A ENTREVISTA COM A CRIANÇA NO ÂMBITO DO SISTEMA DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS Ficha Técnica EBOOK | A Entrevista com a Criança no Âmbito do Sistema de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens Data: Junho de 2023 Autor(a): Susana da Silva - Psicóloga Clínica. Membro efetivo da OPP; - Formadora certificada pelo IEFP; - A exercer funções em Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental (CAFAP); - Prática profissional em Comunidade de Inserção, Gabinete de Psicologia e Apoio à Família, Projeto CLDS 3G, Linha Concelhia de Apoio à Terceira Idade e Pessoas Dependentes, Cantina Social, Agrupamentos de Escolas e Prática Privada. Copyright© PSICOGNIS, Psicologia e Formação® Contacto: geral@psicognis.pt Visite-nos em: www.psicognis.pt facebook.com/psicognis instagram.com/psicognis copyright © PSICOGNIS, Psicologia e Formação®, 2023 Todos os direitos reservados. É estritamente proibido o uso, em todo ou em parte, do conteúdo deste documento sem autorização prévia e por escrito, da PSICOGNIS, Psicologia e Formação®, seja para fins pessoais ou comerciais. WWW.PSICOGNIS.PT Índice 06 01 Nota Introdutória Pág. 6 02 Enquadramento Jurídico Pág. 8 Guião de Entrevista no decorrer do Processo Pág. 24 08 Pág. 9 04 Folha de Registo (Avaliação Diagnóstica) Pág. 25 09 As Fases da Entrevista Pág. 11 05 Pág. 20 07 03 A Entrevista no Sistema de Promoção e Proteção Guião de Entrevista Inicial (Avaliação Diagnóstica) Aspetos a ter em conta durante a realização da entrevista Pág. 18 Folha de Registo (Avaliação no decorrer Pág. 29 do Processo) 10 Referências Bibiográficas Pág. 30 01 NOTA INTRODUTÓRIA NOTA: Neste guia, o termo “criança” refere-se a qualquer pessoa com menos de 18 anos de idade ou com menos de 21 anos que solicite a continuação da intervenção iniciada antes de atingir os 18 anos, e ainda a pessoa até aos 25 anos sempre que existam, e apenas enquanto durem, processos educativos ou de formação profissional. O termo “pais” engloba os progenitores, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto da criança. O presente documento destina-se a profissionais que exerçam funções no âmbito do Sistema de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens e pode revelar-se útil na realização da entrevista junto da criança. Salvaguarda-se que o uso deste guia não se direciona para as entrevistas periciais ou forenses, as quais permite diagnosticar e/ou analisar uma situação de maus tratos ou de perigo. Permite recolher informação relevante acerca das necessidades de desenvolvimento da criança, do funcionamento da família e da sua integração na comunidade, devendo ser enquadrada na linha de pensamento inerente seguem protocolos próprios de avaliação e de recolha de informação. ao Modelo Ecológico de Avaliação e Intervenção em Situações de Risco e Perigo. A informação recolhida vai ser crucial para delinear a intervenção (os objetivos, as ações e as tomadas de decisão no âmbito do processo), A entrevista, enquanto técnica valiosa de recolha de informação, em conjunto com outros métodos e técnicas de avaliação e diagnóstico, PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 6 daí ser fundamental o profissional estar ciente da oportunidade que representa o momento da entrevista e da importância de existir uma preparação prévia antes desta ocorrer. No presente guia, encontra um breve enquadramento jurídico, onde se faz referência aos direitos da criança relativamente à sua audição no processo de promoção e proteção; um apontamento relativamente à entrevista junto da criança no Sistema de Promoção e Proteção, onde se distingue a entrevista no início do processo (diagnóstico da situação) e no decorrer do processo (recolha de informação para balanço do processo e dos objetivos e ações realizadas); a distinção das diferentes fases da entrevista (desde a sua preparação, até ao seu término); os aspetos a ter em consideração durante a realização da entrevista; um guião de entrevista inicial, útil para realizar a primeira abordagem junto da criança e onde se recolhe a informação essencial, para compreender a situação e dar início à intervenção; um breve PSICOGNIS • guião de entrevista a realizar durante o decorrer do processo, as respetivas folhas de registo e por fim, as referências bibliográficas, onde constam as fontes das pesquisas da informação que consta no presente guia. A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 7 02 ENQUADRAMENTO JURÍDICO Atendendo à lei em vigor, tendo por base a e capacidade de compreensão e de tomada de Convenção Sobre os Direitos das Crianças decisão. (CSDC) e a Lei de Proteção de Crianças e Estes direitos estão