realizadas.
Com esse dado, é possível fazer um estudo da distribuição geográfica da utilização desses
artefatos no Estado do Rio de Janeiro.
O que mais chama atenção é a última coluna, referente ao campo observação. Nela
estão resumidas informações inseridas mais no intuito de ressaltar aos usuários desse banco,
os próprios componentes do Esquadrão Antibomba, as características diferenciadoras ou
típicas de um determinado material. Analisadas isoladamente, essas características perdem
muito do seu valor enquanto meio de investigação.
Como exemplo, os artefatos caseiros que receberam a denominação “tipo pedaleira”
no campo observação. São granadas artesanais e que foram classificadas pela semelhança, ou
mesmo pela utilização em seu corpo externo de peças de motocicletas, os apoios para pés, as
77
chamadas pedaleiras. Por possuírem a sua superfície externa recartilhada, acabam
potencializando o efeito de fragmentação da explosão.
Em uma primeira leitura, essas informações podem não indicar o seu verdadeiro
potencial como instrumento de pesquisa, mas quando são confrontadas com as diversas
apreensões que podem receber a mesma classificação, ou seja, “tipo pedaleira” (Figura 36),
não só no Estado do Rio de Janeiro, como também em todo o Brasil, e ainda em épocas
diferentes, o resultado pode ser surpreendente. A similaridade pode traçar o perfil do seu
fabrico, chegando a um modus operandi, que permita rastrear a origem de componentes e
insumos, e até determinar a autoria. Para tanto, é necessário que um conjunto mínimo de
informações circule nos órgãos próprios de segurança, sendo ideal a utilização de imagens.
Figura 36: granadas artesanais "tipo pedaleira" (2007, 2009, 2003, 2004).
Apreensões de granadas semelhantes por instituições distintas. No sentido horário começando pela superior
esquerda: Esquadrão Antibombas da PC/RJ; idem; GATE/SP; PF/BA.
Fontes: Comissário de Polícia Carlos Alberto Maulaz de Sá (2007); Inspetor de Polícia Luiz Fernando Argento
Tinoco (2009); PCF Aggeu Lemos Bezerra Neto (2003); PCF Antônio Luís Brandão Franco (2004).
78
Em relação ao GBE/RJ, o mesmo também não possui uma estatística oficial e
tampouco o modo de compilação dos dados é padronizado. A produção de relatórios visa
atender demandas específicas e a fonte dos dados são os livros manuscritos de ocorrências.
Durante um período experimental de atuação de um grupo embrionário que acabou não se
efetivando, foram anotadas as seguintes ocorrências durante o período aproximado de três
meses (Figura 37):
Figura 37: amostra das ocorrências atendidas pelo GBE/RJ.
Nota-se que embora os dois grupos possuam basicamente a mesma função, em
decorrência das atribuições distintas dos órgãos à que estão subordinados, as casuísticas
possuem enfoques diferentes, além de a freqüência ser bem maior na Polícia Civil. No caso da
Polícia Federal, responsável pela segurança de Chefes de Estados e outras autoridades, a
demanda principal recaí nas vistorias de segurança, onde os especialistas agem
preventivamente na busca de possíveis artefatos explosivos.
79
A forma resumida da informação também é prejudicial neste caso, já que a
experiência e o aprendizado resultantes de uma operação acabam não sendo repassados.
Existem outros instrumentos, como os relatórios de missão, entretanto, sem a devida
padronização não há como se buscar os dados de forma rápida e eficiente, mesmo que sejam
informatizados.
3.2.3. Instituto de Segurança Pública
O Instituto de Segurança Pública (ISP) foi criado pela lei nº 3329 de 28 de dezembro
de 1999, como uma autarquia que visa basicamente às pesquisas e análises criminais. O ISP
se propõe a produzir relatórios estatísticos na área de segurança pública, como definido pelo
próprio instituto:
Através do Núcleo de Pesquisa em Justiça Criminal e Segurança Pública (NUPESP),
o ISP produz relatórios estatísticos sobre o sistema de segurança pública estadual
com o objetivo de analisar os problemas que mais afetam a população e assim
avaliar o desempenho das ações de segurança no Estado.
Alguns dos produtos regulares do NUPESP são: as publicações de incidências
criminais no Estado do RJ; a divulgação do boletim mensal de monitoramento e
análise; quadro de locais e horários de incidência criminal; avaliação de risco e
indicação de linhas de ônibus para maior policiamento; monitoramento diário de
crimes considerados como prioridades pela Secretaria de Estado de Segurança
(homicídio doloso, roubo de veículos, furto de veículos e crimes de rua – roubo de
celular, roubo a transeunte, roubo em coletivo); monitoramento de padrões regionais
e das Áreas Integradas de Segurança Pública; elaboração e análise de pesquisas
voltadas para o tema Segurança (dados sobre vitimização, roubo de veículos,
homicídio doloso, crimes de rua, furto de veículos) e ainda apresentação de
relatórios temáticos (criança e adolescente, dossiê mulher, e idoso)56.
Infelizmente o ISP não tem abordado especificamente a questão de bombas e
explosivos, muito embora possua total estrutura para avaliar os boletins de ocorrências das
delegacias e também os acionamentos do Esquadrão Antibomba da Polícia Civil do Rio de
Janeiro. O que tem sido realizado é um levantamento numérico das apreensões (Figura 38),
sem a preocupação de coletar os demais dados que podem caracterizar o artefato ou a
ocorrência.
A análise quantitativa permite aos órgãos de administração visualizar o crescimento
do problema, mas não dá margem a se buscar soluções mitigadoras específicas. Como é
coletado apenas o número de apreensões, não é possível a partir do dado existente no ISP
fazer emergir as importantes características existentes sob esse número. O único caminho é o
retorno às fontes originais, ou seja, aos boletins e registros das delegacias e do Esquadrão
Antibomba, refazendo-se o trabalho de coleta.
5656
Descrição da própria instituição, disponível em: <http://www.isp.rj.gov.br/Conteudo.asp?ident=42>. Acesso
em: 25 jun. 2009.
80
Figura 38: gráfico do número de apreensões por ano no Estado do Rio de Janeiro (2008).
Fonte: ISP, Balanço das incidências criminais e administrativas no Estado do Rio de Janeiro.
De qualquer forma, a estrutura criada e os levantamentos realizados representam uma
evolução, e como lembra DUARTE57, é um processo de modernização que necessariamente
passa por várias etapas. Assim sendo, o ponto a ser almejado é a possibilidade da análise
qualitativa e circulação apropriada da informação, dando-lhe mais utilidade.
3.3. Fontes alternativas de dados
Além das fontes mais óbvias e diretas, há outras possibilidades que podem
complementar, retificar, ou ratificar os dados obtidos de forma própria. Seguem as que foram
vislumbradas durante o processo de pesquisa.
3.3.1. Registros hospitalares
Uma interessante fonte de dados é a rede hospitalar, principalmente as unidades de
emergência, que, à guisa do que acontece quando há feridos por arma de fogo, deveriam
proceder obrigatoriamente uma notificação no caso de um paciente ferido por explosão.
Excluem-se desse universo, evidentemente, os casos de ferimento ou morte causados por
explosões mecânicas, como as que ocorrem em caldeiras e linhas pressurizadas, ou mesmo os
acidentes domésticos com panelas de pressão.
57
DUARTE, Mário Sérgio de Brito (coord.). A análise criminal e o planejamento operacional. Série Análise
Criminal, v. 1. Rio de Janeiro: Riosegurança, 2008.
81
Utilizando-se a base de dados do Departamento de Informática do Sistema Único de
Saúde – DATASUS58, e se restringindo aos casos noticiados de morbidade hospitalar devido
às causas externas com o Código Internacional de Doenças (CID) – X96 (agressão por meio
de material explosivo) no ano de 2008, é possível notar um número razoável de internações
(Tabela 2).
Tabela 2 – Morbidade Hospitalar do SUS com CID X96, ano de 2008.
Região/UF
Região Norte
Internações
5
.. Amazonas
1
.. Pará
2
.. Tocantins
2
Região Nordeste
7
.. Piauí
2
.. Ceará
2
.. Rio Grande do Norte
1
.. Bahia
2
Região Sudeste
8
.. Minas Gerais
1
.. Rio de Janeiro
3
.. São Paulo
4
Região Sul
2
.. Paraná
1
.. Rio Grande do Sul
1
Total
22
Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS).
Além do CID X96, há o CID W40 que se refere aos casos referentes à explosão de
outros materiais, o que pode abranger as explosões não por agressão com explosivos, mas que
contemplem situações que envolvam materiais explosivos (acidente de trabalho com uma
granada apreendida, por exemplo). Outras situações também de explosão, porém que não se
enquadrariam na situação pesquisada, seriam o CID W35 (explosão ou ruptura de caldeira),
CID W36 (explosão ou ruptura de cilindro de gás), CID W37 (explosão ou ruptura de
pneumático, tubulação, mangueira, pressurizados), CID W38 (explosão ou ruptura de outros
aparelhos pressurizados especificados) e o CID W39 (queima de fogos de artifício)
Com o CID W40, o número de internações é bem maior, considerando o mesmo
período de avaliação (ano de 2008), passando dos 22 casos para um total nacional de 988
58
Disponível em: <http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sih/cnv/fiuf.defdatasus.gov.br>. Acesso em: 28
ago. 2009.
82
(Tabela 3), sendo que destes, o Estado do Rio de Janeiro responde por 74,70% dos casos (738
registros).
Tabela 3 – Morbidade Hospitalar do SUS com CID W40, ano de 2008.
Região/UF
Região Norte
.. Rondônia
Internações
7
1
.. Acre
2
.. Pará
4
Região Nordeste
.. Maranhão
106
21
.. Piauí
4
.. Rio Grande do Norte
2
.. Paraíba
1
.. Alagoas
2
.. Sergipe
.. Bahia
1
75
Região Sudeste
843
.. Minas Gerais
49
.. Rio de Janeiro
738
.. São Paulo
56
Região Sul
29
.. Paraná
.. Santa Catarina
6
8
.. Rio Grande do Sul
15
Região Centro-Oeste
3
.. Mato Grosso do Sul
2
.. Mato Grosso
1
Total
988
Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS).
Mais uma vez, o simples número não permite entender o fenômeno do uso ilícito e
violento dos explosivos, não pela possível existência de casos codificados incorretamente ou
não notificados, considerando que envolve toda a rede SUS. O problema reside na ausência de
uma narrativa do evento, ou pelo menos de dados que o relacionem com o devido
procedimento legal vinculado, já que o fato por si só, em tese, trata-se de um crime.
De qualquer forma, a estrutura de notificação existe e é abrangente, o que usada
corretamente, poderia alimentar um banco único de dados sobre explosivos.
83
3.3.2. Registros administrativos dos Correios
Uma das formas utilizadas para se obter êxito nas ameaças de bombas é a via postal.
A segurança do anonimato e a eficiência da entrega são características que atraem os
delinqüentes. Destarte, as empresas de entregas postais representam uma preciosa fonte de
dados para se estudar o fenômeno.
Infelizmente, a inexistência de uma cultura de registros ou de preservação destes,
impede a utilização dessa fonte em sua totalidade. Consultando-se a Empresa Brasileira de
Correios e Telégrafos (ECT), no setor responsável pela análise de eventos dessa natureza59,
inicialmente obteve-se tão somente a ilustração a seguir (Figura 39), onde nota-se o registro
de 41 ocorrências no período de 1972 a 2007, com o Distrito Federal liderando com 8
ocorrências.
Figura 39: distribuição nacional de ocorrências de bombas nos Correios (2007).
Fonte: Auditoria interna – Audit/ECT.
Uma das possíveis explicações para uma maior concentração no Distrito Federal está
na motivação política, despertando o interesse pela capital do país, por reunir os órgãos
centrais da administração pública nas três esferas do poder, além da concentração de
embaixadas.
É o caso, por exemplo, do envio da carta bomba de 25 de setembro de 1972 a
embaixada israelense em Brasília, uma das muitas enviadas no mundo inteiro pelo grupo
terrorista Setembro Negro. O destinatário era o embaixador Itzhak Harakvi e foi postada de
59
Auditoria interna – Audit/ECT – SBN, Q-1 Bloco A, 20º - Norte. Andar – Brasília/DF.
84
Amsterdã, Holanda (Figura 40). A carta bomba foi desativada por peritos do Instituto
Nacional de Criminalística, órgão da Polícia Federal60.
Figura 40: carta-bomba, Brasília (1972).
Fonte: PCF João Dantas de Carvalho.
Dois dias depois, no Rio de Janeiro, uma outra carta-bomba foi desativada, esta
enviada ao Sr. Hana Olamy, no bairro do Largo do Machado. Os especialistas da Secretaria de
Segurança Pública do Estado da Guanabara, atual Esquadrão Antibomba foram os
responsáveis pela desativação.
Diante dos vários relatos de casos, foi feita nova solicitação de mais informações
quando então foi disponibilizado um arquivo com uma tabela com os registros das
ocorrências relativas à ECT. Pela tabela se confirma a distribuição nacional de ocorrências
anteriormente comentada e acrescenta-se alguns dados como data, origem, destino e algumas
observações (Figura 41).
São preciosas informações que deveriam ser mais completas e melhor aproveitadas,
servindo inclusive de estudo para identificação de autoria, análise de como proceder, pois
como citado no exemplo das cartas do grupo Setembro Negro, houve uma repetição na forma
de atuar, o que uma vez identificado, certamente facilitaria o trabalho policial.
60
Conforme relatos obtidos nas entrevistas.
85
Figura 41: registro existente das ocorrências de bombas pela ECT (2006).
Fonte: Auditoria interna – Audit/ECT.
86
3.3.3. Registros administrativos da INFRAERO
A Empresa Brasileira de Infra-Esrutura Aeroportuária – INFRAERO é a responsável
pela administração dos aeroportos brasileiros, e como tal possui o dever institucional de zelar
pela segurança da aviação comercial. Atentados a aeroportos e aeronaves são os que mais
causam impacto na mídia internacional, e por isso são alvos preferências do terrorismo, até
pela possibilidade de atingir diversos cidadãos ou empresas de um determinado país no solo
ou na passagem por outro país. Daí a necessidade de uma regulamentação pactual entre as
nações visando o mínimo de segurança.
A organização que fica à frente dessa regulamentação internacional é a OACI
(Organização de Aviação Civil Internacional) sediada em Montreal, Canadá. O Brasil
participa do conselho da administração da OACI desde a sua fundação.
Nesse contexto, a INFRAERO tem papel fundamental. Além de estabelecer
condições para o fiel cumprimento das regulamentações da OACI, são vitais que se registrem
as ocorrências relativas a bombas e ameaças, mesmo que estas não resultem em qualquer
dano.
