ARTIGO ORIGINAL 203 Rev Bras Hipertens vol.17(4):203-209, 2010. Prevalência de fatores de risco para hipertensão arterial em escolares do município de Fortaleza, CE Prevalence of hypertension risk factors in students in the city of Fortaleza, Ceará, Brazil Frederico Lemos Araújo1, Luciana Zaranza Monteiro2, Mônica Helena Neves Pereira Pinheiro3, Carlos Antônio Bruno da Silva1 RESUMO No Brasil, a prevalência de hipertensão arterial (HA) e seus fatores de risco para crianças e adolescentes são pouco conhecidos nas regiões menos desenvolvidas. O objetivo deste estudo foi determinar a prevalência de fatores de risco para hipertensão arterial, em escolares da rede pública do município de Fortaleza, Ceará. Foram avaliados 493 indivíduos de 7 a 17 anos, em duas escolas da cidade de Fortaleza, Ceará. Fatores de risco comportamentais (inatividade física, tabagismo e etilismo) e biológicos (excesso de peso corporal e pressão arterial elevada) foram investigados. Para as comparações entre proporções, utilizou-se o teste do qui-quadrado e, para amostras independentes, o teste T. Considerando os valores para os fatores de risco cardiovascular, os meninos estavam, de alguma forma, mais “irregularmente ativos” (89,2%) do que as meninas (76%), uma vez mais sedentárias (19,1%). A prevalência de HAS foi maior entre os meninos [25,2% (p < 0,03)]. Concluiu-se que os fatores de risco para hipertensão representam um problema de saúde com alta prevalência entre os escolares de Fortaleza, CE. PALAVRAS-CHAVE Escolares, hipertensão, fatores de risco. ABSTRACT The systemic arterial hypertension (SAH) represents serious problem of health. Some risk factors for illness are more common in great urban centers. Little is known about the prevalence of arterial hypertension (AH) and its risk factors in the less developed regions of Brazil. The aim of this study was to determine the prevalence of hypertension risk factors in students enrolled in public schools in the municipality of Fortaleza, Ceará, Brazil. We evaluated 493 students aged between 7 and 17 from a school in the city of Fortaleza, Ceará state, Brazil. Behavioral risk factors (physical inactivity, smoking and alcoholism) as well as biological risk factors (overweight and high blood pressure) were investigated. The chi-square test was used for comparing proportions, while the T test was used for independent samples. Among the values for cardiovascular risk factors, the boys were, somehow more “irregularly active” (89.2%) of girls (76%) as more sedentary (19.1%). Another risk factor explored was the presence of tobacco, directly or indirectly by a group of matched age groups where they positively (groups 7 and 8) smoked more than they represent a small proportion compared with nonsmokers. The prevalence of hypertension was 25.2% higher in boys (p < 0.03). It has been concluded that the cardiovascular risk factors represent a high prevalence health problem among the students in Fortaleza, Ceará, Brazil. KEYWORDS Students, hypertension, risk factors. Recebido: 14/7/2010 Aceito: 22/11/2010 1 Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Universidade de Fortaleza (Unifor). 2 Departamento de Clínica Médica, Divisão de Endocrinologia e Metabologia, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (FMRP-USP). 