consagrados na Convenção Jovens em Perigo (LPCJP), a criança deve Sobre os Direitos das Crianças (CSDC), no art. ser reconhecida como um sujeito participativo, 3º (Interesse Superior da Criança), art. 5º interveniente no seu processo de crescimento, (orientação da criança), art. 12º (opinião da pelo que entre o vasto conjunto de direitos criança), artigo 13º (liberdade de expressão) e fundamentais, é-lhe concedido o direito de art. 17º (acesso à informação). audição e participação nos processos que lhe dizem respeito. No âmbito do Sistema de Ao nível da Lei de Proteção de Crianças e Promoção e Proteção, a criança, em separado Jovens em Perigo (LPCJP) estão considerados ou na companhia dos pais, tem direito a ser no informada sobre os seus direitos, os motivos intervenção), art. 9º (consentimento), art. 10º que determinaram a intervenção, a forma como (não oposição da criança e do jovem), art. 84º esta se processa, garantindo que a sua (audição da criança e do jovem), art. 86º participação é realizada de forma livre e (informação e assistência), art. 94º (informação esclarecida. Tem ainda direito a ser ouvida e a e participar nos atos e na definição da medida de (advogado), art. 104º (contraditório), art. 107º promoção e proteção, sendo-lhe concedido o (despacho inicial) e art. 114º (debate judicial). exercício do contraditório. art. audição 4º (princípios dos orientadores interessados), art. da 103º Qualquer intervenção deve ser sempre efetuada tendo em conta o permitindo Superior o Interesse da Criança, envolvimento da criança, respeitando a fase de desenvolvimento em que se encontra, de acordo com a idade, maturidade PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 8 03 A ENTREVISTA NO SISTEMA DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO A entrevista pode ser utilizada, numa fase inicial, aquando a sinalização, para a realização da avaliação diagnóstica, da tomada de decisão e do delineamento do respetivo plano de intervenção. Também deve ser utilizada enquanto o processo de promoção e proteção estiver a decorrer, com o intuito de informar, orientar, motivar os progenitores e/ou a criança, promover as mudanças e avaliar os resultados. Se for uma entrevista inicial, revela-se importante avaliar com cuidado os pormenores da ficha de sinalização. Na eventualidade da sinalização advir de uma entidade, deve ser realizada a articulação com a mesma, para recolher mais informação, antes de abordar a família. Ao convocar a família e a criança, podem ser realizadas várias entrevistas (entrevista com os pais e em caso de necessidade com outros familiares, entrevista individual com a criança ou entrevista con- PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 9 junta com os pais e a criança), a fim de apurar o máximo de informação que seja relevante para delinear os objetivos da intervenção. A atitude do profissional, nesta fase, revela-se muito importante para a adesão da família e para o sucesso/insucesso da intervenção. É importante salientar que no âmbito da intervenção das entidades de 1ª linha (Entidades com Competência em Matéria de Infância e Juventude – ECMIJ) e de 2ª linha (Comissão de Proteção de Crianças e Jovens – CPCJ), salvo situações de urgência, a intervenção depende do consentimento expresso dos pais e da não oposição da criança com idade igual ou superior a 12 anos (ou com idade inferior, desde que tenha capacidade e maturidade para conhecer o sentido e alcance da intervenção). Assim, para além da obrigatoriedade acima referida, em qualquer avaliação que esteja relacionada com a criança, antes de ser tomada qualquer decisão, é sempre aconselhável o profissional ouvir ou ter contacto direto com a criança, independentemente das suas capacidades cognitivas ou de maturidade. Se for uma criança de faixa etária precoce, em que não consiga exprimir-se, é benéfico observar a criança e a sua interação com os pais e o meio envolvente e podem utilizar-se técnicas como a observação direta em jogos, desenhos e/ou brincadeiras. A partir dos 4 anos é possível recolher informação através da técnica da entrevista, embora possa existir a necessidade de complementar com outras técnicas, como o desenho, os jogos ou as brincadeiras ao “faz de conta”. Com crianças a partir dos 5 e/ou 6 anos pode-se recorrer às técnicas de desenho, fantoches, ou à reconstituição dos acontecimentos (se não for traumático). Salvaguarda-se que as entidades de 3ª linha (Tribunais) não carecem de consentimento das partes para a sua intervenção. PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 10 04 AS FASES DA ENTREVISTA O cumprimento dos objetivos que se pretende alcançar com a