Após consulta realizada com a gerência de segurança, da mesma forma como foi
feito com a ECT, obteve-se uma tabela geral com os eventos ocorridos nos aeroportos, dignos
de registros no entendimento da INFRAERO (Figura 42). Para o objetivo desta pesquisa,
procurou-se manter a tabela da forma mais fiel que a mesma foi recebida, à exceção das linhas
com ocorrências que não são relativas a bombas e explosivos que foram suprimidas.
87
Figura 42: registro da INFRAERO sobre ocorrências de bombas (2008).
Fonte: INFRAERO.
88
3.3.4. Instituto Médico-Legal
Outra possível fonte de dados reside nos institutos de medicina-legal. Esta assertiva
decorre de que há casos em que vítimas fatais podem não estar associadas imediatamente a
explosões, mas com o exame cadavérico pode se chegar a esta conclusão face às lesões
características. O mesmo vale para quando se precisa comprovar para fins legais a existência
de lesões em pessoas vivas. São os peritos médicos legistas que possuem essa competência.
No caso do Rio de Janeiro, há o Instituto Médico Legal Afrânio Peixoto (IMLAP),
subordinado ao Departamento de Polícia Técnico-Científica (DPTC), que por sua vez
responde à Chefia de Polícia Civil, dentro da estrutura da Secretaria de Estado de Segurança
Pública. O IMLAP realiza pesquisas científicas por meio de um Centro de Estudos (CE) e
possui inclusive um Comitê de Ética em Pesquisa – CEP, criado em 18 de outubro de 2004.
Assim, é factível que essa estrutura, devidamente provocada, possa atender a uma demanda
específica para a geração de informação dos casos de exames onde o resultado aponte para a
utilização de explosivos.
89
4. AS RESPOSTAS DA SEGURANÇA PÚBLICA
O uso ilícito de bombas e explosivos é um problema essencialmente de segurança
pública. Entender a competência de cada ente e como eles se integram faz parte do presente
estudo. Esta competência se refere a como esses entes deveriam ser, conforme está previsto
nos normativos. Não se pretende explorar o que de fato ocorre, pois o que se busca é a
compreensão das respostas que o Estado previu como oposição ao problema do uso ilícito de
bombas e explosivos.
4.1. A segurança pública nacional
A resposta a ser dada à ameaça com bombas e explosivos necessariamente recai no
estudo da segurança pública, suas implicações e bem como seus desdobramentos. A
relevância da segurança pública é de tal ordem que coube ao maior ordenamento jurídico
nacional, ou seja, a Constituição da República Federativa do Brasil, um capítulo exclusivo
(Título V, Capítulo III) para tratar do tema. No primeiro artigo deste capitulo está implícita a
definição de segurança pública e a exposição de seus objetivos.
Art. 144 – A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de
todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das
pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
polícia federal
polícia rodoviária federal
polícia ferroviária federal;
polícias civis;
polícias militares e corpos de bombeiros militares.
SILVA61 (2003) entende que Segurança Pública é a preservação ou o
restabelecimento da ordem pública, isto é, de uma situação de pacífica convivência social,
isenta de ameaça de violência ou de sublevação que tenha produzido ou que possa produzir a
prática de crimes. Conseqüentemente, permitiria a todos o gozo de seus direitos e exercício de
suas atividades sem a perturbação de outrem. Na prática, é uma atividade de vigilância,
prevenção e repressão de condutas delituosas.
Como ficou patente em tal definição, a segurança pública é inserida no rol dos
deveres do Estado, porém com um diferencial, pois também é atribuída a todos os cidadãos a
responsabilidade pela segurança de toda a sociedade.
Evidentemente que colocar a segurança pública como uma atribuição de todos os
cidadãos não significa que estes devam se organizar materialmente para suplementar o
61
SILVA, José Afonso da: Curso de direito constitucional 22 ed. .São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 753,
754.
90
trabalho do Estado. A pretensão da Lei Maior é de promover a participação comunitária e da
sociedade civil, afinal esta é uma causa que interessa a todos e não somente ao Estado.
Quanto a tal assertiva assim se manifestou SILVA62 (2003):
Mas a segurança publica não é só repressão e não é problema apenas de polícia, pois
a Constituição, ao estabelecer que a segurança é dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos, acolheu a concepção do I Ciclo de Estudos sobre
Segurança, segundo a qual é preciso que a questão da segurança seja discutida e
assumida como tarefa e responsabilidade permanente de todos, Estado e população.
Daí decorre também a aceitação de outras teses daquele certame, tal como a de que
“se faz necessária uma nova concepção de ordem pública, em que a colaboração e a
integração comunitária sejam os novos e importantes referenciais”e a de que, dada
“a amplitude da missão de manutenção da ordem pública, o combate à criminalidade
deve ser inserido no contexto mais abrangente e importante da proteção da
população”, o que requer a adoção de outro princípio ali firmado de acordo com o
qual é preciso “adequar a polícia às condições e exigências de uma sociedade
democrática, aperfeiçoando a formação profissional e orientando-a para a obediência
aos preceitos legais de respeito aos direitos do cidadão, independentemente de sua
condição social.
Apesar da necessária participação da sociedade, no que diz respeito ao planejamento
e a implementação da segurança pública, certo é que o encargo maior cabe ao Estado.
SILVA63 (2008), em sua obra “Criminologia Critica: segurança e polícia”, ao tratar do dever
do Estado de proporcionar a tão desejável segurança pública, afirma que esta se caracteriza
por ser um setor em que o objetivo é administrar riscos e medos, sendo certo que o maior
desafio é evidenciar os riscos e perigos a que os indivíduos e as comunidades estão expostos
em um dado momento e lugar. Para tanto, assim se manifesta quanto ao dever do Estado.
Ao Estado incumbirá, além de ele próprio oferecer serviços de segurança em
quantidade e qualidade razoáveis, imbuir-se da função coordenadora que lhe é
inerente e coordenar efetivamente os esforços societários de gerenciamento da
insegurança, para o que deverá estar atento às diferentes formas de criminalidade e
violência, sem contar outros riscos, como os ligados à relação das comunidades com
o meio ambiente. Em seu próprio proveito, mas também no dos indivíduos, das
comunidades, das instituições públicas e dos setores privados e com interesse na
segurança, elaborará mapas de risco da criminalidade, dando conta da freqüência
com que os diferentes tipos de crimes são cometidos, onde, quando e como; que
meios são utilizados; a contribuição das vítimas para sua própria vitimização, como
no caso do envolvimento com drogas, por exemplo etc. Em suma, não se poderá
dizer “a criminalidade”, “a violência”, genericamente, como é comum ouvir-se.
O meio com o qual o Estado busca defender a ordem pública e a incolumidade das
pessoas e do patrimônio é através do seu poder de polícia. É através deste poder, reconhecido
62
63
SILVA, José Afonso da: Op Cit. p. 755.
SILVA, Jorge da. Criminologia Crítica: segurança pública e política..2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p.
229-230.
91
juridicamente, que o Estado visa à promoção da segurança pública, uma vez que atuará
limitando o exercício de direitos individuais em benefício do interesse público.
MEIRELLES64 (2003) conceituou o poder de polícia da seguinte forma:
Poder de polícia é a faculdade de que dispõe a Administração Pública para
condicionar e restringir o uso e o gozo de bens, atividades e direitos individuais, em
benefício da coletividade ou do próprio Estado. Em linguagem menos técnica,
podemos dizer que o poder de polícia é o mecanismo de frenagem de que dispõe a
Administração Publica para conter os abusos do direito individual. Por esse
mecanismo, que faz parte de toda a Administração, o Estado detém a atividade dos
particulares que se revelar contrária, nociva ou inconveniente ao bem-estar social, ao
desenvolvimento e à segurança nacional.
Destarte, constata-se que o grande fundamento desta prerrogativa do Estado em
exercer o seu poder de polícia é o interesse público. Tal atuação somente se justifica quando
estiver em vistas de satisfazer o interesse da coletividade.
O poder de polícia costuma ser dividido em dois segmentos: polícia administrativa e
polícia judiciária, sendo certo que ambas fazem parte da função administrativa desempenhada
pelo
Estado.
“A
polícia
administrativa
(polícia
preventiva,
ou
ostensiva)
atua
preventivamente, evitando que o crime aconteça na área do ilícito administrativo. Já a polícia
judiciária (polícia de investigação) atua repressivamente, depois de ocorrido o ilícito penal”
(LENZA65, 2008, p. 579). Assim, constata-se que a principal diferenciação está na prática ou
não do ilícito penal. Sobre o mesmo tema assim se coloca elucidativamente SILVA66 (2008):
Nos velhos tempos, dizia-se que a função da polícia era “pegar o ladrão”. Há muito,
porém, que o seu papel tornou-se altamente complexo, devido a fatores como a
urbanização, o inchaço populacional, os avanços da ciência e da tecnologia e,
principalmente, o crime organizado. É conclusão unânime, todavia, que, no
provimento da segurança pública são principais metas da polícia: (a) assegurar a
liberdade, a propriedade e a segurança individual e coletiva (polícia administrativa);
e (b) apurar os crimes acontecidos, de modo a apontar à justiça os seus autores e
apresentar as provas para incriminá-los (polícia judiciária).
Com isso, fica nítido que a polícia judiciária prepara a atuação da função
jurisdicional penal regulada pelo Código de Processo Penal.
Como já exposto anteriormente, a segurança pública é exercida pelos seguintes
órgãos: polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis,
polícias militares e corpo de bombeiros militares. Mister se faz esclarecer que o exercício da
64
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 28 ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda,
2003. p. 127
65
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 579.
66
SILVA, Jorge da. Op Cit. p. 321.
92
segurança pública é de competência de cada unidade da Federação, razão pela qual deve ser
observada a repartição de competência entre os Estados e a União.
Segundo MORAES67 “a multiplicidade de órgãos de defesa da segurança pública,
pela nova Constituição, teve dupla finalidade: o atendimento aos reclamos sociais e a redução
da possibilidade de intervenção da Forças Armadas na segurança interna”.
4.1.1. Polícia Federal
Segundo a divisão constitucional, temos que a Polícia Federal, órgão permanente,
instituída por lei, organizada e mantida pela União, apresentando estrutura em carreira,
destina-se a apurar infrações penais contra a ordem política e social em detrimento de bens,
serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim
como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija
repressão uniforme, segundo se dispuser em lei.
Também incube a Polícia Federal prevenir e reprimir o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, o contrabando e descaminho, sem prejuízo da ação federal e de
outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência. Incube ainda, exercer as funções
de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras. E por fim, segundo a nossa Constituição,
exercer com exclusividade as funções de polícia judiciária da União.
4.1.2. Polícia Rodoviária e Polícia Ferroviária
Já a Polícia Rodoviária Federal (PRF), bem como a Polícia Ferroviária Federal
(PFF), ambos órgãos permanentes, organizados e mantidos pela União e estruturados em
carreira, destinam-se, respectivamente, ao patrulhamento das rodovias e ferrovias federais.
Proporcionalmente à utilização do meio de transporte que esses órgãos visam
proteger, estão as suas estruturas. Assim, ao contrário da PRF, a Polícia Ferroviária Federal,
em função do reduzido sistema ferroviário nacional, praticamente inexiste.
Esta atuação de patrulhamento é fundamental para a repreensão do contrabando e do
tráfico de material explosivo que se utiliza até de bagageiros de ônibus de linhas comerciais
(Figura 43), por exemplo.
67
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 767.
93
Figura 43: caixa contendo granadas, apreendida dentro de um ônibus pela PRF (2001).
Fonte: arquivo pessoal.
No que tange as polícias estaduais, temos a Polícia Civil, a Polícia Militar e o Corpo
de Bombeiros Militar:
4.1.3. Polícia Civil
A Polícia Civil é dirigida pelo delegado de carreira e é responsável pelo exercício das
funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, ressalvada a competência da
Polícia Federal, bem como as infrações militares. No caso do Rio de Janeiro, diferentemente
da maioria dos outros estados, cabe a Polícia Civil, por meio da Coordenadoria de Recursos
Especiais (CORE) a atuação direta na neutralização dos artefatos explosivos. Na estrutura do
CORE está o Esquadrão Antibomba, conceituada instituição que recentemente completou 40
anos.
O discurso de abertura do dia comemorativo à criação do referido esquadrão, retrata
bem a sua grandiosa história:
Por iniciativa do Detetive-Inspetor JOSÉ PAULO BONESCHI, no final do ano de
1968 foi idealizada uma equipe constituída por elementos altamente especializados
que iriam apoiar os diversos Órgãos de Segurança, Civis e Militares, Estaduais e
Federais, em operações especiais e contraterrorismo.
Dentro dessa idéia, foi autorizada pelo então Secretário de Segurança, General
ANTONIO FAUSTINO DA COSTA, em inícios de 1969, a formação, a título
experimental, da equipe proposta.
Era idéia de seus idealizadores criar um grupo que pudesse apoiar, com “mão de
obra” altamente especializada, os diversos órgãos de segurança, principalmente os
da SSP/GB. Imaginavam eles que seus componentes deveriam ser todos voluntários,
possuir um alto grau de disciplina, espírito de equipe e cooperativismo, serem
treinados em operações do tipo "Ações de Comandos", e estarem aptos a desativar e
desmontar engenhos explosivos, terem noções de primeiros socorros e de operações
de informações, saberem utilizar qualquer tipo de arma portátil que lhes viessem às
mãos, serem adestrados em combate corpo-a-corpo, em alpinismo militar, operações
helitransportadas e em combate em localidades urbanas.
Criado em 04 de julho de 1969 pela Portaria "E" nº 0947 do Secretário de Segurança
Pública, o então Grupo de Operações Especiais viria a ser transformado, por ato do
Exmº Senhor Governador, em Serviço de Operações Especiais em 31 de agosto de
1971, através do Decreto "E" nº 5039, quando foi criada a Seção de Desativação de
Artefatos Explosivos (SEDAE), transformada em Serviço de Desativação de
94
Artefatos de Explosivos e Incendiários (SEDAEI) pela Resolução SSP nº 551 de 22
de julho de 2002, subordinado à Coordenadoria de Recursos Especiais (CoRE).
Com a reestruturação feita através do Decreto nº 34.663 de 23 de dezembro de 2003
(Ato da então Governadora) que alterou a Estrutura Básica de Polícia Civil do
Estado do Rio de Janeiro, passou o Serviço de Desativação de Artefatos Explosivos
e Incendiários (SEDAEI) a ser denominado Esquadrão Antibomba da Polícia Civil,
dentro da Estrutura da CoRE, subordinada ao recém criado D.P.O.P.(Departamento
de Planejamento e Operação Policiais).