3 Departamento de Educação Física da Unifor. Correspondência para: Frederico Lemos Araújo. Universidade de Fortaleza. Av. Washington Soares, 1321, Edson Queiroz – 60811-341 – Fortaleza, CE. E-mail: lucianazaranza@ hotmail.com 204 Prevalência de fatores de risco para hipertensão arterial em escolares do município de Fortaleza, CE Rev Bras Hipertens vol.17(4):203-209, 2010. Araújo FL, Monteiro LZ, Pinheiro MHNP, Silva CAB INTRODUÇÃO As doenças cardiovasculares (DCV) são as principais causas de morbidade e mortalidade em todo o mundo. No ano 2000, essas doenças contribuíram para 62,9% da mortalidade nas Américas1,2. A hipertensão arterial sistêmica (HAS), por seu importante papel como fator de risco cardiovascular modificável3, revelase como um dos mais relevantes problemas de saúde pública do país, com prevalência entre 22,3% e 43,9%, dependendo da po­pulação estudada, da região ou do critério diagnóstico utilizado4. Dentre os diversos indicadores de risco que contribuem para o desenvolvimento da hipertensão arterial em crianças e adolescentes, destacam-se: níveis iniciais elevados de pressão arterial (PA), história familiar, obesidade, sedentarismo, tabagismo e etilismo. Estudos longitudinais têm demonstrado que crianças com níveis de PA elevados apresentam maior probabilidade de se tornarem adultos portadores de hipertensão arterial5,6. A necessidade de uma definição do que seria o nível pressórico normal em crianças e adolescentes motivou a rea­ lização de um estudo epidemiológico realizado em Bogalusa (Louisiana, EUA), denominado The Bogalusa Study, no qual por foco descreveu o comportamento da PA em mais de 4 mil crianças negras e brancas, com o intuito da padronização de valores considerados normais para aquelas pessoas7. Já em 1977, um novo estudo chamado National Task Force on Hypertension of National Heart, Lung and Blood Institute foi proferido pela Academia Americana de Pediatria propondo que valores iguais ou acima do percentil 95 para a respectiva idade e sexo fossem considerados como hipertensão 8. Por conseguinte, em 1987 saiu a segunda versão, revisada, desses dados do Task Force norte-americano. Dentre os pontos determinados, um foi que a definição de hipertensão arterial deve estar associada também aos valores do peso corporal e da estatura, e no ano de 1996 foi publicada uma atualização do Task Force 1987 com as tabelas normativas com altura, idade e sexo para o diagnóstico de HAS de crianças e adolescentes9. A etiologia das doenças e agravos não transmissíveis (DANTs) e, consequentemente, das DCVs tem origem na presença e/ou agrupamento de fatores de riscos inerentes ao próprio indivíduo (gerais, comportamentais e biológicos) ou à comunidade em que ele se encontra inserido (condições socioeconômicas, ambientais, culturais e de urbanização)10-13. Além disso, diversos fatores de risco de origem biológica adquiridos na adolescência tendem a persistir até a maioridade14, acentuando o risco de morbidade na vida adulta15,16. A Organização Mundial da Saúde (OMS)17 considera a escola como um ambiente apropriado para a implementação de programas de promoção da saúde visando à prevenção de mortes prematuras e doenças. Todavia, estudos sobre fatores de risco cardiovascular em adolescentes e/ou escolares brasileiros são escassos18-21. Informação sobre a prevalência de hipertensão nas diferentes regiões do Brasil é essencial para o desenvolvimento de políticas de prevenção e controle. Além do mais, é importante conhecer os fatores de risco para a hipertensão, que podem variar de acordo com as localidades estudadas. Assim, o objetivo do presente estudo foi determinar a prevalência de fatores de risco para hipertensão arterial em escolares da rede pública do município de Fortaleza, Ceará. PARTICIPANTES E MÉTODOS O presente estudo caracterizou-se como sendo do tipo analítico transversal, realizado entre maio e agosto de 2008, com escolares da rede pública de ensino do município de Fortaleza. A população foi composta por crianças e adolescentes de 7 a 17 anos, matriculados em duas escolas da zona urbana, uma vez que, considerados uma população de 350 mil estudantes que existem na cidade de Fortaleza nas faixas etárias acima citadas, uma frequência estimada de 50% para a ocorrência da presença de fatores de risco cardiovascular, como hipertensão, a precisão de 5% e um nível de confiança de 95%, a