entrevista, contempla quatro fases: (1) uma fase prévia de preparação da entrevista, (2) uma fase inicial em que ocorre a apresentação do profissional e dos objetivos da entrevista, (3) uma fase intermédia onde se realiza a recolha da informação e, por fim, (4) uma fase final, onde se encerra a entrevista. A entrevista semiestruturada, com questões abertas e fechadas, é amplamente a mais utilizada. As questões devem ser colocadas de forma fluída no decorrer da entrevista e não de forma estanque, como se o profissional estivesse a seguir um inquérito. É sempre importante relembrar que o cumprimento dos objetivos da entrevista e a realização (ou não) das questões previamente planeadas, irá depender da interação estabelecida e da abertura da criança para colaborar. PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 11 1.FASE PRÉVIA - PREPARAÇÃO DA ENTREVISTA 1.1. Premissas a ponderar no âmbito do planeamento da entrevista ? Trata-se de uma entrevista inicial ou de uma entrevista no decorrer do processo? Consiste em planificar como irá ser realizada a entrevista, a sua finalidade e os objetivos a atingir. Implica: Se for uma entrevista inicial, o foco deve estar no estabelecimento da relação e da interação 1. Ponderar algumas premissas acerca de com a criança. Prevê-se a necessidade de que forma se irá processar a entrevista; conceber um guião de entrevista mais 2. Agendar a entrevista; elaborado, uma vez que existe a necessidade 3. Preparar o setting; de recolher a informação inicial para se compreender o processo e o diagnóstico da 4. Realizar o guião de entrevista. situação. Nem sempre é possível recolher toda De forma a que seja possível recolher a informação necessária de forma organizada e completa, deve existir uma planificação da informação que se pretende obter, da ordem em que as questões são colocadas, das técnicas a utilizar, do setting a preparar, sempre tendo em vista a finalidade e os objetivos da entrevista e respeitando o tempo da criança. a informação necessária numa só entrevista e como tal, poderá ser necessário agendar uma segunda entrevista (principalmente se a criança estiver cansada ou não estiver ainda preparada para abordar determinados assuntos). Se for uma entrevista no decorrer do processo, a mesma é realizada com uma finalidade bem precisa. Por norma, pretende-se apurar informação acerca de uma situação específica ou realizar um balanço da intervenção realizada até outrora. PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 12 ? A entrevista é realizada individualmente maior segurança junto do profissional e os pais com a criança ou ocorre na presença dos sentem que não estão a ser excluídos do pais? processo. É, no entanto, importante avaliar se tal não pode conduzir a maior probabilidade de A criança tem direito a ser informada dos seus direitos, dos motivos que determinaram a intervenção e da forma como esta se processa. Em separado ou na companhia dos pais, tem direito a ser ouvida e a participar nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção. As pessoas presentes na entrevista, deverão ser determinadas em função das caraterísticas de cada caso. Cabe ao profissional decidir se a entrevista é realizada de forma individual com a criança (a criança entra sozinha no espaço e é entregue no término da entrevista aos pais), se a entrevista é realizada na presença dos pais ou se a entrevista é realizada de forma mista (a criança entra no espaço com os pais, é realizada a apresentação sugestionabilidade das respostas da criança, pois a criança pode não se abstrair daquilo que os pais eventualmente gostariam que respondesse. Em outras situações, por exemplo, no decorrer do processo, quando se realiza um balanço da intervenção e quando se trata de crianças com mais idade, pode revelar-se útil realizar uma entrevista conjunta com os pais e a criança e delinear objetivos e tarefas em conjunto. Cabe ao profissional avaliar e decidir na situação em concreto qual a melhor metodologia a adotar. Nos casos em que existem suspeitas de um ou ambos os pais serem responsáveis pelos maus-tratos, estes não deverão estar presentes na entrevista. do profissional e os objetivos da entrevista e é solicitado aos pais para se ausentarem do espaço, apenas regressando na fase final da mesma). Por exemplo, em situações de perigo iminente, sempre que possível, procura-se realizar a entrevista individual à criança. Por outro lado, em situações em que se obteve previamente o consentimento informado dos pais e que estes demonstram estar colaborantes, pode-se eventualmente optar pela entrevista mista. A presença dos pais permite à criança sentir uma PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 13 ? No caso de fratria, a entrevista é realizada 1.3. Preparar o setting (espaço físico e de forma conjunta ou individual? materiais lúdicos à disposição da criança) Não existe apenas uma resposta válida, para cada situação o profissional deve tentar perceber As instalações devem ser acolhedoras e de que forma poderá obter com mais facilidade apelativas para a informação que necessita. agradável, possuir A entrevista individual permite que a criança algumas comodidades, como por ex. casa de expresse a sua opinião de forma espontânea, banho próxima, sala de espera). sem influência ou receio da presença da restante Os materiais lúdicos devem ser adequados à fratria. A entrevista conjunta permite ao idade e ao nível de desenvolvimento da profissional observar a dinâmica relacional entre criança e quando necessário, podem ser a fratria. utilizados, para facilitar a expressão da criança Quando é possível e se tal se justificar, deve-se privilegiar a possibilidade de realizar duas entrevistas, uma de forma conjunta e outra individual. a criança alguns (decoração brinquedos e e a interação com o profissional. Os desenhos ou brincadeiras elaboradas pela criança, devem ser contextualizados, ou seja, é importante pedir à criança que descreva o que desenhou ou representou, para não ser realizada uma interpretação ou suposição elaborada pelo profissional. 1.2. Agendar a entrevista Estabelecer contacto com os pais, com o intuito de indicar o dia, hora, local e identificação dos membros da família que se pretende entrevistar. Alguns exemplos de materiais lúdicos: - Material de desenho e pintura (folhas de papel, lápis, canetas, borracha…); - Família de madeira com roupas a representar as três gerações (filhos, pais e avós); - Utensílios de cozinha (panela, pratos, copos, garfos, facas, colheres); - Nenuco, biberão, bacio; doudou, pano, roca; PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 14 - Mala de saúde (seringa, estetoscópio…); 2. FASE INICIAL DA REALIZAÇÃO - Soldadinhos (ou Índios e Cowboys); DA ENTREVISTA - Animais de borracha (selvagens, domésticos, pré-históricos); - Legos; - Carros (ambulância, carro de bombeiros, carro de polícia, táxi, carros normais); Consiste em realizar a apresentação do profissional e dos objetivos da entrevista. - Peças de madeira; - Plasticina; - Puzzles do corpo humano; Nesta fase - Peças de encaixe; procurar: inicial, o profissional deve Dar oportunidade à criança de explorar o espaço; Manter uma postura empática e tranquila, referindo-se à criança sempre no primeiro nome; 1.4. Realizar um guião de entrevista Preparar um guião onde conste as dimensões e variáveis que se pretende explorar e a ordenação mais adequada e lógica de inserir as questões. Adotar uma linguagem clara e adequada à sua idade e nível de desenvolvimento; Realizar a sua apresentação (indicar o seu nome, a sua profissão e a entidade em que exerce funções); Tentar apurar as expetativas da criança (porque acha que está ali ou se algo lhe foi dito por parte de terceiros) e se necessário clarificá-las; Explicar o motivo da convocatória, prestar informação acerca dos seus direitos, os motivos que conduziram à intervenção, a forma como esta se processa e os limites da confidencialidade (com vocabulário adequado ao nível de desenvolvimento da criança); PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 15 Transmitir à criança que esta tem o direito Tal situação, para além de estabelecer a a ser ouvida e dizer o que pensa e o que proximidade e a interação com a criança, sente e que na eventualidade de não permite ao profissional perceber se está a compreender alguma coisa que foi dita utilizar uma linguagem percetível para a pelo profissional, pode dizer que não criança. percebeu e fazer perguntas; capacidade cognitiva da criança e funciona Garantir a privacidade no decurso das como preparação para as perguntas que entrevistas às crianças e suas famílias. poderão suscitar mais emoções e reações. É Permite ainda compreender a comum usar-se as conhecidas seis questões do jornalismo: “o quê”, “quem”, “quando”, 3. FASE INTERMÉDIA DA “onde”, “como” e “porquê”, para perceber se REALIZAÇÃO DA ENTREVISTA a criança consegue compreender e fornecer uma descrição mais completa. Por exemplo, uma criança com mais idade, à partida consegue explicar que: iniciou a frequência Consiste em recolher a informação necessária para realizar a avaliação da situação- problema: informação sobre a criança, a família, o meio envolvente, os fatores de risco, os fatores de proteção e a consciencialização da criança acerca dos motivos que conduziram à sinalização. Nesta fase em ATL, por