O Esquadrão Antibomba participou dos mais importantes eventos policiais do Rio
de Janeiro com referência a Explosivos, sendo o primeiro e único grupo de
operações especiais antibomba do mundo a desativar uma carta-bomba. Em
setembro de 1972, o grupo terrorista islâmico conhecido como SETEMBRO
NEGRO enviou, simultaneamente, diversas cartas-bombas às Embaixadas e
Consulados de Israel em todo o mundo. Algumas explodiram e outras foram
destruídas, exceto a da Embaixada de Israel localizada no Estado do Rio de Janeiro,
que foi desativada e desmontada pelos técnicos em explosivos e desativação daquela
época, fato esse de Repercussão Internacional, exaustivamente comentado pela
mídia, gerando diversos elogios por parte de vários Embaixadores e Cônsules de
países amigos.
OBS: Esta Carta bomba se encontra desmontada, colocada em moldura própria e
exposta com orgulho na parede da Sala de Expediente do ESQUADRÃO
ANTIBOMBA, com "status" de um troféu.
Nos dias atuais, conta com 32 (trinta e dois) componentes TODOS
VOLUNTÁRIOS e altamente especializados, vários com cursos no exterior (Estados
Unidos, Israel, Colômbia, Venezuela, Panamá, Peru). Atualmente, seus
equipamentos Técnicos de Desativação e Proteção ao Explosivista são de última
geração, face ao reequipamento do Esquadrão Antibomba por ocasião do (PAN
2007). Seus componentes continuam realizando o árduo trabalho de arrecadar
explosivos, atendendo a todos os locais de bombas, locais
pós-explosão, locais de ameaças e suspeitas de bombas, sempre que são solicitados,
ocasiões nas quais colocam em risco suas próprias vidas, agindo com bravura e
destemor visando a resguardar a integridade física da população protegendo-as de
criminosos e grupos criminosos, que com freqüência usam locais públicos em suas
ações (vias públicas, no interior de comunidades carentes, túneis, estações de metrô,
prédios comerciais, instituições policiais, repartições públicas e até mesmo em
hospitais) para atentados, ameaças de bombas explosivas e incendiárias e até mesmo
o arremesso de granadas privativas das Forças Armadas e de fabricação caseira.
Este é o Esquadrão Antibomba da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro que, na
data de amanhã (04 de julho de 2009), completa 40 anos de existência e de Bons
Serviços Prestados à Sociedade do Estado do Rio de Janeiro e do Brasil.
Rio de Janeiro, 03 de julho de 2009.
4.1.4. Polícia Militar
Quanto à polícia militar a esta fica reservada, em cada estado, a atribuição de polícia
ostensiva, visando à preservação da ordem pública. Na maioria dos estados brasileiros,
compete a polícia militar a atuação direta na desativação e nas medidas preventivas relativas à
bombas e explosivos. O destaque fica para Polícia Militar de São Paulo, que tem em sua
estrutura o GATE – Grupo de Ações Táticas Especiais, encarregado pelo atendimento de
ocorrências com artefatos explosivos.
95
4.1.5. Corpo de Bombeiros
Já aos corpos de bombeiros militares cabe a execução de atividades de defesa civil e
nesses essenciais trabalhos, eventualmente se deparam com situações que envolvem bombas e
explosivos. Há também situações, como as bombas incendiárias, em que a participação do
corpo de bombeiro é essencial, tanto no combate aos locais com incêndio como nas perícias
pós-explosão, pela experiência em identificar a causa inicial do fogo.
4.1.6. Força Nacional
A Força Nacional de Segurança Pública foi instituída pelo atual presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, através do Decreto 5289/2004 e trata-se de um programa de cooperação
federativa ao qual poderão aderir os estados interessados. A atuação da Força Nacional se
restringe as atividades de policiamento ostensivo e somente ocorrerá em determinadas
hipóteses episódicas e planejadas, sempre por determinação do Ministro de Estado da Justiça.
A Força Nacional é composta por servidores que tenham recebido do Ministério da
Justiça treinamento especial para atuação conjunta, integrantes das polícias federais e dos
órgãos de segurança pública dos estados, que tenham aderido ao programa de cooperação
efetiva.
A atuação da Força Nacional tem área e prazo delimitado. Todo o desempenho, bem
como as medidas a serem implementadas, serão norteados por ato do Ministro de Estado da
Justiça, uma vez que é através deste que será determinado o emprego da Força Nacional.
Visando a preservação da ordem pública e a incolumidade das pessoas e do
patrimônio, a Força Nacional deve seguir determinados princípios inerentes ao desempenho
de suas funções, quais sejam: respeito aos direitos individuais e coletivos, uso moderado e
proporcional da força, unidade de comando, eficácia, pronto atendimento, emprego de
técnicas proporcionais e adequadas de controle de distúrbios civis, qualificação especial para
gestão de conflitos e solidariedade.
Tais polícias militarizadas do Estado são consideradas forças auxiliares do exército.
Diante do exposto, fica a indagação quanto à responsabilidade ou não do Município
no que tange a segurança pública. Certo é que, não incube ao Município nenhuma
responsabilidade específica pela segurança pública, sendo apenas facultado ao mesmo a
constituição de Guarda Municipal, que ficará com a incumbência de proteger bens, serviços e
instalações do Município, conforme dispuser a lei. Logicamente que o Município não se
exime de zelar pela segurança pública, visto que por ser entidade estatal deverá ajudar os
estados no cumprimento dessa função.
96
Assim, quando se trata de segurança pública, fica evidente o uso do poder soberano
do Estado no trato com particulares, visando atuar na proteção dos bens coletivos. Neste
sentido, se manifesta SILVA68 (2008):
Em se tratando de segurança pública, estamos falando de bens e interesses difusos,
relativos a titulares dispersos, sem qualquer vínculo especial a não ser o fato de
serem residentes de cidade, região ou país. Estamos falando de “ordem pública”
como bem coletivo; “da incolumidade das pessoas e do patrimônio” em geral, e não
destes e daqueles indivíduos. A ordem pública, portanto, tem a ver com a segurança
dos cidadãos coletivamente considerados, e com a tranqüilidade e a salubridade
públicas.
Logo, tendo em vista o acima exposto, conclui-se que a segurança pública deve ser
implementada através de um trabalho conjunto do governo e sociedade, apoiado na
solidariedade e na cooperação.
4.2. Prevenção e controle do uso de explosivos
Muito embora todas as instituições anteriormente listadas e descritas possuam papéis
importantes no combate e na prevenção do uso criminoso do explosivo, o controle efetivo
cabe ao Exército Brasileiro (EB), conforme dispõe o Regulamento para a Fiscalização de
Produtos Controlados (R-105), cuja redação é dada pelo Decreto 3665 de 20 de novembro de
2000.
É com base na R-105 que o EB, por meio da Diretoria de Fiscalização de Produtos
Controlados (DFPC), órgão central em Brasília, exerce o controle do uso de explosivos, desde
a fabricação, armazenamento, transporte e destinação final. Essa fiscalização é exercida pelas
12 regiões militares, cada uma com o seu respectivo Serviço de Fiscalização de Produtos
Controlados (SFPC). O Estado do Rio de Janeiro está no campo de atuação do SFPC/1
juntamente com o Estado do Espírito Santo. O papel da fiscalização é de suma importância
nas medidas preventivas para que não haja o desvio para utilização ilícita dos explosivos.
4.3. Visão dos que estão na linha de frente
Durante o processo de conhecimento e análise preliminar do objeto de estudo
formatou-se um pequeno questionário que foi encaminhado a alguns técnicos e peritos
responsáveis pelo atendimento a locais sob ameaça de bombas. Buscou-se atingir os técnicos
e peritos que lidam com problema e que estão na ponta, na execução, ou seja, na linha de
frente dos atendimentos às ocorrências que envolvem bombas e explosivos.
68
SILVA, Jorge da. Op Cit. p. 245.
97
Foram encaminhados formulários, pelo correio eletrônico, aos especialistas do
Esquadrão Antibomba da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, do GATE em São Paulo
e da Polícia Federal. Nesta última instituição foram enviados às unidades da federação onde
estão instituídos os Grupos Especializados em Bombas e Explosivos (GBE) quais sejam:
Bahia, Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e ao GBE central ligado à DITEC (Diretoria
Técnica-Científica) localizado no Distrito Federal. Além disso, algumas pessoas consideradas
estratégicas pela experiência no assunto, ou pela participação nos casos emblemáticos
apresentados neste estudo, também foram consultadas. A mensagem enviada a essas pessoas
solicitava ainda que os formulários fossem repassados aos demais especialistas a quem elas
tivessem contato direto, sendo uma forma de tentar aumentar o número de respostas,
minimizando o efeito da desconfiança devido à sensibilidade do tema. Desse universo, vários
se abstiveram de responder e não houve uma reiteração ou insistência pela resposta, pois a
proposta foi de propiciar aos que labutam em tão arriscada área a oportunidade de se
manifestar, o que muitos fizeram diretamente, ou por telefone, sem o preenchimento das
fichas.
No total foram obtidos 21 formulários respondidos. A maioria, 17, foi da Polícia
Federal, sendo 1 da Bahia, 1 do Paraná, 3 do Rio Grande do Sul, 7 do Rio de Janeiro e 2 do
Distrito Federal. Os outros 3 formulários foram de estados onde não há ainda GBE
funcionando plenamente, embora haja a função do perito em explosivos: Ceará, Minas Gerais
e Rondônia. Das outras instituições, 2 formulários foram da Polícia Militar de São Paulo
(GATE) e 2 da Polícia Civil do Rio de Janeiro (Esquadrão Antibomba).
Destaca-se dos formulários a experiência declarada de alguns dos entrevistados. Do
total, 13 possuem mais de 10 anos de trabalho na área, sendo 4 com mais de 20 anos. O mais
experiente possui 38 anos de dedicação ao combate ao crime envolvendo bombas e
explosivos.
A preferência de alguns especialistas em participar da pesquisa proposta, por meio de
opiniões, sugestões e fornecimento de material, mas sem o preenchimento do formulário, é
um importante aspecto a ser considerado na eventual construção de um banco de dados sobre
o assunto. Essa resistência em formalizar opiniões pode ter reflexos nos registros das
informações das ocorrências, de onde se depreende que nem sempre os técnicos que estão na
execução das medidas de combate são os mais indicados a formalizar o que ocorreu.
Na formulação dos campos (Figura 44) se questionou: a importância que cada um
atribuía ao seu trabalho; quais são as maiores dificuldades enfrentadas; se as situações
relativas a bombas e explosivos têm sido bem resolvidas e o que pode ser melhorado; qual
98
seria a principal motivação para o uso violento do explosivo e por fim qual a experiência na
utilização de bases de dados com as ocorrências de bombas e explosivos.
Figura 44: formulário de entrevista
Mesmo existindo um espaçamento prévio no formulário, não houve uma limitação
rigorosa que impedisse ao entrevistado ultrapassar o dimensionamento inicial. Também não
foram rejeitadas as fichas com alguns campos incompletos. Com isso, reforçou-se a idéia de
liberdade para se tentar extrair ao máximo os anseios e as dificuldades desse campo de estudo,
pouco explorado, do combate aos crimes com bombas e explosivos.
99
Visando preservar a identidade desses colaboradores, muito embora todos tenham
autorizados a utilização das fichas, as referências aos entrevistados passam a ser por números.
4.3.1. Utilidade do serviço prestado
Nas respostas ao primeiro quesito do formulário, versando sobre quais benefícios os
entrevistados acreditam terem proporcionados à sociedade com o seu trabalho, destacam-se os
trechos a seguir.
Do “entrevistado 3”, nota-se a compreensão da importância do uso lícito dos
explosivos como um meio necessário ao progresso:
Como produto comercial os explosivos contribuem para o desenvolvimento da
sociedade, seja na mineração, demolição ou ate em produtos do dia-a-dia como airbags. Infelizmente desvios da sociedade podem utiliza-los para produzir medo ou
terror. Assim, a polícia necessita ter equipes especializadas para proporcionar um
adequado tratamento a ameaças com explosivos ou agentes de guerra passando uma
sensação de segurança para a sociedade e salvando vidas. Trabalhando nestas
equipes espero ter alcançado este objetivo.
O “entrevistado 4” talvez devido à sua grande experiência (30 anos) na área aponta
pela importância doutrinária:
Em primeiro plano: a estabilidade social, através da sensação de segurança
transmitida a população em geral e as autoridades do Estado Brasileiro em
particular, e da manutenção da paz e da tranqüilidade em inúmeros grandes eventos
públicos de interesse do país. Em segundo plano: a participação na construção e
consolidação de um doutrina para a segurança pública, nesta atividade, a
participação na formação e capacitação de profissionais da segurança pública e
privada para prevenir, responder e apurar atos criminosos dessa natureza.
O “entrevistado 8” chama atenção para o objetivo de instalação do terror, o que pode
ser obtido com as ameaças de bombas, mesmo sendo falsas:
Segurança no atendimento de ameaças de artefatos explosivos. Essas ameaças têm
grande poder desestabilizador independente da sua veracidade. A correta abordagem
da situação, baseada em sólidos conhecimentos técnicos, oferece segurança ao
público envolvido no incidente. A orientação adequada para a busca no ambiente
tem sido fator fundamental - de educação - no lidar com tais ameaças. O objetivo
nem sempre é a perda de vidas ou perda material, mas apenas instalar desespero e
terror, ao que a nossa atuação tem respondido de forma eficaz. Nos casos positivos,
a nossa atuação tem se mostrado igualmente eficaz.
Interessante destacar a forma simples como o “entrevistado 13” resume o trabalho às
vezes imperceptível dos que fornecem segurança à sociedade:
Agregar segurança à sociedade, mesmo sem ela perceber.
100
4.3.2. Dificuldades enfrentadas
No preenchimento do segundo item do formulário, a abordagem feita pela grande
maioria dos entrevistados como a principal dificuldade enfrentada pode ser sintetizada pela
resposta do “entrevistado 3”:
Falta de equipamentos, falta de condições e meios adequados ao treinamento do
pessoal e por último ausência de reconhecimento pelo trabalho realizado.
O “entrevistado 2” faz uma análise mais profunda sobre as situações que envolvem o
uso ilícito de explosivos, destacando a idéia da sensação do problema ser algo distante da
realidade brasileira:
A maior dificuldade é a crença de que no Brasil não se tem uso criminoso de
explosivos. O fato de não ocorrerem ações de terrorismo com fundamentação
ideológica no país faz com que a mídia e a própria população tratem o assunto como
um problema distante. Mesmo não causando a mesma comoção que os grandes
atentados, é essencial caracterizar a real dimensão das ações criminosas que
empregam explosivos, dimensionando seus riscos potenciais e os prejuízos
correlatos.