amostra necessária para se avaliar neste estudo seria de 384 estudantes. Foi utilizada uma amostra de conveniência nas duas escolas com um total de 493 estudantes, maior que o número mínimo calculado. Foram incluídas no estudo crianças e adolescentes, independentemente do gênero, que estivessem regularmente matriculados nas instituições e cujos nomes constassem na lista de frequência. As crianças foram convidadas a participar voluntariamente da pesquisa e sua inclusão estava vinculada à apresentação do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado por seus pais ou responsáveis legais. O projeto de pesquisa resultou no estudo sobre a prevalência de fatores de risco para hipertensão arterial em escolares do município de Fortaleza, CE, sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade de Fortaleza (nº 224/08), de acordo com a Resolução nº 196/96, do Conselho Nacional de Saúde. Todas as turmas de ambas as escolas participaram das avaliações em que os dias corresponderam aos mesmos das aulas de educação física escolar. A coleta de dados teve início com as devidas aprovações e após reunião com os pais dos alunos, na qual estes foram esclarecidos sobre os objetivos propostos e convidados a assinar o termo de consentimento para que as crianças e adolescentes pudessem participar da pesquisa. Rev Bras Hipertens vol.17(4):203-209, 2010. 205 Prevalência de fatores de risco para hipertensão arterial em escolares do município de Fortaleza, CE Araújo FL, Monteiro LZ, Pinheiro MHNP, Silva CAB Os fatores de risco comportamentais foram avaliados por questionários elaborados com base em outros instrumentos previamente validados e empregados em estudos com estudantes. Para definir o nível de atividade física de cada estudante, utilizouse o critério de classificação do Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ) (Apêndice I), versão curta em português. Na análise do tabagismo, foram considerados tabagistas aqueles que tinham hábito ativo de fumar e/ou hábito passivo (pais, irmãos ou amigos fumantes). Os fatores de risco biológicos investigados foram o excesso de peso corporal (sobrepeso e obesidade) e a PA elevada. As medidas antropométricas de massa corporal (kg) e estatura (cm) foram obtidas por meio de uma balança digital e um estadiômetro portátil afixado na parede e devidamente calibrado, por um único avaliador treinado, e o cálculo do índice de massa corporal (IMC) foi obtido por meio do protocolo de Cole et al.22. Medidas da pressão arterial sistólica (PAS) e diastólica (PAD) foram realizadas pelo método auscultatório, mediante a utilização de um esfigmomanômetro do tipo aneroide portátil com manguitos de tamanhos apropriados às circunferências dos braços dos estudantes e devidamente calibrados antes do início do período dos testes. Duas medidas com um intervalo mínimo de 3 minutos foram obtidas com os adolescentes sentados e em repouso por pelo menos 5 minutos. Foi padronizado que, caso houvesse diferenças iguais ou maiores que 4 mmHg entre as aferições, uma terceira mensuração seria realizada. Para fins de análise, considerou-se o valor médio das medidas. Todas as medidas foram realizadas por um único avaliador, devidamente familiarizado com a padronização adotada. A mensuração da PA seguiu as recomendações relatadas na IV Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial12, de acordo com procedimentos e critérios de diagnóstico e classificação de hipertensão arterial em crianças e adolescentes, sendo consideradas hipertensas aquelas em que a PAS e a PAD estivessem no percentil 95 a 99. Para a análise estatística, utilizou-se o programa SPSS versão 15.0 para Windows, em que foi realizada uma análise descritiva (frequência absoluta e relativa) da amostra. Para a comparação dos fatores de riscos cardiovasculares dos escolares, foi utilizado o