opção dos progenitores (o quê? e quem?), aquando o início do 2º ciclo (quando?), num espaço perto da sua residência (onde?), para que pudesse ter o apoio individualizado na realização dos trabalhos de casa (como? e porquê?). Crianças mais pequenas, tendem a não conseguir responder às questões “como” e “porquê”, pois exige intermédia, o profissional deve maior interpretação e reflexão. optar por introduzir questões relacionadas com dimensões neutras, ou seja, que são relevantes recolher para melhor compreender o processo, mas que não estão relacionadas com a problemática principal subjacente ao processo (por exemplo, escola, amigos, atividades extracurriculares, atividades de lazer, interesses). PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 16 Cabe ao entrevistador certificar-se acerca da 4. FASE FINAL DA REALIZAÇÃO DA capacidade da criança responder a estas ENTREVISTA questões, para numa etapa posterior, aquando o cerne da entrevista, saber que tipo de questões pode colocar. Aquando a exploração da situação que conduziu à entrevista, é importante apurar: A duração, quando se considera que não estão reunidas intensidade e generalização da situação- condições para dar continuidade à mesma (por problema; motivos Os frequência, Quando se cumpriu o objetivo da entrevista ou magnitude, acontecimentos antecedentes e de fadiga, excesso de tensão emocional…), dá-se o término da entrevista. consequentes, incluindo os acontecimentos potencialmente reforçadores, relacionados com a situação-problema; As circunstâncias em que a situaçãoproblema tem maior ou menor probabilidade de ocorrer; Os fatores relacionados com os pais, a escola e o ambiente que pode contribuir para a situação-problema; As perceções da criança acerca dos seus pais, professores, amigos e outras pessoas importantes na sua vida; As forças, motivações e recursos para a mudança; A capacidade e disposição da criança para colaborar no processo de avaliação e mudança. Nesta fase final, o profissional deve: Realizar um resumo dos pontos centrais da entrevista, dando oportunidade à criança de corrigir algo que não tenha sido bem interpretado; Dar espaço à criança para acrescentar informação ou para esclarecer algumas dúvidas; Evitar fazer promessas que eventualmente possa não conseguir cumprir; Fazer a ponte para a entrevista seguinte, incidindo sobre as tarefas, os objetivos e as ações futuramente previstas; Concluir com um assunto neutro ou positivo (que ajude a criança a sair de forma tranquila da entrevista) e com um reforço positivo à criança pelo esforço e colaboração no processo (e não pelos conteúdos relatados). PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 17 05 ASPETOS A TER EM CONTA DURANTE A REALIZAÇÃO DA ENTREVISTA No início da entrevista pode-se encorajar a criança a relatar de forma espontânea a informação através de questões abertas (por ex. na tua forma de veres as coisas, o que achas que pode ter levado a que isto O profissional deve ter conhecimento dos processos de desenvolvimento típicos das várias faixas etárias, para melhor compreender as necessidades da criança e assim, melhorar a qualidade da informação acontecesse?) e quando esgotada a informação espontânea, optar pelo uso de questões fechadas para obter informação precisa (“em que momento começaste a faltar às aulas?”). obtida; PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 18 Deve ser colocada uma questão de cada vez e podem ser usadas as palavras da criança para formular a próxima questão; Quando não se entende de forma clara o que a criança pretendeu dizer, não se deve corrigir a resposta da criança, mas sim, usar a técnica da clarificação (por ex. “há pouco referiste (…) podes explicar melhor?”); Enquanto vai colocando as questões, o profissional deve ter o cuidado em avaliar o estado emocional da criança (por exemplo, expressão verbal e não verbal de medo, ansiedade, tristeza, alegria…) e assim conduzir a entrevista de forma a que a criança se mantenha confortável. Se a criança chorar ou se se mantiver em silêncio, deve-se respeitar o tempo da criança. Pode-se sugerir a utilização do material lúdico como técnica facilitadora de comunicação e expressão; Ao longo do discurso da criança, é importante o profissional manter o contacto visual, a escuta ativa e verbalizações empáticas para que a criança se sinta acolhida e compreendida; No caso da criança estar incomodada, Quando se entrevista a criança, é importante não manifestar críticas acerca dos pais e não fazer com que a criança se sinta culpada ao abordar os temas da família; Nos momentos em que a criança se estende no seu discurso com informação acessória, o profissional