Como demonstra o “entrevistado 15”, a disponibilidade de informações na internet
propicia as atividades delituosas e, por outro lado, a inexistência de um banco de dados
integrado dos órgãos de segurança fragiliza a reação por parte desses órgãos:
As dificuldades começam pela impossiblidade de trabalhar exclusivamente da área
de bombas e explosivos no âmbito do DPF devido ao reduzido efetivo dos Peritos
Criminais Federais; dificuldades de troca de informações entre as diversas
instituições policiais; poucas oportunidades de realizar cursos e treinamentos no
exterior junto às escolas mais avançadas; as informações sobre a área de bombas e
explosivos encontram-se cada vez mais acessíveis ao público em geral na grande
rede; tem se observado um maior grau de complexidade técnica na confecção dos
artefatos explosivos em geral; e necessidade da participação de especialistas na
elaboração do planejamento tático e operacional de grandes eventos, bem como no
gerenciamento de crises e na execução do comando e controle de operações.
O “entrevistado 12” também resume as maiores dificuldades enfrentadas no setor:
Falta de importância e reconhecimento da atividade, falta de investimentos no setor,
dificuldade na aquisição de equipamentos e treinamentos, dificuldades na dedicação
exclusiva de pessoal.
Em relação às dificuldades de obtenção de informação sobre os casos que ocorrem
no Brasil, o “entrevistado 4” sentencia no final de sua resposta:
Além da complexidade instríseca da atividade, as duas maiores dificuldades têm
sido: a carência de recursos materiais e/ou sua obsolescência, e a falta de dados
sobre o que ocorre em território nacional, principalmente de forma sistêmica e
organizada.
Por vezes é mais fácil e mais rápido obter dados de casos ocorridos em outros países
do que no nosso.
101
4.3.3. Adequabilidade das respostas da segurança pública e possíveis melhorias
Com esse questionamento propiciou-se um diagnóstico do atual quadro e estimulouse a formulação de sugestões. O “entrevistado 9” apresenta uma análise profunda:
Como me referi no item "Quais benefícios você acredita ter proporcionado à
sociedade com o trabalho.desenvolvido nessa área?" acredito que em parte está
sendo resolvido, apesar do aumento das apreensões de Artefatos Bélicos Leves
(granadas de mão) e dos Pesados (Granadas de Obus, AT 4, e tubos descartáveis e
carregados dos M72A2), intáctos e falhados, das bombas de fabricação caseira, dos
explosivos desviados de pedreiras, dos coletes bombas desativados, todos estes
materiais que, com a sua simples apresentação se tornam armas de coação e
intimidação. A ação com uso (detonação) dos artefatos e das bombas de fabricação
caseira diminuíram. Felizmente, os marginais não têm maiores conhecimentos e
confiança para utilizar estes materiais, ficando com uma pequena parcela de
elementos marginalizados, oriundos das Forças Armadas e das Polícias Civil e
Militar, afastados por desvios de conduta. São eles que sabem manejar e fabricar
estes artefatos.
O que se pode fazer para minimizar a atual situação é desenvolver um controle
rigoroso nas pedreiras, nas fábricas de explosivos e de materiais bélicos, e tornar
mais eficaz a vigilância dos depósitos e paióis das Forças Armadas, tentando evitar
os desvios de explosivos, armas, munições e granadas. As Autoridades do país
deveriam dar ênfase à segurança das fronteiras brasileiras, exercendo um maior
controle e vigilância, para desestimular o desvio e o contrabando de armas,
explosivos e munição; ativar e manter em permanente funcionamento as barreiras de
fiscalização tanto nas fronteiras com outros países, como nas principais rodovias de
entrada e saída dos grandes Centros como Rio de Janeiro, Espírito Santo, Belo
Horizonte, São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná, Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso
do Sul, Brasília, etc.; manter permanente vigilância e fiscalização nos aeroportos
internacionais e nos aeroportos secundários; manter vigilância e inspecionar os
Containers de procedência duvidosa que são desembarcados nos principais portos do
país; checar certos tipos de remessas oriundas do exterior (pacotes pesados), pois se
tem notícias de que explosivos, granadas, armas desmontadas, munições e drogas
são postadas em países distantes como Dinamarca, Estados Unidos etc., e são
entregues ao destinatário aqui no Brasil sem nenhum problema.
A necessidade do banco de dados integrado e a normatização com relação ao
material apreendido são indicadas pelo “entrevistado 2” como as principais melhorias:
Duas vertentes devem ser observadas. A primeira é a continuidade do processo
investigativo, efetuando análises para rastreamento da procedência do explosivo,
tentando determinar a autoria, inclusive intelectual, dos crimes. Para atingir este
patamar de eficiência é imperativo a criação de um banco de dados em âmbito
nacional. O segundo aspecto é referente ao material apreendido. Não há dispositivos
legais que estabeleçam procedimentos de análise e descarte célere de explosivos,
ocasionando exposições desnecessárias da segurança dos profissionais envolvidos
no processo de apreensão e custodia.
O “entrevistado 10” considera que, em vista dos poucos recursos que são destinados
a essa área no Brasil, os resultados tem sido a contento, mas mesmo assim, novamente surge a
necessidade de criação de um banco de dados nacional:
102
A solução tem sido satisfatória, proporcional aos problemas que estão surgindo no
Brasil, mas muitos casos são resolvidos com procedimentos improvisados e
empíricos. Falta criar uma padronização operacional e um banco de dados nacional
sobre casos com bombas e explosivos.
O “entrevistado 15” considera os bons resultados alcançados, mas aponta alguns
tópicos a serem reforçados, inclusive o intercâmbio entre as instituições:
Ultimamente temos observado uma melhora substancial no trabalho de prevenção e
de contramedidas graças a aquisição de modernos equipamentos pelas principais
polícias do país, mas considero ser fundamental a difusão de doutrinas visando uma
uniformização de procedimentos, o que pode ser conseguido através de cursos,
treinamentos e troca de informações entre as diversas polícias.
Há um alerta por parte do “entrevistado 17’ de que, embora até o presente momento
os atos sejam isolados, está ocorrendo um crescimento, em especial na utilização de granadas:
No país como um todo, os atos terroristas com emprego de artefatos explosivos,
nunca foram tradição, porém, ultimamente, percebe-se um incremento de
ocorrências desta natureza, especialmente com o emprego de granadas, porém estas
intervenções, em meu entendimento ainda são casos isolados e de pequena
magnitude. É claro, que os órgãos que detém esta atribuição, devem sempre estar
equipados e treinados para atuarem prontamente, oferecendo a resposta necessária, o
que a meu ver ainda não ocorre.
Como forma de prevenir e prontamente responder a atos desta natureza, creio que a
efetiva implementação dos itens relacionados no quesito anterior, já seria um ótimo
começo.
4.3.4. Motivações identificadas para o uso violento dos explosivos
Face à ausência de estatísticas oficiais, buscou-se identificar junto aos entrevistados
qual seria a principal motivação para o uso violento dos explosivos. Não houve limitação
quanto ao número de opções a serem marcadas, ocorrendo casos de entrevistados assinalarem
cinco opções distintas (entrevistado “7” e “10”). Na opção “Outros”, o “entrevistado “7”
destacou a possibilidade do intuito de se causar danos ou mesmo como chamativo:
A utilização de explosivo de maneira criminosa ou violenta se dá para causar um
grande dano ou para chamar a atenção da sociedade para algum fato, portanto
entendo que a principal motivação vai depender do agente que utiliza.
Ao final, obteve-se no total 41 indicações. A resposta mais apontada foi a do uso
como arma do crime organizado, com 16 votos. Em segundo lugar ficou o emprego para
roubo de valores, com 7, seguido de vandalismo e terrorismo, ambos com 5 indicações. Após,
vieram as opções de ataque a instalações prisionais, com 4 votos, e crimes passionais com 2.
As motivações de violência entre gangues e torcidas e crime ambiental receberam 1 voto
cada.
103
4.3.5. Utilização de base de dados estatísticos
A maioria dos entrevistados não utiliza uma base de dados. Os que a utilizam, citam
registros do próprio grupo especializado onde trabalham e arquivos pessoais. É o caso do
relato do “entrevistado 10” que reporta a utilização de uma base de dados própria de seu
grupo de atuação, que registra as ocorrências atendidas, ou seja, não é um banco integrado:
Sim, uma base própria, criada no GATE-SP para atender a sua demanda de serviço,
mas é local, apenas registra as ocorrências atendidas por esse grupo.
O “entrevistado 4” além dos registros próprios para análise quantitativa e de
tendências, cita também o uso de bancos de dados estrangeiros:
Os registros de ocorrência na minha atividade, sempre foram efetuados de forma
simples, para estatísticas quantitativas, não se prestando como uma base dados de
consulta para outro tipo de pesquisa, mesmo assim, se torna útil para acompanhar as
tendências de crescimento ou redução dessa modalidade criminosa. Entretanto,
várias vezes, efetuei consultas a banco de dados, principalmente estrangeiros como
auxílio em meu trabalho.
4.4. A integração das diversas forças
A segurança pública nacional, com os seus vários órgãos, necessita de uma
coordenação que os integre, somando os esforços e otimizando os resultados, no interesse da
sociedade. A área da segurança é afeta ao Ministério da Justiça que por sua vez possui uma
secretaria de ações coordenadas com esta finalidade. Trata-se da Secretaria Nacional de
Segurança Pública – Senasp. A sua criação ocorreu por meio do Decreto nº 2.315 de 4 de
setembro de 1997. Anteriormente, existia a Secretaria de Planejamento de Ações Nacionais de
Segurança Pública – SEPLANSEG, que foi criada pela Medida Provisória nº 813 de 1º de
janeiro de 1995.
O texto legal que atualmente vigora dando a competência da Senasp é o disposto no
Decreto nº 6.061, de 15 de março de 2007, Anexo I. São as seguintes atribuições:
I - assessorar o Ministro de Estado na definição, implementação e acompanhamento
da Política Nacional de Segurança Pública e dos Programas Federais de Prevenção
Social e Controle da Violência e Criminalidade;
II - planejar, acompanhar e avaliar a implementação de programas do Governo
Federal para a área de segurança pública;
III - elaborar propostas de legislação e regulamentação em assuntos de segurança
pública, referentes ao setor público e ao setor privado;
IV - promover a integração dos órgãos de segurança pública;
V - estimular a modernização e o reaparelhamento dos órgãos de segurança pública;
VI - promover a interface de ações com organismos governamentais e nãogovernamentais, de âmbito nacional e internacional;
104
VII - realizar e fomentar estudos e pesquisas voltados para a redução da
criminalidade e da violência;
VIII - estimular e propor aos órgãos estaduais e municipais a elaboração de planos e
programas integrados de segurança pública, objetivando controlar ações de
organizações criminosas ou fatores específicos geradores de criminalidade e
violência, bem como estimular ações sociais de prevenção da violência e da
criminalidade;
IX - exercer, por seu titular, as funções de Ouvidor-Geral das Polícias Federais;
X - implementar, manter e modernizar o Sistema Nacional de Informações de Justiça
e Segurança Pública - INFOSEG;
XI - promover e coordenar as reuniões do Conselho Nacional de Segurança Pública;
XII - incentivar e acompanhar a atuação dos Conselhos Regionais de Segurança
Pública; e
XIII - coordenar as atividades da Força Nacional de Segurança Pública.
Assim, cabe à Senasp o desempenho de importantes funções. Para tanto, a Senasp
administra o Fundo Nacional de Segurança Pública, criado em 2000, visando financiar
projetos na área de segurança pública. Também é da Senasp a gerência do programa de
Sistema Único de Segurança Pública – SUSP, estruturado em 2003.
Devido à atuação da Senasp, estão sendo adotadas várias ações no sentido de
capacitar, tanto materialmente como em termos de conhecimento, policiais de todo o Brasil,
sejam eles federais, estaduais, civis e militares. Com essa formatação, que permeia as diversas
esferas administrativas de todos os estados federados, a Senasp, em um primeiro momento, é
a estrutura mais indicada para planejar e gerir um banco de dados sobre bombas e explosivos,
único, centralizado e de âmbito nacional, dando acesso à quem de direito, como ocorre com o
sistema INFOSEG. A partir desse banco, planejar as ações visando integrar as forças da
segurança pública, especificamente no combate ao emprego ilícito de explosivos.
A Senasp é assim, conforme FERREIRA69, um verdadeiro elo de união entre os
governos federal, estaduais e municipais.
69
FERREIRA, Helder; FONTOURA, Natália de Oliveira. Sistema de justiça criminal no Brasil: quadro
institucional e um diagnóstico de sua atuação. Texto para discussão nº 1330. Brasília: IPEA, 2008. p. 10.
105
5. PERSPECTIVAS E DESAFIOS
A questão da violência utilizando bombas e explosivos está longe de ser um
problema local, do Brasil ou de qualquer outra nação. Muito embora cada país possua suas
peculiaridades, com maior ênfase para determinada motivação dos atos violentos e ainda,
diferentes níveis de controle e de segurança no uso do explosivo, a preocupação é global.
Independentemente do quadro instalado, trata-se de um desafio para as nações que almejam
serem reconhecidas como Estados seguros, capazes de receber qualquer cidadão, seja qual for
a sua nacionalidade, religião, orientação política etc.
O Brasil se insere nesse contexto, organizando grandes eventos internacionais e se
candidatando a tantos outros. O País busca o desenvolvimento pelo intercâmbio com outras
nações e também com o desenvolvimento de tecnologia própria. Por outro lado, o risco do
surgimento de novas e catastróficas ameaças é real e preocupante. Para a prevenção e combate
das ameaças existentes e futuras, são fundamentais medidas de políticas públicas, como a
criação de um banco de dados oficial, centralizado e específico para bombas e explosivos e
que sirva como ferramenta de gestão e controle.
5.1. A segurança de grandes eventos mundiais sediados pelo Brasil
O Brasil vem se destacando pela organização de grandes eventos que reúnem
importantes dignitários como os chefes de Estados, líderes eclesiásticos mundiais, e outros
representantes de destaque internacional. Esses encontros são constantes desafios à segurança
pública, quer pela permanência de vários líderes em um mesmo ambiente, tornando-os um
alvo preferencial aos possíveis ataques terroristas, ou pela aglomeração de multidões em
busca de seus líderes, o que necessita de todo um aparato visando à integridade dos
participantes.
As realizações desses eventos alavancam aquisições de novos e modernos
equipamentos, que por sua vez demandam treinamentos e cursos de capacitação. A operação
integrada dos órgãos de segurança é condição necessária para a obtenção do sucesso. Passado
o evento, normalmente fica como legado um acréscimo na qualidade e na capacidade de
resposta da segurança pública.
Há vários exemplos, e todos eles têm sido relatados positivamente quanto à
segurança proporcionada, gerando com isso mais crédito ao país, habilitando-o a concorrer na
realização de novos e disputados eventos, como as competições desportivas internacionais.
106
Seguem alguns desses exemplos, todos de grande repercussão e que foram sediados no estado
do Rio de Janeiro nos últimos anos.