teste qui-quadrado e, para amostras independentes, o teste T. RESULTADOS Foram avaliados 493 escolares, sendo 262 (53,2%) do sexo feminino. A tabela 1 apresenta as características dos participantes. Observou-se que os meninos apresentavam uma diferença estatisticamente significativa na PAD quando comparados com as meninas. Tabela 1. Características gerais dos escolares examinados do município de Fortaleza, CE Variáveis Meninas (n = 262) Meninos (n = 231) p 0,77 Idade (anos) 11,7 ± 2,7 11,5 ± 2,8 Peso corporal (kg) 40,6 ± 13,7 40,6 ± 14,4 0,18 Estatura (cm) 145,1 ± 13,6 147,1 ± 16,4* 0,000 IMC (kg/m2) 18,8 ± 4,1 18,2 ± 3,4 0,14 PAS (mmHg) 110,6 ± 18,8 113,6 ± 18,1 0,92 PAD (mmHg) 67,5 ± 13,5 66,7 ± 10,5* 0,240 * p < 0,05. Em relação à prevalência de fatores de riscos comportamentais, nota-se que as meninas eram mais sedentárias do que os meninos. Observa-se também que tanto os meninos quanto as meninas estavam classificados no nível irregularmente ativo B, ou seja, não atingiu nenhum dos critérios da recomendação do IPAQ, versão curta (Tabela 2). Tabela 2. Prevalência de fatores de riscos comportamentais entre os escolares examinados em duas escolas públicas em Fortaleza, CE Nível de atividade física (Apêndice I) Meninas (n = 262) Meninos (n = 231) N % N Muito ativo 4 1,5 2 0,9 Ativo 8 3,1 1 0,4 Irregularmente ativo A 1 0,4 0 0,0 Irregularmente ativo B 199 76,0 206 89,2 Sedentário 50 19,1 22 9,5 Tabagismo por idades Grupo 1 6,9 a 7,9 anos Grupo 2 8 a 8,9 anos Grupo 3 9 a 9,9 anos Grupo 4 10 a 10,9 anos Grupo 5 11 a 11,9 anos Grupo 6 12 a 12,9 anos Grupo 7 13 a 13,9 anos Grupo 8 14 a 14,9 anos Grupo 9 15 a 15,9 anos Grupo 10 16 a 17 anos Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não 0 25 0 24 0 25 0 50 0 21 0 14 2 27 0 31 2 28 2 11 0 9,54 0,00 9,16 0,00 9,54 0,00 19,08 0,00 8,02 0,00 5,34 0,76 10,31 0,00 11,83 0,76 10,69 0,76 4,20 5 20 5 17 3 27 2 34 1 15 0 13 4 20 4 31 1 19 0 9 X2 % 2,17 8,70 2,17 7,39 1,30 11,74 0,87 14,78 0,43 6,52 0,00 5,65 1,74 8,70 1,74 13,48 0,43 8,26 0,00 3,91 15,73* 5,56* 6,12* 2,64 2,84 1,35 NC 1,25 3,77 0,59 1,52 * p < 0,05. NC = não calculado, pois não houve casos de tabagismo nesta idade. 206 Prevalência de fatores de risco para hipertensão arterial em escolares do município de Fortaleza, CE Rev Bras Hipertens vol.17(4):203-209, 2010. Araújo FL, Monteiro LZ, Pinheiro MHNP, Silva CAB Sobre o tabagismo, a presença direta ou indiretamente foi correspondida pela distribuição de grupos por faixas etárias, e, positivamente, os grupos 7 e 8 foram aqueles em que o fumo foi mais evidenciado no sexo masculino, com apenas 1,74%, representando uma proporção mínima se comparados com aqueles que não estavam relacionados ao tabaco. Avaliando o índice de massa corporal (IMC), verificou-se que as meninas (23,7%) estavam acima do peso quando comparadas com os meninos. Os valores para prevalência HAS foram maiores nos meninos, representando 25,2%, enquanto entre as meninas apenas 17,6% estavam entre os percentis 95 e 99 (Tabela 3). Tabela 3. Prevalência de fatores de riscos biológicos entre os escolares em duas escolas públicas em Fortaleza, CE Riscos biológicos Meninas (n = 262) Meninos (n = 231) IMC Normal Sobrepeso Obesidade N (%) 200 (76,3) 50 (19,1) 12 (4,6) N (%) 181 (78,4) 50 (21,6) 13 (5,6) Pressão arterial Normal Elevada 216 (82,4) 46 (17,6) 172 (74,8) 58 (25,2) X2 P 0,985 0,661 4,311* 0,038 * p < 0,05. Observa-se na figura 1 que a maioria dos escolares apresentava baixo nível de atividade física, seguido de excesso de gordura corporal. Baixo nível de atividade física 96,7 Sobrepeso e obesidade (IMC) 22,7 Hipertensão 21,2 Histórico familiar DCV 13,2 6,3 Tabagismo 0 20 40 60 80 Percentual 100 120 Figura 1. Prevalência dos fatores de risco cardiovascular de escolares (n = 493). DISCUSSÃO Em estudos observacionais, de recorte transversal, as