deve interromper suavemente, oportunidade esperando para pela melhor redirecionar as questões sobre a informação que importa obter. recomenda-se o adiamento de perguntas que suscitem reações mais emotivas, para outras entrevistas, em que a relação de confiança entre a criança e o profissional o permita; PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 19 06 GUIÃO DE ENTREVISTA INICIAL (AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA) Nota prévia: O presente guião de entrevista deve ser adaptado de acordo com a idade da criança, a natureza da situação concreta e os quesitos específicos a que se pretende dar resposta. O profissional deve previamente ponderar as dimensões e variáveis que pretende explorar e a ordenação mais adequada e lógica de inserir as questões, de forma a manter um fio condutor que facilite o processo de raciocínio e a narração de eventos. 1. Apresentação Apresentação rendimento, do comportamento e da relação do profissional, dos objetivos da entrevista e dos limites da confidencialidade; Auscultação das expetativas da criança relativas à entrevista; do Agregado Familiar Nome, D.N., nacionalidade, morada, telefónico, composição do agregado familiar, ocupação /profissão dos elementos do agregado familiar; pares e restante comunidade turma, Diretor Presente ano letivo: 1. Escola, ano, de Turma/Professor Titular; Assiduidade eventualidade e de pontualidade absentismo (na escolar, perceber se é recorrente e as causas); 3. Aproveitamento escolar (especial atenção para mudanças bruscas e recentes do rendimento, dificuldades de aprendizagem, problemas de atenção e concentração, assim como problemas de desenvolvimento físico, cognitivo, social e 3. Situação Escolar e Social emocional); Percurso escolar (informações relevantes dos anos letivos anteriores ao nível do PSICOGNIS os educativa); 2. 2. Dados de Identificação e Composição contacto com • 4. O que mais e menos gosta na escola e porquê; A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 20 5. Sucessos e dificuldades escolares, a sua mo agressividade para com os outros, lesões perceção acerca dos mesmos; ações adotadas autoinfligidas pela criança, pela escola e pelos pais para menos adequados ou psicopatológicos); ou outros comportamentos ultrapassar as dificuldades; 6. Padrão relacional com os pares, os 6. Autoconceito professores e o pessoal não docente; 7.Vontade de mudar de escola (se sim, quais os Como se vê e descreve a si própria, aspetos motivos); que gosta e outros que gostaria de alterar e Perceção da escola e expetativas face ao porquê, em que situações experiencia futuro; alegria/tristeza/raiva/medo, vergonha… e Frequência de ATL, atividades extra- como reage?, como considera que é curriculares e desportivas; percecionado nos diferentes contextos que frequenta (familiar, escolar, social); 4. Relação com os pares 7. Dinâmicas Familiares Identificação dos pares, contextos, duração das relações, atividades que realizam em conjunto, pontos de identificação, estratégias de resolução de conflitos, sentimento de pertença no grupo/isolamento social; de a criança descreve os pais; se identifica caraterísticas individuais ao nível da saúde física e mental, capacidades intelectuais e comportamentos aditivos e/ou violentos; aspetos positivos e aspetos a melhorar em cada um dos pais); 5. Situação de Saúde Problemas Perceção das caraterísticas dos pais (como Perceção saúde identificados (especialidades, nome do médico e local onde tem acompanhamento, data de início do acompanhamento, última consulta e consultas futuras agendadas); Presença de sintomatologia a carecer de avaliação (problemas de saúde física, mental, adições, presença de problemas emocionais ou indicadores de mal-estar, co- PSICOGNIS • da relação com os pais (atividades realizadas em conjunto; quem supervisiona e orienta as rotinas; papel de cada um; práticas parentais; regras e métodos de disciplina; comunicação; emoções associadas a cada um dos pais; eventuais aspetos que gostaria de alterar); Perceção da relação entre os pais (atividades que realizam em conjunto; rotinas; áreas de acordo e desacordo; con- A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 21 flitos parentais; estratégias de gestão de - Acesso do agressor à criança e presença de emoções e de resolução de conflitos). Tentar figuras protetoras; avaliar se no caso da relação conjugal estar em Estratégia/reação da criança na ocorrência crise ou em situações de monoparentalidade, se dos factos (para avaliar a capacidade de tal afeta a atenção e os cuidados prestados à resiliência da criança, até que ponto a criança; criança demonstra o desejo e capacidade de