5.1.1. ECO 92 (03 a 14 de junho de 1992)
A ECO 92, também chamada Rio-92, reuniu na cidade do Rio de Janeiro diversos
chefes de Estado que discutiram, por quase duas semanas, o futuro sustentável da
humanidade. O Exército Brasileiro comandou as operações de segurança. A Polícia Federal
atuou juntamente com a Polícia Civil e Militar. Foi considerado o primeiro grande desafio de
integração entre as forças. Meses antes, policiais federais foram capacitados por especialistas
em explosivos da Bundeskriminalamt (BKA), polícia federal alemã. Equipamentos e
materiais foram cedidos e a partir dessa transferência de conhecimento foi possível o
desenvolvimento de tecnologia própria para a produção de canhões disruptores, importante
ferramenta na desarticulação de pacotes com suspeição de serem artefatos explosivos.
O canhão disruptor, também chamado de canhão d’água, tem uma definição básica
por FRANCO70:
É como um cano de uma espingarda calibre 12, com as paredes reforçadas para
suportar um disparo com uma pressão de gases bem maior que uma arma comum,
acelerando um pequeno volume de água (150 ml) contra o objeto suspeito. Ao
atingir o objeto suspeito, espera-se com isso que haja o rompimento do invólucro,
externando o seu conteúdo e também, se possível a desarticulação dos componentes,
neutralizando no caso a bomba, sempre de forma remota.
O canhão pode ser usado diretamente no artefato explosivo ou utilizado para acessálo. Isto ocorre quando, por exemplo, há um pacote suspeito dentro de um veículo. Nesses
casos, o canhão é direcionado contra o sistema de fechamento das portas (Figura 45).
Figura 45: ação do canhão d’água na abertura da mala de um veículo (2000).
Treinamento realizado durante o VIII CABE, no RJ.
Fonte: arquivo pessoal.
Assim, passada a ECO 92, os ganhos tecnológicos foram incorporados resultando em
benefícios para o interesse público.
70
FRANCO, Antônio Luís Brandão; MARTINS, Ataide da Rosa; SAIKALI, Ricardo Hamid. Segurança na
aviação civil: o papel do Departamento de Polícia Federal no combate ao terrorismo envolvendo bombas e
explosivos. Monografia apresentada no Curso Superior de Polícia. Brasília. Academia Nacional de Polícia e
Fundação Universidade do Tocantis – UNITINS, 2006.
107
5.1.2. Encontro do Santo Padre com as famílias (2 a 6 de outubro de 1997)
Em sua última visita ao Brasil, o Papa João Paulo II participou do “II Encontro
Mundial do Santo Padre com as Famílias”. Qualquer evento que tenha a participação de um
Papa requer uma enorme estrutura de segurança, pela importância da sua presença. Sendo
uma visita oficial, e ainda tratando-se de um Papa extremamente popular como foi João Paulo
II, já vítima de um atentado anterior71, as cautelas são redobradas. Mais uma vez, as forças
que compõem a segurança nacional e também o EB demonstraram boa capacidade de
integração, cada qual realizando as tarefas conforme suas competências.
A preocupação não se resumiu só ao evento, toda a permanência do Papa em solo
nacional foi monitorada, incluindo os deslocamentos e os pernoites, o que de certa forma foi
um ponto crítico devido ao local escolhido (Residência do Sumaré, no Bairro do Rio
Comprido, Rio de Janeiro). A logística exigiu planejamento e vistorias prévias de segurança
nos ambientes e posteriormente nos presentes enviados ao Santo Padre. As possibilidades de
ameaças ou suspeitas de explosivos teriam que ser prontamente atendidas evitando
comprometer o evento. Peritos em explosivos da Polícia Federal se revezaram cobrindo o
evento 24 horas. A missa campal foi outro ponto crítico, tendo sido realizada no Aterro do
Flamengo para um público estimado de mais de 2 milhões de pessoas (Figura 46).
Figura 46: missa campal realizada por Sua Santidade o Papa João Paulo II (1997).
Fonte: arquivo pessoal.
71
Em 13 de maio de 1981, o Papa João Paulo II é alvejado por dois tiros de pistola disparados pelo turco
Mehmet Ali Agca.
108
5.1.3. CIMEIRA (28 e 29 de junho de 1999)
Outro grande encontro de chefes de Estado ocorrido no Rio de Janeiro foi a “Cimeira
dos Países da América Latina e Caribe – União Européia”. Não houve grandes incidentes com
a segurança. Especificamente com relação a bombas e explosivos, várias equipes foram
formadas com especialistas da Polícia Federal, devido à grande quantidade de locais a serem
examinados antes do evento, buscando-se localizar possíveis artefatos explosivos (vistoria
prévia de segurança).
Apenas um incidente foi registrado. Ocorreu durante uma das vistorias de segurança,
às vésperas do início do evento, mais precisamente na madrugada do dia 27 de junho, quando
os peritos foram acionados devido a uma mochila suspeita72. A ação de neutralização ocorreu
em pleno campo de futebol do Aterro do Flamengo (Figura 47). Posteriormente, verificou-se
com a abertura segura da mochila, por meio de procedimentos remotos, conhecido como
“técnica da corda”, que não havia explosivos no seu interior e sim equipamentos eletrônicos
(rádio, toca-fitas, etc.). Mesmo ocorrendo em local público, não houve alarde, o que pode ser
atribuído a eficiência do grande aparato de segurança montado.
Figura 47: neutralização de uma mochila suspeita (1999)
Fonte: arquivo pessoal.
5.1.4. PAN 2007 (13 a 29 de julho de 2007)
A realização do XV Jogos Pan-Americanos na cidade do Rio de Janeiro, e logo em
seguida o III Jogos PARA PAN-AMERICANOS (12 a 19 de agosto de 2007), foi sem dúvida
o grande momento da segurança nacional em termos de realização de eventos dessa natureza,
um verdadeiro marco. Certamente, o sucesso do Brasil na organização o credenciou para
ganhar a eleição de sede da Copa de 2014, e ainda pontuar para futuras candidaturas
olímpicas.
72
A ocorrência gerou o número de registro 126/99 no livro de registros de plantão da criminalística da PF.
109
A magnitude do PAN 2007 pode ser representada pelos números envolvidos. Apenas
em relação à segurança do evento, em especial a questão das ameaças de bombas e
explosivos, foram vistoriados 22 locais, destacando-se a Vila Pan-americana, o complexo do
Maracanã, o complexo do Autódromo e o Riocentro. Também foram examinados 101 ônibus
da frota utilizada para a cerimônia de abertura, 63 ônibus para a de encerramento e
aproximadamente 870 carros. Foram formadas 44 equipes de vistorias, totalizando 136
policiais capacitados e treinados para esse fim (BELARMINO73, 2008).
Novamente o sucesso veio da integração e coordenação das forças envolvidas, desde
o planejamento estratégico até a execução final. Estrearam novos atores nesse cenário de
segurança, com a participação da Força Nacional e de técnicos da Comissão Nacional de
Energia Nuclear – CNEN, estes visando treinar os policiais no uso de equipamentos de
detecção e apoio numa eventual resposta a ameaças radiológicas.
A coordenação coube à Senasp, que fomentou projetos e planejou as ações, desde a
capacitação até a compra de equipamentos. Um exemplo foi a utilização de policiais com cães
farejadores de explosivos, que receberam treinamento bem antes do evento e foram bastante
utilizados nos grandes espaços abertos do evento (Figura 48).
Figura 48: utilização de cães adestrados para farejar explosivos (2007).
Fonte: arquivo pessoal.
73
BELARMINO, Alexanders Tadeu das Neves; FORTES, Marcelo de Azambuja; MAIA, Bruno Costa Pitanga.
Análise da atuação da coordenação de vistorias e contramedidas nos jogos panamericanos: gestão de grupos
antibombas em grandes eventos. 2008. 68f. Monografia (conclusão do curso) – Academia Nacional de Polícia,
Curso Superior de Polícia. Brasília.
110
Para o futuro, a realização da Copa do Mundo de 2014 é aguardada com grandes
expectativas. O desafio é maior ainda do que foi o PAN 2007, tanto pelo volume de pessoas e
estruturas envolvidas quanto pela descentralização das sedes dos jogos em várias unidades da
federação, envolvendo um número muito maior de instituições da segurança pública nacional.
5.2. Novas tecnologias e equipamentos
O uso criminoso de explosivo está cada vez mais sofisticado. Os instrumentos de
combate também precisam progredir em velocidade compatível. Além do intercâmbio e da
compra de novos equipamentos, é importante o desenvolvimento de tecnologias nacionais.
O PAN 2007 representou um enorme salto de qualidade em termos de novas técnicas
e equipamentos na detecção e neutralização das ameaças envolvendo bombas e explosivos.
Cinco viaturas completamente equipadas com as mais modernas ferramentas, incluindo robôs
e trajes antibombas foram montadas. Foram entregues 2 viaturas à Força Nacional, 2 para a
Polícia Federal, que as redistribuiu para o GBE de Brasília (GBE/DITEC) e 1 para o
Esquadrão Antibomba da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro (Figura 49).
Figura 49: exposição de equipamentos do Esquadrão Antibombas da PC/RJ (2009).
Fonte: arquivo pessoal.
As críticas relatadas pelos técnicos em explosivos nos formulários de entrevistas
foram principalmente pela falta de critério na distribuição dessas estações após a realização
dos jogos. A inexistência de um banco centralizado de dados e de estatísticas oficiais das
ocorrências em todo o território nacional não permite a gestão técnica e objetiva desses
111
recursos, cuja distribuição deveria priorizar as maiores demandas. Em substituição, são
adotados critérios subjetivos passíveis de críticas.
O destaque foi para aquisições de unidades robóticas teleguiadas. Esses robôs
possuem controles precisos e são capazes de superar diversos obstáculos (escadas, por
exemplo), permitindo aos peritos em explosivos proceder as ações de remoção, desativação e,
já que são dotados de canhões disruptores, também a neutralização dos artefatos suspeitos,
sempre remotamente, resguardando a vida dos técnicos.
Figura 50: robô antibombas dotado de canhão disruptor (2009).
Treinamento realizado em Brasília.
Fonte: GBE/DITEC.
A necessidade de constante evolução é incompatível com dependência da realização
de grandes eventos. O processo não deve ocorrer em saltos descontínuos e sim em constantes
aquisições de tecnologia. Nesse intuito, a parceria escola-polícia pode ser o caminho mais
promissor, fornecendo aplicações práticas para os alunos utilizarem os seus conhecimentos
acadêmicos, e na via contrária, propiciar embasamento teórico e instrumental para os
profissionais da área de bombas e explosivos desenvolverem suas idéias e assim suprirem
suas necessidades. Estas podem ser complexas, como o desenvolvimento de robôs, ou mesmo
simples como a geração de espuma capaz de conter fragmentos de uma explosão. Sobre esta
última, destaca-se a pesquisa feita por peritos da Polícia Federal sobre a confecção de um
gerador de espuma de baixo custo, capaz de envolver o artefato explosivo e minimizar os
efeitos da explosão (Figura 51).
112
Figura 51: gerador de espuma de baixo custo desenvolvido por Peritos da PF (2008).
Fonte: PCF Roberto de Araújo Vieira.
Os resultados do gerador de espuma foram bastante animadores como concluem seus
idealizadores (PINTO74, 2008):
A variação do impacto da fragmentação e das ondas de choque da granada padrão
utilizada nas explosões controladas realizadas demonstraram que esta espuma,
somada às caixas contentoras também desenvolvidas foram eficazes em reter mais
de 95% (noventa e cinco por cento) dos fragmentos decorrentes das explosões.
Assim, as pesquisas devem ser sempre incentivadas e com ampla divulgação dos
resultados entre os técnicos de bombas e explosivos, ampliando a discussão e propiciando
uma cultura de desenvolvimento tecnológico que pode ser, no primeiro momento, para uso
próprio, mas que possui potencial para o fomento de indústrias nacionais gerando empregos e
divisas ao país.
5.3. Ameaças futuras – o desafio QBRN
Conforme exposto, a ameaça dos explosivos convencionais é real e precisa ser bem
monitorada e devidamente combatida. A facilidade de obtenção dos meios necessários para a
confecção de uma bomba é, de certa forma, uma explicação para a freqüência das ocorrências.
Em contrapartida, há outros tipos de artefatos que ainda não são vistos como ameaças reais
pela dificuldade do acesso aos seus constituintes, ou pela complexidade na construção e
74
PINTO, Cleverson Neves; SILVA, Marcello Torres da; VIEIRA, Roberto de Araújo. O uso de espuma própria
para a contenção de material explosivo: uma abordagem prática. 2008. 64f. Monografia (conclusão do curso) –
Academia Nacional de Polícia, Curso Superior de Polícia. Brasília.
113
aplicação do dispositivo, passando uma sensação, às vezes falsa, de segurança. São as armas
não convencionais.
Os especialistas que se dedicam ao estudo do combate ao terrorismo possuem uma
preocupação com armas não convencionais, ou seja, os ataques envolvendo Armas de
Destruição em Massa (ADM). Essas armas podem se valer de elementos químicos,
biológicos, radiológicos e nucleares. São as chamadas ameaças QBRN (Químicas, Biológicas,
Radiológicas e Nucleares). Essencialmente não há um alvo específico, o que se busca é ferir
ou matar o maior número de pessoas possível.
As armas de destruição em massa não focam um determinado grupo da população e
por isso, em tese, todos os países estão sujeitos a esta terrível ameaça. O risco de realmente
acontecer um ataque com armas QBRN é relativamente muito pequeno quando comparado
com as ameaças com explosivos, entretanto, caso ocorra, as conseqüências são extremamente
danosas (Figura 52).
Explosivos
Químicas
Radiológicas
Biológicas
Nucleares
RISCO
AMEAÇAS
CONSEQUÊNCIA
Figura 52: gráfico de risco x consequência das ameaças.
Fonte: adaptação de ACKERMAN75.
A utilização dos explosivos combinada com algum elemento QBRN forma as
chamadas bombas sujas, as quais possuem o objetivo de dispersar o material agressivo e
contaminar grandes áreas. Novamente é notória a necessidade do controle do uso dos
explosivos, além de outros materiais, principalmente as fontes radioativas, pela sua ampla
utilização em equipamentos industriais e médico-hospitalares.
75
ACKERMAN, Gary. WMD terrorism research: whereto from here? International Studies Review. Monterey,
v. 7, n.1, p. 140-143, 2005.
114
5.4. A criação de um banco de dados oficial
Conforme evidenciado nos capítulos anteriores, há várias fontes de dados sobre
bombas e explosivos. Algumas mais imediatas, como os registros de ocorrências policiais,
decorrentes de iniciativas pessoais, não sistematizadas e realizadas de acordo com demandas
específicas, para uso próprio ou no máximo para uso do grupo especializado ao qual o policial
que teve a iniciativa de levantar os registros pertença. Outras possíveis fontes se referem a
instituições como a INFRAERO, Correios, Hospitais, entre outros, onde a busca pela
informação é mais difícil por não ser a atividade fim dessas instituições. Percebe-se a falta de
uma instituição que normatize a coleta e o tratamento dessas informações, impondo a
alimentação de uma base de dados única.