principais limitações são decorrentes da possibilidade de viés de seleção, viés de causalidade reversa e envolvimento de fatores de confusão. Na presente pesquisa, adotou-se uma amostra representativa da população. A prevalência da hipertensão arterial tem aumentado na população infanto-juvenil, na qual seu valor varia de 2% a 13%12. No presente estudo, foram identificados 42,8% dos escolares com PA elevada. Esse número é superior ao encontrado em um estudo13 que teve como achado uma prevalência de 16,2% da PAS ou PAD em 1.005 crianças e adolescentes. Já Ferreira e Aydos23, em um estudo com crianças e adolescentes obesas em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, constataram uma prevalência de hipertensão de 15,8% no sexo masculino e 26,4% no sexo feminino. O estudo contou com 129 avaliados nas faixas etárias de 7 a 14 anos. Com relação ao sobrepeso, nossos achados se aproximam dos de outro estudo11 no qual 17,7% dos indivíduos apresentavam alterações do peso. Foi constatado também por um estudo13 que a chance de um indivíduo com obesidade ser também portador de hipertensão arterial é 7,53 vezes maior que a chance de um indivíduo com sobrepeso. Comparando indivíduos com sobrepeso e indivíduos com peso normal, o risco de desenvolver hipertensão aumenta em 180%24. Diante disso, o incentivo para a redução do peso deve ser considerado prioritário, pois até mesmo pequenas perdas podem resultar em significativa queda da PA. Outros estudos indicaram uma associação positiva entre o IMC elevado e a prevalência da hipertensão arterial13,14. O excesso de massa corporal é um fator predisponente para a hipertensão, podendo ser responsável por 20% a 30% dos casos de hipertensão arterial15. Em relação ao nível de atividade física, 76% das meninas e 89,2% dos meninos apresentaram nível irregularmente ativo B e 19,1% das meninas e 9,5% dos meninos eram sedentários. Segundo Oehlschlaeger et al.25, os meninos tendem a ser mais ativos do que as meninas. Programas direcionados às meninas devem ser implementados para que, assim, elas usufruam os efeitos benéficos da redução do sedentarismo sobre a saúde. Evidências indicam que a prática de atividade física regular oferece benefícios diretos e indiretos que auxiliam a redução da PA e do risco cardiovascular total26. No Brasil, não há muitos estudos de base populacional ou escolar sobre o nível de atividade física de crianças e adolescentes, mas um do tipo transversal realizado na cidade de Niterói com adolescentes de 14-15 anos evidenciou que 85% dos meninos e 94% das meninas foram classificados como sedentários, escore abaixo de três pontos em uma escala que englobava atividades esportivas realizadas no tempo de lazer27. Outro estudo envolvendo adolescentes de 15 a 18 anos residentes na zona urbana de Pelotas constatou que 39% dos adolescentes eram sedentários. A prevalência de sedentarismo Rev Bras Hipertens vol.17(4):203-209, 2010. Prevalência de fatores de risco para hipertensão arterial em escolares do município de Fortaleza, CE Araújo FL, Monteiro LZ, Pinheiro MHNP, Silva CAB esteve relacionada com o sexo do adolescente, indicando que as meninas são mais sedentárias que os meninos – 54,5% e 22,2%, respectivamente25. Os resultados para o nível de atividade física (NAF) evidenciaram que 89,2% da população masculina e 76% da feminina eram insuficientemente ativos B, ou seja, eram aqueles que realizavam atividades físicas com, no máximo, 120 a 239 min/semana, e 9,5% e 19,1%, masculinos e femininos respectivamente, eram sedentários, realizando apenas 59 minutos no máximo por semana. Esses resultados para o NAF representam valores inferiores ao mínimo necessário para um padrão regular de atividade física, o que é comum entre a população infanto-juvenil atual27. O hábito de fumar cigarros tem sido identificado como um grande