Relação/proximidade com a restante proteger-se a si mesma dos maus-tratos); família alargada (qualidade e frequência da Emoções associadas à situação; relação estabelecida); Como reagem os diferentes elementos Apoio social extra-familiar, como vizinhos, familiares ou educativos face à situação- ATL, problema; centro lúdico, atividades extracurriculares; Consciência da criança relativamente às Rotinas familiares (hora de levantar, deitar, consequências que a situação de perigo refeições, percurso para a escola, higiene origina no seu bem-estar e segurança; pessoal e habitacional, participação nas Avaliar o grau de recidiva: compreender a tarefas domésticas); duração dos comportamentos de risco ou 8. Avaliação da situação de risco e/ou perigo e do seu grau de perigosidade Perspetiva da criança relativamente aos factos apontados na sinalização (para avaliar a veracidade dos factos, perceção da criança relativamente à situação e possíveis sequelas a nível físico, emocional ou comportamental); Avaliação da problemática que origina a situação de risco e/ou perigo: - Intensidade, frequência e duração dos maus tratos/situação problema; - Proximidade temporal do incidente; - História anterior de maus-tratos; PSICOGNIS perigo (fazer a ponte entre o passado e o presente), identificar as causas que despoletaram o aparecimento da situação de mau-trato (situação de crise – aguda) e contribuíram para a sua manutenção (quando se trata de situação crónica); Na sua perspetiva de que forma pode ser solucionada a situação (ou gostaria que fosse resolvida); Expetativa, motivação e otimismo relativamente à possibilidade de mudança dos intervenientes e/ou das circunstâncias, grau de colaboração na mudança; Carências ou necessidades existentes e que não estejam a conseguir ser respondidas pelos pais; • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 22 9. Conclusão Resumo dos pontos centrais da entrevista, dar espaço à criança para colocar dúvidas, fazer a ponte para a entrevista seguinte abordando os objetivos, as tarefas e as ações futuramente previstas (especificar as tarefas que ficarão a cargo do profissional e as que ficarão a cargo da criança); Terminar com um assunto neutro e um reforço positivo à criança pelo seu esforço e colaboração. PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 23 07 GUIÃO DE ENTREVISTA NO DECORRER DO PROCESSO Nota prévia: O presente guião de entrevista deve ser adaptado de acordo com a idade da criança, a natureza da situação concreta e os quesitos específicos a que se pretende dar resposta. O profissional deve previamente ponderar as dimensões e variáveis que pretende explorar e a ordenação mais adequada e lógica de inserir as questões, de forma a manter um fio condutor que facilite o processo de raciocínio e a narração de eventos. Realizar a ponte com a entrevista anterior, tendo como referência o resumo, os objetivos, as tarefas e as ações delineadas na conclusão da entrevista anterior; Apurar alterações no agregado familiar: situação escolar, atividades extracurriculares, relação com os pares, situação de saúde e dinâmicas familiares; Averiguar se foram cumpridas as tarefas e as ações a serem realizadas pela criança, delineadas na entrevista anterior e dar feedback das ações e tarefas realizadas pelo profissional; Apurar se ocorreram mudanças relativamente às situações-problema/situações de risco; Delinear novas estratégias de intervenção e definir novas tarefas e ações; Resumir os pontos centrais da entrevista e dar espaço à criança para colocar dúvidas; Terminar com um assunto neutro e um reforço positivo à criança pelo seu esforço e colaboração. PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 24 08 FOLHA DE REGISTO (Avaliação Diagnóstica) Processo__________________________________________________________________________ Data_________________________________________ Local_______________________________ Intervenientes______________________________________________________________________ Objetivos_________________________________________________________________________ _ 1. Apresentação 2. Dados de Identificação e Composição do Agregado Familiar (Nome, D.N., Nacionalidade, Morada, Contacto telefónico, Composição do agregado familiar, Ocupação/profissão dos elementos do agregado familiar) 3. Situação Escolar e Social (Percurso escolar, Ano, Turma, Escola, Assiduidade, Aproveitamento, O que mais e menos gosta na escola, Ações adotadas pela criança, pelos pais e pelos professores para ultrapassar as dificuldades, Relação com os pares, os professores e restante comunidade educativa, Expetativas face ao futuro, Atividades