No Rio de Janeiro, existe a atuação do ISP na geração de pesquisas e produção de
relatórios estatísticos, se valendo da implementação do Programa Delegacia Legal que
informatizou os registros de ocorrência. Entretanto, a única informação oferecida relativa ao
uso ilícito dos explosivos como forma de violência é o número de apreensões dos artefatos.
Embora este seja um dado importante, diversas outras informações não são oferecidas,
limitando a capacidade de resposta e gestão da administração pública, e também impedindo
que os especialistas que estão na linha de frente possam usufruir do conhecimento de outros
grupos especializados ou das experiências antigas do seu próprio grupo de atuação.
Uma vez existindo um banco centralizado, a forma como a informação irá circular
requer uma análise criteriosa sobre qual público pretende se atingir e como fazê-lo
adequadamente sem perder o objetivo e nem a segurança de informações mais sensíveis. Por
fim, é interessante uma breve análise da experiência de outros países que adotam um banco
centralizado sobre o assunto.
5.4.1. O desafio da centralização dos dados em estatísticas oficiais
Ao longo do trabalho de pesquisa, constatou-se a existência de relevantes e
numerosas ocorrências envolvendo bombas e explosivos. Evidenciou-se a forte necessidade
de obtenção de informações das ocorrências por parte dos policiais que operam na ponta do
combate desse mal da sociedade. Percebeu-se também o prejuízo que a ausência de dados
acarreta ao impossibilitar a objetividade na gestão dos recursos públicos para a aquisição e
distribuição de equipamentos, bem como treinamento e capacitação dos policiais. Assim, fica
patente a demanda pelos dados e a necessidade que os mesmos estejam centralizados em uma
115
única base. A partir daí, um desafio se impõe: como centralizar os dados dessas ocorrências e
gerar estatísticas oficiais?
Essas estatísticas não podem ter caráter especulativo e nem oriundas de arquivos
pessoais, ou realizadas por profissionais poucos afetos às estatísticas e às ciências da
informação, que buscam simplesmente solucionar problemas imediatos do seu dia-a-dia.
Devem atender à sociedade e não ao indivíduo, devem ter suas devidas defesas à má
utilização pela natureza sensível do tema, mas nem por isso perder sua essência pública.
Como se trata de informações de segurança pública e de âmbito nacional, o mister de
tratá-las recai na alçada do Ministério da Justiça (MJ).
Pela estrutura da segurança pública nacional, como já visto na teoria e exemplificado
na prática pela execução dos grandes eventos de segurança com as forças policiais
trabalhando de forma integrada, cabe à Senasp promover ações para a formação desse
almejado banco de dados.
Para uma solução mais consistente, o ideal é que haja a coordenação por uma
instituição com essência na geração de estatísticas e com a autoridade de produzi-las nos mais
variados temas. A aceitação internacional dessas estatísticas é vital para o correto intercâmbio
entre os países. Assim, nesse contexto, caberia ao Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – IBGE realizá-las.
A estrutura de coleta e centralização dos dados oriundos das unidades da federação
existe desde o lançamento do primeiro módulo do Sistema Nacional de Estatísticas de
Segurança Pública e Justiça Criminal (Sinesp) em dezembro de 2003, com a realização de
padronizações de procedimentos para o tratamento da informação das ocorrências policiais. O
monitoramento é relacionado a 54 tipos de delitos, em 224 municípios brasileiros com
população acima de 100 mil habitantes, caracterizando vítimas, agressores e a presença de
armas (PEIXOTO76, 2004).
A estrutura prevê a utilização de várias bases de dados (Tabela 4).
76
PEIXOTO, Betânia Totino; LIMA, Renato Sérgio de; DURANTE, Marcelo Ottoni. Metodologias e
criminalidade violenta no Brasil. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 18, n.1, p. 13-21, mar. 2004.
116
PERIODICIDADE
Mensal
Anual
Anual
Anual
Tabela 4 – Estrutura de coleta de dados do Sinesp.
BASES DO SISTEMA
FONTES DE DADOS
Polícia Civil
Ocorrências Criminais e
Polícia Militar
Atividades de Segurança
Corpo de Bombeiros
Pública
Guardas Municipais
Polícia Civil
Cadastro Nacional de Mortes
Sistema
Único de Saúde
Violentas
Ouvidorias
Controle de Ação Policial
Corregedorias
Polícia Civil
Fluxo Sistema Justiça
Polícia Militar
Criminal
Ministério Público
Tribunais
Pesquisa Nacional de
IBGE
Vitimização
Polícia Civil
Polícia Militar
Perfil das Organizações de
Corpo de Bombeiros
Segurança Pública
Guardas Municipais
Polícia Técnica
77
Fonte: Ministério da Justiça - Sinesp .
Evidentemente, os dados coletados para, por exemplo, descrever um crime de
homicídio, caracterizando tão somente o agressor, a vítima e a arma utilizada, não atenderá a
demanda desejada. Há diversas outras informações necessárias. Entretanto, pode-se valer da
estrutura existente na Sinesp, acrescentando outras fontes de dados, conforme já descrito, e
padronizar junto a essas um conjunto mínimo de procedimentos, visando tratar
especificamente das informações relativas às ocorrências de bombas e explosivos.
5.4.2. As informações quantitativas e qualitativas relevantes
Os dados quando existentes, não seguem uma formatação própria. Assim, mesmo
que exista uma política de registro, nem sempre as informações mais importantes são
preservadas.
Além de um breve relato do ocorrido, algumas descrições são imprescindíveis. É
preciso então realizar um profundo estudo técnico objetivando padronizar os campos
necessários a correta utilização das informações. Comparativamente a outras bases de dados,
mesmo as criminais, a quantidade de registros não é muito grande, o que pode propiciar o uso
também de imagens.
77
Disponível em: <http://www.mj.gov.br/data/Pages/MJCF2BAE97ITEMID01FDE79D86AA482EA3A212E94
697F2C2PTBRNN.htm>. Acesso em: 28 ago. 2009.
117
Em se tratando de artefato explosivo, cita-se, por exemplo, a diferenciação de
algumas características, tais como tipo de explosivo, quantidade utilizada, tamanho, forma de
acionamento, origem, grau de sofisticação, habilidade empregada na fabricação, etc.
Caso se trate de um local onde já tenha ocorrido uma explosão, este também deve ser
minuciosamente descrito, relacionando os danos, os relatos de possíveis testemunhas sobre
suas percepções, como som da explosão, cor da fumaça (podem ajudar a diferenciar o tipo de
explosivo empregado), características dos fragmentos encontrados, a distância que houve
lançamento de fragmentos, etc.
Até mesmo as ameaças não concretizadas, devem ser devidamente registradas e
caracterizadas, podem ser descritos o meio empregado (ligação telefônica, carta anônima,
etc.), a ameaça em si, as características de quem fez a ameaça, o alvo, etc.
A quantidade de apreensões e o quanto elas representam em termos de material
explosivo (massa) é relevante para se rastrear a origem dos mesmos, bem como o meio como
foram obtidos.
5.4.3. Política de acesso aos dados
As informações oriundas desse banco de dados centralizado podem ter vários usos, e
com isso, diversos públicos. A utilização pode servir de termômetro do fenômeno, o que
implica numa ampla divulgação de dados quantitativos, como já faz o ISP para apreensões de
explosivos no Rio de Janeiro.
Na utilização para intercâmbio técnico entre as instituições policiais, com o acesso
total ou mesmo parcial das características registradas do evento, é fundamental que haja um
controle. Pode-se usar como exemplo o que já existe hoje na Rede INFOSEG da Senasp78:
A REDE INFOSEG integra as 28 criminais do Brasil (26 estados, distrito federal e
polícia federal) e tem como premissa integrar todas as bases de dados que sejam
úteis à área de segurança pública, justiça e fiscalização de forma a disponibilizar as
informações de acordo com o perfil dos usuários da rede nacional.
Foram criados perfis a fim de serem disponibilizadas para cada usuário somente
as informações necessárias de acordo com a função exercida pelos usuários dentro
de sua instituição.
A rede nacional permite a criação de novos perfis sempre que solicitado por
algum órgão componente da Rede Infoseg, pois o objetivo é difundir o acesso e
levar a informação a todo e qualquer órgão ligado segurança pública, justiça e
fiscalização.
São definidos perfis de acessos pela instituição de segurança a qual o usuário
pertence. Além do acesso aos dados, é importante que a informação trafegue na outra mão, ou
78
Disponível em: < http://www.infoseg.gov.br/infoseg/rede-infoseg/perfis-dos-usuarios>. Acesso em: 30 ago.
2009
118
seja, que vá até o usuário. Isto é possível com a publicação de boletins e relatórios técnicos,
onde os casos mais relevantes são descritos e analisados por especialistas da área, servindo
como fonte de consulta.
Ao governo interessa principalmente a utilização como ferramenta de gestão,
embasando as decisões na alocação de recursos. Para tanto, as informações precisam ser
trabalhadas traduzindo os números em seus significados de prioridades e demandas,
satisfazendo o interesse público de forma clara e objetiva.
5.4.4. A experiência de alguns países na adoção de um banco de dados
A adoção de um sistema que centralize os dados referentes às ocorrências que
envolvem artefatos explosivos, locais sob ameaça, locais de pós-explosão, etc. já é vivenciada
por alguns países há muito tempo. LEÃO79 alerta para a necessidade de se aproveitar esses
sistemas já desenvolvidos e testados, estudando a forma que eles coletam, analisam e
divulgam os dados sobre bombas e explosivos.
Citando como exemplos alguns bancos que possuem sítios na rede mundial de
computadores, têm-se: o banco de dados australiano ABCD (Australian Bomb Data Centre);
o norte americano BDC (Bomb Data Centre) vinculado ao FBI (Federal Bureau of
Investigations); o canadense CBDC (Canadian Bomb Data Centre) e o filipino PBDC
(Philippinne Bomb Data Center).
LEÃO80 faz uma análise detalhada dos seguintes bancos: ABCD, FBI BCD, CBDC e
também do USBDC (United States Bomb Data Center), sendo este mais um banco norte
americano, diferenciando-se do FBI BDC por ser vinculado a outra agência, a ATF (Bureau
of Alcohol, Tobacco, Firearms and Explosives). São comparadas as formas de classificação
do tipo de evento (explosão de bomba, falsa bomba, extravios de explosivos, etc.); os tipos de
local (alvos comerciais, área aberta, pessoa, veículo, etc.); as possíveis motivações
(vandalismo, suicídio, gangues, etc.); o tipo de objeto (caixa, cano, bolsa, granada, garrafa,
etc.); e o tipo de explosivo (ANFO, dinamite, emulsão, pólvora negra, etc.). No comparativo,
são apresentadas as propostas para implementação na Polícia Militar do Estado de São Paulo,
adequando as várias formas à realidade do estado de São Paulo..
79
LEÃO, Décio José Aguiar. Metodologia para análise de eventos criminais com bombas e explosivos.
Monografia apresentada no Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais I/09. São Paulo. Centro de Aperfeiçoamento e
Estudos Superiores da Polícia Militar de São Paulo, 2009. p. 90.
80
LEÃO, Décio. Op Cit. p. 90-136.
119
A complexidade da modelagem de um banco de dados tão específico requer o
trabalho de profissionais especializados na tecnologia da informação, bem como o amplo
assessoramento dos especialistas em bombas e explosivos dos vários entes da segurança
pública em todas as unidades da federação. Essa etapa inicial é fundamental para o sucesso na
criação de um banco centralizado que contemple as demandas existentes, considerando as
diversidades regionais de um país como o Brasil.
120
CONCLUSÃO
O fabrico e a utilização de explosivos foi uma inovação científica e tecnológica, fruto
da engenhosidade humana. Há cerca de mil anos, os chineses descobriram a pólvora e
passaram a utilizá-la, em diversas situações, nos chamados “fogos químicos”. Coube ao sueco
Alfred Nobel, em 1867, dominar os problemas técnicos de sensibilidade e de detonação para
criar a dinamite e colocá-la a serviço da indústria e da exploração mineral, mas também para o
uso militar e de guerras. Embora os royalties da invenção da dinamite tenham sido utilizados
para criar o fundo Nobel de apoio à ciência e à paz, o desenvolvimento dos explosivos serviu
também para a destruição em massa de vidas nas guerras e para ações violentas contra
populações civis e para ações criminosas e terroristas.
A humanidade encontra-se no atual estágio de evolução graças ao emprego dos
explosivos nas mais diversas áreas. Entretanto, o seu uso ilícito e violento pode ocasionar
verdadeiras tragédias, ou mesmo pequenos incidentes que passam despercebidos no cotidiano.
No Brasil, ao contrário do que se pensava, o uso ilícito dos explosivos é um sério e
grave problema de violência, uma questão de segurança pública requerendo uma maior
atenção das autoridades e da sociedade como um todo. Nessa dissertação foi mostrado como
os explosivos são utilizados pelo crime organizado, no roubo de valores, em ataques a
instalações prisionais, em crimes passionais, no vandalismo, na violência entre gangues e
torcidas, na violência em escolas, em crimes ambientais, em crimes contra o patrimônio e nas
ações terroristas. Foram também identificados alguns casos emblemáticos que tiveram grande
repercussão quando ocorreram, mas que não foram suficientemente documentados e suas
lições, muitas vezes, esquecidas.
Neste sentido, a constatação mais grave é de que os registros dessa forma de
violência não estão sistematizados e muito menos contabilizados da forma como deveriam.
Há várias instituições que lidam diretamente com o problema, principalmente as instituições
policiais, mas não há uma comunicação adequada sobre os dados registrados, muito embora
ocorram várias ações conjuntas demonstrando a existência de integração operacional.
Impressiona a variedade de exemplos para os mais diversos tipos de utilização ilícita
dos explosivos. Desde os simulacros ou ameaças falsas, até os perigosos carros-bombas. Da
simplicidade à sofisticação, do crime passional ao terrorismo empresarial. Todas essas
ocorrências desmitificam de vez qualquer idéia de que o Brasil não possui este problema. Os
casos descritos comprovam tal realidade.
121
Por inexistir uma centralização dos importantes registros desses crimes e ainda com
raras referências bibliográficas, os mesmos estão fadados a caírem no esquecimento. O
resgate dessa história só foi possível graças ao empenho dos técnicos policiais que forneceram
muitos dados dos seus próprios arquivos pessoais.
Foram identificadas várias fontes de dados, tantos as diretas, como as alternativas. Se
o problema existe, tem que existir a responsabilidade para solucioná-lo. Neste caso, é um
problema de segurança nacional. As atribuições de cada ente que compõe o sistema foram
levantadas, buscando identificar os possíveis pontos de integração.
A funcionalidade e utilidade de uma sistematização dos dados sobre o uso ilícito dos
explosivos, centralizando todas as ocorrências em um grande banco nacional são enormes.