problema de saúde pública e causa de morte prematura na população. O nível de tabagismo presente entre a população de estudantes do ensino médio e fundamental no Brasil tem variado de 1% a 34%28. A frequência mais baixa de tabagismo identificado no estudo de Mendes et al.29 foi de 7,5%, semelhante a esta pesquisa, na qual 6,3% afirmaram já ter usado o cigarro. Uma pesquisa realizada com pais de alunos evidenciou que a frequência do tabagismo entre as famílias foi duas vezes maior do que nos filhos estudantes. O estudo de McGill e McMahan30 sugere que a exposição de crianças de forma passiva ao tabaco está relacionada aos efeitos diretos que levam à obstrução das vias aéreas e ao retardo do crescimento da função pulmonar e em adolescentes ao tabagismo. O alto percentual de fumantes nas famílias encontrado no nosso estudo (36,7%) pode contribuir para o desenvolvimento de outras enfermidades a curto e longo prazo. Estudos afirmam que crianças fumantes passivas têm maior frequência de resfriados, infecções do ouvido médio e de doenças respiratórias, tais como pneumonias, bronquites e exacerbação da asma31. Embora o monitoramento da prevalência dos fatores de risco cardiovascular de maneira isolada possa contribuir para o planejamento e o direcionamento de estratégias intervencionistas, a identificação da proporção de indivíduos que apresentam agregação de fatores de risco torna-se extremamente importante, dado que as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) são multicausais16. No presente estudo, a análise de simultaneidade demonstrou que aproximadamente 50% dos adolescentes apresentam dois ou mais fatores de risco cardiovasculares. Em uma revisão da literatura, Guerra et al.32 constataram que ainda não existe um consenso em relação ao sexo que apresenta maior simultaneidade dos fatores de risco de natureza biológica. Aparentemente, essa relação parece ser influenciada pelos pontos de corte utilizados para a caracterização da presença dos respectivos fatores de risco. A probabilidade de alguma das doenças cardiovasculares (DCVs) ocorrer aumenta na presença de múltiplos fatores de 207 risco estabelecidos para aterosclerose. Independentemente de qual fator seja, estudos probabilísticos demonstraram1 que as DCVs aumentam com a idade, e a cada dez anos há uma possibilidade de aumentar em 2,5 vezes a mortalidade por essas doenças. Nesta pesquisa nenhum estudante teve ausência de qualquer fator de risco avaliado, e a associação de três fatores foi maior no sexo feminino e no sexo masculino a prevalência era na maioria de dois fatores associados. Os dados apresentados neste trabalho indicam que os fatores de risco para hipertensão constituem um problema de prevalência elevada entre estudantes da rede pública de ensino do município de cidade de Fortaleza, CE. Além disso, a associação entre esses fatores pode causar risco mais acentuado para doenças cardiovasculares no sexo masculino. Nossos achados reforçam a necessidade de implementação de programas de saúde em ambiente escolar para desenvolver ações preventivas contra esses possíveis problemas. FONTE DE FINANCIAMENTO O presente estudo foi financiado pela Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap). REFERÊNCIAS 1. Romanzini M, Reichert FF, Lopes AS, Petroski ÉL, Farias Jr JC. Prevalência de fatores de risco cardiovascular em adolescentes. Cad Saude Publica. 2008;24(11):2573-81. 2. Ministério da Saúde. Sistema de Informações de Mortalidade (SIM). DATASUS. Óbitos causados por doenças do aparelho circulatório; 2002. 3. Rosário TM, Scala LCN, França GVA, Pereira MR, Jardim PCBV. Fatores associados à hipertensão arterial sistêmica em Nobres-MT. Rev Bras Epidemiol. 2009;12(2):248-57. 4. Sociedade Brasileira de Cardiologia. Sociedade Brasileira de Hipertensão. 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