extracurriculares) PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 25 08 FOLHA DE REGISTO (Avaliação Diagnóstica) 4. Relação com os Pares (Identificação dos pares, Contextos, Duração das relações, Atividades que realizam em conjunto, Pontos de identificação, Estratégias de resolução de conflitos, Sentimento de pertença no grupo) 5. Situação de Saúde (Problemas de saúde identificados, Presença de sintomatologia a carecer de avaliação) 6. Autoconceito (Descrição de si própria, Aspetos que gosta e que gostaria de alterar e porquê, Situações em que experiencia alegria/tristeza/raiva, medo, vergonha e como reage, Como considera que é percecionada nos diferentes contextos) PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 26 08 FOLHA DE REGISTO (Avaliação Diagnóstica) 7. Dinâmica Familiar (Descrição dos pais, Aspetos positivos e aspetos a melhorar em cada um dos pais, Relação com os pais, Atividades realizadas em conjunto, Definição de papéis, Supervisão e orientação de rotinas, Eventuais aspetos que gostaria de alterar; Perceção da relação entre os pais, Áreas de acordo/descordo, Conflitos parentais, Resolução de conflitos, Proximidade com família alargada, Apoio social extra-familiar) 8. Avaliação da Situação de Risco e/ou Perigo (Perspetiva acerca dos factos apontados na sinalização, Frequência, duração, proximidade temporal do incidente, proximidade do agressor e presença de figuras protetoras, História anterior de maus tratos, Estratégias/reações da criança na ocorrência dos factos, Emoções associadas à situação, Reação dos diferentes elementos familiares e educativos, Consciência das consequências, Grau de recidiva, Soluções para a situação-problema, Expetativa e motivação para a mudança, Necessidades que não estejam a ser respondidas pelos pais) PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 27 08 FOLHA DE REGISTO (Avaliação Diagnóstica) 9. Outros Assuntos a Abordar 10. Conclusão (Objetivos, Tarefas e Ações futuras previstas) PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 28 09 FOLHA DE REGISTO (Avaliação no decorrer do Processo) Processo_________________________________________ Local______________________ Data_________________________________________ Intervenientes______________________________________________________ Objetivos_________________________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________________________________ 1. Registo da Informação Recolhida (Ponte com a entrevista realizada na sessão anterior; Avaliação de resultados; Atualizar informação relativa a situação escolar, atividades extracurriculares, relação com os pares, situação de saúde e dinâmicas familiares; Mudanças relativamente às situações-problema); 2. Estratégias, Tarefas e Ações a Desenvolver PSICOGNIS • A ENTREVISTA COM A CRIANÇA 29 08 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Agulhas, R & Alexandre, J. (2017). Audição da Criança - Guia de Boas Práticas. Lisboa: Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados. Alexandre, J. & Agulhas, R. (s.d). Audição de Crianças e Jovens - Guia de Boas Práticas Profissionais. Projeto 12 - Justiça para as Crianças. Lisboa: ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa. Comissão Nacional de Crianças e Jovens em Risco. (s.d.). Promoção e Proteção dos Direitos da Criança - Guia de Orientações para os Profissionais de Acção Social na Abordagem de Situações de Maus-Tratos ou outras Situações de Perigo. Educo (2019). Guía Educo para entrevistar a niños, ninãs y adolescentes con enfoque de derechos. Madrid: Educo. Fundación Ciencia Joven (s.d). Protocolo de actuación con niños, niñas y adolescentes. Fundación Ciencia Joven. Lei nº 147/99, de 1 de setembro, atualizada pela Lei 26/2018, de 5 de julho (Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo). https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.phpnid=2911&tabela=leis&ficha=1&pagina =1&so_miolo Ordem dos Psicólogos Portugueses (2014). Revisão do Sistema de Promoção e Proteção das Crianças e Jovens em Perigo. Lisboa. Ordem dos Psicólogos Portugueses (2021). Guia de boas práticas sobre a avaliação forense pericial em processos de regulação do Exercício das responsabilidades parentais. Lisboa. N O M E D A TPUSAI CMOAGRNCI S A •• OE D EB AT ÍETNUTL R VO IST AOCOOKM A C R I A N Ç A 3 04 Resolução da Assembleia da República nº 20/90. Convenção sobre os Direitos da Criança. https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=1894&tabela=leis Sattler, J. (2008). Entrevistas con niños, padres, maestros y familias. En evaluación infantil: aplicaciones conductuales, sociales y clínicas (161-185). México: El Manuel Moderna. 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