Basta analisar o que já é feito em outros países. Não só os Estados Unidos, tido como alvo
preferencial do terrorismo, mas também, países que teoricamente teriam uma preocupação
menor, como o a Austrália, o Canadá, Filipinas e outros, só para citar os que possuem acesso
pela rede mundial de computadores.
A realização da primeira Conferência de Segurança Pública (1ª CONSEG), realizada
entre os dias 27 e 30 de agosto de 2009, constitui-se em uma iniciativa fundamental para a
democratização do tema e para a busca de instrumentos que possam garantir a efetividade das
ações de segurança. No eixo 1 do Texto-base da 1ª CONSEG - Gestão democrática: controle
social e externo, integração e federalismo, está escrito o seguinte:
I. Partindo dos princípios do federalismo democrático e da premissa de que a
política de segurança orienta-se por uma abordagem sistêmica, a idealização do
Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) teve como objetivo, entre outros,
incrementar a cooperação intergovernamental em ambiente democrático de
negociação e consenso de interesses, metas e objetivos entre os órgãos de segurança
pública e entre as esferas de governo. Essa premissa é reforçada pelo Programa
Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), que busca ainda
fortalecer os laços federativos e os comunitários. A mesma política de integração
sistêmica dos entes federados e o envolvimento progressivo dos municípios
resultaram na criação de Gabinetes de Gestão Integrada (GGIs), como um espaço de
interlocução permanente entre instâncias governamentais e instituições, sem afetar
as respectivas autonomias e sem qualquer tipo de subordinação funcional ou
política, mas com o objetivo de formalizar e consolidar a participação dos governos
locais nas políticas públicas de segurança e para uma ação coordenada das
instituições de segurança pública. Cabe ainda ressaltar a forte indução do
PRONASCI para a constituição dos Gabinetes de Gestão Integrada Municipais de
forma a produzir mobilizações comunitárias e policiais em torno da sua execução.
Nesse contexto, um dos desafios que se apresenta é a revisão das normas e estruturas
hoje existentes referentes à área de segurança pública, tais como Pronasci, Fundo
Nacional de Segurança Pública e a própria Secretaria Nacional de Segurança Pública
(Senasp) 81.
81
Texto-base da 1ª CONSEG, disponível em:
http://www.conseg.gov.br/index.php?option=com_content&view=category&id=209&Itemid=154
122
Assim, a questão dos explosivos deve ser tratada dentro dos “princípios do
federalismo democrático”. A análise quantitativa e posterior estudo das ocorrências permitirão
a produção e divulgação de relatórios técnicos dos casos mais relevantes nos meios
apropriados, servindo tanto para o conhecimento dos técnicos que lidam com esse problema,
como para as investigações, que podem identificar o modus operandis nas diversas regiões do
país e assim chegar aos autores.
A conclusão que se chega é a necessidade de implantação de um banco de dados
sobre bombas e explosivos, modelados de acordo com os anseios dos profissionais que lidam
com o problema, e adequado à realidade brasileira, visando sempre o interesse público. Para a
concepção e efetiva utilização desse banco, novos estudos precisam ser realizados sobre os
mais diferentes aspectos sobre o tema.
123
ANEXO 1 – LEGISLAÇÃO FEDERAL PERTINENTE AO TEMA
DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 07 DE DEZEMBRO DE 1940 - CÓDIGO PENAL
a) Aplicação da pena - Circunstâncias agravantes:
Artigo 61 – São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem
ou qualificam o crime:
(...)
II – ter o agente cometido o crime:
(...)
d) com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou
cruel, ou de que podia resultar perigo comum;
(...)
b) Dos Crimes contra a vida – Homicídio qualificado:
Artigo 121 – Matar alguém:
Pena – reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos.
(...)
Parágrafo segundo: se o homicídio é cometido:
(...)
III – com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio
insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;
(...)
Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.
c) Dos crimes contra a liberdade individual – Ameaça:
Artigo 147 – Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio
simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave:
Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.
Parágrafo único: somente se procede mediante representação.
d) Dano qualificado:
Artigo 163 – Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia:
Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.
Parágrafo único. Se o crime é cometido:
(...)
II – com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui
crime mais grave;
(...)
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa, além da pena
correspondente à violência.
124
e) Dos crimes de perigo comum – Incêndio:
Artigo 250 – Causar incêndio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o
patrimônio de outrem:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
§ 1º - As penas aumentam-se de um terço:
I – se o crime é cometido com o intuito de obter vantagem pecuniária em proveito
próprio ou alheio;
II – se o incêndio é:
a) em casa habitada ou destinada a habitação;
b) em edifício público ou destinado a uso público ou a obra de assistência social ou
de cultura;
c) em embarcação, aeronave, comboio ou veículo de transporte coletivo;
d) em estação ferroviária ou aeródromo;
e) em estaleiro, fábrica ou oficina;
f) em depósito de explosivo, combustível ou inflamável;
g) em poço petrolífero ou galeria de mineração;
h) em lavoura, pastagem, mata ou floresta.
§ 2º - Se culposo o incêndio, a pena é de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.
f) Dos crimes de perigo comum – Explosão:
Artigo 251 – Expor a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem,
mediante explosão, arremesso ou simples colocação de engenho de dinamite ou de
substância de efeitos análogos:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
§ 1º - Se a substância não é dinamite ou explosivo de efeitos análogos:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 2º - As penas aumentam-se de um terço, se ocorre qualquer das hipóteses previstas
no § 1º, I, do artigo anterior, ou é visada ou atingida qualquer das coisas enumeradas
no Nº II do mesmo parágrafo.
§ 3º - No caso de culpa, se a explosão é de dinamite ou substância de efeitos
análogos, a pena é de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos; nos demais casos,
é de detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.
g) Dos Crimes de perigo comum – Uso de gás tóxico ou asfixiante:
Artigo 252 – Expor a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem,
usando de gás tóxico ou asfixiante:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Se o crime é culposo:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) anos.
h) Dos crimes de perigo comum – Fabrico, fornecimento, aquisição, posse ou transporte
de explosivos ou gás tóxico, ou asfixiante:
Artigo 253 – Fabricar, fornecer, adquirir, possuir ou transportar, sem licença da
autoridade, substância ou engenho explosivo, gás tóxico ou asfixiante, ou material
destinado à sua fabricação:
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
125
i) Formas qualificadas de crime de perigo comum:
Artigo 258 - Se do crime doloso de perigo comum resulta lesão corporal de natureza
grave, a pena privativa de liberdade é aumentada de metade; se resulta morte, é
aplicada em dobro. No caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena
aumenta-se de metade; se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio
culposo, aumentada de um terço.
j) Comunicação falsa de crime ou de contravenção penal:
Artigo 340 – Provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime
ou de contravenção que sabe não se ter verificado:
Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.
DECRETO-LEI N° 3.688, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941 - LEI DAS
CONTRAVENÇÕES PENAIS
a) Falso alarma
Artigo 41 – Provocar alarma, anunciando desastre ou perigo inexistente, ou praticar
qualquer ato capaz de produzir pânico ou tumulto:
Pena – prisão simples, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, ou multa.
DECRETO-LEI Nº 1.001, DE 21 DE OUTUBRO DE 1969 - CÓDIGO PENAL
MILITAR
a) Bombas e explosivos como circunstâncias agravantes:
Art. 70 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não integrantes ou
qualificativas do crime:
(...)
II - ter o agente cometido o crime:
(...)
e) com o emprego de veneno, asfixia, tortura, fogo, explosivo, ou qualquer outro
meio dissimulado ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum;
(...)
b) Homicídio qualificado pelo uso de bombas ou explosivos:
Art. 205 - Matar alguém
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
(...)
§ 2º - Se o homicídio é cometido:
(...)
III - com emprego de veneno, asfixia, tortura, fogo, explosivo, ou qualquer outro
126
meio
dissimulado
ou
cruel,
resultar perigo comum;
(...)
Pena - reclusão, de doze a trinta anos.
ou
de
que
possa
c) Ameaça de bomba:
Art. 223 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio
simbólico, de lhe causar mal injusto e grave:
Pena - detenção, até seis meses, se o fato não constitui crime mais grave.
Parágrafo único. Se a ameaça é motivada por fato referente a serviço de natureza
militar, a pena é aumentada de um terço.
d) Dano qualificado pelo uso de bombas ou explosivos:
Art. 259 - Destruir, inutilizar, deteriorar ou fazer desaparecer coisa alheia:
Pena - detenção, até seis meses.
Parágrafo único. Se se trata de bem público:
Pena - detenção, de seis meses a três anos.
Art. 261 - Se o dano é cometido:
(...)
II - com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui
crime mais grave;
(...)
Pena - reclusão, até quatro anos, além da pena correspondente à violência.
e) Bomba incendiária
Art. 268 - Causar incêndio em lugar sujeito à administração militar, expondo a
perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem:
Pena - reclusão, de três a oito anos.
§ 1º - A pena é agravada:
I - se o crime é cometido com intuito de obter vantagem pecuniária para si ou para
outrem;
II - se o incêndio é:
a) em casa habitada ou destinada a habitação;
b) em edifício público ou qualquer construção destinada a uso público ou a obra de
assistência social ou de cultura;
c) em navio, aeronave, comboio ou veículo de transporte coletivo;
d) em estação ferroviária, rodoviária, aeródromo ou construção portuária;
e) em estaleiro, fábrica ou oficina;
f) em depósito de explosivo, combustível ou inflamável;
g) em poço petrolífero ou galeria de mineração;
h) em lavoura, pastagem, mata ou floresta.
§ 2º - Se culposo o incêndio:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
f) Bomba explosiva
Art. 269 - Causar ou tentar causar explosão, em lugar sujeito à administração militar,
expondo a perigo a vida, a integridade ou o patrimônio de outrem:
127
Pena - reclusão, até quatro anos.
§ 1º - Se a substância utilizada é dinamite ou outra de efeitos análogos:
Pena - reclusão, de três a oito anos.
§ 2º - A pena é agravada se ocorre qualquer das hipóteses previstas no § 1, número I,
do artigo anterior, ou é visada ou atingida qualquer das coisas enumeradas no
número II do mesmo parágrafo.
§ 3º - Se a explosão é causada pelo desencadeamento de energia nuclear:
Pena - reclusão, de cinco a vinte anos.
§ 4º - No caso de culpa, se a explosão é causada por dinamite ou substância de
efeitos análogos, a pena é detenção, de seis meses a dois anos; se é causada pelo
desencadeamento de energia nuclear, detenção de três a dez anos; nos demais casos,
detenção de três meses a um ano.
g) Bomba tóxica
Art. 270 - Expor a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem, em
lugar sujeito à administração militar, usando de gás tóxico ou asfixiante ou
prejudicial de qualquer modo à incolumidade da pessoa ou da coisa:
Pena - reclusão, até cinco anos.
Parágrafo único. Se o crime é culposo:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
h) Bomba radioativa
Art. 271 - Expor a perigo a vida ou a integridade física de outrem, em lugar sujeito à
administração militar, pelo abuso de radiação ionizante ou de substância radioativa:
Pena - reclusão, até quatro anos.
Parágrafo único. Se o crime é culposo:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
i) Formas qualificadas pelo resultado
Art. 277 - Se do crime doloso de perigo comum resulta, além da vontade do agente,
lesão grave, a pena é aumentada de metade; se resulta morte, é aplicada em dobro.
No caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; se
resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um
terço.
j) Crime de perigo comum em tempo de guerra
Art. 386 - Praticar crime de perigo comum definido nos artigos 268 a 276 e 278, na
modalidade dolosa:
I - se o fato compromete ou pode comprometer a preparação, a eficiência ou as
operações militares;
II - se o fato é praticado em zona de efetivas operações militares e dele resulta
morte:
Pena - morte, grau máximo; reclusão, de vinte anos, grau mínimo.
128
LEI Nº 7.170, DE 14 DE DEZEMBRO DE 1983 - LEI QUE DISPÕE SOBRE
CRIMES CONTRA A SEGURANÇA NACIONAL
a) Sabotagem:
Artigo 15 – Provocar sabotagem contra instalações militares, meios de
comunicações, meios e vias de transporte, estaleiros, portos, aeroportos, fábricas,
usinas, barragens, depósitos e outras instalações congêneres:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos.
§ 1º - Se do fato resulta:
a) lesão corporal grave, a pena aumenta-se até a metade;
b) dano, destruição ou neutralização dos meios de defesa ou de segurança;
paralisação, total ou parcial, de atividade ou serviços públicos reputados essenciais
para a defesa, a segurança ou a economia do País, a pena aumenta-se até o dobro;
c) morte, a pena aumenta-se até o triplo.
§ 2º - Punem-se os atos preparatórios de sabotagem com a pena deste artigo reduzida
de dois terços, se o fato não constitui crime mais grave.
b) Terrorismo
Artigo 20 – Devastar, saquear, extorquir, roubar, seqüestrar, manter em cárcere
privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de
terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à
manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas.
Pena – reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos.
Parágrafo único. Se do fato resulta lesão corporal grave, a pena aumenta-se até o
dobro; se resulta morte, aumenta-se até o triplo.
LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990 - ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE
a) Dos crimes:
Artigo 242 – Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer
forma, a criança ou ao adolescente arma, munição ou explosivo:
Pena – reclusão de 3 (três) a 6 (seis) anos;
Artigo 244 - Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer
forma, a criança ou ao adolescente fogos de estampido ou de artifício, exceto
aqueles que, pelo seu reduzido potencial, sejam incapazes de provocar qualquer
dano físico em caso de utilização indevida:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
129
LEI N.º 8.072, DE 25 DE JULHO DE 1990 - LEI QUE DISPÕE SOBRE OS
CRIMES HEDIONDOS
a) Homicídio qualificado pelo uso de explosivos:
Art. 1º - São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou
tentados:
I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de
extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121,
§ 2º, I, II, III, IV e V);
(...)
b) Conseqüências da pratica do terrorismo
Art. 2º - Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e
drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de:
I - anistia, graça e indulto;
II - fiança.
§ 1º - A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime
fechado.
§ 2º - A progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste
artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for
primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente.
§ 3º - Em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o
réu poderá apelar em liberdade.
§ 4º - A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei nº 7.960, de 21 de dezembro de
1989, nos crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável
por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade.
LEI Nº 7.565, DE 19 DE DEZEMBRO DE 1986 - CÓDIGO BRASILEIRO DE
AERONÁUTICA
a) Transporte de material perigoso:
Art. 21. Salvo com autorização especial de órgão competente, nenhuma aeronave
poderá transportar explosivos, munições, arma de fogo, material bélico,
equipamento destinado a levantamento aerofotogramétrico ou de prospecção, ou
ainda quaisquer outros objetos ou substâncias consideradas perigosas para a
segurança pública, da própria aeronave ou de seus ocupantes.
Parágrafo único. O porte de aparelhos fotográficos, cinematográficos, eletrônicos ou
nucleares, a bordo de aeronave, poderá ser impedido quando a segurança da
navegação aérea ou o interesse público assim o exigir.
Art. 299. Será aplicada multa de (vetado) ate 1.000 (mil) valores de referência, ou de
suspensão ou cassação de quaisquer certificados de matrícula, habilitação,
concessão, autorização, permissão ou homologação expedidos segundo as regras
deste Código, nos seguintes casos:
(...)
130
k) transportar, ciente do conteúdo real, carga ou material perigoso ou proibido, ou
em desacordo com as normas que regulam o trânsito de materiais sujeitos a
restrições;
b) Detenção, Interdição e Apreensão de Aeronave
Art. 303. A aeronave poderá ser detida por autoridades aeronáuticas, fazendárias ou
da Polícia Federal, nos seguintes casos:
(...)
IV - para verificação de sua carga no caso de restrição legal (artigo 21) ou de porte
proibido de equipamento (parágrafo único do artigo 21);
V - para averiguação de ilícito.
Art. 304. Quando, no caso do item IV, do artigo anterior, for constatada a existência
de material proibido, explosivo ou apetrechos de guerra, sem autorização, ou
contrariando os termos da que foi outorgada, pondo em risco a segurança pública ou
a paz entre as Nações, a autoridade aeronáutica poderá reter o material de que trata
este artigo e liberar a aeronave se, por força de lei, não houver necessidade de
apreendê-la.
§ 1° Se a aeronave for estrangeira e a carga não puser em risco a segurança pública
ou a paz entre as Nações, poderá a autoridade aeronáutica fazer a aeronave retornar
ao país de origem pela rota e prazo determinados, sem a retenção da carga.
§ 2° Embora estrangeira a aeronave, se a carga puser em risco a segurança pública e
a paz entre os povos, poderá a autoridade aeronáutica reter o material bélico e fazer
retornar a aeronave na forma do disposto no parágrafo anterior.
Art. 307. A autoridade aeronáutica poderá interditar a aeronave, por prazo não
superior a 15 (quinze) dias, mediante requisição da autoridade aduaneira, de Polícia
ou de saúde.
Parágrafo único. A requisição deverá ser motivada, de modo a demonstrar justo
receio de que haja lesão grave e de difícil reparação a direitos do Poder Público ou
de terceiros; ou que haja perigo à ordem pública, à saúde ou às instituições.
LEI 10.744, DE 09 DE OUTUBRO DE 2003 – LEI QUE DISPÕE SOBRE
ATENTADOS TERRORISTAS CONTRA AERONAVES DE MATRÍCULA
BRASILEIRA
a) Assunção pela União de responsabilidades civis perante terceiros no caso de atentados
terroristas e outros eventos correlatos, contra aeronaves de matrícula brasileira
operadas por empresas brasileiras de transporte aéreo público:
Art. 1º. Fica a União autorizada, na forma e critérios estabelecidos pelo Poder
Executivo, a assumir despesas de responsabilidades civis perante terceiros na
hipótese da ocorrência de danos a bens e pessoas, passageiros ou não, provocados
por atentados terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos, ocorridos no Brasil ou
no exterior, contra aeronaves de matrícula brasileira operadas por empresas
brasileiras de transporte aéreo público, excluídas as empresas de táxi aéreo.
§1º O montante global das despesas de responsabilidades civis referidas no caput
fica limitado ao equivalente em reais a US$ 1,000,000,000.00 (um bilhão de dólares
dos Estados Unidos da América) para o total dos eventos contra aeronaves de
131
matrícula brasileira operadas por empresas brasileiras de transporte aéreo público,
excluídas as empresas de táxi aéreo.
§2º As despesas de responsabilidades civis perante terceiros, na hipótese da
ocorrência de danos a pessoas de que trata o caput deste artigo, estão limitadas
exclusivamente à reparação de danos corporais, doenças, morte ou invalidez sofridos
em decorrência dos atos referidos no caput deste artigo, excetuados, dentre outros,
os danos morais, ofensa à honra, ao afeto, à liberdade, à profissão, ao respeito aos
mortos, à psique, à saúde, ao nome, ao crédito e ao bem-estar, sem necessidade da
ocorrência de prejuízo econômico.
§3º Entende-se por atos de guerra qualquer guerra, invasão, atos inimigos
estrangeiros, hostilidades com ou sem guerra declarada, guerra civil, rebelião,
revolução, insurreição, lei marcial, poder militar ou usurpado ou tentativas para
usurpação do poder.
§4º Entende-se por ato terrorista qualquer ato de uma ou mais pessoas, sendo ou não
agentes de um poder soberano, com fins políticos ou terroristas, seja a perda ou dano
dele resultante acidental ou intencional.
§5º Os eventos correlatos, a que se refere o caput deste artigo, incluem greves,
tumultos, comoções civis, distúrbios trabalhistas, ato malicioso, ato de sabotagem,
confisco, nacionalização, apreensão, sujeição, detenção, apropriação, seqüestro ou
qualquer apreensão ilegal ou exercício indevido de controle da aeronave ou da
tripulação em vôo por parte de qualquer pessoa ou pessoas a bordo da aeronave sem
consentimento do explorador.
132
REFERÊNCIAS
ABRAMOVAY, Mirian; RUA, Maria das Graças. Violences in schools. Brasília: UNESCO,
2005.
ACKERMAN, Gary. WMD terrorism research: whereto from here? International Studies
Review. Monterey, v. 7, n.1, p. 140-143, 2005.
AZAROW, Kenneth et al. Bronchoscopy in the blast injury patient. Archives of Surgery.
Chicago, v. 141, n. 8, p. 806-811, ago. 2006.
BACCI, Denise de La Corte; LANDIM, Paulo Milton Barbosa; ESTON, Sérgio Médici de.
Aspectos e impactos ambientais de pedreira em área urbana. Revista Escola de Minas. Ouro
Preto, v. 59, n. 1, p. 47-54, jan/mar. 2006.
BANKER, John G.; REINEKE, Edward G. Explosion welding. In: OLSON, David L. (ed.).
ASM Handbook. Cleveland: ASM International, v. 6, p. 303-305, 1993.
BAR-TAL, Gabi et al. Role of radiology in evaluation of terror attack victims. American
Journal of Roentgenology. Leesburg, v. 187, n. 3, p. 609-616, set. 2006.
BELANGER, Heather G. et al. Mechanism-of-injury approach to evaluating patients with
blast-related polytrauma. The Journal of the American Osteopathic Association. Chicago,
v. 106, n. 5, p. 265-270, maio 2006.
BELARMINO, Alexanders Tadeu das Neves; FORTES, Marcelo de Azambuja; MAIA,
Bruno Costa Pitanga. Análise da atuação da coordenação de vistorias e contramedidas
nos jogos panamericanos: gestão de grupos antibombas em grandes eventos. 2008. 68f.
Monografia (conclusão do curso) – Academia Nacional de Polícia, Curso Superior de Polícia.
Brasília.
BEZERRA NETO, Aggeu Lemos et al. Bombas e explosivos: XVII CABE. Brasília:
Academia Nacional de Polícia, 2006.
BISTERÇO, Maristela Guizardi; LOCATELLI, Lys Rosita Boeira. Atentados com uso de
explosivos: gerenciamento da crise. Monografia apresentada no Curso Superior de Polícia.
Brasília. Academia Nacional de Polícia e Fundação Getúlio Vargas, 2005.
BRANT, Leonardo Nemer Caldeira Brant (coord.). Terrorismo e direito: os impactos do
terrorismo na comunidade internacional e no Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
133
CRODDY, Eric A.; WIRTZ, James J. Weapons of mass destruction: an encyclopedia of
worldwide policy, technology, and history. Santa Barbara: ABC-CLIO, 2005.
DAVIS, Mark A. et al. The United States twenty-year experience with bombing incidents:
implications for terrorism preparedness and medical response. The Journal of trauma
injury, Infection, and critical care. San Antonio, n. 59, p. 1436-1444, dez. 2005.
DAVIS, W. C.; HILL, L. G. Joints, Cracks, Holes and Gaps in Detonating Explosives. In:
Symposium (International) on Detonation, 12, 2002, San Diego. Proceedings of the…
DUARTE, Mário Sérgio de Brito (coord.). A análise criminal e o planejamento
operacional. Série Análise Criminal, v. 1. Rio de Janeiro: Riosegurança, 2008.
ENTRAM os assassinos. Veja, São Paulo, n. 625, p. 16-23, set. 1980.
ERISMAN, Jan W. et al. How a century of ammonia synthesis changed the world. Nature
Geoscience. London, v. 1, n. 10, p. 636-639, out. 2008.
EUA. Department of Justice. Office of Justice Programs. National Institute of Justice. A
guide for explosion and bombing scene investigation. Washington: 2000.
FERREIRA, Helder; FONTOURA, Natália de Oliveira. Sistema de justiça criminal no
Brasil: quadro institucional e um diagnóstico de sua atuação. Texto para discussão nº
1330. Brasília: IPEA, 2008.
FORDHAM, Stanley. High explosives and propellants. 2 ed. Oxford: Pergamon, 1980.
FRANCO, Antônio Luís Brandão; MARTINS, Ataide da Rosa; SAIKALI, Ricardo Hamid.
Segurança na aviação civil: o papel do Departamento de Polícia Federal no combate ao
terrorismo envolvendo bombas e explosivos. Monografia apresentada no Curso Superior de
Polícia. Brasília. Academia Nacional de Polícia e Fundação Universidade do Tocantis –
UNITINS, 2006.
HAMMOND, David J.; HINMAN, Eve E. Lessons from the Oklahoma City Bombing:
defensive design techniques. Reston: ASCE Publications, 1997.
134
LAFONT, M. C.; NOBILI, A.; MASRI T. Recent Developments in Characterization of a
Titanium-Steel Explosion Bond Interface. In: Proceedings of reactive metals in corrosive
applications conference. Albany: Wah Chang, p. 89-98, set. 1999.
LEÃO, Décio José Aguiar. Metodologia para análise de eventos criminais com bombas e
explosivos. Monografia apresentada no Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais I/09. São
Paulo. Centro de Aperfeiçoamento e Estudos Superiores da Polícia Militar de São Paulo,
2009.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2008
MARCELLA, Gabriel. The United States and Colombia: the journey from ambiguity to
strategic clarity. Strategic Studies Institute. Carlisle: United States Army War College, may.
2003.
MARCONDES FILHO, Ciro. Violência fundadora e violência reativa na cultura brasileira.
São Paulo em perspectiva, São Paulo, v.15, n.2, p. 20-27, abr. 2001.
MAUES, Flamarion. O momento oportuno: Kairós, uma editora de oposição. História,
Franca, v. 25, n. 2, p. 115-146, nov. 2006.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 28 ed. São Paulo: Malheiros
Editores Ltda, 2003.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2007.
MOHTADI, Hamid; MURSHID, Antu. A global chronology of incidents of Chemical,
Biological, Radioactive, and Nuclear Attacks: 1950-2005. National Center of Food
Protection and Defense. University of Minnesota. St. Paul: 2006.
PAES, Vivian Ferreira. A Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro: análise de uma (re)
forma de governo na Polícia Judiciária. 2006. 164f. Dissertação (Mestrado do Programa de
Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio
de Janeiro.
PEIXOTO, Betânia Totino; LIMA, Renato Sérgio de; DURANTE, Marcelo Ottoni.
Metodologias e criminalidade violenta no Brasil. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v.
18, n.1, p. 13-21, mar. 2004.
135
PIMENTA, Carlos Alberto Máximo. Violência entre torcidas organizadas de futebol. São
Paulo em perspectiva, São Paulo, v.14, n.2, p. 122-128, jun. 2000.
PINTO, Cleverson Neves; SILVA, Marcello Torres da; VIEIRA, Roberto de Araújo. O uso
de espuma própria para a contenção de material explosivo: uma abordagem prática.
2008. 64f. Monografia (conclusão do curso) – Academia Nacional de Polícia, Curso Superior
de Polícia. Brasília.
RAMOS, Mariana. Agressão além do mar - Pesca com bomba, um crime social, cultural e
ambiental. Salvador: Faculdade de Comunicação e Marketing/Centro Universitário da Bahia
- FIB, 2006.
ROWLAND III, James H.; MAINIERO, Richard J. A review of recent accidents involving
explosives transport. In: ANNUAL CONFERENCE ON EXPLOSIVES AND BLASTING
TECHNIQUE, 34, Louisiana. Anais… Cleveland: International Society of Explosives
Engineers, 2008. Disponível em: <http://www.cdc.gov/niosh/mining/pubs/pdfs/arora.pdf>.
Acesso em: 29 dez. 2008.
SEIXAS, Eunice Castro. “Terrorismos”: uma exploração conceitual. Revista de sociologia e
política, Curitiba, v.16, número suplementar, p. 9-26, ago. 2008.
SENRA, Nelson. O saber e o poder das estatísticas. Rio de Janeiro: IBGE/CDDI, 2005.
SILVA, José Afonso da: Curso de direito constitucional. 22 ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 2003.
SILVA, Jorge da. Criminologia Crítica: segurança pública e política. 2 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2008.
SILVA, Maria J. D. da. Violências nas escolas, vozes ausentes: a perspectiva de pais ou
responsáveis de escolas públicas. 2004. 166f. Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade Federal do Paraná, Curitiba.
SOARES, Luiz Eduardo. Meu casaco de general: 500 dias no front da segurança pública
do Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
STEPHENS, Hugh W. The Texas City Disaster, 1947. Texas: Universty of Texas Press,
1997.
136
STETTBACHER, Alfred. Polvoras y explosivos. Buenos Aires: G. Gili, 1952.
SUCESKA, Muhamed. Test methods for explosives. Nova York: Springer, 1995.
TOLEDO, Luiz Henrique de. Short Cuts – histórias de jovens, futebol e condutas de risco.
Revista Brasileira de Educação. Campinas, n. 6, p. 209-221, set/out/nov/dez. 1997.
UMA bomba nos nervos do país tenso. Veja, São Paulo, n. 1078, p.62-67, mai. 1989.
WALTERS William P. Shock waves in the study of shaped charges. Technical Report.
Maryland: Ballistic Research Laboratory Aberdeen proving ground; ago. 1991. BRL-TR3258.
______. A Brief History of Shaped Charges. Technical Report. Maryland: Ballistic
Research Laboratory Aberdeen proving ground; dez. 2008. ARL-RP-232. p. 2
WALTERS William P.; ZUKAS, Jonas A. (ed.). Explosive effects and applications. Nova
York: Springer, 2003.
ZAVERUCHA, Jorge; MELO FILHO, Hugo Cavalcanti. Superior Tribunal Militar: entre o
autoritarismo e a democracia. Dados, Rio de Janeiro, v. 47, n. 4, p. 763-797, 2004.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo
Descargar